Nascido no Cairo poucos meses antes da Revolução Russa, de 1917, Hobsbawm é um influente pensador marxista e passou toda sua vida ligado aos movimentos revolucionários. Um de seus livros mais conhecidos, “A Era das Revoluções”, que retrata justamente as revoltas de 1848, é um clássico da historiografia.

Além de escrever sobre as revoluções, Hobsbawm também apoiou algumas revoltas. Com mais de 90 anos, sua longa paixão pela política reaparece no título de seu mais novo livro: How to change the World (Como mudar o mundo) e em seu enorme interesse pela Primavera Árabe. “A verdade é que tenho um sentimento de excitação e alívio”, disse, ao receber a reportagem em sua casa em Hampstead Heath, bairro no norte de Londres.

Para Hobsbawm, 2011 lembra outro ano de revoluções. “Me lembra 1848, outra revolução impulsionada de forma autônoma, que começou em um país e depois se estendeu por todo um continente em pouco tempo”, diz. Naquele ano, um levante popular em Paris acabou se alastrando pela área da atual Alemanha e Itália e pelo Império Habsburgo (hoje Áustria).

Hobsbawm tem uma palavra de alento para quem ajudou a encher a praça Tahir, no Cairo, derrubando o regime de Hosni Mubarak, em fevereiro, e agora teme pelo destino da revolução egípcia. “Dois anos após 1848, tudo parecia como se houvesse fracassado. Mas no longo prazo não houve fracasso. Conseguiu-se uma boa quantidade de avanços liberais. De modo que foi um fracasso imediato, mas um êxito parcial no médio prazo, ainda que não tenha sido na forma de revolução”, diz.

Talvez com exceção da Tunísia, Hobsbawm não vê grandes possibilidades da democracia liberal ou governos representativos ao estilo ocidental triunfarem no mundo árabe. O historiador ressalta ainda as diferenças entre os vários países varridos pela atual onda revolucionária. “Estamos no meio de uma revolução, mas não de uma única revolução. O que une (os árabes) é um descontentamento comum e forças de mobilização comuns: uma casse média modernizadora e sobretudo jovem, estudantes e, principalmente, uma tecnologia que permite que hoje seja muito mais fácil mobilizar os protestos”, afirma.

Indignados e ‘Occupy’

A importância das redes sociais também ficou evidente em outro movimento que marcou 2011: os protestos dos indignados e as ocupações que ocorreram na Europa e na América do Norte. Segundo Hobsbawm, o movimento remonta à campanha eleitoral de Barack Obama, em 2008. Na ocasião, o então candidato mobilizou com sucesso, por meio da internet, uma juventude até então apática à política.

“As ocupações, em sua maioria, não foram protestos de massa, não foram os 99% (da população), mas de estudantes e membros da contracultura. Em momentos, isso encontro eco na opinião pública. É o caso dos protestos contra Wall Street e as ocupações anticapitalistas”, afirma.

Segundo Hobsbawm, “as mobilizações de massa mais efetivas hoje são aquelas que começam em meio a uma classe média moderna, em particular num grupo grande de estudantes. São mais efetivos em países onde, demograficamente, os jovens são mais numerosos”. Isso evidencia, diz o historiador, uma nova realidade para as focas progressistas.

“A esquerda tradicional estava orientada para um tipo de sociedade que já não existe mais ou está deixando de existir. Acreditava-se sobretudo no movimento operário como o grande responsável pelo futuro. Bem, nos desindustrializamos, e isso já não é possível”, opina o historiador.

Compreender o passado

Eric Hobsbawm não espera que as revoluções árabes tenham maiores ecos no mundo, ao menos não como uma antessala de uma revolução mais ampla. Será mais provável, assegura, uma dinâmica que compreenda reformas graduais do estilo das que “ocorreram na Coreia do Sul nos anos 1980, quando uma classe média jovem passou a disputar o poder com os militares”.

Sobre o drama político que ainda se desenrola nos países árabes, o historiador diz que vale a pena recordar o Irã de 1979, cenário da primeira revolução que teve o Islã como elemento político. Esse aspecto da revolução iraniana teve reflexos na Primavera Árabe.

“Quem fez concessões ao Islã sem ser religioso, como os reformistas, liberais e comunistas, acabou marginalizado”, diz, destacando outros grupos que se somaram aos religiosos para derrubar a monarquia iraniana alinhada ao Ocidente. “A ideologia das massas não é a ideologia dos que começaram as manifestações”, pontua. Embora diga que a Primavera Árabe lhe tenha causado alegria, Hobsbawm diz que o elemento religioso no movimento é “desnecessário e não necessariamente bem-vindo”.

Com informações da BBC