A proposta consiste em organizar e divulgar cerca de 20 mil imagens do acervo. Estão previstas a coleta, armazenamento e divulgação – em livro e eletrônica – de 42 depoimentos de militantes que foram vítimas de repressão e perseguição política durante a ditadura militar no país; a digitalização de periódicos, cartazes e imagens que reflitam a resistência, a perseguição e a vida de organizações revolucionárias.

Na segunda-feira (30), o diretor da Fundação Maurício Grabois, Leocir Rosa, e o coordenador do projeto Felipe Spadari da Silva, estiveram em Brasília para participar da primeira oficina sobre execução dos projetos. A reunião aconteceu na sede do Ministério da Justiça e contou com a participação do secretário Paulo Abrão, presidente da Comissão de Anistia, que destacou a importância do edital para a construção de uma memória oficial sobre a ditadura que vitimou o país por mais de duas décadas. Ele ressaltou que esse é um passo importante para a criação de um movimento nacional de memória.

Para Abrão resgatar a história é um ato de reparação coletiva que permite dar visibilidade aos erros cometidos como ferramenta de defesa da democracia e dos princípios democráticos, zelando para que jamais se repitam. “Estamos rompendo com uma tradição cultural de esquecimento que produz injustiças. A memória é uma arma humana contra a barbárie, precisamos dar visibilidade aos erros para que eles não voltem a acontecer e como forma de combate às violências atuais”, ressaltou.

Marcas da Memória

O projeto “Marcas da Memória” reúne depoimentos, sistematiza informações e fomenta iniciativas culturais que permitam a toda sociedade conhecer o passado e dele extrair lições para o futuro.Entre seus propósitos está expandir a reparação individual em um processo de reflexão e aprendizado coletivo, baseado em quatro eixos: audiências públicas, história oral, chamadas públicas de fomento ás iniciativas da sociedade civil e publicações

As propostas selecionadas no primeiro edital público, em 2010, elaboraram livros, documentários, materiais didáticos e informativos, exposições artísticas, peças teatrais, palestras e musicais. Entre os produtos selecionados estão: “Caravanas da Democracia”, documentário sobre a atuação da Comissão de Anistia; Livro “Caravanas da Anistia – O Brasil pede perdão”; “Repare Bem”, documentário sobre os filhos dos perseguidos políticos; Documentário sobre 24 ex-presas políticas da Colônia Penal do Bom Pastor de Recife; “Para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça”, exposição de painéis com fotos e textos sobre os 30 anos da Lei de Anistia; “Filha da Anistia”, Peça teatral com 27 apresentações gratuitas em seis Estados; entre o utras iniciativas louváveis.

A segunda chamada pública apresentou aproximadamente 50 propostas. De acordo com Marcelo Torelli, coordenador geral de Memória Histórica, foram contratadas as melhores colocadas obedecendo os limites estabelecidos pelo orçamento. A seleção das propostas foi feita por um comitê externo, para garantir a lisura do processo. Após selecionadas foram apresentadas individualmente ao ministro da Justiça, que assinou cada contrato. Além do projeto da FMG foram selecionadas propostas da Fundação Getúlio Vargas, que produzirá um livro dedicado ao papel de profissionais da advocacia na contestação de atos de arbítrio do regime militar; da Associação Pesquisadores sem Fronteira; do Instituto Gestão e Tecnologia de Pernambuco; do Instituto Macuco; do Movimento Tortura Nunca Mais, entre outros.

Repressão e o direito à resistência

Através da coleta de depoimentos o CDM pretende reconstituir processos que, devido aos regimes de exceção, tiveram destruídos fontes como documentos, fotos e manuscritos, prática comum ao Estado autoritário e repressor que destruía e saqueava documentos, tornando mais difícil contar a história da resistência da sociedade e das organizações revolucionárias. Com o projeto será possível recontar a história de militantes perseguidos pela ditadura, que para garantir suas vidas e sua liberdade, precisaram, muitas vezes, destruir também documentos e outros registros.

As fontes orais serão estratégicas para historiar a memória política do período. “O resgate da história da resistência à ditadura militar necessita da história oral, mas deve-se ter cuidado em seu uso – é necessária atenção para que não haja uma sobreposição do indivíduo à história construída coletivamente“, explica Fernando Garcia, Coordenador do CDM.

Ele lembra que antes de chegar às questões que serão tratadas pelo depoente há a necessidade de pesquisa exaustiva com fontes primárias e secundárias, bibliografia relativa ao tema a ser abordado pelo depoente, e claro, conhecimento, mesmo que elementar, da trajetória do próprio indivíduo.

De acordo com Garcia, o projeto terá abrangência nacional, embora, a princípio, seja focado no Ceará, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. O resultado do projeto será disponibilizado na página da Fundação Maurício Grabois e também estará aberto para pesquisa no Centro de Documentação e Memória (CDM). As entrevistas mais expressivas serão publicadas em livro.

Centro de Memória e Documentação

A Fundação Maurício Grabois foi criada em abril de 2008 para suceder o Instituto de mesmo nome. A entidade é um espaço de promoção de estudos, pesquisas e análises nas áreas política, econômica, social e cultural, e sobre as realidades brasileira e mundial. Através do seu Centro de Documentação e Memória (CDM), realiza um trabalho de educação política e formação militante, além de pesquisar e organizar o acervo sobre a história e a memória do Partido Comunista do Brasil, da esquerda brasileira, e do movimento operário e popular.

A Grabois constituiu em 2008 o CDM para resgatar, coletar, acondicionar, restaurar, organizar, classificar, catalogar e difundir a documentação existente do Partido Comunista do Brasil; além de sistematizar essa trajetória em linhas de pesquisa que resultem em trabalhos (científicos ou não). Essa produção está sendo disponibilizada ao público pelo seu sítio na internet (www.grabois.org.br/portal/cdm).

Durante o ano de 2009, o CDM contou com o trabalho de uma equipe de arquivistas experientes para iniciar a classificação e limpeza de 70 caixas de documentos; dezenas de títulos de periódicos, que somam milhares de exemplares; por volta de 14 mil fotos, mais de 4.500 livros; 400 cartazes; 350 slides; 998 fitas de vídeo; 455 fitas cassete; 190 DVDs; e um amplo leque de cultura material.

Em 2010 o CDM/Grabois inaugurou seu sítio virtual, onde passou a divulgar centenas de documentos, artigos, áudios, vídeos, entrevistas, resenhas e notícias vinculadas aos direitos humanos, em especial à defesa da Comissão da Verdade no Brasil, Chile, Argentina e Uruguai. Hoje o sítio do CDM/Grabois é uma das principais referências de notícias sobre a luta de ex-perseguidos políticos, a busca dos corpos dos desaparecidos e a reconstrução da memória da repressão durante a ditadura militar no Brasil.