A frase acima, atribuída a Karl Marx, é uma boa lembrança para a vida seminal do professor Aloísio Teixeira, morto aos 67 anos em decorrência de enfarte fulminante na manhã desta segunda-feira, 23 de agosto de 2012, em sua casa, em Ipanema, na cidade do Rio de Janeiro, onde estava com a mulher, a economista Beatriz Azeredo. Aloísio Teixeira deixa cinco filhos e quatro netos.

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Nota da Fundação Maurício Grabois
N
ota do PCdoB-RJ
Renato Rabelo: O Brasil e a educação perdem Aloísio Teixeira

Em 1998, apontado por alunos, professores e funcionários como o nome escolhido para a cadeira de reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), foi vetado para o cargo pelo então ministro da Educação do governo tucano de Fernando Henrique Cardoso (FHC), Paulo Renato Souza. Professor titular do Instituto de Economia, finalmente assumiu a reitoria, em 2003, e ocupou o cargo até 2011. Como legado para os estudantes e funcionários da UFRJ, tem no currículo a criação de um Plano Diretor com metas até 2020 e a recuperação, após longo imbróglio judicial, do terreno onde funcionava o Canecão.

Em sua gestão, a universidade aderiu ao Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), que ampliou as vagas nas universidades públicas e substituiu o vestibular próprio pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu), do MEC. Como explicitou o atual reitor da instituição de ensino, Carlos Levi, “o professor Aloísio imprimiu à UFRJ a marca do diálogo, da preocupação com o acesso universal ao Ensino Superior e, sobretudo, da reflexão, características de sua longa trajetória na administração pública e no ensino”. Para ele, as Ciências Humanas e Sociais deveriam ter a centralidade no processo de reestruturação da Universidade, instituição indispensável para a construção de um projeto nacional sólido para a nação”, afirmou. A UFRJ divulgou nota de pesar destacando o papel de Aloísio Teixeira à frente de uma série de conquistas da instituição, “como a expansão de cursos e a reserva de 30% das vagas para cotas sociais”. (veja aqui)

A jornalista Maria Luisa de Melo, do Jornal do Brasil, lembra que Aloísio Teixeira tinha um outro grande talento: atuava como chefe de cozinha nas horas vagas. O carro-chefe dos seus pratos era o pato. Ele tinha, inclusive, 50 receitas elaboradas salvas em seu computador pessoal. O prato considerado de preparo mais difícil elaborado por ele, no entanto, levava codorna. “O prato mais difícil é a Calle em Sarcophage avec sauce berigourdine, uma codorna assada com trufas. Exige muita técnica”, contou no dia 17 de novembro de 1990 à repórter  Patrícia Paladino, na seção Comida, do Caderno B do Jornal do Brasil. (veja aqui)

Aloísio Teixeira, à direita na mesa (à esquerda de Dilermando Toni e de Luis Fernandes, ambos do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil, PCdoB)

Outra de suas características era o bom humor. Em suas palestras, as tiradas rápidas arrancavam risos da plateia. Foi assim, por exemplo, quando participou do seminário “Desvendar o Brasil — suas singularidades, contradições e potencialidades”, promovido pela Fundação Maurício Grabois em conjunto com o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) entre 3 e 5 de abril de 2009, em São Paulo. Ele abriu o debate citando a seguinte frase de Karl Marx na carta a W. Bracke no preâmbulo do texto Crítica ao Programa de Gotha: “Cada passo de movimento real vale mais do que uma dúzia de programas.”

Após centrar a atenção da plateia no tema em debate, Aloísio Teixeira fez algumas considerações sobre este documento marxista para lembrar que Marx inicia a sua grandiosa obra O Capital com a análise da mercadoria. Segundo ele, os três componentes essenciais da produção de mercadoria — trabalho, terra e dinheiro — ganharam um dinamismo avançado no capitalismo e promoveram uma mudança radical na sociedade humana. Explicou também que não há uma “teoria geral” para se interpretar esse fenômeno em decorrência das particularidades de cada país. Para Aloísio Teixeira, no caso do Brasil é preciso ter em conta a colonização local, produto da expansão mercantil europeia.

Segundo ele, os colonizadores encontraram aqui terra farta e clima favorável à produção de açúcar, mercadoria com uma forte demanda à época. A produção iniciou-se com o trabalho escravo – em um processo no qual nem o trabalho e nem a terra eram livres. Para Aloísio Teixeira, essa configuração determinou o desenvolvimento das relações econômicas e sociais brasileiras. No decorrer do debate, ele fez também considerações sobre o papel do proletariado na transformação da sociedade, o desenvolvimento do Brasil no século XX e a atual crise econômica.

Aloísio Teixeira lembrou que os investimentos estatais foram essenciais para a chegada do grande capital no país. Sem a destinação de recursos públicos maciços para o desenvolvimento da siderurgia e da energia, por exemplo, os investimentos estrangeiros poderiam ter tomado outro destino. Na atual crise, segundo ele, o governo deve destravar a máquina pública, amarrada, por exemplo, pelas imposições da Lei de Responsabilidade Fiscal e do superávit primário.

Em outro seminário promovido pela Fundação Maurício Grabois, denominado “Pensar Lênin —Aspectos Contemporâneos de sua Teoria”, realizado em 8 de maio de 2010 também em São Paulo, Aloísio Teixeira situou o contexto em que Lênin produziu a sua obra teórica. Ele explicou que era a época em que os bancos passaram a ter novo papel, as empresas iniciaram uma nova fase em suas formas de organização com a administração científica e a concorrência monopolista começava a se impor. Aloísio Teixeira lembrou que o termo imperialismo surgiu na época de Benjamin Disraeli, escritor e histórico dirigente político britânico — um símbolo do conservadorismo da era vitoriana.

Para ele, o debate marxista sobre o imperialismo revelou três visões — a de Lênin, a de Rosa Luxemburgo e a de Karl Kautski. Mas há um certo consenso de que o imperialismo tem algo de novo em relação aos impérios da antigüidade, ou mesmo àqueles dos albores da modernidade capitalista, que foram instrumentos de acumulação originária do capital, disse. Hoje, explicou Aloísio Teixeira, existe uma diferença brutal entre os Estados Unidos e o resto do mundo. Com a desvinculação do padrão ouro, no início da década de 70, o império norte-americano passou a usar também o dinheiro como símbolo do exercício do poder. Pela primeira vez na história, destacou, há uma relação de troca baseada em algo que não é real.

Aloísio Teixeira era também um colaborador da revista Princípios, editada pela Fundação Maurício Grabois. Na edição de março-abril de 2209, ele escreveu o artigo “A universidade brasileira e os desafios do século XXI”, indicando que a exclusão e a desigualdade social ainda persistem como ranço no elitista e oligárquico sistema universitário brasileiro. A universidade poderia cumprir sua função original de fomentar conhecimento, atuando, assim, na formação de quadros dirigentes para o país, analisou. Na edição de maio, junho e julho de 2004, Aloísio Teixeira concedeu entrevista aos jornalistas Edvar Bonotto e Ana Rocha sobre alguns elementos necessários a um novo projeto de desenvolvimento econômico para o país.