Com quantos paus se faz uma canoa?

 

O grão Pará do Brasil sentinela do Norte
Solo nordestino acrescido na Amazônia, mor destino dos Brasis brasileiros
por sorte conquistado há 400 anos ao suposto reino das Almazonas
15 de agosto desgosto do Povo Parauara bastardo cabano
Acordo neocolonial anglo-português pra inglês ver
Parido do movimento tardio para independência das Américas
Data amarga: ovo da serpente
semente da tragédia do brigue Palhaço
vésperas da perseguição e morte do patriota Batista Campos
feitoria da guerra-civil chamada Cabanagem a torto
e direito
na corte do Rio de Janeiro fevereiro e março
Por necessidade e acaso forjado na dependência de Portugal
A fim de que os Reis Católicos, a possessiva e bipolar França,
Os ávidos Países-Baixos ou a pérfida Albion não nos engolissem;
Com artes e manhas crescemos em contrabandos com pinta lusitana
Debaixo das asas e tentáculos da Inglaterra na terra dos Tapuias
Os sete povos nheengaíbas do Pará senhores das bocas do Amazonas
Golfão marajoara povoado de aldeias e ilhas filhas da pororoca
Aruãs, Anajás, Mupuás,
Pixi-Pixi, Guaianá, Mamaianás, Cambocas…
Marajós mil e tantos anos mais velhos
Do que a guerra caraíba com os bravos Tupinambás nossos avós:
Tapuya tetama na contraparte nortista de Pindorama
Que nem um jaguar sem pressa a caminhar pelas beiras
Do império incaico das quatro partes do mundo
Nas terras baixas da América do sol tintas de sangue
E o caminho marítimo das Índias acidentais
Traço de carvão de pólo a pólo no mapa múndi
370 léguas a oeste das ilhas de Cabo Verde
Na linha imaginária de Tordesilhas arvorada
Com as cores preta e encarnada da cerâmica marajoara
Por acaso achada no teso Pacoval
no dia nacional da Consciência negra do ano de 1756…

Na margem meridional do rio-mar: Jurunas, Tembés, Pariquis, Caripunas,
Tamoios, Mundurucus, Apinajés…
Sete povos mais sete são 14 de Abril, é hora do grande Pará: deu-se o sinal
E o rebate vinha estampado em manchete no jornal “O Paraense”
Do precursor Felipe Patroni sob chancela do cônego Batista Campos
Adesão à Independência do Brasil proclamada já!
Singela circunstância na mui heróica Vila de Muaná
Congresso insulano de sumanos brancos degredados, casais dos Açores, cabocos no mato sem cachorro, pretos e pardos na ilha do Marajó
Mil e tontos anos nos contemplavam
Naquela data magna de 28 de Maio ano de mil oitocentos e 23.

Como então o preclaro Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
E seus silogeus provinciais herdeiros do império de Pedro II
Não sabem da verdadeira história amazônica do Maranhão e Grão-Pará?
Claro que sabem, mas historiografia da branquitude é outra história
Conforme o gosto da ‘belle époque’ e a voz dos donos do tempo e lugar.
O 28 de Maio tal qual o 7 de Janeiro-bis está na saga dos Tupinambás:
7 de Janeiro de 1619 mais 7 de Janeiro de 1835 dá 28 de Maio relembrado
Sua raízes ancestrais.
As mais velhas migrações do Norte em busca do país do Arapari,
Cruzeiro do Sul: hoje a pátria grande latino-americana rumo ao porvir.
Nós todos estamos aí na barca dos Libertadores das Américas
Bolívar na nau capitânia
Que o povo do futebol nem imagina quais foram em carne e osso
Desde as pazes de 27 de Agosto de 1659 no rio dos Mapuá
Quando guerreiros Tupinambás, soldados da praça de Cametá
E guerrilheiros nheengaíbas na improvisada igreja do Santo Cristo
Botaram termo a 44 anos de guerra para conquista do rio das Amazonas,
Iniciada no Maranhão em 1615 com a tomada da França Equinocial
E continuada a toda força contra os holandeses no Baixo Amazonas:
Por necessidade e acaso, no Pará, se casaram a utopia brasílica
Da Terra sem males e o messianismo luso
da ressurreição de Dom Sebastião no rio das Amazonas.

Mas o grão Pará já havia vencido a morte da Utopia
mediante o rito do Kuarup rememorando os heróis da brava gente
E o padre grande Vieira não pescou tamanha coisa no “Sermão aos Peixes”
Cego que ele estava pela conquista das Almazonas no Rio Babel,
Arauto do Reino de Jesus Cristo consumado na Terra sem males,
ou Quinto império do mundo antevisto na “História do Futuro”,
não viu nem entendeu tudo que se passava sob seu apostólico nariz:
Urge portanto exorcizar o bruxedo de 15 de agosto
Refazer as pazes amazônicas de 27 deste mesmo mês
Pra ficar freguês da memória libertada do medo de ser feliz
Na Feliz Lusitânia resgatada na Amazônia e renascida
Como a Fênix na Nova Lusitânia pernambucana
Saga deixada ao relento entre chuvas e esquecimento
Já devemos reimplantar o decepado dedo da história no Entroncamento
Como sugere o discurso de Niemeyer em cimento
No maltratado Memorial da Cabanagem.

 

   José Varella, Belém-PA (1937), autor dos ensaios “Novíssima Viagem Filosófica”, “Amazônia Latina e a terra sem mal” e “Breve história da amazônia marajoara”.

autor dos ensaios “Novíssima Viagem Filosófica” e “Amazônia latina e a terra sem mal”, blog http://gentemarajoara.blogspot.com