Estratégia dos EUA no Pacífico Asiático desestabiliza a região
A Ásia estaria hoje mais estável do que antes de os EUA adoratem a nova estratégia para a região do Pacífico Asiático? Muito evidentemente, não está. A China e os EUA viviam antes em relativamente bons termos. Mas várias mudanças dramáticas ocorreram na Ásia, que só se explicam como efeito da nova política dos EUA.
Antes dessa nova política, a China e outras nações asiáticas constantemente ajustavam-se umas às outras, para atender as necessidades umas das outras. Muitos países asiáticos, em especial as nações reunidas desde 1967 na Associação das Nações do Sudeste da Ásia (Association of South-East Asian Nations ost Asian countries, ASEAN), adotaram política externa pragmática.
Viram o crescimento econômico da China como oportunidade e, resultado disso, ajustaram adequadamente suas relações com a China. A China, por sua vez, deu prioridade às suas relações comerciais e econômicas com outros países asiáticos; e, coerente com isso, manteve posição comedida e discreta nas questões políticas e estratégicas e reconheceu a liderança da ASEAN.
Graças a esse esforço mútuo e coordenado, o relacionamento entre as nações reunidas na ASEAN e a China conheceu rápido progresso; e as relações entre a China e outros países asiáticos foram-se gradualmente institucionalizando através de vários canais regionais, internacionais, bilaterais e multilaterais.
Muitos especialistas ocidentais já reconheceram essa evidência, ao longo dos últimos 30 anos. A Ásia preservou a paz, apesar do rápido crescimento da China – como a demonstrar o erro da teoria que fala da “tragédia política das grandes potências”, segundo a qual toda potência emergente fatalmente desafiaria a potência existente. A paz na Ásia, em larga medida, foi resultado de decisões racionais e do mútuo ajustamento dos países asiáticos, incluindo a China. A China deu absoluta prioridade estratégica à economia e ao comércio, não à força militar.
Por tudo isso, a dita ‘ameaça’ que os EUA enfrentariam na Ásia – os temores de que a China venha eventualmente a ‘exportar-se’ como potência para fora da Ásia – tem muito mais de imaginação e fantasia, que de realidade.
Assim sendo, de onde veem os medos dos norte-americanos? Inúmeros fatores contribuem para esses medos, dentre os quais o chamado “dilema de segurança” causado pela anarquia estrutural nas relações internacionais, diferenças de ideologia política e falta de confiança na China.
Como o “movimento de pivô na direção da Ásia”, dos EUA, afeta a política regional? É preciso aqui considerar as relações entre China e EUA; entre China e outros países asiáticos; e entre EUA e outros países asiáticos.
Para começar, a estratégia dos EUA mudou – pode-se dizer que interrompeu – o processo de mútua adaptação da China e outros países asiáticos. Embora o governo Obama só tenha falado da nova estratégia, e tudo esteja ainda no campo da retórica política, a mudança foi suficiente para que muitos países asiáticos passassem a esperar cada dia mais ajuda dos EUA. Supondo que os EUA investirão quantidades descomunais de recursos para impor-se ante a China, como os EUA fizeram contra a União Soviética durante a Guerra Fria, esses países, especialmente os que têm disputas de fronteiras marítimas com a China, optaram por alinhar-se aos EUA. Apesar de a resposta da China à estratégia dos EUA ter sido em larga medida defensiva, mesmo assim houve mudança suficiente para impedir que as relações com aqueles países continuassem a evoluir.
Em segundo lugar, o “movimento de pivô” dos EUA modificou a prioridade na Ásia, que passou, de política econômica, para política estratégica.
Isso foi feito, pelo menos em parte, porque os EUA reavaliaram suas próprias forças. Depois do início da crise financeira, o domínio econômico dos EUA enfraqueceu; mas os EUA ainda são a maior potência bélica do mundo. Durante a Guerra Fria, presença militar e presença econômica tiveram pesos equivalentes na política externa dos EUA. Mas agora, com o “movimento de pivô”, os EUA estão reintroduzindo a competição estratégico-bélica na Ásia. Essa alteração forçou a China a também mover seu foco: da economia para a estratégia militar.
Ao longo de muitos anos de esforços conjuntos, China e EUA realmente chegaram a construir relações bilaterais muito próximas, sobretudo na cooperação econômica, comércio e finanças. Resultado desses esforços, especialistas norte-americanos cunharam a palavra “ChinAmérica” para descrever as interações e interdependência entre China e EUA. Mas esse relacionamento foi alterado, quando os EUA reintroduziram na equação, a competição estratégica.
A história já mostrou várias vezes que a competição econômica pode ser benigna. Mas o confronto estratégico só pode levar, como sempre levou, ao confronto militar. Quando EUA e China chegarem a esse confronto, estarão inevitavelmente reproduzindo os papéis das duas antigas cidades-estado gregas, Atenas e Esparta; ou de EUA e União Soviética, na Guerra Fria.
Os EUA baseiam seu “movimento de pivô na direção da Ásia” no que entendem como “interesse nacional”. E também é difícil para a China mudar a compreensão dos próprios interesses nacionais. Mas isso não implica que o confronto militar China-EUA seja inevitável.
Se os EUA querem contrabalançar a China na Ásia, movendo-se como pivô de volta para cá, caberá à China encontrar meios para contrabalançar os EUA, porque encontrar esses meios é a garantia de paz.
*Zheng Yongnian é diretor do Instituto Ásia Oriental, da Universidade Nacional de Cingapura.
Fonte: China.org
Tradução: Vila Vudu