No evento, a família de Anísio Teixeira entregou às duas comissões e apresentou ao público um dossiê inédito sobre a morte do educador e as perseguições que ele sofreu no regime militar. A entrega e apresentação foi feita pelo filho do educador Carlos Teixeira, que assina o documento.

Segundo o conselheiro Paulo Sérgio Pinheiro, da CNV, o objetivo do acordo entre comissões é dar ao grupo de trabalho da UnB acesso a documentos e depoimentos coletados pela comissão nacional. “Com a cooperação, a comissão da UnB poderá se valer dos poderes que temos, tanto no que diz respeito ao acesso a documentos, à convocação de pessoas e à atuação em todo o território nacional”, disse Pinheiro.

Ao participar da audiência temática em que foi firmado o acordo, na sede da UnB, Pinheiro evitou comentar o conteúdo do dossiê entregue pela família de Anísio Teixeira à CNV, que ainda será analisado por seus membros, mas admitiu serem “estranhas” as circunstâncias da morte do educador. “Ainda não podemos dizer nada. Estamos recebendo o documento hoje, mas sempre chamou a atenção a forma como ele morreu, tendo sido encontrado no fosso do elevador. É muito estranho.”

De acordo com Pinheiro, o relatório da comissão, que deverá ser concluído em maio de 2014, trará a descrição das circunstâncias dos casos investigados e poderá indicar responsabilidades. Ele ressaltou, porém, que a Comissão Nacional da Verdade não tem poder para atuar como tribunal, proferindo julgamento, ou como promotoria, fazendo acusações. No entanto, o documento e suas conclusões “terão consequências”, e poderão ser encaminhados aos órgãos competentes, como o Ministério Público.

“É difícil extrair a verdade de acontecimento tão controverso, passados 41 anos. Mas não é impossível. Difícil mesmo é a Nação brasileira conviver com a dúvida atroz e interminável sobre o que aconteceu com um de seus mais ilustres filhos, o Professor Anísio Teixeira”, disse o ex-deputado Haroldo Lima e sobrinho de Anísio Teixeira.

Para ele, o Brasil ainda não conseguiu virar a página do período ditatorial porque episódios em que sucumbiram diversos brasileiros não foram até hoje esclarecidos. Nesse sentido, ele destacou a importância da Comissão Nacional da Verdade. 

 

Segundo contou Haroldo Lima, o empenho e destemor de Anísio em fortalecer a escola pública, universal, gratuita e de boa qualidade e seus projetos e experiências pioneiras de escola em tempo integral, realçavam o caráter progressista de suas ideias. E o reacionarismo das elites via Anísio como um simpatizante do comunismo, o que, para eles, significava uma ameaça ao Brasil.

Para a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que participou do evento, o passo dado pela família do educador é um dos muitos que já começam a contribuir na restituição da história do País. “Nossa expectativa é que a história seja resgatada por esta Comissão para que erros do passado não retornem”, lembra a deputada.

Jandira também afirmou a necessidade de que a iniciativa da UnB se multiplique em outras instituições do País: “É preciso que outras universidades se inspirem e criem também grupos que atuem nesse sentido, para que o passado seja resgatado”, concluiu.

 

O secretário executivo da Comissão da Verdade da UnB, Cristiano Paixão, ressaltou a importância da cooperação entre as duas comissões e lembrou que cada uma atuará de acordo com suas competências. “O papel da comissão nacional é mais amplo, diz respeitos a violações, aos direitos humanos, como um todo.”

Ele explicou que a comissão da UnB, por sua vez, investigará os acontecimentos no âmbito na história e do projeto da universidade. “Temos o mesmo caso e a mesma figura emblemática, mas com desdobramentos diferentes”, disse Paixão. Ele informou que o relatório da comissão da universidade será entregue à CNV no início de 2014, antes da conclusão dos trabalhos do organismo nacional.

Ao comentar as suspeitas de assassinato, Paixão disse que, se a hipótese for confirmada, “terá sido não só um grande crime contra uma pessoa, mas contra um projeto de educação”. “Ele (Anísio Teixeira) representava a ideia da educação inclusiva e democrática, contrariando tudo o que pensava o regime da época.”

Considerado um dos maiores educadores brasileiros, Anísio Teixeira nasceu em Caetité, no sertão da Bahia. Na década de 1960, junto com Darcy Ribeiro, foi um dos mentores da UnB, fundada em 1961, e tornou-se seu reitor em 1963. Em 1964, teve o mandato cassado durante o golpe militar, mudou-se para os Estados Unidos, onde deu aulas, e retornou ao Brasil anos depois, para cumprir mandato no Conselho Federal de Educação, tendo morrido em 1971.

Ele foi encontrado no fosso do elevador do edifício onde morava Aurélio Buarque de Holanda. Estava de cócoras, em um platô de cimento armado, com a cabeça sobre os joelhos e com as mãos segurando as pernas. Duas vigas, com separação de um pouco mais de um palmo, situavam-se acima de seu corpo.

Segundo a polícia: “acidente é praticamente impossível, a posição do corpo fere tudo o que já foi visto até hoje na base do acidente. Alguém matou e colocou ali o cadáver do Professor Anísio Teixeira”.

A Comissão Nacional da Verdade foi criada pela Lei 12528/2011 e instituída em maio deste ano. Num prazo de dois anos, vai apurar graves violações de direitos humanos, praticadas por agentes públicos, ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988.

Com agências