Os bancos e o desemprego na Europa
Desemprego em massa reflete o fracasso da política de frugalidade
Bruxelas – Em meio a mais uma reunião de cúpula dos chefes de Estado e de Governo da União Européia (UE) – mas, na realidade, suas decisões já não têm mais nenhuma importância – cresce novamente a discussão sobre o futuro da Zona do Euro. E cresce atípica em meio a declarações, pesquisas e, principalmente, em meio a negativas e desmentidos.
Também o desmentido por si só significa que o tema, de alguma forma, está sobre a mesa: se a Itália permanecerá na Zona do Euro, se Chipre permanecerá na Zona do Euro e se amanhã existirá euro. A discussão começou com uma avançada declaração semana passada do líder da campanha pré-eleitoral dos parceiros liberais da chanceler alemã, Angela Merkel.
Rainer Bründerle iniciou a discussão mais para conseguir divulgação nos veículos de comunicação em torno de seu nome do que sua opinião sobre o que se faz na Europa é importante. Isso não tem a menor importância. Bründerle disse que “pode a Itália (membro-fundador da Comunidade Econômica Européia e terceira maior economia da Zona do Euro) decidir sair da Zona do Euro”.
A Alemanha oficialmente apressou-se a ignorar a declaração de Bründerle. Mas o grande vencedor das eleições italianas, Beppe Grillo – talvez independentemente da declaração de Bründerle – lançou a idéia de realizar-se um plebiscito.
Itália quer ficar
O jornal italiano Corriere della Sera, por sua vez, apressou-se, também, a encomendar uma pesquisa cujos resultados surpreenderam: 74% dos italianos deseja permanecer na Zona do Euro e usar a moeda comum européia, contra apenas 16% que flerta com o retorno à lira italiana.
Mas, simultaneamente, 69% dos italianos declarou não ter gostado nada da idéia de plebiscito. O interessante é que quase semelhantes com o total da massa dos eleitores são os percentuais dos entrevistados que declararam terem sido eleitores do movimento das Cinco Estrelas de Grillo.
Análoga discussão iniciou-se, também, em Chipre, pelo arcebispo Crisóstomos (primaz da ilha). Pode Chipre não ser tão “explosiva” quanto a Itália para a Zona do Euro, podem as decisões serem tomadas por políticos e não por padres, mas o até recentemente inefável saiu de uma boca: “Se a tróica (União Européia, Fundo Monetário Internacional e Banco Central Europeu) aplicar medidas catastróficas em Chipre, o país pode viver sozinho, com a libra cipriota”, afirmou o arcebispo Crisóstomos.
Sobre a Grécia, novamente, voltou ao tema um dos suspeitos habituais, o secretário-geral do Partido Social-Democrata da Bavária, Alexander Dobrindt, o qual sustentou que “a longo prazo a saída da Grécia da Zona do Euro é uma provável solução alternativa – tanto para a Europa, quanto para a própria Grécia”.
Anticrescimento
No momento em que a discussão sobre o euro entra pela porta de trás, os estados-maiores dos governos europeus discutiram na reunião de cúpula da UE novas estratégias para o crescimento. Sempre, contudo, sem desdenhar a mão única do saneamento fiscal.
Como de hábito não ocorreram derrubadas mas, alguns poucos recuos temporais – aceitações indiretas – que a política de frugalidade provoca em todos os países do continente, maior queda do que o esperado e, essencialmente, exclui a consecução das metas fiscais dentro dos cronogramas aprovados.
Provavelmente, então, Portugal será premiado com uma prorrogação anual para levar, finalmente, seu déficit fiscal a 3% em 2015, ao invés de 2014. O “bom aluno” Portugal avalia-se que tem envidado “grande esforço de adequação”, mas a queda, que neste ano espera-se que oscilará em torno de 2%, não permite ao país atingir as famigeradas metas.
Assim como não as atingirá, também, a Itália, recentemente desvalorizada pela agência internacional de rating Fitch. O Serviço Oficial de Estatística italiano anunciou que “no último trimestre de 2012 o Produto Interno Bruto (PIB) do país contraiu-se em 2,8%”, enquanto o governo transitório do tecnocrata Mario Monti prevê que “a queda deverá durar, pelo menos, mais dois trimestres”.
Medidas recusadas
A caminho da reunião de cúpula da UE, o presidente do Parlamento Europeu, Martin Schultz, tentou sensibilizar os empoados líderes europeus, declarando que “salvamos os bancos, mas destruímos uma geração”.
O político social-democrata alemão lembrou que “a UE já gastou centenas de bilhões de euros para a salvação dos bancos europeus, mas nada faz para enfrentar as consequências da crise sobre as sociedades. Desde 2009 a UE tem criado complicados mecanismos de apoio para os abalados países-membros e seus sistemas bancários, gastando cerca de 700 bilhões de euros. Contudo, fez pouco para os 26 milhões de desempregados europeus e, principalmente, os jovens desempregados”.
Schultz fez questão de destacar que “em países como a Grécia, a Espanha – e, pelo andar da carruagem, também Itália e Portugal – um em cada dois jovens não consegue emprego. Um dos maiores riscos que enfrenta hoje a UE é que os cidadãos perdem completamente sua confiança na capacidade da UE para solucionar seus problemas. E quando os jovens perdem sua confiança, então a UE encontra-se em verdadeiro perigo”.
E para ser ouvido pelos técnicos do poder, Shultz fez questão de advertir que “os elevadíssimos níveis de desemprego resultam em manifestações de protesto e explosões de violência no Sul da Europa, aumentando o risco de uma total derrocada social, com aumento da criminalidade, abalando mais os governos instáveis”.
Os temores de Schultz sobre a perda de confiança dos cidadãos na Europa confirmam-se, também, pelos últimos dados do Eurobarômetro. Os cidadãos europeus, em todos os países, menos Malta e Estônia, julgam que a política econômica de frugalidade em vigor é equivocada e que a UE não leva em consideração suas opiniões.
A maioria dos europeus não confia mais nas políticas decididas a portas fechadas em Bruxelas, enquanto o maior déficit de confiança registra-se na Grécia, 81%, mas também na Alemanha oscila em torno de 60%.
Conflitos na Europa
Tons mais dramáticos do que o presidente do Parlamento Europeu utilizou o primeiro-ministro de Luxemburgo, Jean-Claude Juncker, em entrevista publicada na última edição da revista alemã Der Spiegel. Juncker trouxe, de novo, para a mesa o risco de guerra: “Quem acredita, ainda, que a pergunta eterna sobre paz e guerra não será formulada mais na Europa, lamentavelmente, engana-se. Os demônios não foram embora, simplesmente estão dormindo”.
O ex-presidente do Eurogroup sustentou: “Para minha geração, a moeda comum européia constituiu uma política de paz. Contudo, após a eclosão da crise retornam, perigosamente, os egoísmos nacionais. Vejo, com tristeza, que muitos europeus perdem seus empregos. A forma com a qual certos líderes da elite política alemã atacaram a Grécia, quando este país mergulhou na crise, a feriram profundamente. Igualmente, fiquei assustado com as faixas dos manifestações em Atenas, ilustradas com a chanceler Angela Merkel vestindo farda nazista. De repente emergiram inimizades que acreditávamos que haviam sido eliminadas para sempre.”
Referindo-se à campanha pré-eleitoral italiana, Juncker estimou que “era, em grau elevado, antigermânica, consequentemente, anti-européia. Insisto, a Europa unida é a única solução para o continente europeu”.
Juncker soa o sinal de alerta, mas não duvida da política de disciplina fiscal na Zona do Euro. Defende que “as reformas são o único caminho e os governo deverão adotá-la ignorando o custo político”. E, finalmente, coloca a cereja no bolo: “Declaro que estou disposto a apoiar a chanceler Angela Merkel em sua campanha pré-eleitoral. Isto, aliás, já me foi pedido”.
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Fonte: Monitor Mercantil