Os BRICS e a questão síria
A reconciliação, na 6ª-feira que o presidente Obama dos EUA costurou entre Turquia e Israel foi premontada em cenário dramático, na pista do aeroporto Ben Gurion próximo de Telavive, num trailer, quando Obama já partia, depois de concluída a visita a Israel. Foi preparada como espetáculo para a Região: para fazer crer que os EUA estão mudando de marcha para atacar a questão síria.
Dois dias antes, no domingo, veio a grave acusação, feita pelo poderoso presidente da Comissão de Inteligência do Senado e destacado Republicano, Mike Rogers, de que “acumulam-se evidências” de que o regime sírio já ultrapassou “completamente” a chamada “linha vermelha” que Obama fixou, sobre deslocamento e uso de armas químicas, pelas forças do governo sírio.
Tudo parece bem orquestrado. Na véspera, Obama anunciara em Jerusalém que qualquer uso de armas químicas pelas forças sírias seria fator para “mudança no jogo”. Agora, Obama tem o argumento perfeito para intervir militarmente na Síria.
Simultaneamente, o New York Times noticiou que a CIA já está metida até o pescoço no conflito sírio,[1] com tudo preparado para expandir suas operações clandestinas.
E Israel, por sua vez, já testa as defesas sírias nas colinas do Golan.[2] O ministro da Defesa israelense Moshe Yaalon alegou “ataque à soberania”, pela Síria. E tudo, na sequência imediata da visita de Obama a Israel e à Jordânia.
O mais revelador é a reestruturação na liderança da Coalizão das Oposições na Síria. No final da semana, Ahmed Moaz al-Khatib renunciou à presidência da coalizão. Khatib estava com viagem marcada a Moscou, para conversações.
Evidentemente, alguém ficou aflito com a possibilidade de Khatib ser persuadido pelos russos a dar uma chance ao diálogo nacional interno, na Síria.
Bingo! Um novo primeiro-ministro para a oposição síria surgiu repentinamente, do nada, no fim de semana, um sírio-norte-americano, profissional de Tecnologias da Informação, com base nos EUA: Ghassan Hitto.
Hitto tem sido vagamente apresentado como caixeiro-viajante a serviço da Fraternidade Muçulmana, mas o embaixador dos EUA na Síria Robert Ford já apareceu citado pela Agência France Press[3], dizendo, simploriamente, que “ele é mais texano que da Fraternidade Muçulmana.”
De fato, não faz diferença que Hitto seja norte-americano ou Irmão. Mohamed Morsi do Egito é mais ou menos da mesma espécie. E os EUA estão bastante satisfeitos com o desempenho dos Irmãos até aqui, no Egito; e parecem bem interessados em ter mais regimes comandados pelos Irmãos no Oriente Médio Muçulmano. O Qatar e a Turquia não teriam o que objetar.
Sem dúvida alguma, o plano do jogo é estruturar um “governo no exílio” para a Síria firmemente controlado pelos EUA, antes de começar a intervenção militar de destruição total, ao estilo do que foi feito na Líbia, dessa vez na Síria. Nada de repetir as tolices que George W. Bush cometeu antes de partir para destruir o Iraque. Obama é gelado, cerebral e meticuloso, quando se trata de planejar eventos de tipo bélico.
Obama fará com que esses tumultos de mudança de regime agitem Damasco, quando os iranianos estiverem focados na eleição presidencial de junho, e a crucial formação de novo governo em Teerã (que jamais é fácil, dada as muitas divisões que cortam a política dos xiitas) estiver em curso. Obama foi a Israel e a Jordânia especificamente para organizar a guerra contra Síria e Irã, nada mais, nada menos.
No domingo, Obama despachou o secretário de Estado John Kerry para Bagdá, em visita surpresa, para ler os mandamentos ao primeiro-ministro Nouri al-Maliki e fazê-lo pôr fim aos voos sobre território iraquiano, até a Síria.[4] Apertem os cintos. Turbulências pela frente.
Mas, voltando aos BRICS: essa reunião em Durban será crucial, como marco do desenvolvimento do grupo. Pelo sim, pelo não, Tio Sam está de olho no que os estadistas dos BRICS fazem em Durban.
Interessante: o Brookings Doha Centre, think-tank que opera nos EUA e no Qatar, conclamou abertamente os BRICS para um motim! Querem que os presidentes de África do Sul, Brasil e Índia metam a coleira em Rússia e China, na questão síria.[5]
[1] http://www.nytimes.com/2013/03/25/world/middleeast/arms-airlift-to-syrian-rebels-expands-with-cia-aid.html?_r=0
[2] http://www.washingtonpost.com/world/middle_east/israeli-military-responds-to-fire-from-syria-in-golan-heights/2013/03/24/f473aed2-949d-11e2-bc8a-934ce979aa74_story.html
[3] http://www.globalpost.com/dispatch/news/afp/130324/syria-opposition-disarray-head-resigns-1
[4] http://online.wsj.com/article/SB10001424127887323466204578380140228355074.html#printMode
[5] http://www.aawsat.net/2013/03/article55296829/print/
Publicado em 25/3/2013, MK Bhadrakumar, Indian Punchline
http://blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/
Tradução do coletivo Vila Vudu