VÍDEO: Seminário discute democracia, soberania e integração
O presidente do PCdoB, Renato Rabelo, saudou os participantes explicando que o seminário tem objetivo preparatório para o 13o Congresso do Partido que ocorre em novembro, em São Paulo. Uma tradição que aprimora as bases do partido e enriquece o Congresso. “Nesses dez anos, acumulamos condições para passos maiores e para desafios maiores”, disse ele, referindo-se aos temas da primeira mesa. Para isso, diz Rabelo, é preciso analisar o curso da geopolítica, “para onde caminha o mundo, sobretudo encarando a questão da crise sistemática e estrutural do capitalismo”.
Nádia lembrou que o governo de São Paulo reproduz as alianças que sustentam os dez anos de Lula e Dilma. Desta forma, é importante trazer para a cidade os avanços do Governo Federal, assim como entender as implicações e limites das potencialidades e resultados destes governos.
Vizinhos inimigos e unidade nacional
Como disse o ministro Aldo Rebelo, sua experiência parlamentar na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, “ajuda a ampliar o horizonte para a frente e para trás das relações entre os países da América Latina”. Rebelo resgatou as diferenças na história da colonização hispânica e portuguesa para demonstrar a construção história da unidade territorial brasileira em detrimento da fragmentação que marcou a história da América hispânica, a despeito do sonho bolivariano. Segundo ele, o regime monárquico contribuiu para preservar a unidade do território, numa época em que não havia intercâmbios políticos, econômicos e de mão-de-obra para limitar o contato entre as capitanias e núcleos coloniais e impedir o desenvolvimento de uma consciência nacional. A perspectiva de instalação de repúblicas em ex-colônias espanholas marcadas pela influência de caudilhos regionais levou à fragmentação territorial.
Foi assim, por exemplo, que o patriarca da Independência, José Bonifácio de Andrada, homenageado durante o seminário pelos 250 anos de seu nascimento, imaginou que a monarquia teria mais capacidade de unificar a nação, em vez das repúblicas vizinhas. Bonifácio foi o homem que melhor pensou a estratégia da independência e a construção da unidade nacional. As homenagens ao precursor de tantos ideais que mobilizam a esquerda brasileira continuam na Sessão Solene do Congresso Nacional, em 13 junho, a pedido do senador comunista Inácio Arruda.
Conforme lembrou Rebelo, foi o iluminista e antimonarquista Simon Bolívar que concebeu a integração latinoamericana e os pressupostos da relação com os vizinhos. Ele sabia que o colonialismo e o imperialismo usariam as ambições legítimas e ilegítimas dos vizinhos para gerar discórdia, como as desconfianças que prejudicaram as relações entre uruguaios, paraguaios e argentinos, chegando à guerra que incluiu o Brasil entre os rivais históricos. “O Rio Grande do Sul sempre teve grandes concentrações militares em seu território fronteiriço, contando até mesmo com uma importante escola militar, mantendo um clima de riscos e disputas”, afirma o ministro.
“Se o Brasil tivesse cooperado na área nuclear com a Argentina, seu status político no mundo de hoje seria muito distinto. No entanto, sempre que possível, sabotaram o programa nuclear de um e de outro. Esta rivalidade retroalimentada não ajudou o desenvolvimento nem a importância geopolítica de nosso continente”. Para o comunista, se nos integrarmos num sistema energético, potencializando a diversidade de fontes, teremos um fator decisivo para o desenvolvimento continuado do continente.
O ministro lamenta a falta de uma integração física no continente. “As ferrovias existem, mas não é possível ir de Santos a Antofagasta de trem, porque em vez de ser investida de recursos e manutenção, ela foi sendo desativada”, disse Rebelo, citando também os baixos custos para a obra de uma rodovia de Santos a Santa Cruz, que sempre sofreu impedimentos burocráticos. “Tínhamos que fazer isso, nem que fosse para simbolizar nossa disposição de ligar os dois oceanos, atravessando o continente, fazendo a nossa parte”, afirmou.
Outra situação simbólica dessa década foi a construção da primeira ponte ligando o Acre ao Peru, mostrando o atraso e desinteresse dos governos anteriores por uma integração física tão simples.
Mas Rebelo diz estar muito otimista pela perspectiva dessa integração, embora haja problemas pontuais difíceis como o déficit muito alto na balança comercial com países vizinhos. Deformações internas como o superávit paulista e o déficit gaúcho com o Mercosul completam o desafio.
Para haver integração, na opinião do ministro, é preciso reduzir as desconfianças, buscando uma condição mínima de equilíbrio. “Se você é maior e mais forte, tem que ser mais generoso para alimentar relações comerciais que são extremamente deficitárias para eles”, disse ele, pontuando obras como rodovias, pontes e ferrovias.
Os jornais guaranis e o castelo judiciário
O senador Arruda também voltou ao Brasil imperial para resgatar a primeira nacional constituinte, um texto avançado rechaçado por Portugal, que versava sobre abolição da escravidão, situação indígena, desenvolvimento econômico… “Por isso tivemos tantas escaramuças gigantescas, como a Guerra dos Farrapos, lutas do povo em busca de um espaço mais democrático no país”, disse o senador.
Na República, a busca e tentativa de ter um projeto nacional é sabotado e dificultado pelas elites, gerando novas lutas, como as revoltas de oficiais militares brasileiros, ou a grande marcha da Coluna Prestes, “uma verdadeira saga buscando conhecer o Brasil”. “O episódio da revolução de 1930, querendo ou não, é fruto dessa fomentação do povo brasileiro na busca por seu projeto”, disse Arruda.
Para o senador, a criação de cinco jornais pelo escritor cearense José de Alencar é um episodio chave da luta democrática brasileira. “Esse jornais tinham papel importante para as forças conservadoras enfrentarem seus adversários perigosos e rompiam os entraves ao diálogo com a população brasileira”, menciona o senador, lembrando o papel primordial da mídia brasileira, desde aquele período na manutenção do projeto conservador.
Inácio chama a atenção para o papel fundamental dos tribunais superiores de justiça nos processos de cassação dos políticos comunistas eleitos por todo o Brasil no final dos anos 1940. “São processos que têm início no TSE e no STF, que cassam o registro do partido e abrem o caminho para que o Congresso pudesse cassar os mandatos de políticos legitimamente eleitos pelo povo”, conta ele, acrescentando que até hoje o Supremo Tribunal Federal não se dignou a pronunciar-se sobre o recurso do Partido, mesmo tendo sido uma decisão inconstitucional.
São instâncias que têm muita força no Brasil, desde sempre, desde que eram as cortes de apelação das elites conservadoras e mais reacionárias. “Alcançar um lugar nessas instâncias não é algo fácil. Mesmo os juízes das primeiras instâncias eram simplesmente indicados pelos governadores”, declarou Arruda.
Hoje, as atribuições do Judiciário e do Ministério Público estão em debate, mas é um debate que sofre ataques da imprensa. “Não se trata de reduzir atribuições dessas instâncias poderosas, mas criar mecanismos de controle, pois os Conselhos Nacionais de controle são hoje altamente corporativos e arquivam recursos sobre excessos dessas instâncias sem nem avaliar”, denunciou o comunista.
“São instâncias com forte influência, entrelaçadas umas com as outras e com a mídia”, afirmou Arruda. Ele descreve a ação conjugada desses setores quando o cidadão investigado nunca é informado sobre seu inquérito, mas o principal órgão de comunicação é o primeiro informado e convocado para julgá-lo e condená-lo. “Quando essa ação conjugada se expressa, não há mais nenhum reparo a ser feito para ninguém”, diz o senador.
Inácio Arruda aponta avanços na eleição de Lula e Dilma na democratização do acesso ao poder, por meio das conferências que mobilizaram todos os setores da sociedade. Para ele, essa mobilização teve um papel importante na sustentação do governo Lula e pode ser a pressão necessária para a destinação dos royalties do petróleo para a educação.
Para termos um projeto nacional arrojado de desenvolvimento, capaz de realizar a integração da América do Sul com o Brasil, na opinião do senador cearense, o partido comunista precisa crescer no judiciário. “Precisamos ter juízes comunistas comprometidos com as causas do povo. Precisamos crescer nos meios de comunicação de massa, com jornalistas comunistas. Precisamos avançar na intelectualidade, pois grassa na academia o pensamento mais conservador, mais atrasado”, apontou Arruda, citando ainda o avanço do partido no Parlamento.
O portais de internet mais influentes, lembra ele, são os grandes portais dos mesmos grandes jornais, as mesmas famílias que estão a cem anos dizendo o que é certo e errado. “Ninguém vai controlar essa mídia, mas podemos ter instrumentos tão fortes quanto eles. Essa é uma questão de decisão politica, pois o Partido já teve onze jornais diários”, afirmou. Para ele, a reforma da mídia é estratégica, mas é cético com a reforma política, que parece estar preparada para acabar com os poucos avanços eleitorais conquistados pelo campo progressista.
“O problema não é eleição de dois em dois anos, mas o escândalo do financiamento privado. Essa é a reforma que não vamos conseguir aprovar, mesmo com a retórica dos grandes partidos”, disse o senador.
A culpa é de você sabe quem
O embaixador Guimarães começou destacando como a autodeterminação do Brasil é apenas jurídica e “longe de ser de fato”. Na economia, o déficit gera obrigação de altas taxas de juros para atrair investimentos, assim como a dependência tecnológica é extremamente acentuada. “O número de patentes anuais das empresas brasileiras gira em torno de 500, enquanto nos EUA são 50 mil”, diz ele.
Na geopolítica, o Brasil está sujeito às decisões do Conselho de Segurança da ONU. “Se o Conselho decidir sanções ao Irã, o Brasil está obrigado a cumprí-las”, lembrou ele.
Na questão militar, é notória a deficiência do Brasil, segundo o embaixador. Mas as pessoas perguntam porque o Brasil teria que se preocupar com ameaças militares, “sendo um país tão pacífico”. “Temos até medo de dizer de onde pode vir a ameaça”, diz Guimarães, com sua ironia peculiar que arrancou gargalhadas do público.
Para o embaixador, o Brasil teve muitos governos que abdicaram de sua soberania em diversas áreas, que não eram representantes do povo brasileiro. “Dilma e Lula fizeram um esforço grande para aumentar a margem de soberania do povo brasileiro”, declarou.
“Enquanto o Brasil tinha dívida com o FMI, o Fundo tinha o poder de orientar as políticas econômicas e, inclusive sociais, do Brasil”, lembrou ele, citando ainda a rejeição da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Segundo ele, na Alca, o Brasil faria parte de uma série de compromissos que tornariam impossível haver o cenário atual. “Hoje, a indústria nacional não existiria mais, como a Eletrobras e a Petrobras, ou o próprio Banco do Brasil, pois estava prevista a privatização de tudo isto no projeto da Alca”, disse, acrescentando que isso só não avançou mais por resistência da própria população e da sociedade.
Guimarães também revela o papel colonizado da imprensa ao ridicularizar a candidatura do Brasil a um assento no Conselho de Segurança da ONU, com o objetivo de reformá-lo. Do mesmo modo, a mídia ignora a criação de mecanismos importantes como a Unasul, a Comunidade dos Países da América Latina e do Caribe, “organismos latino americanos sem presença de potências extracontinentais”. “Isso é um eufemismo enorme, pois queremos falar sem a presença dos EUA, mas temos um medo enorme de dar nome aos bois”, disse o embaixador, citando ainda as tais empresas que dizem não ser competitivas, quando na verdade são as estrangeiras instaladas aqui. Isso diz muito sobre o tema da soberania, para ele.
Sobre democracia, o governo do povo, ele questiona quem seja o povo brasileiro para dizer que 50% não estão representados, considerando a presença tímida das mulheres no parlamento ou nos governos, para não falar da população afrodescendente ou o número de deputados trabalhadores ou sindicalistas, enquanto os ruralistas são sobrerepresentados. “Por isso, não aprovam regulamentação dos meios de comunicação, o principal instrumento de controle das classes hegemônicas sobre o povo”, disse o embaixador, sendo didático.
Guimarães ainda citou a questão da distribuição de publicidade oficial entre os veículos de mídia, rejeitando o critério de audiência, por considerar que estes veículos já são muito apoiados pelo poder econômico. Ele defende uma distribuição equitativa, “senão se pereniza a concentração de poder na mídia que se reflete na concentração econômica e na política”.
Ele também observou a perda de oportunidade de Dilma em aumentar a representação feminina no Judiciário. “Não é por falta de saber jurídico, pois já estamos fartos de saber jurídico neste judiciário que não adianta nada para a população!”, disse ele, sob aplausos acalorados. Ele mencionou a série de decisões do Supremo Tribunal que extrapolam sua função.
Sobre integração, o embaixador lembrou que o assunto sempre foi tratado de forma retórica. “A integração só beneficia, se todos se sentirem beneficiados, sem desequilíbrios e assimetrias”, disse, ressaltando os desafios para o Brasil, com vantagens competitivas muito maiores que os vizinhos.
Segundo ele, os acordos de integração são uma estratégia antiga para fortalecer os sistemas políticos, mas foram aplicadas aqui de forma diversa e contraditória. Há aquela integração patrocinada pelos EUA por meio de acordos de comércio com sua estratégia neoliberal de desenvolvimento, o receituário do consenso de Washington.
Há a estratégia da criação da Alba (Aliança Bolivariana das Américas) do comandante Hugo Chávez, com o objetivo de cooperação e não integração, nas áreas de energia, moeda local, alimentos, saúde.
E Guimarães cita o Mercosul, como mecanismo de fortalecimento da economia, “que muitas vezes é uma estratégia voltada para o fortalecimento do capital, empresas multinacionais, sem preocupação com os direitos dos trabalhadores”. “Estou sendo um pouco rude, dando nomes aos bois?”, brincou o embaixador.
Ele foi ainda mais explícito ao citar empresas populares, que a maioria não sabe que, vendidas ao capital internacional, geram lucro remetido e nenhuma exportação ou receita.
“O Brasil não pode se desenvolver de forma estável, se os demais países não se desenvolverem”, sentenciou. De acordo com ele, estamos sofrendo os efeitos da emergência da China, grande demandante de produtos primários e grande exportadora de produtos manufaturados, inclusive para mercados da América do Sul, para onde exportamos 89% do nosso total. Ele citou ainda os acordos de comércio com a comunidade andina.
“Dilma fez algo muito importante ao decidir pela Venezuela contra o Paraguai. Uma decisão dela, não da burocracia. Interpretem isso como quiser”, afirmou. Com isso, ela fortaleceu a Venezuela diante das perspectivas de golpe que se desenvolvem agora, por exemplo.
“Outra medida foi a doação de 500 milhões de dólares para a construção da linha de transmissão entre Itaipu e Assunção que vai transformar a economia do Paraguai”, enfatizou, lembrando que energia é a base do desenvolvimento, especialmente uma obra importante para o país mais pobre do continente. “Foi uma doação, não um financiamento!”
Para o embaixador que atua na área da integração comercial, há várias iniciativas de grande importância nesse período de dez anos. “Há muito que fazer com a investida ideológica dos acordos comerciais, que tratam a competitividade sempre a partir dos direitos trabalhistas. É preciso fortalecer esses mecanismos de integração para que o Brasil tenha déficits com os países vizinhos e superávits com os desenvolvidos”.
Transição, contenção e defesa
O geógrafo Ronaldo Carmona, assessor da Secretaria de Relações Internacionais do PCdoB, apontou a necessidade do Brasil resolver sua baixa estatura geopolítica em relação à economia e à politica. Segundo ele, há baixo investimento em defesa, comparativamente. Para ele, as questões de soberania e integração têm um forte componente de defesa num cenário global de instabilidade e transição hegemônica.
Para ele, seria importante revitalizar as Zopacas (Zonas de Paz e Cooperação do Atlântico Sul), em contraponto à ocupação militar da Otan no Chile.
Carmona também propôs o esforço, raro no Brasil, de prospecção de cenários para o horizonte de 2022. Esse esforço comum nos países centrais, se daria a partir das tendências do sistema internacional, que devem contraditar a maior ambição do Brasil nessa transição geopolítica, sem um desfecho delineado.
“Há uma grave crise nos países centrais, que veio acelerar a tendência de transição com declínio econômico relativo. É ingenuidade achar que, estabelecida a transição, que os países centrais cederiam sua hegemonia a novos atores. É histórico que os países centrais reagem militarmente para não perder espaço”, defendeu o comunista.
Ainda dentro de sua análise sem idealismos, Carmona diz que o maior número de polos atuais no sistema internacional, como a formação dos BRICs, não ajuda, apenas forma tendência a um acirramento de conflitos militares. É assim, por exemplo, que funciona a doutrina da contenção, em que os países hegemônicos barram a ascensão de novos povos no sistema internacional.
O ressurgimento desta doutrina contra novos polos, primeiro se dirige à China, como alvo de concentração, conforme revelam estudos de prospecção dos EUA, citados por Carmona. “Mas, os BRICs e o Brasil não foram abandonados. Sabotar e fraturar a unidade e a integração sul-americana também são objetivos de contenção.”
Segundo ele, os BRICs sofrem com a extrema má vontade dos países desenvolvidos e dos “jornalões” que só ressaltam divergências, pois são parte da ideia do desfecho da transição geopolítica.
Carmona considera que há insuficiente capacidade de iniciativa do Brasil para reagir a isso. “Com isso, o golpe no Paraguai criou um cavalo de tróia no meio da América do Sul.”
Uma segunda grande tendência na situação internacional, segundo Carmona, é a escassez de ativos estratégicos, água, energia, minérios e alimentos, que deve se tornar motivo de conflitos estratégicos entre as economias. Este tema concerne principalmente à América do Sul com seu alto estoque de biodiversidade, terras cultiváveis e recursos hídricos, além do petróleo.
“Há uma nova corrida imperialista aos recursos naturais, em que os EUA querem garantir acesso ilimitado e livre a isso”, diz o geógrafo.
Qual a resposta do Brasil? Segundo ele, houve uma busca, nessa década, de atualização da geopolítica do país, como a superação da teoria do “inimigo interno”, que foi interessante para as potências estrangeiras durante a guerra fria. A distensão com a Argentina deu origem ao Mercosul no início dos anos 80, com a superação de outro estigma, o do vizinho inimigo.
Para Carmona, o Brasil precisa por em prática um plano de readequação das forças armadas de R$ 400 bi de investimentos nos próximos anos. Um exemplo emblemático desses investimentos é o submarino de propulsão nuclear, em cooperação com a França. Ele ressaltou que, com isso, o país passará a fazer parte do seleto grupo de integrantes donos de artefatos de dissuasão, como esse (EUA, França, Inglaterra e Rússia).
A importância desse tipo de estratégia de defesa é tal, diz Carmona, que o programa nuclear e espacial brasileiro sofre constante cerceamento e recusa de cooperação de outros países.
O avanço tecnológico e o capital privatizado
Após as intervenções do público presente, o embaixador Guimarães entusiasmou-se e fez novos comentários sobre os temas propostos. Em sua análise, os EUA partem de uma premissa de que, para eles, é bom eliminar todas as barreiras de todos os países para garantir o crescimento de suas empresas e sua liderança científica. Desta forma, os sistemas de integração são considerados barreiras para a circulação de mercadorias. “Por isso, criam acordos bilaterais com taxas de lucro extraordinárias num mercado exclusivo”, disse ele.
“Qualquer avanço científico brasileiro interfere nas exportações daqueles países”, explicou Guimarães. Segundo ele, quando o Brasil procurou desenvolver informática, tecnologias médicas, nuclear, “houve reações violentíssimas” com sanções.
É assim, que a mídia das elites repete que o melhor para o Brasil é se integrar ao mercado internacional. “Depois a gente vê. Se não der certo, é porque o país não é competitivo”, parafraseia o embaixador. É assim que a mídia faz o convencimento da população sobre a desimportância dos BRICs, da integração, da industrialização e da tecnologia.
Por outro lado, há as complexidades do capital no Brasil. O embaixador cita o exemplo da Fiat, que exporta automóveis para a Itália, mas não para a China. “Para a Itália é competitivo, mas na China, a Fiat deve ter uma fábrica”, disse.
Quanto maior a concentração de produtos, maior instabilidade cambial, quanto maior a diversidade de produtos, mais equilíbrio. Essa é a equação que desafia o país com sua baixa industrialização e balança superavitária em commodities.
“Tecnologia nao é desenvolvida nas universidades, que tratam de ciência; tecnologia é coisa das empresas,” diz, explicando que é por isso que empresas nacionais desenvolveram tecnologia, como o sistema bancário, a antiga Vale, a Petrobras, a Embrapa. “O predomínio de multinacionais barra isso”.
Sobre uma pergunta de como contornar os acordos pela OMC, Guimarães foi sarcástico ao dizer que não estão sendo obedecidos por ninguém. “Os EUA interveio fortemente na indústria automobilística e no sistema financeiro e ninguém falou nada. Fizeram isso, senão, seus bancos seriam todos chineses, hoje”, relatou.
Guimarães defendeu que, se o BNDES financia a juros “convenientes/adequados” a empresa, tem que exigir que desenvolva tecnologia e seja patenteado em nome do BNDES, também. “Se não quer compartilhar resultado de pesquia, não adianta nada! Então, peça empréstimo ao Santander…”
Para ele, esse tipo de política se não for induzida pelo estado, não ocorre naturalmente. “Não há desenvolvimento sem indústria, não há indústria sem energia, por isso os BRICs criaram um banco para financiar infraestrutura de energia”.