A agência de notícias norte-americana AP (Associated Press) afirmou nesta segunda-feira (13/05) ter sido alvo de escutas telefônicas por autoridades federais durante os meses de abril e maio do ano passado. A companhia recebeu essa informação através de uma carta do próprio Departamento de Justiça norte-americano, enviada na última sexta-feira (10) pelo procurador de Justiça, Eric Holder, ao presidente da agência, Gary Pruitt.

Pruitt, em resposta de protesto a Holder, criticou a “intrusão massiva e sem precedentes” do Departamento às atividades noticiosas da AP. Segundo ele, o governo obteve um número de informações muito além de qualquer justificativa para uma eventual investigação específica.

“Não há justificativa possível para uma coleta tão grande de comunicações telefônicas da AP e dos seus jornalistas. Os registros podem revelar conversas realizadas com fontes confidenciais durante a atividade jornalística levada a cabo pela AP por dois meses, providenciam um mapa das operações jornalísticas e divulgam informação sobre as atividades da AP que o governo não tem o direito de saber”, disse Pruitt na carta dirigida ao procurador Eric Holder, Secretário de Justiça.

Os dados grampeados incluem números de chamadas telefônicas recebidas e enviadas, de e para números profissionais ou pessoais e as durações de cada uma dessas conversas. O número exato de jornalistas grampeados nesses dois meses é indeterminado, mas calcula-se que sejam mais de cem.

Pruitt considera que essa ação do departamento é uma “séria interferência aos direitos constitucionais” da agência e exige que todos os registros telefônicos sejam devolvidos e as respectivas cópias, destruídas.

No entanto, o órgão não revelou, na carta à agência, quais seriam os motivos dessa ação. Segundo a AP, a medida pode estar relacionada ao fato de Holder ter dito publicamente que estava conduzindo uma investigação que teria relação com uma matéria da agência que revelava a intenção da rede terrorista Al Qaeda de realizar um suposto atentado terrorista. Os funcionários do governo teriam tentado localizar fontes da AP relacionadas a uma operação de contraterrirsmo da CIA (central de inteligência norte-americana) no Iêmen – entre os números grampeados estavam os dos jornalistas que participaram da reportagem investigativa.

A Associated Press, uma das mais antigas agências do mundo e fundada em 1846, é uma cooperativa gerida pelos proprietários de uma série de jornais e estações de rádios e televisão norte-americanos.

O Departamento de Justiça tem autorização legal para grampear veículos de comunicação, mas só através de autorização da procuradoria-geral do país e quando todas as outras alternativas já tiverem se esgotado. Até o momento, o órgão não se pronunciou sobre a situação.

Repercussões

O congressista republicano da Califórnia Darrel Issa, presidente do Comité de Supervisão e Reforma do Governo da Câmara de Representantes, criticou o governo em comunicado: “Os norte-americanos deveriam perceber que os funcionários de alto nível da administração Obama se veem como acima da lei, sentindo-se encorajados pela crença de que não precisam responder perante ninguém”.

A organização RSF (Repórteres sem Fronteiras) qualificou o escândalo das escutas de “infração gravíssima” contra a liberdade de informação e de “violação das comunicações telefônicas”.

A RSF afirma que o Departamento de Justiça norte-americano enviou em 10 de maio uma carta à AP na qual informava sobre a investigação de 20 linhas telefônicas, mas “sem” precisar os motivos e nem os argumentos legais do procedimento”.

“Assinamos embaixo as palavras de Gary Pruitt, diretor-geral da AP, que denuncia uma ‘intromissão em massa e sem precedentes'”, disse a organização, em outra carta enviada a Eric Holder.

“Repórteres sem Fronteiras pede ao Departamento de Justiça que responda sem demora ao pedido da AP de destruir dados dos telefones. Estimamos também que fatos contrários às garantias constitucionais exigem um exame de uma comissão de investigação do Congresso”, acrescenta RSF em comunicado.

Além disso, a organização com sede em Paris “constata com preocupação que a administração federal atual não acabou com as práticas em vigor durante o duplo mandato de George W. Bush, que sacrificaram os dados privados e sobretudo o direito dos cidadãos de estarem informados”, acrescenta.

A RSF considera que este fato demonstra a necessidade de uma lei federal nos Estados Unidos para proteção de fontes jornalísticas, já em vigor em 34 Estados do país.