A farsa do cansaço estrangeiro
A quem interessa afirmar que os “investidores estrangeiros estão cansados do Brasil”? Aos próprios, hoje dispostos a criar um clima favorável ao aumento dos juros além dos 8% ao ano da Selic, a taxa básica que remunera os títulos da dívida pública.
A esses “investidores” também faz sentido pressionar para as regras em negociação das concessões públicas programadas serem as mais favoráveis possíveis. Nada como ter o governo contra as cordas, por motivos justos ou injustos, para barganhar vantagens.
Cria-se a ficção de um governo exageradamente “intervencionista”, como se mundo afora o cenário de crise permitisse outra opção a não ser intervir para se contrapor aos problemas criados pela desregulação irresponsável.
Cita-se, com razoável dose de cinismo, o caso das concessões do setor elétrico, que seriam um exemplo de medida imposta “de cima para baixo”. Mas ninguém familiarizado com o mundo dos negócios poderia supor que a queda da taxa de lucro imposta aos acionistas das empresas elétricas (para reduzir o custo da energia para milhões de empresas e famílias) seria acordada de forma consensual.
Os especuladores argumentam, em suas declarações públicas evidentemente interesseiras, que há “incoerência”, onde há a tentativa de se contrapor às saídas arquitetadas nos países desenvolvidos para recuperar suas respectivas economias, com destaque para os EUA e, mais recentemente, o Japão.
Com a decisão de reduzir o IOF nas aplicações dos estrangeiros em renda fixa, medida anunciada pelo governo na terça-feira 4 para se contrapor à alta do dólar e à elevação dos juros norte-americano, infla-se uma nova ilusão: os tais especuladores “agora voltaram a ser bem-vindos”.
Mas não é verdade. As operações nos mercados futuros, os famigerados derivativos, seguem sobretaxadas, novidade intervencionista que reduz o lucro da especulação.
“Os investidores estão cansados”, diz hoje um desses especuladores. Ele ‘esquece’ da série de operações bem sucedidas das últimas semanas no exterior: a Petrobras captou 11 bilhões de dólares, o Banco do Brasil fez a maior abertura de capital dos últimos seis meses, o Tesouro lançou bônus no mercado internacional pagando a menor taxa da história, sem falar no apetite dos investidores pelas concessões na área de petróleo.
Publicado em Carta Capital