Marx, Engels e a tradição democrática
Podemos afirmar que, ao contrário do que dizem os teóricos e políticos liberais, Marx e Engels se inserem, plenamente, no interior da tradição democrática, na qual também se incluem Rousseau, Blanqui e os cartistas ingleses. Para esses a democracia não podia ser definida – à moda schumpeteriana – como um simples método de selecionar os líderes encarregados de governar.
Democracia, para Rousseau e seus sucessores, se confundia com “soberania popular”. Ou seja, era a condição pela qual o conjunto dos cidadãos, efetivamente, decidia sobre os rumos da política. No entanto, sabiam muito bem que, enquanto o povo estivesse submetido ao “reino da propriedade privada”, a soberania popular não poderia ser realizada plenamente. Rousseau foi uma exceção – ou uma excrescência – na tradição liberal. O mesmo podemos dizer de seu fiel discípulo Robespierre, que levou a revolução democrático-burguesa na França até os seus limites; ou seja, levou-a a um ponto que tornou-a irreconhecível para a própria burguesia.
Até a primeira metade do século XIX, na retórica liberal-burguesa, a democracia política se confundia com o “despotismo das massas” e o “comunismo”. A operação ideológica de fusão entre liberalismo e democracia ainda não havia começado. Processo analisado de maneira primorosa por Domenico Losurdo.
Foi nesse ambiente que dois jovens comunistas alemães, Marx e Engels, ingressaram no movimento democrático e socialista internacional que se formava, constituindo assim uma espécie de ala esquerda e proletária. Engels escreveu em 1847: “Os comunistas, longe de provocar, nas atuais circunstâncias, confrontos inúteis com os democratas, se comportam como democratas em todas as questões práticas do partido. A democracia tem como consequência necessária em todos os países avançados o poder político do proletariado, e o poder político do proletariado é a primeira condição prévia da iniciativa comunista”. Ainda neste ano afirmaria: “onde a democracia não haja sido conquistada, os comunistas e os democratas lutam lado a lado, e os interesses dos democratas são também os interesses dos comunistas. Até esse momento as divergências de ambos partidos têm um caráter puramente teórico (…) sem prejuízo algum para as ações comuns”.
Karl Marx, representando a Associação Fraternal Democrática da Bélgica, num discurso, afirmou: “Os democratas da Bélgica estão convencidos de que os cartistas da Inglaterra são verdadeiros democratas e de que no momento em que tenham realizado os seis pontos de seu programa, o caminho da liberdade estará aberto para todo o mundo. Alcançai este grande objetivo, trabalhadores da Inglaterra, e sereis considerados os salvadores de toda a humanidade.” Quais eram essas reivindicações que, se conquistadas, abririam o caminho da liberdade para a classe operária e “toda a humanidade”? 1º) Instituição do sufrágio universal; 2º) igualdade dos distritos eleitorais; 3º) supressão do censo exigido dos candidatos ao Parlamento; 4º) eleições anuais; 5º) voto secreto; e 6º) remuneração aos membros do Parlamento. Algo não muito radical, aos olhos de hoje.
Assim, o esboço de um programa do que chamamos atualmente de democracia burguesa foi expresso pela primeira vez, de maneira mais ou menos articulada, pela classe operária inglesa a partir de 1842 e, imediatamente, condenado pelas classes proprietárias de todo o mundo. O sufrágio universal seria utilizado de maneira pioneira na França após a revolução democrático-popular de fevereiro de 1848. O princípio havia sido estampado anteriormente na Constituição jacobina de 1793, mas não pôde ser implementado devido à contrarrevolução liberal.
Quando eclodiu a Revolução Alemã, Marx e Engels voltaram do exílio e passaram a editar o jornal Nova Gazeta Renana, como “órgão da democracia”. Então, apresentaram uma plataforma política para aquela revolução, as Reivindicações do Partido Comunista na Alemanha – uma adaptação do Manifesto do Partido Comunista à situação da revolução burguesa que se desenvolvia. A primeira das reivindicações era: “Toda Alemanha será declarada uma República una e indivisível”.
Outra atitude tomada foi ingressarem na Associação Democrática de Colônia, buscando fortalecer a sua ala mais avançada, que era composta por elementos radicais da burguesia liberal, da pequena burguesia e do proletariado alemão. Tais decisões foram duramente criticadas pelos elementos esquerdistas da Liga dos Comunistas, que pediram a imediata expulsão dos dois revolucionários alemães, acusando-os de traírem o programa internacional que eles mesmos haviam elaborado: o Manifesto do Partido Comunista.
Engels, mais tarde, em 1884, justificaria as posições tomadas em 1848: “Os operários alemães tinham que conquistar, antes de tudo, os direitos que lhes eram indispensáveis para se organizarem de modo independente, como partido de classe. (Por isso) quando fundamos na Alemanha um grande periódico, nossa bandeira não podia ser outra senão a bandeira da democracia; porém uma democracia que destacava sempre, e em cada caso concreto, o caráter especificamente operário que ainda não podia estampar de uma vez para sempre em seu estandarte. Se não houvéssemos procedido desse modo, se não houvéssemos aderido ao movimento, incorporando-nos àquela ala que já existia, que era a mais progressista, e que, no fundo, era uma ala proletária, para impulsioná-la para frente, não nos teria sobrado outro remédio senão pormo-nos a predicar o comunismo em algum jornalzinho local e fundar, em vez de um grande partido de ação, uma pequena seita. Porém o papel de pregadores no deserto não nos caía bem; havíamos estudado demasiado bem os utopistas para cair nisso. Não era para isso que havíamos traçado nosso programa”.
Do sufrágio universal ou da transição por vias democráticas ao socialismo
Marx e Engels sempre defenderam que a melhor – e mais curta – via para a conquista e construção do socialismo era a democrática. Eles não negavam a possibilidade de que a transição ao socialismo em alguns (poucos) países pudesse prescindir de violência revolucionária.
Num discurso pronunciado em setembro de 1872, o próprio Marx afirmou: “O operário deve um dia conquistar a supremacia política para estabelecer a nova organização do trabalho; ele deve abater a velha política que sustenta as velhas instituições (…). Mas nunca pretendemos que os meios para chegar a esse objetivo sejam idênticos. Sabemos o papel que se deve reconhecer às instituições, aos costumes e às tradições das diferentes regiões; e não negamos que existam países, como a América, a Inglaterra (…) onde os trabalhadores podem alcançar seu objetivo por meios pacíficos. Se isto é verdade, devemos reconhecer também que, na maioria dos países do continente, é a força que deve ser a alavanca de nossas revoluções: é à força que será preciso recorrer, durante algum tempo, para estabelecer o reino do trabalho”. Assim, para Marx e Engels, não haveria uma forma única de se transitar para o socialismo.
Como vimos, eles acreditavam, ainda na segunda metade do século XIX, que seria possível a transição socialista na Inglaterra – e mesmo nos Estados Unidos – sem a necessária quebra da máquina do Estado burguês. Muitos anos mais tarde, outro grande revolucionário, Vladimir Ilitch Lênin, iria dizer que essa tese havia perdido a atualidade no limiar do século XX. Escreveria no seu O Estado e a Revolução de 1917: “Isso se compreendia em 1871, quando a Inglaterra era ainda um modelo de país puramente capitalista, mas sem militarismo e, até certo ponto, sem burocracia (…). Em 1917, na época da primeira guerra imperialista, esta restrição de Marx caiu por terra: a Inglaterra e os Estados Unidos, os maiores representantes do mundo da ‘liberdade’ anglo-saxônica, sem militarismo e sem burocracia, se atolaram completamente no pântano infecto e sangrento das instituições burocráticas e militares europeias”. Por isso, segundo Lênin, a revolução violenta e a necessidade de destruição do aparelho estatal militar-burocrático haviam entrado na ordem do dia também nesses países.
A democracia política – ainda que num sentido bastante limitado da palavra – pressupõe a existência do direito de todos os cidadãos e cidadãs (acima de determinada idade) poderem eleger e serem eleitos. Ela exige, por conseguinte, o fim dos critérios eleitorais censitários, classistas, machistas e racistas – que predominaram na maioria dos regimes liberais ocidentais até o início do século XX. Lembremos que o voto censitário predominou amplamente no século XIX, as mulheres só adquiriram o direito ao voto nas primeiras décadas do século XX e os negros norte-americanos até recentemente (anos 1960) estavam excluídos do direito ao voto em várias regiões dos Estados Unidos.
A democracia exigiria também o controle dos eleitores sobre os eleitos e, destes últimos, sobre as rédeas efetivas do Estado, pois existe sempre a possibilidade de que o parlamento, mesmo nos regimes parlamentaristas, seja apenas peça decorativa, e de que as principais decisões sobre a política do Estado sejam tomadas pela alta burocracia que exerce, na prática, o poder Executivo a serviço da grande burguesia. De fato, é isso que geralmente acontece nas chamadas democracias ocidentais dominadas pelo capital financeiro.
O sufrágio universal foi um dos primeiros passos para a implantação da democracia política moderna e, por isso mesmo, se tornou uma das principais bandeiras do movimento operário e passou a integrar todos os programas da social-democracia europeia. No entanto, existiam correntes que não pensavam da mesma maneira. Os anarquistas e esquerdistas tendiam a menosprezar sua importância e, por isso, não o incluíam como uma exigência em suas plataformas de luta.
Qual posição assumida por Marx e Engels diante dessa questão crucial? Para eles, o sufrágio universal seria um mero instrumento de ludíbrio, conforme afirmavam os anarquistas e esquerdistas, ou um meio de emancipação dos trabalhadores, como pensariam os socialistas reformistas? A resposta não é fácil de ser dada. Para Marx e Engels, contraditoriamente ou dialeticamente, o sufrágio universal poderia representar as duas coisas e ao mesmo tempo.
Já observamos que, no caso inglês, os dois revolucionários alemães depositavam muitas esperanças no sufrágio universal. Na contraface da esperança operária estava a resistência feroz imposta pelos latifundiários e pela burguesia em relação à sua aplicação. A lógica dominante era: se os trabalhadores constituem a maioria da população, o direito ao voto necessariamente lhe dará também a maioria no parlamento. A maioria parlamentar proletária seria o toque de finado para a propriedade privada dos meios de produção. Assim pensavam todos os operários e burgueses conscientes dos seus interesses de classe. Por esse motivo não poderia haver acordo quanto à implantação de um mecanismo, aparentemente, tão perigoso.
Marx, novamente, escreveu no New York Daily Tribune (1850) sobre a luta dos cartistas ingleses pelo sufrágio universal: “Os seis pontos da Carta pela qual combatem não afirmam nada mais do que a reivindicação do sufrágio universal e as condições sem as quais o sufrágio universal seria ilusório para a classe operária, por exemplo: escrutínio secreto, uma retribuição para os membros do parlamento, eleições gerais anuais. Mas o sufrágio universal é sinônimo de poder político para a classe operária na Inglaterra, onde os proletários formam a grande maioria da população, onde, numa longa guerra civil conduzida subterraneamente, eles adquiriram a clara consciência de sua situação enquanto classe (…). A conquista do sufrágio universal na Inglaterra seria, por conseguinte, uma reforma que mereceria ser qualificada de socialista, mais do que qualquer outra medida agraciada com esse nome no continente. Na Inglaterra, seu resultado inevitável é a supremacia política da classe operária”.
Na França o sufrágio universal não teria a mesma importância que na Inglaterra. No mesmo ano (1850), fazendo um balanço do movimento revolucionário ocorrido entre 1848 e 1850, Marx afirmou: “O sufrágio universal não possuía a virtude mágica que lhe haviam atribuído os republicanos da velha escola. Em toda a França, ou pelo menos na maioria dos franceses, eles enxergavam cidadãos, que tinham os mesmos interesses, o mesmo discernimento etc. Praticavam o culto do povo. Mas, no lugar de seu povo imaginário, as eleições trouxeram à luz o povo real, isto é, representantes das diferentes classes (…). Mas, se o sufrágio universal não era a milagrosa varinha mágica imaginada por bravos republicanos, ele tem o mérito, infinitamente maior, de desencadear a luta de classes, de fazer com que as diferentes camadas médias da sociedade burguesa (…) percam rapidamente suas ilusões e decepções, e de elevar de um só golpe todas as frações da classe exploradora ao topo do Estado, arrancando suas máscaras enganadoras”.
O sufrágio universal teria um papel diferente em países que tinham maioria operária, como a Inglaterra, e naqueles que a maioria da população era camponesa (pequeno-burguesa), como a França e a Alemanha. Embora o sufrágio universal fosse importante nos dois casos, apenas no primeiro ele teria um caráter emancipador imediato. No segundo caso o processo era mais complexo e conheceria várias etapas.
Esse esquema sofreria algumas, mas significativas, alterações nos últimos textos de Marx. Em 1880 ele ditou as suas Considerações ao Programa do Partido Operário Francês, dirigidos à Guesde e Lafargue, nas quais afirmou: “a apropriação coletiva só pode decorrer da ação revolucionária da classe produtora – ou proletariado – organizada em partido político distinto; que semelhante organização deve ser buscada por todos os meios de que disponha o proletariado, inclusive o sufrágio universal, transformando-o assim de instrumento de ludíbrio que foi até agora em instrumento de emancipação”.
Sem dúvida, essa ideia vinda do próprio Marx de que o sufrágio universal poderia ser convertido num “instrumento de emancipação” dos trabalhadores na França – e não mais apenas na Inglaterra e nos Estados Unidos – soa um pouco estranha aos nossos ouvidos. A esquerda revolucionária sempre encarou as eleições como mero “instrumento de ludíbrio” ou, no máximo, um expediente tático para avaliar e acumular forças. A bem da verdade, Marx não fala aqui numa revolução feita pelo sufrágio universal, mas do papel do sufrágio universal no processo de unificação e organização da classe operária criando as melhores condições para que ela realize a ruptura revolucionária com o capitalismo e conquiste o socialismo.
Na Crítica ao projeto de Programa de Erfurt (1891), seria Engels que insistiria nas possibilidades da chamada via pacífica em alguns países. A novidade era que entre estes incluiu, explicitamente e pela primeira vez, a França. “Pode-se”, afirmou ele, “conceder-se que a velha sociedade possa evoluir pacificamente para a nova nos países em que a representação popular concentra em si a maioria da nação; em repúblicas democráticas como a França e a América, em monarquia como a Inglaterra (…)”, e continuou: “Uma coisa absolutamente certa”, disse ele, “é que nosso Partido e a classe operária só podem atingir a dominação sob a forma da república democrática. Esta última é mesmo a forma específica da ditadura do proletariado”.
Contrariando as afirmações de Lênin, no início dos anos 1890, o número de países que poderiam transitar ao socialismo pela “via pacífica” havia aumentado. Nele, entraria a França, país símbolo do domínio da burocracia e do militarismo, conforme o próprio Marx afirmou em As Lutas de Classes na França e no Dezoito de Brumário de Louis Bonaparte. A possibilidade de uma “evolução pacífica” não deve ser confundida com a necessidade (fatalidade) dela. Nem tudo o que é possível é o que necessariamente ocorre.
Para Marx e Engels a existência de um regime democrático não eliminava a possibilidade e a necessidade do uso da violência revolucionária pelo proletariado. Neste caso, a violência seria meramente defensiva. Uma resposta às tentativas golpistas da burguesia contra a vontade popular expressadas por institutos democráticos. A revolução, assim, seria um meio de defender e ampliar – através de elementos da democracia direta – a democracia política e não eliminá-la.
Repito: isso não deve nos conduzir à falsa conclusão de que Marx e Engels tivessem qualquer fetiche em relação à democracia política em geral e ao sufrágio universal, em particular. Eles, por exemplo, foram bastante críticos em relação aos revolucionários alemães (1848-1849) e aos comunardos parisienses (1871), que perderam um tempo precioso tentando organizar eleições em vez de marchar sobre seus adversários reacionários e implantar uma ditadura, ainda que provisória, sobre eles.
Por outro lado, a Comuna de Paris (1871) apontou elementos para a construção de uma democracia socialista, mais avançada que a burguesa. Os seus ensinamentos extraídos por Marx foram expressos nos textos organizados e publicados sob o título Guerra Civil na França. Quais medidas tomadas pelos comunardos parisienses apontavam no sentido da construção de um novo poder de Estado, operário e radicalmente democrático? Eram elas: supressão do exército permanente, substituído pelo povo em armas; os conselheiros (representantes do povo), eleitos por sufrágio universal, passavam a ter mandatos imperativos, que podiam ser revogados a qualquer momento por aqueles que os elegeram; o conselho passou a ter funções legislativa e executiva, ou seja, era responsável pela aplicação das leis que ele mesmo aprovara; o salário dos dirigentes do Estado foi igualado ao salário médio do operário qualificado; os juízes passaram a ser eleitos e, como os conselheiros da Comuna, poderiam ser revogados de suas funções. Esses mecanismos democráticos, entre outras coisas, visavam a reduzir o fosso existente entre governantes e governados, uma condição essencial para a construção de qualquer poder verdadeiramente popular e socialista.
Marx e Engels nunca deixaram de considerar as liberdades políticas – conquistadas pelo povo – como burguesas, pois elas além de limitadas estavam aprisionadas nos estreitos limites da estrutura socioeconômica do capitalismo. Sabiam que a igualdade formal (jurídico-política) neste sistema se assenta numa desigualdade real (econômico-social). Isso faz com que as liberdades políticas sejam sempre distorcidas a favor dos donos do capital.
Mesmo essas liberdades burguesas, limitadas, às vezes assustam a burguesia e precisam ser defendidas pelos trabalhadores. Engels, referindo-se a elas, escreveu: “Ainda que essas instituições sejam puramente burguesas, já se observou que uma burguesia amedrontada pode perfeitamente passar sem elas, enquanto os operários, sem elas, jamais poderão conquistar sua emancipação.”Continuou: “Mesmo no caso extremo em que, por temor aos operários, a burguesia se refugiasse no colo da reação, apelando à força de seus inimigos para proteger-se dos operários, não restaria ao partido operário outra alternativa a não ser prosseguir, a despeito dos burgueses, a agitação traída por eles em defesa das liberdades burguesas, da liberdade de imprensa, do direito de associação e de reunião. Sem essas liberdades, ele não pode ter as mãos livres; ao reivindicá-las, ele luta por seu elemento vital, pelo ar que necessita para respirar.”
Em 1850 Marx havia dito: “Ora, a contradição fundamental desta Constituição (burguesa) consiste no seguinte: as classes de que ele deve perpetuar a escravidão social – o proletariado, o campesinato, a pequena burguesia – são postas por ela na posse do poder político por meio do sufrágio universal. E a classe cujo antigo poder social ela confirma – a burguesia – é privada das garantias desse poder. A Constituição enquadra a dominação política dessa classe em condições democráticas que ajudam, a cada instante, as classes inimigas a lhe arrebatarem a vitória e a questionar os próprios fundamentos da sociedade burguesa”. Nos casos acima os institutos democráticos “puramente burgueses” parecem – e são – mais úteis ao proletariado que à própria burguesia.
O longo período de dominação burguesa e de subordinação política e ideológica dos trabalhadores nas democracias capitalistas ocidentais após a Segunda Guerra Mundial, em certo sentido, turvou esta perspectiva marxiana. Nestes casos, os “institutos da democracia” parecem ter se mostrado mais úteis à submissão do que à emancipação do trabalho. Contudo, acredito que mais do que negar Marx e Engels, eles confirmam a dupla dimensão que pode ter a democracia numa sociedade marcada pela luta de classes.
* Augusto Buonicore é historiador, secretário-geral da Fundação Maurício Grabois. E autor dos livros Marxismo, história e a revolução burguesa e Meu Verbo é Lutar: a vida e o pensamento de João Amazonas, ambos publicados pela Editora Anita Garibaldi.
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