Pensamentos de José Bonifácio sobre índios, escravidão e Igreja
Hoje todos vêm o seu papel como positivo. Lutou pela independência e unidade do país, pela fim do tráfico negreiro e abolição gradual dos escravos, propôs a integração dos índios à sociedade através de medidas educativas e miscigenação. Mas, em sua época, foi considerado muito autoritário com os liberais e pouco maleável com os absolutistas. Como escreveu Jorge Caldeira, “se pensava como iluminista, sempre agiu como um dirigente absolutista”.
No próprio dia 13, o Senado realizou sessão especial, proposta pelo senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) e comandada pelo presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), em homenagem a José Bonifácio. Em seu pronunciamento, o senador comunista abordou aspectos da vida, atuação científica, artística e, principalmente, política do homenageado. Ao final deste artigo está um link para a íntegra da fala do líder do PCdoB no Senado.
Aspecto interessante da variegada atuação do Patriarca foi sua abordagem das questões indígena e da exploração dos negros, que marcam o passado e o presente do Brasil. José Bonifácio se considerava “cristão e filantropo” e tinha um irmão padre. Mas criticava a ação do que “com o pretexto de os fazermos” (aos índios) “cristãos, lhes temos feito e fizemos muitas injustiças e crueldades”. Sua opinião sobre os índios reflete abordagens às vezes antagônicas.
Diz que são os “índios povos vagabundos”, envolvidos em guerras e roubos, sem freios religioso ou civil, mas denuncia “o roubo contínuo de suas melhores terras” e os serviços e trapaças a que os setores dominantes da sociedade os sujeitam. Por outro lado, como Rousseau, opina: “Com efeito, o homem primitivo não é bom, nem é mau naturalmente, é um mero autômato, cujas molas podem ser postas em ação pelo exemplo, educação e benefícios”. Deplora: “Faz horror refletir sobre a rápida despovoação destes miseráveis depois que chegamos ao Brasil”.
Para sanar tais males, propugna que os missionários instruam os jovens na “moral de Jesus Cristo, na língua portuguesa, em ler, escrever e contar, vestindo-os e sustendo-os”. Pretende que se adote o “princípio incontestável que se deve permitir o que não se pode evitar”.
Já no que diz respeito à relação da Igreja com os negros, é mais enfático. Critica “nossa religião”, “pela maior parte um sistema de superstições e abusos antissociais”. Deplora que “nosso clero, em muita parte ignorante e corrompido, é o primeiro que se serve de escravos”, até mesmo para formar com as “desgraçadas escravas um harém turco”.
Mais de 60 anos depois de escritas essas palavras, Joaquim Nabuco, que considerava José Bonifácio o “mais ilustre de todos os brasileiros” reafirmava as críticas à Igreja no tratamento da questão dos escravos. Ele escreveu, em O Abolicionismo: “Entre nós, o movimento abolicionista nada deve, infelizmente, à Igreja do Estado; pelo contrário, a posse de homens e mulheres pelos conventos e por todo o clero secular desmoralizou inteiramente o sentimento religioso de senhores e escravos. No sacerdote, estes não viam senão um homem que os podia comprar, e aqueles a última pessoa que se lembraria de acusá-los. (…) Nenhum padre tentou nunca impedir um leilão de escravos, nem condenou o regime católico das senzalas. A Igreja Católica, apesar do seu imenso poderio em um país ainda em grande parte fanatizado por ela, nunca elevou no Brasil a voz em favor da emancipação”.
Mas voltemos a José Bonifácio. Sugiro a leitura do pronunciamento do senador Inácio Arruda.