As Forças Armadas do Egito, por meio do general Abdel Fattah el-Sisi, anunciaram nesta quarta-feira (03/07) que Mohamed Mursi não é mais o presidente do país. Foi anunciado também que haverá um governo de transição, comandado por Maher El-Beheiry, presidente do Tribunal Constitucional, e responsável pela convocação de novas eleições, que serão antecipadas.

A Constituição do Egito foi suspensa e os militares apoiarão o governo interino até que as novas eleições sejam realizadas, disse Sisi. Ele acrescentou que o Exército não quer tomar o poder, mas apenas auxiliar o povo, que pedia ajuda. Após o término do anúncio, milhares de pessoas começaram a comemorar na Praça Tahrir pela saída de Mursi do poder.

Por meio de uma breve declaração em sua página do Facebook, o presidente egípcio, Mohamed Mursi, havia dito poucos minutos antes que “não aceitará nunca renunciar de forma humilhante a sua pátria, sua legitimidade e sua religião”.

“Que saibam nossos filhos que seus pais e avôs foram homens que não aceitam a injustiça e que não aceitarão nunca renunciar de forma humilhante”, dizia a mensagem.

As Forças Armadas do Egito tomaram hoje as ruas do país e cercaram o palácio presidencial logo que expirou o prazo do ultimato de 48 horas que haviam dado ao presidente Mursi para que negociasse com a oposição. Milhares de pessoas pró e contra o governo também saíram às ruas e se concentraram em praças.

Pela manhã, um dos assessores de Mursi, Esam Haddad, afirmou que estava acontecendo um “golpe de Estado” no país, que gerará muita violência. “Centenas de milhares de pessoas se reuniram em apoio à democracia e ao presidente. E não o abandonarão por esse ataque. Para impedi-los, terá que haver violência, seja do exército, da polícia ou de mercenários. Em qualquer caso, haverá um derramamento de sangue considerável”, escreveu Haddad em sua página no Facebook. Ele também pediu que se chame o que está havendo no Egito agora “por seu verdadeiro nome: golpe militar”.

Além disso, defendeu as tentativas do presidente nas últimas semanas de convocar um diálogo nacional, apesar da rejeição da oposição, que, por sua vez, “convidava os militares a serem os guardiões do governo no Egito”. “A oposição negou categoricamente todas as opções que implicavam uma volta às urnas”, destacou.

Uma fonte militar afirmou que o Exército teria fechado, com tanques, todos os acessos à Praça Rabea al Adauiya, situada no leste do Cairo, onde se concentravam partidários do regime. Entretanto, a agência estatal Mena, citando uma outra fonte militar, garantiu que as Forças Armadas estavam cercando também a Praça Tahrir e os arredores do Palácio Presidencial de Itihadiya, onde os opositores geralmente se reúnem. Segundo essa fonte, o objetivo dos militares é “garantir o máximo grau de proteção aos manifestantes nesta etapa crítica da história do Egito”.

Fontes de segurança egípcia afirmam que tanto Mursi quanto os principais líderes da Irmandade Muçulmana, seu partido, estariam impedidos de sair do país. Algumas fontes declararam também que Mursi estaria em prisão domiciliar, mas não houve confirmação quanto a esse fato.

Antes da deposição

A perspectiva de golpe de Estado no Egito foi rechaçada pelo governo brasileiro, que defende a busca de uma solução negociada e respaldada pela sociedade egípcia e está atento aos episódios de violência registrados nos protestos dos últimos dias. O emissário do Brasil para o Oriente Médio mais a Turquia e o Irã, embaixador Cesário Melantonio Neto, ressaltou nesta quarta-feira (03/07) que a expectativa é que os egípcios, “acostumados a conflitos”, obtenham uma “acomodação negociada” entre o governo, a oposição e as Forças Armadas.

“Estamos acompanhando atentamente os acontecimentos no Egito, por intermédio da nossa embaixada no Cairo e também pelas informações divulgadas. É um momento de tensão, sobretudo porque os egípcios querem resultados rápidos de uma revolução que ainda vai completar três anos, é preciso ter paciência”, disse Melantonio.

Em entrevista à Agência Brasil, Melantonio descartou a possibilidade de fechamento da Embaixada do Brasil no Egito e de retirada do embaixador Marco Antônio Brandão e dos funcionários brasileiros que trabalham na representação diplomática. “Não há necessidade disso. Não é o caso. Não somos alvo de atentados, nem de ataques. É importante manter a embaixada em funcionamento para acompanhar os acontecimentos que mudam a todo tempo.”

Em maio, Melantonio conversou com Mursi, em Brasília, e disse que ele sabia que seria alvo de protestos no último dia 30. “O que não se pode saber é a dimensão que o movimento toma”, ressaltou o embaixador. 

De acordo com especialistas, a crise no Egito, é causada por fatores como o agravamento da situação econômica interna, com inflação elevada, o aumento do número de desempregados, a pressão dos militares por mais espaço e o isolamento político de Mursi. Melantonio Neto lembrou ainda que há setores insatisfeitos na sociedade egípcia, que perderam espaço com a queda do ex-presidente Hosni Mubarak em fevereiro de 2011.

“Para avaliar a situação no Egito é preciso considerar o processo democrático e a história política do país. Há pelo menos seis décadas, os militares têm poder e estão diretamente ligados aos governos. A democracia não é caracterizada pela submissão de civis a militares”, destacou o embaixador. “É importante também considerar que fatores envolvendo os vizinhos do Egito também interferem, como as tensões em Israel, Síria, Líbia e Tunísia, assim como no Iêmen.”

O governo de Mursi tem o apoio de vizinhos considerados importantes na região, como o Catar, os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, conversou, por telefone, com Mursi e sugeriu que ele tente um acordo com a oposição e os militares, no esforço de encerrar o impasse.