Política Externa do Brasil para o Oriente Médio evita divergir de potências
Como pensar a política externa brasileira dos últimos dez anos em relação ao Oriente Médio? Quais seus desafios para o próximo período? Essas são duas das questões debatidas na Mesa 11 A política externa brasileira e o Oriente Médio, no âmbito da Conferência Nacional “2003-2013: dez anos de nova política externa”, na tarde desta quarta-feira (17). Embora tenha havido uma abordagem nova do Brasil, ao se aproximar da região de forma inédita, houve questionamentos sobre o posicionamento brasileiro baseado em consensos internacionais, que rebaixariam reivindicações palestinas e até cumplicidade com ilegalidades no comércio com Israel.
Após uma introdução de Paulo Farah, diretor da Biblioteca e Centro de Pesquisa América do Sul-Países Árabes (Bibliaspa), o chefe da Divisão Oriente Médio do Itamaraty, Carlos Oliveira, fez a primeira intervenção. Para Oliveira, as relações entre Brasil e Oriente Médio são muito antigas desde a influência do comércio de café. Cabe notar, também, a parcela importante de muçulmanos dentre os escravos africanos trazidos à força ao Brasil (o abolicionista Luiz Gama era filho de muçulmanos). Esses mundos vieram ao Brasil e os árabes constituem um elemento-chave da formação brasileira. A comunidade judaica possui também presença marcante no Brasil e brasileiros participaram da constituição do Estado de Israel.
Se o relacionamento entre Brasil e Oriente Médio sempre foi intenso, este reforçou-se a partir dos anos 1970 e, sobretudo, nos últimos dez anos. O Iraque é, por exemplo, o país para o qual várias empresas brasileiras começaram a exportar.
Nesta última década, o objetivo foi de aprofundar os vínculos, criar um arcabouço jurídico e diversificar as relações. O país busca trabalhar na região em prol da democracia, dos direitos humanos e do desenvolvimento, sem ser dogmático. Algumas dificuldades situam-se em barreiras culturais, que levam a perguntas como “o que o Brasil está fazendo no Oriente Médio?”. Por um lado, o Brasil possui relações bilaterais com todos os países da região. Por outro, ocorre uma aproximação birregional, na qual o Brasil lidera a América do Sul na iniciativa Aspa (Cúpula América do Sul-Países Árabes).
Para Emir Mourad, secretário-geral da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), nas relações entre Brasil e Oriente Médio existe uma interlocução entre governo e sociedade civil, fato pouco comum na política externa.
Mourad destaca a política multilateral do Brasil, respeitando e compreendendo o outro. Defende, porém, que a paz mundial estará sempre ameaçada enquanto a questão palestina não for resolvida, percebendo Israel e os Estados Unidos como obstáculos a essa resolução.
Salem Nasser, professor da Fundação Getulio Vargas, propõe pensar a política externa brasileira da última década, considerada como nova, progressista e de esquerda (isto é, levando em conta questões da pobreza e da injustiça).
Aceitação da derrota, sensação de impotência, tragédia efetiva, injustiça: eis o Oriente Médio. Uma permanência na região: a questão da Palestina, a questão nacional do povo palestino.
Se a política brasileira deseja reforçar suas relações com o Oriente Médio, isto envolveria uma maior aproximação com o Fatah ou o Hamas? Com a Liga Árabe ou com o Irã, Síria e Hezbollah? No que toca à Síria, ser de esquerda e progressista significa apoiar a oposição que, supostamente, luta contra um governo autoritário ou apoiar um governo que luta contra o projeto imperial, pensando nos dois pólos destas polêmicas questões.
Dentre as opções básicas da diplomacia brasileira para a região, uma seria estar ausente e outra estar presente. O Oriente Médio faz parte do grande jogo das relações internacionais e o Brasil manifestou no Governo Lula uma “vontade de poder”. Estamos, no entanto, nos dando os meios de exercer o poder, de jogar o jogo dos grandes jogadores, pergunta Nasser. Temos as condições materiais para isso?
Pela primeira vez um Presidente da República esteve no Oriente Médio. O Brasil conversa com todos, o que é positivo, mas deve identificar seu interesse nacional e qual o sentido de justiça do país na região. Em relação à Palestina o mesmo discurso se manteve: pelo Estado palestino e pela segurança de Israel. Entretanto, operando dentro do consenso não estaria o Brasil operando no sentido do “rebaixamento” em curso das reivindicações palestinas no dito consenso internacional? Pergunta reforçada por outra de Mourad, do Brasil como possível cúmplice da ilegalidade quando o comércio com Israel envolve produtos advindos dos territórios ocupados.
Nasser – assim como Oliveira e Mourad – defendem uma necessária apropriação do Oriente Médio como campo de saber. Mútuo conhecimento, diálogo pelos direitos humanos, inclusive no que toca ao papel das mulheres. Pontes para fortalecer a luta do Brasil e dos povos árabes para decidir seu destino de modo autônomo.