Em dois dias de atividades, o Seminário Crise da Representação e Renovação da Democracia propôs um profundo debate sobre o futuro das relações entre Estado e sociedade no século XXI. Participação na definição de políticas públicas; movimentos em todo o mundo e sua relação com a representação institucional; meios de comunicação tradicionais e novas narrativas; o uso de novas tecnologias na conformação das relações de poder. Esses foram apenas alguns dos temas tratados por mais de 20 convidados, em quatro mesas de debates, nos dias 5 e 6 de setembro, em Porto Alegre. Todas as atividades, no Palácio Piratini ou no Teatro Bruno Kiefer da Casa de Cultura Mario Quintana, contaram com auditório sempre lotado e foram acompanhadas por pessoas de todo o país por meio da transmissão, que teve mais de 13 mil acessos só pela página do evento, sem contar os sites parceiros.

A inversão nos processos tradicionais das estruturas de representação começou com uma coletiva concedida pelo governador Tarso Genro a blogueiros, jornalistas independentes e ativistas digitais, na tarde de quinta-feira. Na sequência, a participação dos gaúchos e gaúchas no debate sobre a #reformapolítica foi valorizada com a entrega, pelo governador Tarso Genro, a deputados federais gaúchos de um relatório elaborado a partir dos resultados de duas consultas públicas feitas pelo Governo do Estado, por meio digital e presencial.

“Carência de democracia real”

A mesa de abertura do seminário trouxe uma reflexão sobre as formas de representação no século XXI, debatendo as crises e alternativas que se apresentam. “É um momento de refletir sobre erros. Houve um otimismo excessivo das forças progressistas a partir da ascensão à cidadania. Isso serve de alerta aos políticos e mostra que não existe reserva de mercado de voto”, afirmou Maria Inês Nassif. O economista e dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra João Pedro Stédile e o blogueiro Altamiro Borges concordaram que há de fato uma crise, uma “carência de democracia real”, nas palavras do militante do MST. Eles dividiram a mesa com o governador Tarso Genro e o cientista político Juarez Guimarães.

O seminário continuou no dia seguinte com uma conversa sobre comunicação, ainda pela manhã do dia 6. “É ilusão achar que a reforma política seja a mãe das reformas. A mãe das reformas é a da comunicação, porque ela vai destravar o debate e vai possibilitar que as outras reformas, que também são extremamente necessárias, possam ser debatidas à luz do interesse público e não à luz do interesse de grupos midiáticos”, defendeu o diretor da Carta Maior Joaquim Palhares. Colega de mesa, o jornalista Renato Rovai, da Revista Fórum, enfatizou o surgimento de novos atores na construção de narrativas, que se reinventam. Antônio Castro, diretor do portal Sul21, Lino Bocchini, da Carta Capital, Antônio Martins, do Outras Palavras, e o professor Venício Lima completaram a mesa.

Crise?

O debate esquentou na mesa que tratou das novas tecnologias e sua relação com as transformações sociais por que passa o Brasil e o mundo, assim como de alternativas para a reinvenção das instituições democráticas. “Eu acho que a representação política não está em crise”, provocou o professor de Comunicação Wilson Gomes, em oposição ao colega que falara logo antes, Sérgio Amadeu. “A democracia representativa lida mal com a instantaneidade e a aceleração de informações”, afirmou o sociólogo ao justificar sua crença na crise da representação. Natalia Viana apontou a existência de uma crise de legimitidade no jornalismo, mas que também traz enormes possibilidades de reinvenção. O diretor do Centro de Estudos Internacionais sobre Governo (Cegov) da UFRGS, Marco Cepik, focou no debate sobre a ampliação da qualidade da democracia, por meio do aumento da participação.

A última conversa também trouxe divergências entre os convidados. Enquanto a cientista política da UFRGS Céli Pinto defendia a organização política mais tradicional, estruturada em partidos, e não via a existência de uma crise da representação, o ativista do movimento espanhol 15M Bernardo Gutiérrez afirmou que as ruas não são apolíticas e que nelas se constroem críticas e alternativas à representação tradicional. “Uma democracia plena não se faz onde partido político é considerado palavrão”, disse Céli, em oposição à afirmação de Bernardo de que “a política vem de baixo para cima também”.

O meio-termo foi encontrado pelo cientista político Benedito Tadeu César. Para ele, o momento é, sim, de muitas transformações, com uma crise “geral e mundial”, e a construção de alternativas pode se dar incorporando os partidos tradicionais e os novos movimentos. Questionando se a democracia participativa é a resposta para a crise que o seminário propunha debater, o islandês Eirikur Bergmann apresentou a experiência de construção da Constituição do seu país de forma colaborativa por meio das redes sociais. Por videoconferência, participou também da mesa o cientista político da UFMG André Rubião.

Em busca de alternativas

O seminário foi encerrado com um coquetel e o lançamento do livro Gabinete Digital: análise de uma experiência. A publicação reúne uma série de reflexões e perspectivas sobre os desafios da democracia no século XXI e a importância da participação social para transformar a relação entre os cidadãos e a gestão pública e está disponível para download neste link.

Entre os sites parceiros que transmitiram as atividades ao vivo estão Carta Capital, Revista Fórum, Carta Maior, Fundação Perseu Abramo e Fundação Maurício Grabois. Uma estrutura de cobertura instalada na Casa de Cultura Mario Quintana e, virtualmente, no site do seminário, incentivou a participação de blogueiros, jornalistas e midialivristas interessados em ampliar o debate, fosse para concordar ou divergir dos convidados que compunham as mesas. O resultado dessa produção colaborativa pode ser encontrado aqui. O espaço continua aberto para que o debate não se encerre por aqui e muito mais possa ser produzido e formulado buscando a compreensão do momento atual e da crise de legitimidade da representação.   

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