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    Hino à árvore

    Hino à árvore   Árvore irmã que bem cravada por ganchos escuros ao solo a clara fronte levantaste numa sede intensa de céu.   Faz-me piedoso para a escória de cujos limos me mantenho sem que se adormeça a memória do país azul de onde venho.   Tu que anuncia ao viandante a graça de […]

    POR: Redação

    2 min de leitura

    Hino à árvore

     

    Árvore irmã que bem cravada

    por ganchos escuros ao solo

    a clara fronte levantaste

    numa sede intensa de céu.

     


    Faz-me piedoso para a escória

    de cujos limos me mantenho

    sem que se adormeça a memória

    do país azul de onde venho.

     


    Tu que anuncia ao viandante

    a graça de tua presença

    com ampla sobra refrescante

    e com o nimbo de tua essência;

     


    faze com que a minha presença

    revele, nos prados da vida,

    dúlcida e cálida influência

    por sobre as almas exercida.

     


    Árvore criadora dez vezes:

    a que tem fruto cor-de-rosa,

    a de madeira construtora,

    a de zéfiro perfumada,

    a de folhagem protetora,

     


    a de bálsamos suavizantes

    e a de resinas milagrosas

    repleta de pesados ramos

    e de gargantas melodiosas;

     


    torna-me doador opulento,

    faze-me como tu fecundo:

    O coração e o pensamento

    me sejam vastos como o mundo.

     


    E todas as atividades

    não cheguem nunca a fatigar-me;

    as magnas prodigalidades

    surjam em mim sem esgotar-me.

     


    Árvore, em que é tão sossegada

    a pulsação do existir,

    e vês meu alento a agitada

    febre do mundo consumir;

     


    faze-me sereno, sereno,

    dessa viril serenidade

    que deu aos mármores helenos

    o seu sopro de divindade.

     


    Tu que não és outra coisa

    que doce entranha de mulher,

    pois cada rama guarda airosa

    em cada leve ninho um ser,

     


    dá-me ramagem vasta e densa,

    tanto quanto hão de precisar

    os que no bosque humano imenso

    não tenham lenha para o lar.

     


    Árvore que onde se levante

    teu corpo cheio de vigor

    assumes invariavelmente

    o mesmo gesto protetor;

     


    faze que ao longo dos estágios

    da vida, do prazer, da dor,

    minha alma assuma um invariado

    e universal gesto de amor.

     

     


    Gabriela  Mistral – Poesias escolhidas


    Tradução  –   Henriqueta Lisboa

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