Roda Viva | Alexandre Padilha | 28/04/2014
Antonio Biondi
Alexandre Padilha, pré-candidato do PT ao governo estadual de São Paulo, foi o convidado de ontem do programa Roda Viva, da TV Cultura. A participação do ex-ministro da Saúde do governo Dilma registrou ótimos momentos, mas também outros de maior dificuldade. Diante de uma bancada de jornalistas – alguns bem preparados, outros nem tanto – solidária em uma uníssona e hostil busca em colocar o entrevistado nas cordas, o resultado geral pode até ser considerado positivo.
Como esperado, um dos temas mais explorados pelas perguntas foram as questões relacionados à narrativa da grande mídia sobre o PT – Mensalão, doleiros, Operação Lava Jato da Polícia Federal, André Vargas, etc.
Além de buscar explicar com cuidado as situações que envolveriam mais diretamente seu nome, Padilha tratou de aproveitar a oportunidade para se apresentar e construir uma imagem positiva junto ao telespectador. Nesse sentido, muitas vezes priorizou o registro de aspectos interessantes de sua trajetória (e até mesmo pitorescos), lançando mão de duas qualidades suas inegáveis: o carisma e a capacidade técnica.
Falou de sua torcida pelo Corinthians, de sua trajetória na universidade e na medicina, da importância do espírito de cooperação na política, da força e riqueza presentes na história de São Paulo, bem como de seus desafios e diversidade. Contou, ainda, de suas idas ao Campo Limpo (e bairros do entorno) “ainda sem asfalto” acompanhadas por sua mãe, que algumas décadas atrás buscava levar saúde e assistência aos mais necessitados dessa região da capital paulista.
As dificuldades em se construir uma candidatura do PT nesse momento no Estado de São Paulo e de se afirmar uma imagem positiva do candidato Padilha surgiram de forma categórica por meio de perguntas de dois entrevistados. E receberam respostas firmes do pré-candidato.
Quando Germando de Oliveira, do jornal O Globo afirmou que a candidatura de Padilha estava na defensiva, o pré-candidato do PT tratou de destacar que cresce nas adversidades. Oliveira analisou que Padilha vinha atacando o governo Alckmin nos temas da violência e da água. E que agora teria de jogar na defensiva, diante da CPI da Petrobras a investigar o governo Dilma, dos cerca de 2% de intenções de votos de Padilha registradas em algumas pesquisas, das denúncias recentes envolvendo seu nome, etc.
Padilha então respondeu: “Estou na ofensiva” e reafirmou crescer na adversidade. O ex-ministro de Dilma relembrou que lhe diziam para não implementar o Mais Médicos, “mas implementei, pois havia 50 milhões de brasileiros sem acesso à saúde”. Para Padilha, o que ele vem mostrando sobre o governo Alckmin, as criticas sobre a água, as informações e debates levantados, “estão incomodando muita gente. Então, recebo respostas agressivas, grosserias”. Ele afirmou que pretende “continuar trazendo essas informações. Esclarecendo sobre as acusações de terceiros. E construindo as propostas pro Estado”, convidando os telespectadores a participar.
Mais ao final do programa, quando Fernando Rodrigues, da Folha de S. Paulo afirmou que Padilha lembrava a atuação de políticos tradicionais, que escapavam das perguntas mais difíceis com evasivas, Padilha foi bastante incisivo ao dizer que havia sim respondido, mas que “talvez eu não tenha dado a resposta que você esperava”.
Saúde e Segurança
O programa também girou muito em torno de duas questões que se encontram no centro das preocupações dos brasileiros hoje: a saúde e a segurança pública.
No tema da saúde, pode-se dizer que Padilha nadou de braçadas. Demonstrou muito conhecimento, propostas e resultados para a área. Quando um telespectador indagou se Padilha já havia feito tratamento em hospital público, o ex-ministro da Saúde do governo federal destacou que não possui plano de saúde privado, que sempre optou por não ter, mas que também não criticava quem tinha plano.
Ainda na área da saúde, Padilha trouxe à tona sua perspectiva de que a saúde deve ser para todos, com qualidade e tratamento humanizado e que atenda de forma prioritária aos mais necessitados. Fernando Rodrigues trouxe dados de artigo publicado na Folha, segundo o qual o governo federal não teria investido 17 bilhões de reais na saúde em 2013, além de ter fechado algumas dezenas de hospitais públicos nos últimos anos.
Padilha falou que boa parte das instituições fechadas eram manicômios – num total de 14 mil leitos – e que novos hospitais, com um novo perfil, mais completo e complexo, estão sendo construídos, bem como unidades de atendimento mais compatíveis com as necessidades atuais da população. Mesmo assim, ficou a impressão de que faltaram elementos para responder de cabo a rabo à crítica dos hospitais fechados. Ele afirmou que o ministério da Saúde poderia responder com os dados atuais. Quanto aos 17 bilhões de reais, certamente parece ser questão para o ministério da Fazenda, o Banco Central e seus infindáveis superávits responder.
No tema da segurança, um dos mais difíceis para qualquer candidato hoje no Brasil, Padilha foi brindado com uma pergunta dificílima e elaboradíssima por parte de Maria Cristina Fernandes, editora de política do Valor Econômico. A jornalista trouxe à baila vários dados sobre aumento da violência entre 2007 e 2010 em Estados governados pelo PT – como Bahia, Piauí e Pará. O pré-candidato do PT questionou o fato de os dados irem somente até 2010, e que haveria avanços a mostrar desde então, passando a citar avanços em alguns municípios administrados pelo PT, além de destacar o tanto que São Paulo é diferente dos demais Estados elencados pela editora do Valor.
De todo modo, ficou a sensação de que a candidatura de Padilha ainda possui um bom caminho para construir suas propostas e análises nessa área da segurança pública – que é, como bem se sabe, um desafio real colocado para todo o Brasil, e todos os governos: federal, estaduais e municipais.
Para atender às expectativas e necessidades do povo de São Paulo, o ex-ministro de Dilma e Lula afirmou que deverá contar com a colaboração de Márcio Thomaz Bastos e Paulo Lacerda, respectivamente titulares do Ministério da Justiça e da Polícia Federal em parte da gestão de Lula à frente da presidência.
Padilha afirmou que também pretende basear seu plano de governo nessa área em experiências exitosas do PT em municípios grandes e médios, ao lado de iniciativas de sucesso de outros estados, no potencial das próprias polícias paulistas, na colaboração da sociedade (por exemplo por meio do uso inteligente de câmeras particulares), além de políticas exemplares de prefeituras dos EUA – como Nova Iorque e Chicago.
Mais Médicos, Cuba e programa
No debate do Mais Médicos, mostrou que está preocupado sobretudo com a saúde dos brasileiros e paulistas, defendendo muito bem o programa e seus resultados. Indagado sobre as condições de trabalho dos médicos cubanos e se apoiava esse tipo de situação, Padilha afirmou: “Não quero discutir Cuba, quero valorizar o atendimento feito por esses médicos. É uma carreira desse tipo, que trabalha por missões internacionais. As regras lá são essas”. Diante da insistência da bancada no tema, o ex-ministro da Saúde afirmou que “Há pessoas que querem fazer essa polarização com Cuba, mas vieram médicos de vários países”.
O debate sobre o tema se prolongou e, diante da negação de Padilha em classificar o regime cubano como ditadura, ou de comentar questões internas do país, a conclusão dos interlocutores foi de que então ele apoiava o autoritarismo e a ditadura cubana. Padilha reafirmou que não cumpria a ele debater o regime de outro país, mas que abominava qualquer tipo de ditadura e autoritarismo e que tinha grande compromisso com a democracia. Contou histórias familiares riquíssimas, lembrando que nasceu em meio a uma ditadura no Brasil, e que só pode abraçar seu pai pela 1a vez aos oito anos de idade – pois o pai vivia no exílio.
Diante dessa sequência sobre Cuba no Roda Viva, poderia ser interessante que nas próximas rodadas do programa os jornalistas perguntassem para outros candidatos o que acham, por exemplo, das intervenções dos EUA no Iraque e outros países, ou como veem as práticas de interrogatórios estadunidenses na base de Guantánamo. Mas talvez seja pedir demais.
Bastaria que os jornalistas mostrassem preocupação com a ditadura que existiu no Brasil entre 1964 e 1985, e demonstrassem que comungam com Padilha do repúdio a esse período que assombrou o país. Mas isso não foi pauta – ao menos na noite de ontem.
Como sabido, o cenário descrito nos último parágrafo é por demais improvável. Então, a pergunta que fica mesmo é o que mais importará para os cidadãos paulistas ao final desse Roda Viva – e da campanha que virá.
Augusto Nunes, apresentador do Roda Viva, dá pistas de por onde os debates sobre a eleição seguirão, ao menos na narrativa da grande mídia (e talvez da TV Cultura). “Eu honestamente preferiria começar já, de abrir o programa, com a discussão de programas administrativos – o que faremos, com bastante tempo, ao longo da conversa. Mas eu vou mudar o assunto porque fatos divulgados a partir de sexta-feira se impuseram de tal forma no noticiário que o senhor mesmo interrompeu, suspendeu os compromissos da agenda para esclarecer o assunto. E acho que aqui o senhor terá a oportunidade de fazê-lo de vez”.
Diante das questões colocadas, o eleitorado considerará mais importante os resultados do Mais Médicos ou as opiniões (ou a falta delas) de Padilha sobre Cuba? Os paulistas, afinal, apostarão num candidato que possui história – e tarimba – especialmente na área da saúde e que buscará trazer propostas novas para o Estado, por exemplo nas áreas da segurança e da gestão da água? Ou destinarão mais fichas ao partido que governa São Paulo há quase duas décadas (ou mais, segundo cálculos que levam em consideração a situação de fato, e não somente a institucional)? Com a palavra, o futuro de São Paulo, de Padilha e dos paulistas.