O jornalista Nathaniel Parish Flannery, colaborador de várias publicações americanas em áreas como crime organizado, política, cultura e economia, escreveu um bom artigo no site da Forbes sobre a Copa do Mundo.

“Quando a seleção do Brasil entrar em campo, o mundo devia também aproveitar o momento para reconhecer o sucesso das políticas públicas progressivas do país”, escreve Flannery. “O Brasil destinou menos que 2 bilhões de dólares para a construção dos estádios. Em contraste, entre 2010, ano do início da construção dos estádios, e o início de 2014 o governo investiu 360 bilhões de dólares em programas de saúde e educação”.

Eis os principais trechos de sua análise:  

No Brasil, a Copa do Mundo deflagrou protestos de ativistas interessados em chamar atenção para os persistentes problemas de pobreza e desigualdade no país. Em 2013, os manifestantes empunhavam cartazes em inglês com mensagens como “Nós não precisamos da Copa do Mundo” e “Nós precisamos de dinheiro para hospitais e educação”. Contudo, como os cientistas políticos Diego von Vacano e Thiago Silva explicaram em seu excelente artigo para o Washington Post, “os protestos são paradoxais porque o Brasil tem vivenciado um crescimento econômico e social muito significativo desde que o país foi escolhido para realizar o evento em 2007”.

Mais amplamente, a Copa do Mundo de 2014 acentua a emergência econômica da América Latina ao longo da última década. O mar de camisas amarelas que pode ser visto em jogos da Colômbia e áreas inteiras de mexicanos usando roupas verdes e torcendo para a sua seleção é um testemunho do recente sucesso econômico da classe média latino-americana. De acordo com o historiador David Goldblatt, “a televisão pode enganar, e o uso de uma camisa da seleção da Colômbia não é garantia de nacionalidade, mas o estádio do Mineirão em Belo Horizonte estava forrado de amarelo – 20 000 numa multidão de 57 000. A mídia chilena tem reportado que mais de 10 000 estão viajando para o Brasil, e ao que parece eles todos estavam presentes em Cuiabá quando a seleção deles despachou a Austrália.”

Em 2011, pela primeira vez na história, o número de pessoas nas classes médias da América Latina ultrapassou o número de pessoas pobres na região. O Brasil, em particular, destaca-se pelo sucesso no investimento em programas sociais e de redução da pobreza.

Dado o número de camisas amarelas que aparecem na multidão nos jogos, a Copa do Mundo no Brasil tem também sido massivamente frequentada pela classe média emergente do país. Ainda assim, a história de que o gasto com futebol é um desperdício num país em que a população vive na pobreza tem ganhado impulso nas mídias sociais.

Fotos de um grafite mostrando uma criança faminta chorando ao ver uma bola de futebol em seu prato tornaram-se virais e foram compartilhadas aos milhares no Twitter e Facebook. Outros usuário do Twitter compartilharam fotos lembrando a pobreza com a qual eles se deparam a algumas quadras dos estádios.

Estas imagens falham em mencionar que o Brasil destinou menos que 2 bilhões de dólares para a construção dos estádios. Em contraste, entre 2010, ano do início da construção dos estádios, e o início de 2014 o governo federal do Brasil investiu 360 bilhões de dólares em programas de saúde e educação. Para colocar isso em perspectiva, o governo do Brasil investiu 200 milhões de dólares para cada dólar gasto com os estádios da Copa do Mundo. Embora os sistemas de saúde, educação e transporte precisem de investimentos contínuos, os gastos com a Copa do Mundo não têm de maneira alguma eclipsado o investimento progressivo em programas sociais.

A economia do Brasil é definida por uma desigualdade intrinsecamente profunda. É um país conhecido pelas favelas e milionários. De acordo com análises da Forbes, o Brasil é o lar de dezenas de bilionários, incluindo Roberto Irineu Marinho, João Roberto e José Roberto Marinho, que juntos controlam o maior império de mídia da América Latina, a Globo, e têm, juntos, 28 bilhões de dólares. A empresa reportou em 2013 um lucro de 1,2 bilhão de dólares. De acordo com levantamento da Forbes, “enquanto a riqueza crescente do país está criando mais milionários e bilionários do que nunca, famílias ricas estão garantindo a fatia maior desse bolo”. Dos 65 bilionários listados pela Forbes na sua edição dos Bilionários do Mundo, 25 deles são herdeiros ou parentes.Mas, enquanto é fácil apontar os gastos dispendiosos com os estádios da Copa do Mundo ou a longa lista de bilionários do Brasil e contrasta-los com milhões de pessoas que vivem em extrema pobreza, tais comparações falham ao não reconhecer o tremendo sucesso que os criadores de políticas públicas brasileiros têm tido na erradicação da pobreza ao longo da última década. De acordo com um relatório recente do Centro para a América Latina e Caribe da ONU (ECLAC), em 2005 38% da população brasileira vivia abaixo da linha de pobreza. Avançando para 2012, essa taxa caiu para 18,6% da população. Em outras palavras, desde 2005 o Brasil tem efetivamente reduzido para mais da metade o número de seus cidadãos vivendo na pobreza.

Por outro lado, o México, um país cujos políticos estão mais concentrados nas exportações e nos salários competitivos, atualmente viu a pobreza aumentar durante esse mesmo período, de acordo com um relatório do Centro das Nações Unidas para América Latina e Caribe. O Chile, um país há muito elogiado pelo desenvolvimento de suas políticas econômicas, viu um declínio muito menor de sua pobreza no mesmo período. No Chile, a pobreza caiu de 13,7% para 11% em 2011.

A América Latina é a região mais desigual do mundo, e o Brasil em particular é conhecido por sua história colonial baseada em uma espoliativa agricultura de exportação, o que ajudou a desenvolver o estabelecimento de uma economia altamente dividida entre ultra-ricos e ultra-pobres. Em meio à controvérsia da Copa do Mundo, o tremendo sucesso do Brasil na redução da pobreza tem sido de certa forma ignorado.

Jason Marczak, expert em América Latina do Atlantic Council em Washington [um think tank apartidário e influente] , me contou que “a crítica aos excessivos custos dos estádios é na verdade um grito dos cidadãos do novo Brasil, um Brasil mais classe média, que demanda maior transparência e um modelo de estado mais responsável”.

Quando a seleção do Brasil entrar em campo, o mundo devia também aproveitar o momento para reconhecer o sucesso das políticas públicas progressivas do país.

“O Brasil tem atingido conquistas impressionantes no crescimento sócio-econômico na última década com dezenas de milhões de pessoas saindo da pobreza e entrando na classe média”, acrescenta Marczak.

Sobre Kiko Nogueira:

Diretor-adjunto do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

Leia o artigo da Forbes:

World Cup Economics: Why Brazil’s Bashers Have Got It Wrong

Copa Mundial Ranking: How Does Brazil’s Economy Compare?

Ahead of the 2014 World Cup in Brazil protesters held up English language signs emblazoned with messages such as “WE DON’T NEED THE WORLD CUP” and “WE NEED MONEY FOR HOSPITALS AND EDUCATION.” What doesn’t appear on these signs is the fact that since 2010 Brazil’s government spent nearly $200 in health and education programs for every dollar spent on World Cup stadiums. Brazil has also cut its poverty rate in half since 2005. Many economists argue that Brazil should be celebrated as an example of progressive policy making. To put this to the test, Forbes looks at how Brazil’s economy compares to the other Latin American countries participating in the World Cup.

In Brazil, the World Cup has sparked protests from activists interested in drawing attention to their country’s persistent problems of poverty and inequality. In 2013 protesters held up English language signs emblazoned with messages such as “WE DON’T NEED THE WORLD CUP” and “WE NEED MONEY FOR HOSPITALS AND EDUCATION.” However, as political scientists Diego von Vacano and Thiago Silva explained in their excellent article for The Washington Post, “the protests are paradoxical, because Brazil has enjoyed very significant social and economic improvements since the country bid for the event in 2003.”

More broadly, the 2014 World Cup highlights Latin America’s economic emergence over the last decade. The sea of yellow jerseys that can be seen at Colombia’s games and the packed sections of cheering Mexicans wearing green and cheering to support their team are a testament to Latin America’s recent economic success and growing middle class. According to soccer historian David Goldblatt, “Television pictures can be deceptive, and wearing a Colombian shirt is no guarantee of citizenship, but the Estadio Mineirao in Belo Horizonte was awash with yellows — perhaps 20,000 in a crowd of 57,000. The Chilean media has been reporting that up to 10,000 are making the trip to Brazil, and it looked as if they were all present in Cuiaba as the national team swept past Australia.”

In 2011, for the first time in history, Latin America’s middle class outnumbered the region’s poor. Brazil in particular, stands out for its success in investing in social programs and reducing poverty.

If the number of Brazilian jerseys on display in the crowd at the games, Brazil’s World Cup is also being heavily attended by the country’s rising middle class. Still, the theme that spending on soccer is a waste in a country where nearly a fifth of  the population lives in poverty has gathered momentum on social media. Photos of this mural showing a hungry child crying at the sight of a soccer ball in his soup bowl have been shared tens of thousands of times on Twitter TWTR -6.91% and Facebook.  Other Twitter users shared photos such as this one, reminding fans of the poverty that they might fight a few blocks away from some stadiums. Still, these graphics fail to mention that Brazil has allotted less than two billion dollars for the construction of stadiums. By contrast, between 2010 the year that stadium construction began and the start of 2014 Brazil’s federal government spent more than $360 billion on health and education programs. To put this in perspective, Brazil’s government spent nearly $200 in health and education programs for every dollar spent on World Cup stadiums. While Brazil’s health, education, and transportation systems need continued investment and improvement, World Cup spending has in no way eclipsed spending on progressive social programs.

Brazil’s economy is defined by deeply entrenched inequality. It’s a country known for favelas and billionaires. According to Forbes analysis, Brazil is home to dozens of billionaires, including Roberto Irineu Marinho, Joao Roberto and Jose Roberto Marinho, who together control Latin America’s largest media empire, Globo, and have a combined net worth is over $28 billion. The company reported 1.2 billion in profit in 2013. According to Forbes’ research, “As the country’s surging wealth is creating more millionaires and billionaires than ever before, rich families are holding onto a big piece of the pie. Out of the 65 Brazilian billionaires listed by FORBES in our latest World’s Billionaires list, 25 are blood relatives. Eight families have multiple members among our latest rank.” Jorge Lemann, the partial owner of Anheuser-Busch InBev, has a net worth of $22 billion. He is the 30th wealthiest person in the world. Brazil’s fifteen richest families have a combined net worth of $122 billion, a sum that is only slightly lower than Ecuador and Costa Rica’s combined annual economic output.

But, while it is easy to point to expensive World Cup stadiums or Brazil’s long list of billionaires and make contrasts with the millions of the country’s residents who still live in extreme poverty, such comparisons fail to acknowledge the tremendous success that Brazilian policymakers have had in eradicating poverty over the last decade. According to a recent report from the UN Center for the Latin America and Caribbean (ECLAC), in 2005 38 percent of Brazil’s population lived below the poverty line. Fast forward to 2012 and that poverty figure dropped to 18.6 percent of the population. In other words, since 2005 Brazil has effectively reduced the number of its citizens living poverty by more than half. By contrast, Mexico, a country whose politicians are more focused on exports and competitive wages, actually saw poverty increase during this same time period, according to the ECLAC data. Chile, a country long-praised for its economic development policies, saw a much smaller decline in poverty during this same period. In Chile poverty fell from 13.7 percent in 2005 to 11 percent in 2011. Latin America is the world’s most unequal region, and Brazil in particular is known for its colonial history that revolved around cash crop exploitation and helped foster the establishment of a deeply divided economy of ultra-rich and ultra-poor residents. In the controversy over the World Cup, Brazil’s tremendous recent success in reducing poverty has somehow been ignored.


Jason Marczak, a Latin America expert from The Atlantic Council in Washington D.C., told me “Criticism of stadium cost overruns is actually a shout across the bow that the citizenry of the new Brazil, a more middle class Brazil, demands greater transparency and a new more responsive state model.” As Brazil’s national soccer team takes to the field, the world should also take a moment to recognize the success of the country’s progressive policymakers.

“Brazil has made impressive achievements in socioeconomic growth in the last decade with tens of millions of people moving from poverty into the middle class,” Marczak added.

For fun, I gathered together some data from the World Bank and United Nations, and compared Brazil to the other Latin American countries competing in the World Cup. I pulled together data on Foreign Direct Investment (Per Capita), GDP per capita, current poverty levels, poverty reduction since 2005, total number of billionaires, and each country’s World Bank Doing Business ranking. These metrics illustrate the relative strength of the nine Latin American countries competing in the World Cup, and also show how successful each country has been at translating economic success into poverty reduction. After ranking the countries in each category, I then created an aggregated score.