Tropas Legalistas de Arthur Bernardes
Trincheira na esquina da Rua Conselheiro Crispiniano com a Avenida São João
A REVOLUÇÃO DE 1924, ou Como São Paulo foi Bombardeada
Como aprendemos nos livros, o Brasil nunca foi palco de guerra; ainda que muitas revoluções acontecessem, principalmente na época da colonização e formação da cidadania. São Paulo é a única cidade brasileira que já sofreu bombardeio aéreo. A cidade foi bombardeada (covardemente) durante 22 dias, por culpa ou causa da revolução tenentista paulista. O Presidente do Brasil, Arthur Bernardes, junto com seu Ministro da Guerra, mandaram dizer aos que pediam misericórdia para o povo de São Paulo, que São Paulo era rico e não teria problemas para reconstruir a bela cidade se ela fosse destruída. Os revoltosos, que a tomaram (e saquearam) em 05 de julho de 1924; só a abandonariam na madrugada de 28 de julho, quando se retiraram de trem para o interior, bombardeando pontes pelo caminho.
Apelo dos revolucionários ao marinheiros da gloriosa Marinha de Guerra
São Paulo, 5 de julho de 1924, um sábado!
Naquele tempo, sábado era um dia de trabalho como outro qualquer. Quem tomava o café da manhã no bar e restaurante da Estação da Luz às 6h da manhã não notou nada fora do comum. Quem tentou tomar o trem às 8h30 na mesma estação, descobriu que não havia trens e que a estação fora ocupada por uma tropa da Força Pública (antigo nome da Polícia Militar), comandada por um sujeito magricela; o tal de Tenente João Cabanas, que tempos depois ficaria famoso (N.A.1). João Cabanas mandou fuzilar os saqueadores no centro da cidade de São Paulo. Lá no interior de São Paulo, nas vizinhanças da divisa com Minas Gerais, uma família de colonos, encabeçada pelo Sr. Manuel Affonso e mais alguns filhos (Néco, Aurora e Almira) e mais uma enteada, a Guidinha (N.A.2), preparavam o terreno do eito para o plantio de arroz. Ainda era cedo; cerca de oito horas da manhã. Dois aviões voavam à baixa altitude. O Sr. Manuel Affonso havia ouvido no rádio, durante a madrugada, que o exército poderia invadir São Paulo, logo após um bombardeio por aviões. Ele não teve dúvidas: fez com que todos eles se escondessem na mata próxima. Muito choro e corações disparados; porém os aviões não jogaram nenhuma bomba sobre os agricultores.
Na mesma hora em que os aviões vindos através do interior, tal como aqueles vistos pela família do Sr. Manuel Affonso, o comandante da Força Pública e da 2ª Região Militar, do Exército já estava preso. Ele ainda vestia a farda de gala, que ostentou durante uma festa no Hotel Esplanada, atrás do Teatro Municipal de São Paulo. Um ajudante de ordens o acordou durante a madrugada e lhe deu a notícia de que a festa era outra: uma revolta de oficiais do Exército e da Força Pública, para depor o presidente Artur Bernardes. Poucos dias depois, o governador Carlos de Campos abandonava o Palácio dos Campos Elíseos para se refugiar na estação de Guaiaúna, na Penha, (algumas indicações da época, falavam que ele estava em Quitaúna, no quartel do IV Regimento de Infantaria do Exército, sob a tutela das forças legais do Exército. Este autor presume que Carlos Campos estava de conluio com Arthur Bernardes). O estado ficou sem governador por vinte e três dias, período que durou a ocupação dos revoltosos. O prefeito era a única autoridade civil na cidade. Os revoltosos, fugindo dos legalistas, foram acabar em Foz do Iguaçu, sudoeste do estado do Paraná e acabaram por, em sua maior parte, fazendo parte da Coluna de Miguel Costa e de Luís Carlos Prestes. O ministro da Guerra e os generais mandaram então bombardear a cidade para desalojar os revoltosos. Os tiros podiam ser ouvidos dia e noite, em todos os cantos da cidade.
O povo que ainda ficou na cidade e os revoltosos abriram trincheiras nas ruas. Havia trincheiras na Avenida Paulista, que se estendiam até o bairro do Brás; dali até o Belenzinho, deste à Vila Mariana, à Mooca, às Perdizes, ao Ipiranga, à Vila Prudente! A cidade estava toda cheia de valetas para acomodar e salvaguardar a “Resistência”. Um tiro de canhão despejou uma bomba no Liceu Coração de Jesus e feriu algumas crianças. A Igreja da Glória, no Lavapés, foi praticamente destruída; a Igreja do Cambuci ficou bastante danificada. Até algumas delegacias também foram bombardeadas! Famílias inteiras morreram dentro de casas bombardeadas. Mortos foram sepultados em terrenos baldios e quintais. Mais de um terço da população da cidade fugiu para o interior. Um grande número de adultos e crianças foi recolhido a um acampamento de refugiados da Cruz Vermelha. Sem dizer que aquele foi um dos invernos mais frios de São Paulo.
A Revolução de 1924 deixou em São Paulo mais de 500 cadáveres; a maioria composta por civis! Deixou ainda um grande número de mutilados e feridos. Fábricas e armazéns, além de muitas residências (quase 2000), foram destruídos pelos bombardeios e pelos incêndios que se seguiam aos bombardeios.
Infelizmente, talvez receosos de uma nova investida do governo federal, nenhum monumento foi feito para celebrar a memória das vítimas de Arthur Bernardes!
O único monumento que persiste até os dias atuais foi feito à bala de canhão: a chaminé de uma usina termoelétrica na Rua João Teodoro (próxima à Avenida Tiradentes) em que, 89 anos depois, ainda ostenta os buracos resultantes do dia em que a cidade de São Paulo foi bombardeada por ataque aéreo do Exército Brasileiro.
Os legalistas não suportavam o frio que fazia em São Paulo e a garoa londrina era detestável tanto pelos nortistas e mineiros quanto pelos cariocas. E demoraram 23 dias para vencer a “resistência”, sendo que o bombardeio foi elemento importante no evento. Dos 14500 soldados legalistas que lutaram contra menos de 4000 revoltosos, que quase na totalidade fugiram para o Sul. Três anos depois do evento, vários líderes da Revolução foram condenados à prisão pelo governo de Arthur Bernardes.
DADOS
(N.A.1): João Cabanas (1895 @ 1974). Militar, cursou a Escola de Oficiais da Força Pública do Estado de SÃO PAULO, tendo também se bacharelado pela Faculdade de Direito de SÃO PAULO. Em 1924, teve participação ativa no levante tenentista deflagrado em SÃO PAULO contra o governo de ARTHUR BERNARDES. A capital paulista esteve então, por três semanas, sob o controle dos rebeldes. Após a retirada dos revolucionários da cidade, prolongou a luta pelo interior do Estado comandando a COLUNA DA MORTE. Nessa época, seus feitos militares estimulavam o aparecimento de muitas lendas sobre a sua pessoa, a quem se atribuía poderes sobre-humanos em combates e fugas espetaculares. Por conta disso, o governo colocou sua cabeça a prêmio por quinhentos contos. Exilou-se, então, no URUGUAI, não se integrando à COLUNA MIGUEL COSTA, exército guerrilheiro nascido da unificação das forças rebeldes de SÃO PAULO com as quais haviam sublevado guarnições do Exército no interior gaúcho, também em 1924. Foi também político com breve passagem pela Câmara Paulista.
(N.A.2): Maria Águida Couto Costa, a Guidinha, tinha à época 10 anos de idade. Guidinha é a mãe do ACAS; este autor.
BIBLIOGRAFIA
• Artigo Publicado no jornal “O ESTADO DE SÃO PAULO”, em 06 de julho de 2009, por José de Souza Martins.
• Dados amealhados na internet; sem autores definidos.
• Informações orais transmitidas pela família do autor, a respeito desse evento histórico.
Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS. É natural de Cravinhos-SP. É Físico, poeta e contista. Tem textos publicados em 7 livros, sendo 4 “solos e entre eles, o Pequeno Dicionário de Caipirês e o livro infantil “A Sementinha” além de três outros publicados em antologias junto a outros escritores.