1. A Biologia, Base da Agronomia

A biologia trata dos corpos vivos — plantas, animais, micro-organismos.

Uma base teórica em agronomia tem, portanto, que incluir o conhecimento das leis biológicas. E quanto mais profundamente a ciência da biologia revela as leis da vida e do desenvolvimento dos corpos vivos, mais eficiente é a ciência da agronomia.

Em suma, a ciência da agronomia é inseparável da biologia. Quando falamos da teoria da agronomia, referimo-nos às leis descobertas e compreendidas da vida e do desenvolvimento das plantas, dos animais e dos microrganismos.

O nível metodológico do conhecimento biológico, o estado da ciência que trata das leis da vida e do desenvolvimento das formas vegetais e animais, isto é, principalmente da ciência conhecida há meio século como genética, é de importância essencial para nossa ciência agrícola.

                       2. A História da Biologia: uma História de Controvérsias Ideológicas

Aparecimento da doutrina de Darwin, exposta em seu livro A Origem das Espécies, marcou o início da biologia científica.

O ponto principal da doutrina de Darwin é sua teoria sobre a seleção natural e artificial. A seleção de variações favoráveis ao organismo produziu a objetividade que observamos na natureza viva, na estrutura dos organismos e em sua adaptação às suas condições de vida. A teoria da seleção de Darwin forneceu uma explicação racional de objetividade observada na natureza viva. Sua ideia da seleção é científica e verdadeira. Em substância, sua teoria sobre a seleção é um resumo das seculares experiências práticas dos criadores de plantas e animais que, muito tempo antes de Darwin, produziram espécies de plantas e raças de animais pelo método empírico.

Darwin investigou os numerosos espécimens obtidos por naturalistas na natureza viva e analisou-os através do prisma da experiência prática. A prática agrícola serviu a Darwin de base material para a elaboração de sua teoria sobre a Evolução, que explicou a causalidade da adaptação que observamos na estrutura do mundo orgânico. Isso representou um grande progresso no conhecimento da natureza viva.

Na opinião de Engels três grandes descobertas permitiram que o conhecimento humano da interconexão dos processos naturais progredisse de maneira fabulosa: primeiro a descoberta da célula; segundo a descoberta da transformação da energia; terceiro

“a prova, que foi Darwin o primeiro a desenvolver de maneira conexa, de que o conjunto de produtos orgânicos da natureza que hoje nos cercam, inclusive a espécie humana, é resultado de um longo processo de evolução de uns poucos germes unicelulares originais, e de que estes, por sua vez, se originaram do protoplasma ou albúmen que existiu por meios químicos”.(1)
Os clássicos do marxismo, embora apreciassem toda a importância da teoria darwiniana, assinalaram os erros em que Darwin incorreu. A teoria de Darwin, embora inquestionavelmente materialista em seus principais aspectos, não está isenta de graves erros. Um dos erros principais, por exemplo, é o fato de que, paralelamente ao princípio materialista, Darwin introduziu em sua teoria da evolução reacionárias ideias malthusianas. Hoje em dia esse erro está sendo agravado pelos biologistas reacionários.

O próprio Darwin confessou que aceitava a teoria malthusiana. Em sua Autobiografia, escreveu ele:

“Em outubro de 1838, isto é, quinze meses depois que começara minhas pesquisas sistemáticas, li por acaso e como distração o “Ensaio sobre a teoria da população”, de Malthus e, estando muito bem preparado para apreciar a luta pela existência, que em toda parte se trava conforme se evidenciava da longa e constante observação dos hábitos dos animais e das plantas, veio-me logo a ideia de que nessas circunstâncias as variações favoráveis tenderiam a ser preservadas e as desfavoráveis a ser destruídas. Havia, afinal, conseguido uma teoria sobre a qual poderia basear meu trabalho. (Grifo do autor).

Muita gente pode ainda acentuar o erro de Darwin transferindo para sua doutrina as absurdas e reacionárias ideias de Malthus sobre a população. O verdadeiro cientista não pode e não deve ignorar os aspectos errôneos da doutrina de Darwin.

Os biologistas devem sempre refletir sobre as seguintes palavras de Engels:

“Toda a doutrina darwiniana sobre a luta pela existência não faz senão transferir da sociedade para o reino da natureza viva a doutrina de Hobbes sobre bellum omnium contra omnes e a doutrina econômica burguesa sobre a concorrência, justamente com a teoria de Malthus sobre a população. Depois dessa mistificação (cuja justificativa absoluta eu nego, principalmente no que diz respeito à teoria de Malthus) as mesmas teorias são novamente transferidas da natureza orgânica para a história, alegando-se então que ficou provado que elas têm a força de leis eternas da sociedade humana. A infantilidade desse procedimento é óbvio e não vale a pena gastar palavras com ele. Mas se eu tivesse que dispensar a esse assunto maior atenção, começaria por demonstrar que eles são antes de tudo, péssimos economistas e, só depois, péssimos naturalistas e filósofos”.(2)
Para fazer propaganda de suas ideias reacionárias Malthus inventou uma suposta lei natural.

“A causa a que aludo”, escreveu, “é a tendência constante em toda vida animada a crescer além do sustento que lhe foi preparado”.(3)
Deve ser claro a todo darwinista progressista que, embora Darwin tenha aceito a teoria reacionária de Malthus, esta contradiz basicamente o princípio materialista de sua própria doutrina. O próprio Darwin, como pode ser facilmente notado, sendo como foi um grande naturalista, o fundador da biologia científica, cuja atividade assinala uma época na ciência, não podia satisfazer-se com a teoria malthusiana, que está, de fato e fundamentalmente, em contradição com os fenômenos da natureza viva.

Sob o peso da vasta quantidade de elementos biológicos que acumulou, Darwin sentiu-se forçado, em numerosos casos, a alterar radicalmente o conceito da “luta pela existência”, a ampliá-la a ponto de declarar que era simplesmente uma figura de retórica.

O próprio Darwin, em sua época, foi incapaz de se libertar dos erros teóricos em que incorria. Foram os clássicos do marxismo que revelaram esses erros e que os denunciaram. Hoje não há justificativa para que sejam aceitos os aspectos errôneos da teoria darwiniana, os quais se baseiam na teoria de Malthus sobre a superpopulação, com a inferência de uma luta que presumivelmente se processaria dentro da espécie. Mais inadmissível ainda é apresentar esses aspectos errôneos como a pedra angular do darwinismo (como o fazem I. I. Schmalhausen, B. M. Zavadovsky e P. M. Zhukovsky). Essa interpretação da teoria de Darwin prejudica o desenvolvimento criador de sua essência científica.

Mesmo na ocasião em que a doutrina de Darwin apareceu pela primeira vez tornou-se logo claro que sua essência científica, materialista, sua doutrina relativa à evolução da natureza viva, era antagônica ao idealismo que imperava na biologia.

Os biologistas progressistas, tanto em nosso país como no estrangeiro, viram no darwinismo o único caminho certo para o futuro desenvolvimento da biologia científica. Consideraram sua tarefa defender o darwinismo contra os ataques dos reacionários, chefiados pela Igreja, e dos obscurantistas da ciência, como Bateson.

Biologistas eminentes como V. O. Kovalevsky, I. I. Mechnikov, V. M. Sechenov, e principalmente K. A, Timiryazev, defenderam e desenvolveram o darwinismo com toda a paixão de verdadeiros cientistas.

K. A. Timiryazev, esse grande pesquisador, percebeu distintamente que somente à base do darwinismo poderia a ciência da vida das plantas e dos animais desenvolver-se satisfatoriamente, que somente com o maior desenvolvimento do darwinismo, elevando-o a novas alturas, a ciência biológica conseguiria ajudar o lavrador do solo a obter duas espigas de milho onde hoje só cresce uma.

O darwinismo, como foi apresentado por Darwin, contradisse a filosofia idealista, e essa contradição aumentou com o desenvolvimento de sua doutrina materialista. Os biologistas reacionários têm feito, por isso, todo o possível para esvaziar o darwinismo de seus elementos materialistas. As vozes individuais de biologistas progressistas como K. A. Timiryazev foram afogadas pelo coro dos anti-darwinistas, dos biologistas reacionários de todo o mundo.

No período post-darwiniano a esmagadora maioria dos biologistas — longe de desenvolverem a doutrina de Darwin — fizeram todo o possível para desacreditar o darwinismo, para destruir seus fundamentos científicos. A mais evidente manifestação de descrédito do darwinismo é encontrada nas doutrinas de Weismann, Mendel e Morgan, os fundadores da mais recente genética reacionária.

                                      3. Dois Mundos — Duas Ideologias Na Biologia

O weismanismo, seguido pelo mendelismo-morganismo, que surgiu no começo deste século, foi dirigido principalmente contra os fundamentos materialistas da teoria da evolução de Darwin.

Weismann intitulou sua concepção de neodarwinismo, mas, de fato, era ela a completa negação dos aspectos materialistas do darwinismo. Introduzia na biologia o idealismo e a metafísica.

A teoria materialista da evolução da natureza viva compreende o reconhecimento da necessidade de transmissão hereditária de características individuais adquiridas pelo organismo nas condições de sua vida; ela é incompreensível sem o reconhecimento da hereditariedade de caracteres adquiridos. Weismann, entretanto, dispôs-se a refutar essa proposição materialista. Em suas Conferências Sobre a Teoria da Evolução, ele afirma que

“não só não há provas de uma tal forma de hereditariedade, como é esta teoricamente inconcebível”.(4)
Referindo-se a afirmações anteriores no mesmo teor, diz ele que

“assim foi declarada a guerra ao princípio de Lamarck de efeito direto de uso e desuso e que, de fato, marcou o início da luta que prossegue hoje em dia, a luta entre os neolamarckianos e os neodarwinistas, como são chamadas as partes litigantes”.
Weismann, como vemos, diz ter declarado guerra ao princípio de Lamarck; mas é fácil notar-se que ele declarou guerra a uma coisa sem a qual não pode haver teoria materialista da evolução, que sob o disfarce do “neo-darwinismo” ele declarou guerra aos fundamentos materialistas do darwinismo.

Weismann negou a hereditariedade dos caracteres adquiridos e elaborou a ideia de uma substância hereditária especial a ser procurada no núcleo.

“A procura do elemento portador da hereditariedade”, declarou ele, “está contida na matéria do cromossoma”.
Os cromossomas, disse, contêm unidades, cada uma das quais

“dá origem a uma parte determinada do organismo em seu aparecimento e forma final”.
Weismann afirma que há

“duas grandes categorias de matérias vivas, a substância hereditária, ou idioplasma, e a “substância nutritiva”, ou trofoplasma”.
E prossegue declarando que os portadores da substância hereditária,

“os cromossomas, representam uma espécie de mundo à parte”,
um mundo independente do organismo e de suas condições de vida.

Na opinião de Weismann, o ser vivo não é senão um terreno nutritivo para a substância hereditária que é imortal e nunca gerada uma segunda vez.

Afirma, assim, que

“o plasma germinativo nunca é gerado uma segunda vez; apenas cresce e se multiplica continuamente, transmitido de geração em geração… Consideradas do ponto de vista apenas da propagação, as células germinativas são o elemento mais importante no indivíduo, pois que só elas preservam a espécie, enquanto o corpo reduz-se praticamente à condição de mero terreno gerador das células germinativas, local em que se formam e, em condições favoráveis, se alimentam, multiplicam e amadurecem”.
O ser vivo e suas células, na opinião de Weismann, não são senão o receptáculo e meio nutritivo da substância hereditária; não podem, eles próprios, produzir nunca esta última,

“não podem nunca produzir células germinativas”.
Weismann dota pois, a fabulosa substância hereditária com a propriedade de existência contínua; é uma substância que não se desenvolve, ela própria, e que ao mesmo tempo dá origem ao desenvolvimento do corpo mortal.

Ainda mais:

“… a substância hereditária da célula germinativa, anterior à divisão por redução, contém potencialmente todos os elementos do corpo”.
E embora Weismann declare que

“no plasma germinativo não há determinantes de um “nariz adunco”, como não há determinantes da asa de uma borboleta com todas suas partes e partículas”,
prossegue acentuando que, contudo, o plasma germinativo

“…contém um certo número de determinantes que dão origem sucessivamente ao desenvolvimento de todo um grupo de células em todas as suas fases, levando à formação do nariz de maneira a resultar num nariz adunco, exatamente como a asa de uma borboleta, com todas as suas pequenas veias, células, formas de escamas, e depósitos de pigmentos, surge através a ação sucessiva de uma multidão de determinantes no curso da proliferação das células”.
Por conseguinte, segundo Weismann, a substância hereditária não produz novas formas, não se desenvolve com o desenvolvimento do indivíduo, e não está sujeita a quaisquer modificações dependentes.

Uma substância hereditária imortal, independente das características qualitativas que acompanham o desenvolvimento do ser vivo, que dirige o corpo mortal mas não é produzida por este — eis a concepção de Weismann, francamente idealista, essencialmente mística, e que ele disfarçou sob o “neodarwinismo”.

A concepção de Weismann foi totalmente aceita e, podemos dizer, ampliada pelo mendelistas-morganistas.

Morgan, Johannsen o outro expoente do mendelismo-morganismo, declararam de início que pretendiam investigar os fenômenos da hereditariedade, independentemente da teoria darwiniana da evolução. Johannsen, por exemplo, escreveu em seu principal trabalho:

“… um dos objetivos essenciais de nossa pesquisa foi acabar com a prejudicial dependência das teorias hereditárias nas especulações sobre a evolução”.(5)
O propósito dos morganistas ao fazerem tais declarações era completar suas investigações com afirmativas que em última análise negavam a evolução na natureza viva, ou reconheciam-na como um processo de modificações puramente quantitativas.

Como foi notado acima, a controvérsia entre os pontos de vista materialista e idealista na ciência biológica vem ocorrendo através de toda sua história.

No época atual de luta entre dois mundos, as duas correntes opostas e antagônicas que penetram nos fundamentos mesmos de quase todos os ramos da biologia estão definidas de maneira particularmente aguda.

A agricultura socialista, o sistema de fazendas coletivas e do Estado, deu lugar a uma ciência biológica soviética, fundada por Michurin — uma ciência nova em princípio, desenvolvendo-se em íntima ligação com a prática agronômica, com a biologia agronômica.

Os fundamentos da ciência agro-biológica soviética foram lançados por Michurin e Williams, que generalizaram e desenvolveram o que de melhor a ciência e a prática haviam acumulado no passado. Seu trabalho enriqueceu nossos conhecimentos da natureza das plantas e dos solos, nossos conhecimentos da agricultura, com muita coisa nova em princípio.

O íntimo contacto entre a ciência e a prática nas fazendas coletivas e nas fazendas do Estado cria oportunidades inesgotáveis para o desenvolvimento do conhecimento teórico, permitindo-nos aprender sempre mais sobre a natureza dos seres vivos e do solo.

Não é exagero declarar que a fraca “ciência” metafisica de Morgan a respeito da natureza dos seres vivos não pode resistir a uma comparação com nossa eficaz ciência agro-biológica michurinista.

A nova, e vigorosa corrente no biologia, ou mais exatamente a nova biologia soviética, a agrobiologia, enfrentou forte oposição de parte dos representantes da biologia reacionária no estrangeiro, bem como de alguns cientistas em nosso país.

Os representantes da ciência biológica reacionária — os neodarwinistas, weismannistas ou, o que é a mesma coisa, os mendelistas-morganistas — sustentam a chamada teoria de hereditariedade dos cromossomas.

Segundo Weismann, os mendelistas-morganistas sustentam que os cromossomas contêm uma “substância hereditária” especial que reside no corpo do organismo como num estojo e que é transmitida às novas gerações independentemente das características qualitativas do corpo e da suas condições de vida. A conclusão tirada dessa concepção é que novas tendências e características adquiridas pelo organismo sob a influência das condições de sua vida e seu desenvolvimento não são herdadas e não podem ter significação evolutiva.

Segundo essa teoria, os caracteres adquiridos pelos organismos vegetais e animais não podem ser transmitidos, não são herdados.

A teoria mendelista-morganista não inclui no conceito científico de “ser vivo” as condições de vida do corpo. Para os morganistas, o ambiente é apenas o fundo indispensável, admitem — à manifestação e à operação das várias características do ser vivo, de acordo com sua hereditariedade. Sustentam, portanto, que as variações qualitativas na hereditariedade (natureza) dos seres vivos são totalmente independentes do ambiente, das condições da vida.

Os representantes do neodarwinismo, os mendelistas-morganistas, sustentam que os esforços dos pesquisadores para regulamentar a hereditariedade dos organismos por meio de modificações nas condições de vida desses organismos são absolutamente, anticientíficos. Chamam portanto a corrente de Michurin, na agrobiologia, de neo-lamarckiana que, em sua opinião, é absolutamente errônea e anticientífica

Na realidade, é o contrário que sucede.

Em primeiro lugar, as conhecidas teses lamarckianos, que reconhecem o papel ativo das condições exteriores na formação do ser vivo, e a hereditariedade de caracteres adquiridos, ao contrário da metafísica do neodarwinismo (ou weismanismo), não são absolutamente errôneas. Elas são perfeitamente verdadeiras e científicas.

Em segundo lugar, a corrente de Michurin não pode ser chamada, nem de neo-lamarckiana, nem de neodarwinista: ela é o darwinismo soviético criador, que rejeita os erros de ambos e que se libertou dos defeitos da teoria darwiniana, expurgando-a das ideias errôneas de Malthus.

Além do mais, não se pode negar que, na controvérsia surgida entre os weismannistas e lamarckianos no começo do século vinte, os lamarckianos estavam mais próximos da verdade; pois que defendiam os interesses da ciência, enquanto os weismannistas estavam em conflito com a ciência e inclinados a transigir com o misticismo.

O verdadeiro conteúdo ideológico da genética de Morgan foi bem revelado (para desapontamento de nossos geneticistas) pelo físico Erwin Schroedinger. Em seu livro Que é a Vida? O Aspecto Físico das Células Vivas, ele tira algumas conclusões filosóficas da teoria dos cromossomas, de Weismann, que elogia. Eis sua principal conclusão:

“… o eu pessoal é igual ao eu eterno, onipresente, onisciente”.
Schroedinger acha que esta conclusão

“é o máximo que um biologista pode fazer para provar de uma só vez a existência de Deus e da imortalidade”.
Nós, os representantes da corrente soviética de Michurin, sustentamos que a hereditariedade dos caracteres adquiridos pelas plantas e pelos animais no processo de seu desenvolvimento, é possível e necessária. Ivan Vladimirovich Michurin demonstrou essas possibilidades em suas experiências e atividades práticas. O ponto mais importante é que a doutrina de Michurin, exposta em seus trabalhos, mostra a todos os biologistas a maneira de regular a natureza dos organismos vegetais e animais, a maneira de alterá-la no sentido exigido para fins práticos, regulando as condições de vida, isto é, através de meios fisiológicos.

Uma controvérsia aguda, que dividiu os biologistas em dois campos irreconciliáveis, surgiu, assim, em torno da velha questão: é possível que os aspectos e características adquiridos pelos organismos vegetais e animais no curso de sua vida sejam herdados? Em outras palavras, será possível que as variações qualitativas da natureza dos organismos vegetais e animais dependam das condições de vida que atuam sobre o ser vivo, sobre o organismo?

A doutrina de Michurin, que é essencialmente materialista e dialética, prova com fatos que essa dependência existe.

A doutrina de Mendel—Morgan, que é essencialmente metafísica e idealista, nega a existência dessa dependência, embora não possa apresentar qual quer prova em apoio de sua tese.

                                    4. O Escolasticismo do Mendelismo-morganismo

A teoria dos cromossomas baseia-se na absurda tese de Weismann a respeito da continuidade do plasma germinativo e de sua dependência do soma proposição essa que K. A. Timiryazev já havia condenado. Da mesma forma que Weismann, os morganistas-mendelistas consideram que os pais não são geneticamente os progenitores de seus rebentos. Pais e filhos, segundo sua doutrina, são irmãos ou irmãs.

Além do mais, nem os pais nem os filhos são realmente eles próprios. Não são mais do que subprodutos do inesgotável e imortal plasma germinativo. As variações deste último são absolutamente independentes de seus subprodutos, isto é, do corpo do organismo.

Examinemos a Enciclopédia, onde naturalmente podemos esperar encontrar a quintessência da questão que discutimos.

Na edição de 1945 da Enciclopédia Americana, T. H. Morgan, um dos fundadores da teoria dos cromossomas, escreve no artigo intitulado “Hereditariedade”:

“As células germinativas tornam-se mais tarde partes essenciais dos ovários e testículos, respectivamente.. Originalmente, portanto, são independentes do resto do corpo do qual nunca foram parte integrante… A Evolução é germinativa na origem e não somática como a princípio se acreditou (Grifo do autor). Essa ideia da origem de novos caracteres é, hoje em dia, sustentada quase universalmente pelos biologistas”.
A mesma ideia, expressa em palavras diferentes, é enunciada na mesma Enciclopédia Americana pelo Professor Castle no artigo sobre “Genética”. Depois de declarar que usualmente o organismo se desenvolve de um ovo fecundado, Castle prossegue estabelecendo os fundamentos “científicos” da genética da seguinte maneira:

“Na realidade os pais não produzem a criança, nem mesmo a célula reprodutiva que funciona em sua origem. Os pais são eles próprios meros subprodutos do ovo fecundado (ou zigoto) do qual se originaram. O produto direto do zigoto são outras células reprodutivas, semelhantes àquela da qual ele se originou… Por conseguinte a hereditariedade (isto é, a semelhança entre pais e filhos) depende da estreita ligação, entre as células reprodutivas que formaram os pais e as que formaram os filhos, sendo uma o produto imediato e direto da outra. Esse princípio da “continuidade da substância germinativo” (matéria reprodutiva das células) é um dos princípios fundamentais da genética. Mostra como as modificações corporais produzidas num pai pelas influências externas não são herdadas pelo rebento. É porque o rebento não é o produto do corpo do pai, mas apenas do fator germinativo que esse corpo abriga… A August Weismann cabe a honra de primeiro ter tornado claro esse ponto. Pode ele assim ser considerado como um dos fundadores da genética”.
Para nós é claro que os princípios fundamentais do mendelismo-morganismo são falsos. Não refletem a realidade da natureza viva e são um exemplo de metafísica e idealismo.

Por ser isso de tal maneira óbvio, é que os mendelistas-morganistas da União Soviética, embora esposando totalmente os princípios do mendelismo-morganismo, frequentemente os encobrem, envergonhados, disfarçando sua metafísica e seu idealismo com enfeites verbais. Agem assim com medo de serem ridicularizados pelos leitores e auditórios soviéticos que estão convencidos de que os germes do organismo, ou as células sexuais, são resultado da atividade vital dos organismos paternos.

Só quando não são mencionados os fundamentos do mendelismo-morganismo é que pessoas que não possuem conhecimentos detalhados da vida e do desenvolvimento dos plantas e dos animais podem ser levadas a crer que a teoria da hereditariedade dos cromossomas é um sistema claro, que em certo grau corresponde à verdade. Mas uma vez aceita a tese absolutamente verdadeira e geralmente conhecida de que as células reprodutivas, ou os; germes, dos organismos novos soo produzidas pelo organismo, pelo seu corpo, e não pela mesma célula reprodutiva da qual originou o aludido organismo, já maduro, nada resta da “clara” teoria da hereditariedade dos cromossomas’.

Naturalmente, o que foi dito acima não quer dizer que nós negamos o papel biológico e a significação dos cromossomas no desenvolvimento das células e do organismo. Mas não é esse absolutamente o papel que os morganistas atribuem aos cromossomas

Numerosos exemplos podem ser citados para demonstrar que nossos mendelistas-morganistas nacionais aceitam totalmente a teoria da hereditariedade dos cromossomas, seus fundamentos weismannistas e suas conclusões idealistas.

O acadêmico N. K. Koltzov, por exemplo, afirma:

“Quimicamente, o genonema com sua genes, permanece inalterado no curso de toda a ovogênese e não está sujeito ao metabolismo — processos de restauração e oxidação”.(6)
Essa afirmativa que nenhum biologista culto pode aceitar, nega a existência do metabolismo numa parte das células vivas em processo de desenvolvimento. Deve ser claro a qualquer um que a conclusão de N. K. Koltzov está perfeitamente de acordo com a metafísica idealista de Weismann e Morgan.

A afirmativa errônea de N. K. Koltzov data de 1938. Foi logo depois denunciada peles michurinistas e talvez não valesse a pena voltar ao assunto, não fosse o fato dos morganistas persistirem em sua posição anticientífica até hoje.

Podemos encontrar mais provas disto recorrendo mais uma vez ao livro de Schroedinger mencionado acima. Schroedinger diz em essência as mesmas coisas que Koltzov. Como ele participa da concepção idealista dos morganistas, também afirma que existe uma

“substância hereditária” que é “capaz da resistir por longo período à influência perturbadora do impulso do calor. “ (grifo do autor).
O tradutor russo do livro de Schroedinger, A. A. Malinovsky (um cientista do laboratório de N. P. Dubinin) em seu “Post-scriptum” ao livro em questão, subscreve — e com razão — a opinião de Haldene que relaciona a ideia de Schroedinger aos pontos de vista de N. K. Koltzov.

Nesse “Post-scriptum” feito em 1917, Malinovsky diz:

“O ponto de vista aceito por Schroedinger, segundo o qual o cromossoma é uma molécula gigantesca (o “cristal aperiódico” de Schroedinger) foi pela primeira vez apresentado pelo biologista soviético, Prof. N. K. Koltzov, e não por Delbruck, a cujo nome Schroedinger associa essa concepção”.
Não há motivo, neste caso, para entrarmos na questão de quem tem direito ao crédito da autoria desse ponto de vista escolástico. Um ponto mais importante é a alta conta em que um de nossos morganistas nacionais, A. A. Malinovsky, tem o livro de Schroedinger.

Eis alguns exemplos dos elogios que ele derrama sobre esse livro:

“Numa forma fascinante, acessível tanto ao físico como ao biologista, Schroedinger revela ao leitor uma nova corrente que se desenvolve rapidamente na ciência, uma corrente que combina profusamente os métodos físicos e biológicos”.
“A rigor o livro de Schroedinger representa os primeiros resultados coerentes dessa corrente. Schroedinger dá uma grande contribuição à sua própria e nova corrente na ciência da vida, e isto justifica grandemente as opiniões entusiásticas manifestadas sobre seu livro na imprensa científica estrangeira”.
Como eu não sou físico, nada direi sobre os métodos físicos que Schroedinger combina com a biologia. Quanto à biologia no livro de Schroedinger, é pura e simplesmente morganista, o que, de fato, motiva os enlevos de Malinovsky pelo mesmo.

O elogio entusiástico do livro de Schroedinger no “Post-scriptum” de Malinovsky é uma prova bastante eloquente de seus pontos de vista e de suas concepções morganistas, idealistas.

M. M. Zavadovsky, Professor de Biologia na Universidade de Moscou, escreve num artigo intitulado “O Caminho Criador de Thomas Hunt Morgan”:

“As ideias de Weismann encontraram amplo eco entre os biologistas, e muitos deles enveredaram pelo caminho sugerido por esse talentoso investigador… Thomas Hunt Morgan foi um dos que apreciaram grandemente o conteúdo principal das ideias de Weismann”(7).
Mas que querem eles dizer com “o principal conteúdo”?

O significado disso é uma ideia de importância primordial para Weismann e todos os mendelistas-morganistas, inclusive o Prof. M. M. Zavadovsky. Este último formula essa ideia da seguinte maneira:

“Que foi que surgiu em primeiro lugar, o ovo ou a galinha? “E, escreve o Professor Zavadovsky, “à pergunta apresentada de maneira tão direta, Weismann deu uma resposta explícita categórica: o ovo”.
Em 1947 o Professor M. M. Zavadovsky repete e defende as ideias que expôs em 1931 em seu trabalho A Dinâmica do Desenvolvimento dos Organismos. Nesse trabalho M. M. Zavadovsky considerou necessário

“aderir firmemente à Nusbaum que sustenta que os produtos sexuais não se desenvolvem do organismo materno, mas da mesma fonte que este último”, que “os corpúsculos seminais e os óvulos não se originam no organismo paterno, mas têm a mesma origem que este último”.
E em sua “Conclusão Geral” o Professor Zavadovsky escreveu:

“A análise nos leva à conclusão de que as células do processo germinativo não podem ser consideradas como produtos do tecido somático. As células germinativas e as células do soma devem ser consideradas não como gerações de filhas para pais mas como irmãs gêmeas, das quais uma (o soma) é a nutridora, a protetora e a guardiã da outra”.
O geneticista N. P. Dubinin, Professor de Biologia, escreveu em seu artigo, “A Genética e o Neolamarckismo”:

“A genética, muito acertado mente, divide o organismo em duas partes distintas — o plasma hereditário e o soma. Mais ainda, essa divisão é um de seus princípios fundamentais, uma de suas principais generalizações”(8).
Não precisamos continuar a lista de autores como M. M. Zavadovsky e N. P. Dubinin, que expõe francamente o ABC do sistema morganista. Nos livros didáticos dos colégios sobre genética, esse ABC é chamado de “Leis Mendelianas” (dominação, divisão, pureza de gametas, etc.). Um exemplo de como nossos mendelistas-morganistas aceitam sem discussão a genética idealista é o fato de que o livro didático padrão sobre genética em vários de nosso colégios, até bem pouco tempo, foi a tradução de um livro americano de autoria de Sinnott e Dunn.

Inteiramente de acordo com as teses principais desse livro didático, o Prof. N. P. Dubinin escreveu em seu artigo já mencionado (“A Genética e o Neolamarckismo”):

“Assim os fatos da genética moderna anulam qualquer reconhecimento do “fundamento dos fundamentos” do Lamarckismo — o ideia de que os caracteres adquiridos são hereditários”.(9) (grifo do autor).

Os mendelistas-morganistas puseram de lado, assim, uma das maiores conquistas na história da ciência biológica — o principio da hereditariedade de caracteres adquiridos.

A doutrina materialista segundo a qual é possível às plantas e aos animais herdar variações individuais de caracteres adquiridos sob a influência das condições de vida, o mendelismo-morganismo opõe a afirmação idealista que divide o ser vivo em duas substâncias separadas: o corpo mortal (ou soma) e uma substância hereditária imortal, o plasma germinativo. Além disso sustenta categoricamente que as modificações no soma, isto é, no ser vivo, não tem qualquer efeito sobre a substância hereditário.

                    5. A Ideia do Desconhecimento na Doutrina da “Substância Hereditária”

O mendelismo-morganismo empresta ao princípio místico da “substância hereditária” um caráter indeterminado de variação. As mutações, isto é, modificações da “substância hereditária” supostamente não tem tendência determinada. Essa afirmativa dos morganistas está logicamente ligada à base fundamental do mendelismo-morganismo —- o princípio de que a substância hereditária é independente do ser vivo e de suas condições de vida.

Os morganistas-mendelistas, que proclamam que as alterações hereditárias, ou “mutações” como são chamadas, são “indeterminadas”, presumem que essas alterações não podem, por uma questão de princípio, ser previstas É esta uma concepção peculiar de desconhecimento; seu nome na biologia é idealismo.

A afirmativa de que a variação é “indeterminada” levanta uma barreira à previsão científica, desarmando assim a agricultura prática.

Partindo da doutrina anticientífica e reacionária de Morgan, sobre a “variação indeterminada” o professor da cadeira de darwinismo na Universidade de Moscou, o acadêmico I. I. Schmalhausen, afirma em seu trabalho Fatores da Evolução, que a variação hereditária, em suas feições específicas, não depende das condições de vida e, portanto, não tem uma tendência determinada.

“Os fatores não assimilados pelo organismo”, escreve Schmalhausen, se é que atingem o organismo e o influenciam, não podem ter senão um efeito indeterminado… Essa influência só pode ser indeterminada. Por conseguinte, todas as novas alterações no organismo, que ainda não tem um histórico anterior, serão indeterminadas. Essa categoria de alterações incluirá, entretanto, não só as mutações na forma de novas modificações “hereditárias”, como também qualquer modificação nova, isto é, que apareça pela primeira vez”(10).
Numa página precedente do mesmo livro escreve Schmalhausen:

“No desenvolvimento de qualquer individuo os fatores externos exercem, em geral, apenas o papel de agentes que liberam o curso de certos processos geradores de forma e as condições que tornam possível consumar sua realização”(11).
Essa teoria formalista, autonomista, de uma “causa libertadora” em que o papel das condições externas é reduzido à realização de um processo autônomo, já foi há muito destruída pelo avanço da ciência progressista; foi denunciada pelo materialismo como anticientífica, como essencialmente idealista.

Schmalhausen e outros dentre nossos seguidores nacionais do morganismo importado, alegam que o que asseveram já foi dito por Darwin antes deles. Proclamando o caráter “indeterminado” da variação invocam as declarações de Darwin sobre o assunto. Darwin de fato falou da “variação indeterminada”. Mas isso era devido às limitações da prática da seleção em sua época. Darwin, ele próprio, tinha consciência disso, e escreveu que àquela época não havia meios de explicar as causas ou a natureza da variação nos seres orgânicos. Isso, disse ele, era um assunto obscuro.

Os mendelistas-morganistas agarram-se a tudo o que é obsoleto e errado na doutrina de Darwin, descartando ao mesmo tempo sua viva essência materialista.

Em nosso pais socialista a doutrina do grande transformador da natureza, I. V. Michurin, criou uma base fundamentalmente novo para a direção da variabilidade dos organismos vivos.

O próprio Michurin e seus seguidores conseguiram e continuam conseguindo modificações hereditárias dirigidas nos organismos vegetais, em quantidade verdadeiramente fabulosa. Entretanto Schmalhausen continua a afirmar que:

“O aparecimento de mutações individuais, como tudo indica, é um caso de fenômenos casuais. Não podemos predizer, nem introduzir deliberadamente esta ou aquela mutação. Até aqui foi impossível estabelecer qualquer ligação razoável entre a qualidade da mutação e determinadas modificações nos fatores externos”(12).
À base da concepção morganista das mutações, Schmalhausen formulou o teoria da chamada “seleção estabilizadora” — uma teoria profundamente errada ideologicamente e que tem um efeito prejudicial sobre a atividade prática. Segundo Schmalhausen, a formação de raças e espécies segue — presumivelmente de maneira inevitável — uma curva retrocedente: a formação de raças e espécies, violenta no início da civilização, gasta cada vez mais suas “reservas de mutações” e gradualmente retrocede.

“Tanto a formação de raças de animais domésticos como a formação de espécies de plantas cultivadas”, escreve Schmalhausen, “prosseguiu com tão excepcional rapidez devido, principalmente, e aparentemente, à interior reserva acumulada de variabilidade. A seleção posterior, estritamente dirigida, é mais lenta(13).
A afirmativa de Schmalhausen, bem como toda sua concepção de “seleção estabilizadora” seguem a linha de Morgan.

Como sabemos, no curso de sua existência, Michurin produziu mais de trezentas novas espécies de plantas. Muitas delas foram produzidas sem hibridação sexual, e todas foram resultado de seleção estritamente dirigida, inclusive de criação sistemática. É um insulto à ciência progressista afirmar-se em face desses fatos e de realizações subsequentes dos seguidores da doutrina de Michurin — que a seleção estritamente dirigida tem que retroceder progressivamente.

Schmalhausen obviamente acredita que as realizações de Michurin não se enquadram em sua teoria da “seleção estabilizadora”. Em seu livro Fatores de Evolução, ele contorna essa dificuldade, deixando de fazer menção a esses trabalhos de Michurin ou à própria existência de Michurin como cientista. Schmalhausen escreveu um livro volumoso sobre os fatores da evolução sem mencionar uma só vez — nem mesmo em sua bibliografia — quer K. A. Timiryazev, quer I. V.. Michurin. No entonto Timiryazev legou à ciência soviética um trabalho teórico verdadeiramente extraordinário, apresentado praticamente sob o mesmo título: Fatores da Evolução Orgânica. Quanto a Michurin e aos michurinistas, puseram os fatores da evolução a serviço da agricultura, revelaram novos fatores e nos proporcionaram uma compreensão mais profunda dos velhos fatores.

Schmalhausen “esqueceu-se” dos avançados cientistas soviéticos, os fundadores da ciência biológica soviética. Mas ao mesmo tempo cita profunda e repetidamente declarações de grandes e pequenos representantes estrangeiros e nacionais da metafísica de Morgan, dos lideres da biologia reacionária. É esse o estilo do Acadêmico Schmalhausen, que se intitula “darwinista”. Entretanto numa reunião da Faculdade de Biologia da Universidade de Moscou seu livro foi recomendado como uma obra prima no desenvolvimento criador do darwinismo. O livro foi altamente classificado pelos deões das Faculdades de Biologia das Universidades de Moscou e Leningrado; foi elogiado por I. Polyakov, professor de darwinismo na Universidade de Kharkov, pelo Vice-Reitor da Universidade de Leningrado, Y. Polyansky, pelo membro de nossa Academia B. Zavadovsky, e por outros morganistas que às vezes pousam como da darwinistas ortodoxos.

                                               6. A Esterilidade do Morganismo-mendelismo

Os morganistas-weismanistas, isto é, os aderentes da teoria da hereditariedade dos cromossomas, afirmaram repetidamente — sem qualquer base e muitas vezes de maneira caluniosa que eu, como presidente da Academia de Ciências Agrícolas, utilizei minha repartição no interesse da corrente científica de Michurin, do qual faço parte, a fim de suprimir a outra corrente, a que se opõe a Michurin.

Infelizmente até aqui foi o contrário que aconteceu, e é disso que eu, como presidente da Academia de Ciências Agrícolas da URSS, podia e devia ser acusado. Têm-me faltado força e habilidade para utilizar adequadamente minha posição oficial para criar condições para um desenvolvimento mais amplo da corrente de Michurin nas várias divisões da ciência biológica e para restringir, pelo menos um pouco, a corrente contrária dos escolásticos e metafísicos. Entretanto, a corrente que até aqui foi suprimida — suprimida pelos morganistas — é exatamente a corrente representada pelo presidente, isto é, a corrente de Michurin.

Nós, os michurinistas, admitimos francamente que até aqui fomos incapazes de tirar o máximo partido das esplêndidas possibilidades criadas em nosso país pelo Partido e pelo Governo para o desmascaramento completo da metafísica morganista que é, em sua totalidade a importação de uma biologia reacionária estrangeira que nos hostiliza. Compete agora à Academia, para a qual acabam de ser eleitos numerosos michurinistas, dar início a essa importante tarefa. Isso será de importância considerável na questão de exercitar forças e proporcionar maior auxílio científico às fazendas coletivas e às fazendas do Estado.

O morganismo-mendelismo, ou seja, a teoria da hereditariedade dos cromossomas, foi ensinada até aqui, em numerosas versões, em todos os colégios de biologia e agronomia, enquanto o estudo da genética de Michurin não foi de fato absolutamente introduzido. Nos mais altos círculos científicos oficiais de biologistas, também, os seguidores da doutrina de Michurin e Williams estiveram frequentemente em minoria. Foram uma minoria igualmente na Academia Lenin de Ciências Agrícolas da URSS. Mas as condições na Academia mudaram agora sensivelmente, graças ao interesse por ela demonstrado pelo Partido, pelo Governo e pelo camarada Stálin pessoalmente. Um número considerável de michurinistas foram eleitos membros, e membros correspondentes da nossa Academia, e outros serão acrescentados brevemente, nas próximas eleições. Isto criará uma nova situação na Academia e novas oportunidades para o futuro desenvolvimento da doutrina de Michurin.

A afirmativa de que a teoria da hereditariedade dos cromossomas, com sua base metafísica e idealista, foi até aqui suprimida é absolutamente falsa.

A verdade é exatamente o contrário.

Em nosso país os citogeneticistas e morganistas defrontam-se com a eficiência prática da corrente de Michurin na ciência agro-biológica.

Conscientes da inutilidade prática dos postulados teóricos de suo “ciência” metafísica, e não querendo abandoná-los para aceitar a vigorosa corrente de Michurin, os morganistas dedicaram todos os seus esforços para impedir o desenvolvimento da corrente de Michurin que, pela própria natureza, é oposta àquela pseudociência

É uma calúnia afirmar que alguém tem impedido a corrente citogenética na ciência biológica de se associar à agricultura prática em nosso país. Não há sombra de verdade nas afirmativas no sentido de que

“o direito à aplicação prática dos frutos de seu trabalho tem sido um monopólio do acadêmico Lysenko e seus seguidores”.
O Ministério da Agricultura poderia nos dizer exatamente o que os citogeneticistas nos ofereceram para aplicação prática e, caso tais oferecimentos tenham existido, se foram aceitos ou rejeitados.

O Ministério da Agricultura também poderia nos dizer qual dos seus institutos de pesquisas científicas, para não mencionarmos os colégios, não se dedicaram à citogenética em geral, e em particular, à poliploidia das plantas obtidas com a aplicação da colchicina.

Sei que muitos institutos se dedicaram e se dedicam a essa espécie de atividades que, na minha opinião, é pouco produtiva. Ainda mais, o Ministério da Agricultura fundou uma instituição especial, chefiada por A. R. Zhebrak, para estudar as questões de poliploidia. Acho que essa instituição, embora durante alguns anos nada tenha feito além de trabalhar na poliploidia, nada produziu, literalmente, de valor prático.

Eis outro exemplo que pode ser citado a fim de demonstrar como é inútil o programa prático e teórico de nossos citogeneticistas morganistas nacionais.

O professor de Genética, N. P. Dubinin, Membro Correspondente da Academia Ciências da URSS, considerado por nossos morganistas como o mais eminente dentre eles, trabalhou durante muitos anos para estabelecer as diferenças nos núcleos das células das moscas de frutas nas localidades urbanas e rurais.

Para maior clareza, mencionaremos o seguinte: o que Dubinin está investigando não são as alterações qualitativas — neste caso, nos núcleos das células — resultantes da ação de condições de vida qualitativamente diferentes. O que ele está estudando não é a hereditariedade de caracteres adquiridos pelas moscas de frutas sob a influência de determinadas condições de vida, mas modificações reconhecíveis nos cromossomas, na formação da população dessas moscas como resultado por um lado da simples destruição de parte deles, durante a guerra. Dubinin e outros morganistas chamam essa destruição de “seleção”. Essa espécie de “seleção”, idêntica a uma peneiração ordinária, que não tem nada de comum com o verdadeiro papel criador da seleção, é o objeto das investigações de Dubinin.

Seu trabalho intitula-se: “Variabilidade Estrutural dos cromossomas nas Populações de Localidades Urbanas e Rurais”.

Eis alguns de seus trechos:

“Durante o estudo de populações individuais de D. funebris no trabalho de 1937 foi notado o fato de que havia diferenças notáveis a respeito da concentração de inversões. Tinyakov chamou a atenção para esse fenômeno baseado em extenso material. Entretanto, só a análise de 1944 a 1945 nos revelou que essas diferenças substanciais são devidas às diferenças de condições de habitação na cidade e nos campos.
“A população de Moscou tem oito ordens diferentes de gens. No segundo cromossoma há quatro ordens (uma ordem padrão e três inversões diferentes). Uma inversão no cromossoma III e uma no IV… Inv. II-1 tem seu limite de 23C a 31B, Inv. II-2, de 29A a 32B, Inv. II-3 de 32B a 34C, Inv. III-l, de 50A a 56A, Inv. IV-1, de 67C a 73 A/B. No curso de 1943 a 1945 foi estudado o cariótipo de 3.315 indivíduos na população de Moscou. A população continha imensa concentração de inversões, que provaram ser diferentes em vários distritos de Moscou”.(14)
Dubinin prosseguiu em suas investigações durante e depois da guerra e estudou o problema das moscas de frutas no cidade de Voronezh e seus arredores. Escreve ele:

“A destruição dos centros industriais durante a guerra transtornou as condições normais de vida. As populações drosófilas estavam em péssimas condições de existência que, possivelmente, ultrapassavam a severidade das condições invernais nas localidades rurais. Seria profundamente interessante estudar a influência das modificações nas condições de vida causadas pela guerra na estrutura cariotípica das populações urbanas. No primavera de 1945 estudamos as populações da cidade de Voronezh, uma das que sofreram maior destruição em consequência da invasão alemã. Entre 225 indivíduos, apenas duas moscas eram heterozigotais para a inversão 11-2 (0,88 por cento). Assim, a concentração de inversões nessa grande cidade provou ser menor do que nas localidades rurais. Observamos neste caso a ação nefasta da seleção natural sobre a estrutura cariotípica da população”.(15)
Dubinin, como vemos, escreve de tal maneira a dar ao seu trabalho uma aparência científica, superficial. E de fato foi esse um dos principais trabalhos, na base dos quais Dubinin foi eleito Membro Correspondente da Academia de Ciências da URSS.

Mas se fôssemos colocá-lo em termos mais simples, despindo-o da verbosidade pseudocientífica e substituindo o jargão morganista por palavras russas comuns, chegaríamos à seguinte conclusão.

Como resultado de muitos anos de esforços, Dubinin “enriqueceu” a ciência com a “descoberta” de que, durante a guerra, registrou-se entre a população de moscas de frutas da cidade de Voronezh e seus arredores um aumento na percentagem de moscas com certas estruturas cromossomas e um decréscimo na percentagem de moscas com outras estruturas cromossomas (no jargão morganista isto se chama “concentração de inversões” 11-2).

Dubinin não se contenta com essas descobertas “altamente valiosas”, do ponto de vista teórico e prático, que fez durante a guerra. Propõe-se novas tarefas para o período de recuperação. Escreve ele:

“Será muito interessante estudar, no curso dos próximos anos, o restauração da estrutura cariotípica da população urbana em ligação com a restauração das condições normais de vida”.
Isso é um exemplo típico da “contribuição dos morganistas à ciência e à atividade prática antes e durante a guerra, e são essas as perspectivas da ciência” morganista para o período de recuperação.

                       7. A Doutrina de Michurin, Fundamento da Biologia Científica

Ao contrário do mendelismo-morganismo, com suas afirmativas de que as causas da variação na natureza dos organismos são desconhecidos e a negação da possibilidade de modificações dirigidas na natureza das plantas e dos animais, o lema de Michurin era:

“Não devemos esperar favores da Natureza; nossa tarefa é arrancar dela esses favores”.
Seus estudos e investigações levaram Michurin à seguinte conclusão importante.

“Com a intervenção do homem é possível forçar qualquer forma de animal ou planta a se modificar mais rapidamente e na direção desejada. Abre-se diante do homem um vasto campo de atividades de maior utilidade”.(16)

A doutrina de Michurin rejeita radicalmente o princípio fundamental do mendelismo-morganismo de que a hereditariedade é completamente independente das condições de vida dos plantas e dos animais. A doutrina de Michurin não reconhece a existência no organismo de uma substância hereditária separada, independente do corpo. As modificações na hereditariedade de um organismo ou na hereditariedade de qualquer parte de seu corpo são o resultado de modificações no próprio ser vivo. E as modificações do ser vivo ocorrem como resultado da saída do normal no tipo de assimilação e desassimilação, de saída do normal no tipo do metabolismo. As modificações nos organismos, ou em seus órgãos ou caracteres separados, podem não ser sempre ou completamente transmitidos aos descendentes, mas a modificação de germes nos organismos recentemente gerados sempre ocorrem, unicamente como resultado das modificações no corpo do organismo dos pais resultantes da ação direta ou indireta das condições de vida sobre o desenvolvimento do organismo ou de suas partes separados, e entre elas, os germes sexuais ou vegetativos. Ás modificações na hereditariedade, a aquisição de novos caracteres, seu aumento e sua acumulação em gerações sucessivas são sempre determinados pelas condições de vida do organismo. A hereditariedade modifica-se e torna-se mais complexa como resultado da acumulação de novos caracteres e propriedades adquiridas pelos organismos em gerações sucessivas.

O organismo e as condições necessárias à sua vida formam uma unidade inseparável. Seres vivos diferentes requerem condições externas diferentes para seu desenvolvimento. Estudando essas necessidades chegamos a conhecer as feições qualitativas da natureza dos organismos, as feições qualitativas da hereditariedade. A hereditariedade é a propriedade que tem um ser vivo de exigir condições determinadas para sua vida e seu desenvolvimento e para corresponder de maneira determinada a várias condições.

O conhecimento das necessidades naturais de um organismo e de sua correspondência às condições.externas torna possível dirigir a vida e o desenvolvimento do organismo. Regulando as condições de vida e de desenvolvimento de plantas e animais podemos penetrar sua natureza cada vez mais profundamente e assim estabelecer os meios de modificá-la no sentido desejado. Uma vez que conhecemos os meios de regular o desenvolvimento, podemos modificar a hereditariedade dos organismos numa direção determinada.

Cada ser vivo constrói ele próprio as condições que o cercam, à sua própria maneira, de acordo com sua hereditariedade. É esta a razão pela qual organismos diferentes vivem e se desenvolvem no mesmo ambiente. Em regra, cada geração de uma planta ou de um animal se desenvolve geralmente no mesmo sentido que suas predecessoras, principalmente no de suas predecessoras mais próximas. A característica geral de todos os seres vivos é a reprodução do seres semelhantes a eles próprios.

Quando os organismos encontram no seu ambiente as condições adequadas à sua hereditariedade, seu desenvolvimento prossegue na mesma direção seguida pelas gerações precedentes. Quando, entretanto, os organismos não encontram as condições de que necessitam e são forçados a assimilar as condições do ambiente que, em maior ou menor grau, não estão de acordo com sua natureza, então os organismos, ou partes de seus corpos, tornam-se mais ou menos diferentes do geração precedente. Se a parte alterada do corpo é o ponto de partida para a nova geração, esta será, em maior ou menor proporção, diferente das gerações precedentes, quanto às suas necessidades e à sua natureza.

A causa das modificações na natureza de um ser vivo é a modificação no tipo de assimilação, no tipo do metabolismo. Por exemplo, a vernalização (yarovisação) de cereais da primavera não requer baixa temperatura. Normalmente se processa em temperaturas iguais às do campo na primavera e no verão. Através do emprego de condições de temperatura ma s baixa na vernalização dos cereais da primavera é possível, depois de duas ou três gerações, transformá-los em cereais de inverno. E os cereais de inverno requerem temperaturas mais baixas para sua vernalização. Eis um exemplo concreto que mostra de que maneira se introduz uma necessidade na produção das plantas em questão — a necessidade de temperaturas mais baixas como condição para a vernalização.

As células sexuais e quaisquer outras células que os organismos propagam são produzidas como resultado do desenvolvimento de todo o organismo, por meio do metabolismo e da transformação. As fases de evolução de um organismo estão, por assim dizer, acumuladas nas células de que se origina a nova geração.

Podemos, portanto, dizer que todos os caracteres, inclusive a hereditariedade do corpo de um organismo (de uma planta, digamos), se desenvolvem na mesma proporção em que ele é novamente formado na nova geração.

Num único e mesmo organismo o desenvolvimento de várias células e de suas diferentes partes, o desenvolvimento dos processos individuais, requer condições externas diferentes.

Além disso, essas condições são assimiladas de várias maneiras. Deve ser acentuado que neste caso queremos significar com externo aquilo que é assimilado, e com interno aquilo que assimila.

A vida de um organismo passa por inúmeros processos e transformações correlatas. O alimento, que do ambiente externo, penetra no organismo, passa por uma série de transformações através das quais é assimilado pelo ser vivo, transformando-se de externo em interno. Este interno, já que é matéria viva, entra em relações metabólicas com as substâncias de outras células e partículas do corpo, alimentando-as e assim tornando-se externo em relação a elas.

Observam-se duas espécies de modificações qualitativas no desenvolvimento dos organismos vegetais.

Modificações relacionadas com o processo de realização do ciclo individual do desenvolvimento, quando as necessidades naturais, isto é, a hereditariedade, encontram normalmente as condições externas correspondentes. O resultado é um ser da mesmo espécie e hereditariedade das gerações precedentes.
Modificações da natureza, isto é, modificações na hereditariedade. Essas modificações também são o resultado do desenvolvimento individual, mas desviam-se do processo normal, usual. As modificações na hereditariedade, em regra, são o resultado do desenvolvimento do organismo em condições externas que, em maior ou menor proporção, não correspondem às necessidades naturais de uma dada forma orgânica.
As modificações nas condições de vida acarretam modificações no tipo de desenvolvimento dos organismos vegetais. Um tipo de desenvolvimento modificado é, pois, a causa primária das modificações na hereditariedade. Todos os organismos que não se podem modificar de acordo com as condições modificadas de vida não sobrevivem, não deixam descendência.

Os organismos, e por conseguinte também sua natureza, são criados unicamente no processo da evolução. Naturalmente, um ser vivo pode sofrer também alterações fora do processo evolutivo (uma queimadura, uma fratura de ossos, uma dilaceração de raízes, etc.), mas essas alterações não serão características ou necessárias ao processo vital.

Numerosos fatos provam que as modificações em várias partes do corpo de um organismo vegetal ou animal não são fixadas pelas células reprodutoras com a mesma frequência ou na mesma proporção.

Isto se explica pelo fato de que o processo de desenvolvimento de cada órgão, de cada partícula do ser vivo, requer condições externas relativamente determinadas. Essas condições são selecionadas do ambiente pelo desenvolvimento de cado órgão e da mais íntima parte de um órgão. Portanto, se uma parte do corpo de um organismo vegetal for forçado a assimilar condições relativamente pouco usuais à mesma, e em consequência sofrer alterações e se tornar diferente da parte análoga do corpo na geração precedente, as substâncias que ela transmite para as células vizinhas podem não ser selecionadas por estas últimas, podem não se juntar à cadeia seguinte de processos, correspondentes. Naturalmente, haverá sempre uma ligação entre a parte alterada do organismo vegetal e as outras partes do corpo, pois de outra maneira ele não existiria; mas essa ligação pode não ser totalmente recíproca. A parte alterada do corpo estará recebendo este ou aquele alimento das partes vizinhas; mas não poderá dar suas próprias substâncias específicas, porque as partes vizinhas recusar-se-ão a selecioná-las.

Isso explica o fenômeno frequentemente observado sempre que os órgãos, os caracteres ou as propriedades alterados de um organismo não se manifestam na descendência. Mas as partes alteradas do corpo do organismo dos pais sempre possuem uma hereditariedade alterada. Os horticultores sempre conheceram esses fatos. Um rebento ou botão alterado de uma árvore frutífera ou do olho (botão) de uma raiz de batata não pode, em regra, influenciar a hereditariedade do produto da árvore ou raiz em questão que não são diretamente geradas das partes alteradas do organismo paterno. Se, entretanto, a parte alterada for cortada e plantada separadamente, esta última, em regra, possuirá uma hereditariedade modificada, o que caracterizou a parte alterada do corpo paterno.

A proporção de transmissão hereditária de alterações depende da proporção em que as substâncias da parte alterada do corpo juntam-se ao processo que leva à formação de células sexuais reprodutivas ou vegetativas.

Uma vez que sabemos como é formada a hereditariedade de um organismo, podemos modificá-lo numa direção determinada, criando condições determinadas, num momento determinado do desenvolvimento do organismo.

Boas espécies de plantas ou raças de animais são sempre produzidas pela aplicação de métodos próprios de cultivo ou criação. Boas espécies não podem nunca ser produzidas com métodos inadequados de cultivo, e em muitos casos, nessas condições, boas espécies deteriorarão depois de algumas gerações. É uma regra básica no cultivo de sementes que as plantas cultivadas para semeaduras devem ser tratadas com o máximo cuidado. Devem ter as mais excelentes condições correspondentes às exigências hereditárias das plantas em questão. Das plantas bem cultivadas, os melhores são selecionadas para sementes. É assim que se melhoram na prática as espécies de plantas. Com um mau cultivo nenhuma seleção das melhores plantas para sementes produzirá os resultados requeridos. Com um mau cultivo todas as sementes obtidas são más, mesmo as melhores dentre elas.

De acordo com a teoria da hereditariedade dos cromossomas, os híbridas só podem ser produzidas pela reprodução sexual. Essa teoria nega a possibilidade de se obter híbridas vegetativas, pois nega que as condições de vida tenham qualquer influência específica sobre a natureza das plantas. Michurin não só reconheceu a possibilidade de se produzir híbridas vegetativas, como ainda elaborou o método “mentor”. Este método consiste no seguinte: enxertando galhos de velhas espécies de árvores frutíferas nos galhos de uma espécie nova, esta última adquire as propriedades que não possui, e que lhe são transmitidas por meio dos galhos enxertados da velha espécie. É esta a razão pela qual Michurin denominou seu método de “mentor”. O tronco também é utilizado como mentor. Com esse método Michurin produziu ou aperfeiçoou várias espécies novas e boas.

Michurin e os michurinistas descobriram métodos de obter híbridas vegetativas em grandes quantidades.

As híbridas vegetativas forçosamente provam que a concepção de hereditariedade de Michurin é correta. Ao mesmo tempo representam um obstáculo insuperável à teoria dos mendelistas-morganistas.

Quando enxertados os organismos que não atingiram a fase de completa formação, isto é, que ainda não completaram seu ciclo de desenvolvimento, sempre modificarão seu desenvolvimento em relação às plantas que possuem suas próprios raízes. Na união das plantas por meio de enxerto, o produto é um único organismo com espécies variadas, a do tronco e a do enxerto. Plantando as sementes do tronco ou do enxerto é possível obter-se um produto, cujos representantes individuais possuirão as características não só da espécie de que a semente foi tirada, como também da outra a que foi unida por meio do enxerto.

É óbvio que o enxerto e o tronco não poderiam ter trocado entre si cromossomas dos núcleos das células; entretanto, foram transmitidos caracteres herdados do tronco para o enxerto e vice versa. Por conseguinte, as substâncias plásticas produzidas pelo tronco e pelo enxerto são dotadas de hereditariedade determinada, da mesma forma que os cromossomas e qualquer partícula do ser vivo, possuem os caracteres da espécie.

Qualquer caráter pode ser transmitido de uma espécie para outra por meio de enxerto assim como pelo método sexual.

A riqueza de provas materiais relativas à transmissão vegetativa de vários caracteres de batatas, tomates e numerosas outras plantas, leva-nos à conclusão de que as híbridas vegetativas não diferem em princípio das híbridas sexuais.

Os representantes da genética de Mendel e Morgan são não só incapazes de obter alterações de hereditariedade numa direção determinada como negam ainda categoricamente que seja possível modificar a hereditariedade a fim de corresponder adequadamente às condições do ambiente. Os princípios da doutrina de Michurin, por outro lado, ensinam-nos que podemos modificar a hereditariedade a fim de fazer face de maneira completa à ação das condições de vida.

Um caso ilustrativo, por exemplo, são as experiências no sentido de converter as formas de primavera do grão de trigo em formas de inverno, e as formas de inverno em outras ainda mais resistentes nas regiões da Sibéria, por exemplo, onde o inverno é rigoroso. Essas experiências não tem interesse unicamente teórico. São de valor prático considerável para a produção de espécies resistentes à geada. Já possuímos formas de trigo de inverno obtidas das formas de primavera que não são inferiores, no que diz respeito à resistência à geada, às espécies mais resistentes à geada conhecidas na agricultura prática. Algumas são até superiores.

Muitas experiências demonstram que quando uma espécie de hereditariedade há muito tempo estabelecida é eliminada, não conseguimos imediatamente uma nova hereditariedade completamente estabelecida e solidificada. Na grande maioria dos casos o que obtemos é um organismo com uma natureza plástica que Michurin chamou de “abalada”.

Os organismos vegetais com uma natureza “abalada”, são aqueles em que foi eliminado o conservatismo e cuja seletividade, em relação às condições externas foi enfraquecida. Em lugar da hereditariedade conservativa essas plantas preservam, ou se manifesta nelas, apenas uma tendência a demostrar alguma preferência por certas condições.

A natureza de um organismo vegetal pode ser abalada:

  1. Pelo enxerto, isto é, pela união dos tecidos de plantas de diversas variedades;
  2. Fazendo com que as condições externas atuem sobre ele em momentos determinados, quando o organismo sofre este ou aquele processo de desenvolvimento;
  3. Pelo cruzamento, principalmente de formas extremamente divergentes em terreno ou origem.

Os melhores biologistas, em primeiro lugar Michurin, dedicaram grande atenção ao valor prático dos organismos vegetais com hereditariedade abalada. As formas vegetais plásticas com hereditariedade não estabelecida, obtidas por qualquer dos métodos enumerados, devem continuar a ser cultivadas de geração em geração nas condições, cujas necessidades ou a adaptabilidade das quais queiramos introduzir e perpetuar nos organismos.

Na maioria das formas vegetais e animais as novas gerações só se desenvolvem depois da fertilização — a fusão das células reprodutivas femininas e masculinas. A significação biológica do processo de fertilização é que, através dele, 0s organismos são produzidos com dupla hereditariedade — materna e paterna. A dupla hereditariedade empresta vitalidade aos organismos e amplia a proporção de sua adaptabilidade às variadas condições de vida.

É a utilidade de enriquecer a hereditariedade que determina a necessidade biológica de cruzar formas que diferem umas das outras, mesmo que de maneira insignificante.

A renovação e o fortalecimento da vitalidade das formas vegetais também podem ocorrer pelo método vegetativo, não sexual. Isso é obtido através da assimilação pelo ser vivo de novas condições externas, condições que não lhe são habituais. Nas experiências de hibridação vegetativo com o objetivo de produzir formas de primavera das formas de inverno, e vice versa, e em numerosos outros casos em que a natureza dos organismos ficou abalada, podemos observar a renovação e o fortalecimento da vitalidade dos organismos.

Regulando as condições externas, as condições de vida, dos organismos vegetais, podemos modificar as espécies numa direção determinada e criar espécies com a hereditariedade desejada.

A hereditariedade é o efeito da concentração da ação das condições externas assimiladas pelo organismo numa série de gerações precedentes.

Por meio de hibridação hábil, pelo método da conjugação sexual de espécie, é possível unir imediatamente em um organismo o que foi assimilado e solidificado nas espécies cruzadas, por várias gerações. Mas, de acordo com a doutrina de Michurin, nenhuma hibridação produzirá os resultados desejados, a menos que se criem condições que promovam o desenvolvimento dos caracteres que desejamos que a espécie recém-criada ou aperfeiçoada herde.

Expus aqui a doutrina de Michurin em linhas gerais. O ponto importante que precisa ser acentuado é que é absolutamente necessário que todos os biologistas soviéticos façam um estudo aprofundado dessa doutrina. A melhor maneira dos trabalhadores científicos nos vários departamentos da biologia atingirem as profundidades teóricas da doutrina de Michurin é estudar os trabalhos de Michurin, lê-los repetidamente e analisar alguns deles, tendo em vista resolver problemas de importância prática..

A agricultura socialista tem necessidade de uma teoria biológica desenvolvida, profunda, que nos ajude a aperfeiçoar rápida e adequadamente os métodos de cultivar as plantas e de obter safras abundantes e estáveis. Tem necessidade de uma teoria biológica profunda que ajude os trabalhadores na agricultura a obter num curto espaço de tempo as espécies de plantas altamente produtivas que necessitam para corresponder à grande fertilidade que os trabalhadores das fazendas coletivas estão criando em seus campos.

Unidade da teoria e da prática — eis o caminho acertado para a ciência soviética. A doutrina de Michurin é a que melhor realiza essa unidade na ciência biológica.

Em meus discursos e trabalhos escritos citei numerosos exemplos da aplicação da doutrina de Michurin para resolver questões de importância prática em vários setores de criação de plantas. Aqui vou tomar a liberdade de tratar brevemente de algumas questões relacionadas com a criação de animais.

Como no caso das formas vegetais, a formação de animais está intimamente ligada às suas condições de vida, às condições de seu ambiente.

A base para aumentar a produtividade de animais domésticos, para melhorar as espécies existentes e produzir espécies novas, são a sua alimentação e as condições em que são mantidos. Isto é particularmente importante se quisermos elevar a eficiência do cruzamento. Várias espécies de animais domésticos foram e são produzidos pelo homem para vários fins e em várias condições. Cada espécie, portanto, exige suas próprias condições de vida, as que contribuíram para sua formação.

Quanto maiores as divergências entre as propriedades biológicas de uma espécie e as condições de vida proporcionadas para os animais individualmente, tanto menor será o valor econômico da espécie em questão.

Por exemplo, as vantagens — do ponto de vista econômico —- das ricas pastagens e da boa alimentação com forragens suculentas e concentradas são menores, no caso do gado que por natureza não pode dar muito leite, do que no caso do gado com grandes capacidades leiteiras. A primeira espécie, portanto, obviamente não pode atingir, sob o aspecto econômico, as condições que lhe foram proporcionadas. Uma tal espécie deve ser melhorada com o cruzamento a fim de ajustá-la às condições de alimentação e manutenção.

Por outro lado, uma espécie conhecida por suas grandes propriedades leiteiras, quando posta em condições de fraca alimentação e manutenção, não só deixará de corresponder à sua reputação de produtora de leite, como suas possibilidades de sobrevivência diminuirão. Em tais casos as condições de alimentação e manutenção deverão ser melhoradas a fim de ajustá-las à espécie.

Nossa ciência e nossa prática de criação de animais, de acordo com o plano do estado para obter produtos nas quantidades necessárias e de boa qualidade, devem ser guiadas pelo princípio: selecionar e aperfeiçoar as criações de acordo com as condições de alimentação, manutenção e clima e, ao mesmo tempo, criar as condições de alimentação e manutenção mais adequadas às criações em questão.

O método principal para melhorar constantemente as criações é selecionar os animais de raça mais adequados para um objetivo determinado e, ao mesmo tempo, melhorar as condições de alimentação e manutenção mais próprias ao desenvolvimento dos animais, na direção almejada.

O cruzamento é um método radical e rápido para modificar criações esto é, a descendência dos animais em questão.

No cruzamento obtemos, por assim dizer, uma união de duas espécies desenvolvidas pelo homem no curso de um longo período, através da criação de várias condições de vida para os animais. Mas a natureza (hereditariedade) das espécies cruzadas, particularmente na primeira geração, é gerai- mente instável, correspondendo facilmente à ação das condições de vida, alimentação e manutenção.

Portanto, no cruzamento, quando se escolhe uma espécie para aperfeiçoamento de uma espécie local, é especialmente importante ter-se em mente as condições de alimentação, manutenção e clima. Ao mesmo tempo, a fim de desenvolver os caracteres e propriedades que queremos introduzir com o cruzamento, devemos proporcionar condições de alimentação e manutenção que levam ao desenvolvimento de novas e aperfeiçoadas propriedades; do contrário poderemos deixar de estabelecer as qualidades desejadas e a criação pode até perder algumas de suas boas qualidades.

Dei um exemplo da aplicação dos princípios gerais da doutrina de Michurin à criação animal, para mostrar que a genética soviética de Michurin, revelando, como o faz, as leis gerais do desenvolvimento dos seres vivos a fim de enfrentar problemas de importância prática, também é aplicável a criação do gado.

Quando falamos em dominar a doutrina de Michurin também nos referimos ao desenvolvimento e ao aprofundamento de sua doutrina, ao desenvolvimento da biologia científica. É esta a linha ao longo da qual devemos assegurar o crescimento das forças de nossos biologistas michurinistas a fim de proporcionar assistência crescente às fazendas coletivas e às fazendas do Estado no cumprimento das tarefas que lhes foram dadas pelo Partido e pelo Governo.

                     8. Os Jovens Biologistas Soviéticos Devem Estudar a Doutrina de Michurin

Infelizmente a doutrina de Michurin não é tão amplamente ensinada em nossas universidades e colégios. Nós, michurinistas, temos grande culpo nisso. Mas não será errado afirmar que também é culpa do Ministério da Agricultura e do Ministério da Educação Superior.

Até hoje o morganismo-mendelismo é ensinado na maioria de nossas universidades e colégios, nas cadeiras de genética e seleção, e em muitos casos, também, nas cadeiras de darwinismo, enquanto a doutrina de Michurin, a corrente michurinista na ciência, apoiada pelo Partido Bolchevique e pela realidade soviética, permanece na sombra.

O mesmo pode-se dizer da situação da educação de nossos jovens cientistas. Como exemplo ilustrativo citaremos o seguinte. Num artigo “Sobre as Teses dos Médicos e a Responsabilidade dos Oponentes”, publicado no n.° 4 da revista Vestnik Vysshey Shkoly (“O Mensageiro da Educação Superior”), de 1945, o acadêmico P. M. Zhukovsky, que é presidente da Comissão dos Técnicos em Biologia, subordinada ao Comitê Superior de Diplomas Acadêmicos, escreveu:

“Desenvolveu-se uma situação deplorável na questão das teses sobre genética. As teses sobre genética são muito raras; representam, de fato, exemplos isolados. Isto se explica pelas relações anormais, que adquiriram um caráter de hostilidade, entre os aderentes da teoria da hereditariedade dos cromossomas e seus oponentes. A verdade sobre o assunto é que os primeiro? tem um certo receio dos últimos, que são muito agressivos em sua polêmica. Seria melhor pôr um termo a essa situação. Nem o Partido, nem o Governo proíbem a teoria da hereditariedade dos cromossomas, que é livremente pro pagada nas universidades e colégios. Deixemos que a controvérsia continue”(17).
Notemos em primeiro lugar que Zhukovsky confirma que a teoria da hereditariedade dos cromossomas é livremente ensinada nas universidades e colégios. É verdade. Mas ele quer mais: ele quer que o mendelismo-morganismo seja ainda mais amplamente propagado. Ele quer que tenhamos muitos ma s Bacharéis e Doutores em Ciência mendelistas-morganistas para propagar ainda mais extensamente o mendelismo-morganismo em nossas universidades e colégios. Isto, de fato, é onde o acadêmico Zhukovsky quer chegar num grande trecho do seu artigo que reflete sua linha geral como presidente da Comissão de Biologia.

Não é de admirar, portanto, que a Comissão interponha toda sorte de obstáculos no caso das teses sobre genética cujos autores tentaram, embora mu to timidamente, desenvolver este ou aquele princípio da genética de Michurin. Por outro lado, as teses dos morganistas que mereceram o estímulo de P. M. Zhukovsky, apareceram e foram aprovados de modo favorável não tão raramente — em qualquer caso, muito mais frequentemente do que exigido pelos interesses da verdadeira ciência. É verdade que teses com tendência morganista apareceram mais raramente do que desejava o acadêmico P. M. Zhukovsky. Mas há razões para isso. Sob a influência da crítica feita por Michurin ao morganismo, os jovens cientistas com maior compreensão das questões de filosofia perceberam ultimamente que os pontos de vista morganistas são totalmente alheios ao modo de ver universal, do povo soviético. Por este prisma a posição do acadêmico não parece tão boa, visto que ele aconselha os jovens biologistas a não darem atenção à crítica do morganismo feita pelos michurinistas, mas a continuarem a desenvolver o morganismo.

Os biologistas soviéticos têm razão quando suspeitam os pontos de vista morganistas e se recusam a dar ouvidos ao escolasticismo da teoria dos cromossomas Lucrarão sempre e em tudo, se refletirem mais frequentemente sobre o que Michurin disse a respeito do escolasticismo.

Michurin sustentava que o mendelismo

“… contradiz a verdade da natureza, perante a qual nenhuma estrutura habilmente erguida sobre fenômenos mal compreendidos pode se manter em pé”. “O que eu gostaria”, escreveu ele, “é que o observador imparcial se detivesse neste ponto e pusesse à prova pessoalmente a verdade dessas conclusões; elas representam a base que legamos aos naturalistas dos futuros séculos e milênios”(18).

                                          9. Por Uma Biologia Cientifica Criadora

Michurin lançou as bases para uma ciência que regule a natureza das plantas. Essas bases produziram uma modificação no próprio método de pensar em relação aos problemas da biologia.

O conhecimento das ligações causais é essencial à prática do trabalho de regular o desenvolvimento das plantas cultivadas e dos animais domésticos. Para que a ciência biológica esteja em posição de prestar maior assistência às fazendas coletivas e às fazendas do Estado em seu trabalho de obter maiores safras, maior produção de leite, etc., é preciso compreender as complexas inter-relações biológicas, as leis da vida e do desenvolvimento das plantas e dos animais.

O método científico de abordar os problemas práticas é a maneira mais segura de se aprofundar os conhecimentos das leis do desenvolvimento da natureza viva.

Os biologistas deram muito pouca atenção ao estudo das inter-relações, das ligações histórico-naturais que existem entre os seres individuais, os fenômenos individuais, as partes dos corpos individuais e os elos dos fenômenos individuais. Entretanto, somente essas ligações, inter-relações e interações naturais nos permitem compreender o processo do desenvolvimento, a essência dos fenômenos biológicos.

Mas quando a natureza viva é estudada isoladamente das atividades práticas, o princípio científico do estudo das ligações biológicas é desperdiçado.

Os michurinistas, em suas investigações, tomam como base a teoria darwiniana da evolução. Mas em si própria a teoria de Darwin é absolutamente insuficiente para tratar dos problemas práticos da agricultura socialista. Eis porque a base da agrobiologia soviética contemporânea é o darwinismo transformado pela doutrina de Michurin e Williams e assim convertida no darwinismo criador soviético.

Muitos problemas do darwinismo assumem um aspecto diferente como resultado do desenvolvimento de nossa ciência agro-biológica soviética, da corrente michurinista na agrobiologia O darwinismo não só foi purificado de suas deficiências e seus erros e elevado a um nível mais alto, como — em relação a vários princípios — sofreu modificações consideráveis. De uma ciência que explica sobretudo o histórico passado do mundo orgânico, está se transformando num meio criador eficaz de dominar sistematicamente a natureza viva, fazendo-a servir às necessidades práticas.

Nosso darwinismo michurinista soviético é o darwinismo criador que apresenta e resolve os problemas da teoria da evolução de maneira nova, segundo a doutrina de Michurin.

Não posso, neste informe, abordar muitos dos problemas teóricos de grande importância prática. Tratarei rapidamente apenas de um deles, isto é, da questão das relações intra e interespecíficas na natureza viva.

Chegou o momento de se encarar de maneira diferente a questão da formação da espécie, abordando-a do ângulo da transição da acumulação quantitativa para distinções qualitativas.

Precisamos compreender que a formação da espécie é uma transição — no curso do processo histórico — das variações quantitativas para as qualitativas. Esse salto é preparado pela atividade vital das próprias formas orgânicas, como resultado de acumulações quantitativas de correspondências à ação de condições determinadas de vida, e isto é algo que pode ser estudado e dirigido de maneira determinada.

Essa compreensão da formação da espécie, uma compreensão de suas leis naturais, coloca nas mãos dos biologistas um meio poderoso de regular o próprio processo vital, e, por conseguinte, de regular também a formação da espécie.

Acho que apresentando a questão dessa maneira está compreendido que o que leva à formação de uma nova forma específica, à formação de uma nova espécie de uma espécie velha, não é a acumulação de distinções quantitativas através das quais são usualmente reconhecidas as variedades de uma espécie. As acumulações quantitativas de variações que levam à transformação de uma velha forma de espécie à uma nova forma, são variações de ordem diferente

As espécies não são uma abstração, mas, na realidade, elos existentes na cadeia biológica geral.

A natureza viva é uma cadeia biológica separada, por assim dizer, em elos ou espécies individuais. É portanto, errado dizer que uma espécie não retém durante qualquer espaço de tempo, a constância cie sua determinação qualitativa como espécie. Insistir sobre isso seria o mesmo que considerar que a evolução da natureza viva se processa de maneira igual, sem saltos.

Minha opinião é confirmada pelos dados sobre as experiências de conversão do trigo duro (durum) em trigo mole (vulgare).

Quero acentuar que todos os tratadistas admitem que essas são espécies boas, inquestionáveis e independentes.

Sabemos que não existem verdadeiras formas de inverno entre os trigos duros, sendo essa a razão pela qual em todas as regiões de inverno relativamente rigoroso o trigo duro só é cultivado para render safras de primavera, nunca de inverno. Os michurinistas conseguiram dominar um bom método de converter o trigo de primavera em trigo de inverno. Já mencionamos que muitos trigos de primavera foram experimentalmente convertidos em trigo de inverno. Mas todos esses pertenciam à espécie de trigo mole. Quando foram iniciadas as experiências para converter o trigo duro em trigo de inverno, descobriu-se que depois de dois, três ou quatro apos de plantação no outono (necessário para transformar uma safra de primavera numa safra de inverno) o trigo durum transforma-se em trigo vulgare, isto é, uma espécie é convertida na outra. O trigo durum, isto é, um trigo duro de 28 cromossomas, é convertido em diversas variedades de trigo mole de 42 cromossomas; também neste caso não encontramos quaisquer formas transitórias entre as espécies de trigo durum e vulgare. A conversão de uma espécie na outra processa-se de um salto.

Vemos, portanto, que a formação de uma nova espécie é preparada pela atividade vital alterada, em condições determinadas, em várias gerações. No nosso caso é necessário promover condições outonais e invernais para atuarem sobre o trigo duro no curso de dois, três ou quatro gerações. Então ele se transforma de um salto em trigo mole, sem qualquer forma transitória entre as duas espécies.

Creio que cabe notar aqui que o que me levou a estudar profundamente problemas teóricos como o problema das espécies ou das relações intraespecíficas e interespecíficas entre os indivíduos, não foi absolutamente simples curiosidade ou gosto por teorização abstrata. Fui e sou levado a estudar essas questões de teoria pelo meu trabalho no curso do qual preciso encontrar respostas para problemas absolutamente práticos. Para uma compreensão exata das relações entre indivíduos de uma espécie foi necessário ter uma ideia clara das distinções qualitativas das variedades de formas intraespecíficas e interespecíficas.

Foi então possível encontrar novas soluções para problemas de importância prática como o combate a ervas daninhas na agricultura, ou a escolha de gramas para a semeadura de misturas de gramas, ou o amplo e maciço florestamento de áreas das estepes, e muitos outros.

Foi isso o que me levou a proceder a um novo estudo do problema da luta e da concorrência intraespecífica e interespecífica, e depois de profunda e compreensiva investigação cheguei à conclusão de que não existe luta intraespecífica, mas assistência mútua entre indivíduos de uma espécie, e de que existe luta e concorrência interespecífica e também assistência mútua entre diferentes espécies. Lamento ter feito tão pouco até aqui para elucidar através da imprensa, o conteúdo teórico e a significação prática dessas questões.

Estou chegando ao fim. Agora, no que diz respeito à linha teórica na biologia, os biologistas soviéticos sustentam que os princípios michurinistas são os únicos princípios científicos. Os weismannistas e seus seguidores, que negam a hereditariedade dos caracteres adquiridos, não merecem ser estudados minuciosamente. O futuro pertence a Michurin.

Lenin e Stálin descobriram Michurin e tornaram sua doutrina patrimônio de todo o povo soviético. Com seu grande e paternal interesse pelo seu trabalho, preservaram para a biologia a extraordinária doutrina de Michurin. O Partido, o Governo, e Stálin, pessoalmente, dedicaram um interesse inabalável ao futuro desenvolvimento da doutrina de Michurin. Não existe tarefa mais honrosa para nós, biologistas soviéticos, do que desenvolver com espírito criador a doutrina de Michurin e seguir em todas as nossas atividades o estilo de Michurin na investigação da natureza da evolução dos seres vivos.

Nossa Academia deve trabalhar a fim de desenvolver a doutrina de Michurin. Nisto deve seguir o exemplo pessoal de interesse pela atividade de Michurin demonstrado por nosso grandes mestres — Lenin e Stálin.

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Notas de rodapé:
(1) F. Engels — ‘‘Ludwig Feuerbach e o Fim da Filosofia Clássica Alemã”. (retornar ao texto)
(2) F. Engels — “Carta a P. L. Lavrov”, 12-17 de novembro de 1875. (retornar ao texto)
(3) T. R. Malthus, “Ensaio sobre a Teoria da População”, Livro I, Capítulo I. (retornar ao texto)
(4) Todas as citações de Weismann são retraduções da edição russa de 1905 das “Conferências Sobre a Teoria da Evolução” — IV. (retornar ao texto)
(5) Retraduzido do russo (Tr.). (retornar ao texto)
(6) N. K. Koltzov — “A Estrutura dos Cromossomas e o Metabolismo nos Mesmos”, “Revista de Biologia”, vol. VII, n. 1, 1938, pág. 42 — Moscou. (retornar ao texto)
(7) “Boletim da Sociedade de Naturalistas de Moscou”, vol. III — Ed. n. 3, 1947, pág. 86 — Moscou. (retornar ao texto)
(8) “A Ciência Natural e o Marxismo”, 1929, n. 4, pág. 83 — Moscou. (retornar ao texto)
(9) “A Ciência Natural e o Marxismo”, 1929, n. 4, pág. 81 — Moscou. (retornar ao texto)
(10) Acadêmico I. I. Schmalhausen — “Fatores da Evolução” — Academia de Ciências da URSS, 1946, págs. 12-13 — Moscou. (retornar ao texto)
(11) Idem, pág. 11. (retornar ao texto)
(12) Idem, pág. 68. (retornar ao texto)
(13) Acadêmico I. I. Schmalhausen — “Fatores da Evolução” — Edição da Academia de Ciências da URSS, 1946, págs. 214 e 215 — Moscou. (retornar ao texto)
(14) “Relatórios da Academia de Ciências da URSS, 1946, vol. LI, n. 2, pág. 162 — Moscou. (retornar ao texto)
(15) “Relatório da Academia de Ciências da URSS”, 1946, vol. LI, n. 2, pág. 153 — Moscou. (retornar ao texto)
(16) I. V. Michurin, “Obras”, vol. IV, pág. 72. — Moscou. (retornar ao texto)
(17) Vestnik Vysshey Shkoly, pág. 30, n. 4, 1945 — Moscou. (retornar ao texto)
(18) I. V. Michurin, “Obras”, vol. III, págs. 308-309 – Moscou. (retornar ao texto)
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Não se deve adormecer o Partido, e sim desenvolver nele o espírito de vigilância.
Stálin