“Foram oito anos até concluirmos a produção”, conta Furtado. Três deles dedicados apenas à tradução da peça ‘The Staple of News’, de 1625, escrita por Ben Jonson e que baliza a narrativa proposta pelo diretor gaúcho: 13 jornalistas, escolhidos a dedo, dão suas opiniões sobre temas relacionados à profissão, ao mercado e aos interesses que norteiam a atuação da mídia no Brasil.
A encenação da peça é intercalada com os depoimentos, costurando as distorções e contradições do emergente mercado de notícias inglês no século 17 e os problemas da imprensa brasileira. O resultado, segundo o cineasta, revela uma atualidade incrível da crítica de Jonson.
“É um filme difícil, um tema duro, mas já adianto que valeu muito a pena fazê-lo”. Ele comenta que já são 14 debates sobre a obra e que a resposta do público tem ido de encontro à sua proposta: provocar o debate sobre um tema interditado. “Faltava um filme nacional sobre esse assunto, já que fora o ombudsman de um ou outro jornal e algumas iniciativas como o Observatório da Imprensa, a mídia é muito pouco criticada e contestada”.
Para Leandro Fortes, um dos 13 jornalistas selecionados, o filme constrói um mosaico da pluralidade de formação de jornalistas, de suas matizes ideológicas e de gerações. Há muita divergência entre as opiniões registradas pelas câmeras, e Furtado garante: “Concordo e discordo com todos os jornalistas do filme”. O importante, para ele, é suscitar no espectador a dúvida sobre as questões que são colocadas, não oferecer suas respostas.
A oposição sistemática dos grandes grupos de comunicação aos governos de Lula e Dilma Rousseff foi um tema bastante abordado na discussão. Para o cineasta, “houve uma mudança radical na postura da imprensa a partir de 2002”, com uma pauta permanente contra o governo e que, muitas vezes, não traz informação relevante ou até mesmo verídica.
Na visão de Leandro Fortes, é nítida a distorção praticada pela mídia, direcionada para atender seus interesses econômicos. “O ativismo digital e as mídias alternativas, como a blogosfera, até contribuem para combater esse cenário, mas a realidade da imprensa é dura. O filme mostra essa guerra, que ocorre em campo aberto”.
O jornalista avalia que há um casamento perfeito entre a peça de Ben Jonson e o documentário: “A dinâmica retrata bem o obscurantismo que envolve a comunicação no Brasil”. Para Fortes, a obra já é material obrigatório para a formação de jornalistas em todas as universidades brasileiras.
Vítima de uma denúncia infundada e amplamente repercutida nos grandes veículos de imprensa, o caso de Orlando Silva é relatado em O Mercado de Notícias. 10 dias depois do boato “fabricado” pela revista Veja e de um “verdadeiro massacre” contra a sua imagem, o então ministro do Esporte caiu. [Leia reportagem do Barão de Itararé que aborda o caso]
Apesar da tristeza ao reconhecer que o assassinato de reputações é uma prática recorrente por parte da grande mídia, Silva afirma que o filme renova os ânimos para a batalha da informação. “Ainda que forte, o documentário é carregado de esperança. Sugere reflexão não apenas sobre jornalismo, mas também sobre a democracia brasileira”.
Citando a frase “mídia é poder”, proferida mais de uma vez nos depoimentos documentados, Orlando Silva defende que haja um contrapeso para que esse poder não extrapole limites. “A regulação, na minha opinião, é o caminho para estabelecer regras e democratizar o setor. Não é, de forma alguma, censura aos meios”. Ele menciona o Projeto de Lei da Mídia Democrática, de Iniciativa Popular, como uma alternativa ao monopólio da informação.
Furtado faz um paralelo entre o caso de Orlando Silva e as recentes publicações da Veja, também reproduzidas pela maioria dos grandes meios, que trazem denúncias de corrupção obtidas pelo vazamento de um delator. “Até o Eduardo Campos, recentemente falecido, está sendo atacado. Se a delação premiada já é discutível, imagina o seu vazamento”, pontua. “O problema é que a notícia é publicada e espalhada sem nenhuma confirmação, sem nenhuma garantia de que seja a verdade”.
Questionado sobre a validade da democracia brasileira no presente, o gaúcho é enfático: “Acredito muito em nossa democracia. Vivi metade da minha vida sob a ditadura militar, tive que pegar um ônibus até Buenos Aires para poder assistir Laranja Mecânica no cinema, já que aqui era censurado. O país, para mim, está melhorando, ainda que tenha que melhorar muito mais. Mas aos jovens que já nasceram na democracia, garanto que é muito melhor”.

Confira a íntegra dos depoimentos gravados para o filme e mais informações sobre o documentário: http://www.omercadodenoticias.com.br/