O XX Encontro do Foro de São Paulo
O XX Encontro do Foro de São Paulo (FSP) se realizou entre os dias 25 e 29 de agosto na cidade de La Paz, Estado Plurinacional da Bolívia. Como tem ocorrido nos últimos anos, a agenda do evento foi dividida entre atividades da escola de formação política do Foro; reuniões das secretarias regionais (Cone Sul, Andino-Amazônica, Mesoamérica e Caribe e EUA; a Secretaria Europa não teve quórum); o seminário de avaliação dos governos progressistas; cerca de dez oficinas temáticas; vários encontros específicos como o de mulheres, juventude, afrodescendentes e um inédito, chamado Diplomacia dos Povos, proposto pelos companheiros bolivianos a partir de sua experiência de forte interação entre governo, partido e movimentos sociais.
A abertura do Foro de São Paulo no dia 28 contou com a presença do vice-presidente Álvaro Linera, que fez uma memorável exposição teórica e prática sobre o processo de transformação política, econômica e social em evolução na Bolívia e no continente, bem como os desafios para aprofundá-lo, inclusive na relação entre desenvolvimento e preservação do meio ambiente. No dia seguinte, com a presença de outro representante governamental, o chanceler David Choquehuanca, o Foro foi encerrado com a aprovação do ingresso de alguns novos partidos, a declaração final, uma série de resoluções e moções e o plano de trabalho 2014-2015. O XXI Encontro está programado para o segundo semestre de 2015 no México, sob os auspícios do Partido da Revolução Democrática (PRD) e do Partido do Trabalho (PT).
O balanço do encontro, organizado pelo Movimiento Al Socialismo – Instrumento Político por la Soberanía de los Pueblos (MAS-IPSP) da Bolívia, é positivo do ponto de vista da participação de aproximadamente duzentos delegados e delegadas de partidos-membros do FSP de quase vinte países da América Latina e Caribe, vários convidados da região e também de partidos amigos de outros continentes. Da mesma forma, em relação ao debate político. Quando o Foro foi criado, em 1990, havia apenas um país, Cuba, governado pela esquerda. Hoje são dez, e a esquerda não perdeu nenhuma eleição nos últimos anos. Onde houve retrocesso, foi por meio de golpes como no Paraguai e em Honduras. E mesmo assim, neste último e na Costa Rica, registra-se importante crescimento dos partidos Libre e Frente Amplio, que compõem o FSP.
No entanto, constata-se também uma série de obstáculos para a continuidade do processo de transformações no continente, como a oposição cada vez mais ferrenha e raivosa da direita e dos meios de comunicação, bem como de novas exigências da população latino-americana e caribenha, que já não se satisfaz apenas com o combate à pobreza por meio dos programas de transferência de renda. Esse fato é perceptível nas disputas eleitorais acirradas que ocorrem neste momento no Brasil e no Uruguai, onde candidaturas de direita desafiam seriamente os candidatos de governos, apesar de bem-sucedidos, principalmente, do ponto de vista social.
Além disso, há a influência externa advinda da transformação geopolítica mundial em curso, que na América Latina e Caribe se manifestou explicitamente nos golpes já mencionados, assim como no apoio americano aos grupos de oposição na Venezuela e no bloqueio a Cuba, que já dura meio século. É a parte que nos toca até o momento da resistência dos Estados Unidos e de seus aliados contra as tentativas de constituição de um mundo multipolar. Tampouco estamos imunes aos efeitos da crise econômica desses mesmos países, iniciada em 2008 e sem perspectiva de solução no curto prazo.
Por outro lado, é consensual o valor da unidade entre os partidos que compõem o FSP. Este cumprirá 25 anos de existência em 2015, representando uma longa e profícua experiência de articulação da esquerda que deu uma contribuição fundamental ao enfrentamento do neoliberalismo na América Latina e Caribe e à implementação de políticas alternativas após as vitórias eleitorais ocorridas desde sua fundação. Essa unidade supranacional, porém, nem sempre se reproduz no nível nacional, o que prejudica novos avanços eleitorais, o combate aos resquícios de colonialismo ainda presentes no continente, assim como o enfrentamento da direita, que em alguns países como Colômbia, Guatemala e Honduras adquire comportamentos cada vez mais violentos.
Há, contudo, dois outros elementos que começam a adquirir importância estratégica cada vez maior nos debates do Foro, apesar de, pelo menos retoricamente, terem sido mencionados nas declarações de vários encontros passados: o aprofundamento das políticas de desenvolvimento e o da integração continental. O primeiro se relaciona à necessidade e às possibilidades de avançar nas reformas conjunturais implementadas em vários países para combater a pobreza e a exclusão social e nas reformas estruturais que possibilitem um desenvolvimento econômico, social e político mais consolidado, autônomo, sustentável e menos sujeito a pressões externas. Nesse aspecto, percebe-se ainda a evolução para uma visão mais realista sobre as políticas ambientais relativas aos instrumentos para estimular o desenvolvimento, como a promoção da industrialização e a realização de investimentos em infraestrutura.
No tocante à integração, apesar das loas à Celac, Unasul, Alba e ao Mercosul, também fica cada vez mais clara a necessidade de acelerá-la, enfrentando em primeiro lugar as assimetrias, o que é de responsabilidade principalmente dos países maiores, e partindo para fortalecer a infraestrutura e a interligação entre os países e a formação de cadeias produtivas regionais, facilitada pelas riquezas naturais, minerais e energéticas do continente. Além do papel que exerce para a promoção do desenvolvimento continental, a integração representa um antídoto contra as crises decorrentes da transição geopolítica mencionada anteriormente. Caberá à Secretaria Executiva do FSP, sob responsabilidade do Partido dos Trabalhadores, estimular essa discussão nas próximas reuniões do Grupo de Trabalho, bem como nos próximos encontros.
Kjeld Jakobsen é diretor da Fundação Perseu Abramo
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