O que o Brasil pode ganhar com o fim da tensão Washington-Havana?
Com a histórica normalização das relações entre Estados Unidos e Cuba, o Brasil, pelos sólidos laços com Raúl Castro, se transforma num interlocutor privilegiado e larga na frente porque está perto de ver uma aposta controversa se pagar: a construção do Porto de Mariel, nos arredores de Havana, com financiamento do banco BNDES.
O porto, construído pela Odebrecht com cerca de 700 milhões de dólares financiados pelo banco brasileiro (que apareceu nas investigações relacionadas à operação Lava Jato), é o maior investimento privado na ilha desde 1959. A Odebrecht, pelas mãos do governo brasileiro, é também a primeira empresa privada autorizada a operar uma usina de açúcar. E mais: está reformando os aeroportos da ilha.
O porto de Mariel é um entreposto estratégico no Caribe, mas, por causa do embargo econômico imposto por Washington, não pode ter seu potencial plenamente aproveitado. Todo navio que passe por portos cubanos atualmente tem de ficar numa “quarentena” de seis meses até poder atracar novamente em portos americanos. Agora, essa limitação parece estar prestes a acabar.
O governo brasileiro sempre insistiu que era preciso se apostar na obra, mesmo com a limitação, para se posicionar bem na ilha comunista antes do fim do embargo. A ideia do governo de Raúl Castro é que o Mariel, que será operado por uma empresa de Cingapura, seja parte de uma “zona especial de desenvolvimento”, que receberá empresas produtivas e de logística.
Nisso o Brasil também quer ter seu quinhão e já alguns anos discute a instalação de empresas brasileiras na “zona especial”, que, guardadas as proporções, emulam as zonas que a China criou há 30 anos para atrair investimento estrangeiro.
Há conversas em tornos de uma empresa de vidros, a Fenavid, e empresas da área de biotecnologia, um setor avançado em Cuba e o governo brasileiro já demonstrou interesse em estabelecer parcerias.
Além de produzir perto de mercado americano, há o fator de mão-de-obra. Para usar as palavras do então chanceler brasileiro Celso Amorim em 2008, Cuba, por causa da escolaridade alta da população, pode se transformar num “tigre asiático” da América Latina.
Fora do campo estritamente econômico, o Brasil se torna um interlocutor importante de Cuba neste momento de mudanças quando a Venezuela, aliado carnal da ilha, enfrenta crise econômica por causa da queda do preço do petróleo. Por fim, há cerca de 11 mil médicos cubanos, parte do programa federal Mais Médicos, uma parceria fechada diretamente com o governo Raúl Castro.