Leninismo, nas condições de nosso tempo e nosso país
Quando se fala em leninismo é preciso sempre frisar o caráter dialético dessa concepção, rigorosamente presa à análise concreta da situação concreta, e que leva a formulações que estão em movimento, e não paradas, fixas, porque devem corresponder ao movimento real da política e da luta de classes. Por isso, não se deve perder de vista que se aborda o tema Partido em função da estratégia dada, portanto em situação historicamente determinada.
(…) Tratamos das questões consideradas essenciais da teoria leninista de partido revolucionário do proletariado. O alerta é que quando se fala em leninismo, sempre se deve frisar o caráter dialético dessa concepção, rigorosamente presa à análise concreta da situação concreta. Esta é a homenagem mais correta que podemos fazer a esse teórico que é um dos fundadores de nosso pensamento. Ela leva a formulações que estão em movimento, e não paradas, fixas, porque devem corresponder ao movimento real da política e da luta de classes. Por isso, não se deve perder de vista que se aborda o tema Partido em função da estratégia dada, portanto em situação historicamente determinada.
Em texto anterior (“Universalidade e historicidade de Que fazer?”) viu-se que o Partido criado por Lênin estava em função daquela época: um tempo de ofensiva estratégica, nas novas condições do capitalismo em seu tempo, dando base a novos desenvolvimentos estratégicos. No livro “Imperialismo, etapa superior do capitalismo” Lênin fundamentou a ideia de que a revolução entrava na “ordem do dia’’, se estava na antessala da revolução proletária. Isso naturalmente atuou em determinação de tipo novo, vista a superação dos antigos Partidos Operários Socialdemocratas da 2ª. Internacional, que capitularam frente às tarefas postas pela realidade da 1ª. Guerra Mundial.
As famosas máximas da tendência “espontânea” do proletariado ao projeto do Partido Comunista, as correias de transmissão entre o Partido e as organizações de massa, os quadros dedicados profissional e integralmente ao trabalho partidário, os pequenos parafusos da máquina partidária, entre outras, foram metáforas próprias de uma época. Algumas mantêm atualidade, mas é inegável que o seu contexto é datado; algumas outras, como correias de transmissão, estão ultrapassadas. Outras metáforas serão constituídas, com base na experiência atual.
Pode-se referir Gramsci como exemplo de leninismo em país de maior desenvolvimento democrático-burguês que a antiga Rússia: nos marcos da mesma teoria e da mesma época, mas de outros desenvolvimentos estratégicos. Gramsci promoveu as reflexões afamadas sobre a “guerra de posições”, sobre a necessidade de uma longa luta para conquistar as trincheiras da sociedade civil. Obteve novo alcance a idéia leninista da luta pela hegemonia, em determinação do tipo de Partido necessário, que deu ensejo à noção de Partido Comunista de massas enquanto características específicas de estruturação. Também se pôs a necessidade de aplicação ampliada da concepção leninista do centralismo democrático para esse tipo de partido de vanguarda como formação organizativa extensa e não apenas partido de quadros ou partido de atuação predominantemente ilegal ou de pequenos círculos. Na bibliografia complementar pode-se discutir mais extensamente a questão da hegemonia enquanto conceito leninista e o problema das experiências negativas de Partido Comunista de massas, como saída pela direita, descaracterizadoras do caráter de classe do Partido. Neste particular, é necessário resgatar Gramsci das leituras reformistas, que o transformaram injustamente num ícone de paralisia e acomodação.
Pode-se referir também os caminhos originais de Ho Chi Minh no Vietnã e Mao Tse Tung na China: sempre a estratégia geral norteando o modelo de Partido, nos marcos de uma mesma teoria e mesma época geral. Ou ainda, o que é muito importante, diversas experiências revolucionárias que se constituíram inicialmente como movimentos ou frentes revolucionárias, sem Partido Comunista, e vieram a constituir depois importantes experiências socialistas, como é o caso de Cuba. É a “árvore verde da vida” a sacudir o cinzento das fórmulas pré-estabelecidas.
Então podemos concluir o primeiro ponto, com quatro assertivas centrais.
1- Nunca perder de vista que a consciência (a teoria) revolucionária é o vetor determinante para a missão e o sucesso estratégico do Partido Comunista. Cuidar das vias e meios pelas quais ela pode surgir e amadurecer é a questão central, desenvolvida na forma de um projeto político de poder próprio dos trabalhadores e exequível, atuando intensamente na realidade política concreta, na luta de ideias nas diversas formas de produção e manifestação de consciência, e na luta social.
2- O Partido é instrumento para constituir a consciência de classe do proletariado como sujeito político central do processo transformador, classe fundamental para a luta revolucionária, no nosso caso em aliança estratégica com a intelectualidade avançada e a juventude, as extensas camadas populares hoje deserdadas, vivendo em grandes aglomerações urbanas em nosso país. Ele cristaliza essa consciência avançada e dá-lhe uma forma orgânica.
3- Há um princípio diretor – o centralismo democrático –, mas não um modelo único organizativo de Partido, rígido e independente da experiência concreta da luta de classes. Leninismo não deve ser tomado como um modelo organizativo único da experiência bolchevista (forma historicamente determinada, em função da época e da estratégia), codificado pela 3ª. Internacional. Leninistas, sim, mas construindo modelo organizativo adaptado às circunstâncias de nosso país, nosso tempo e nossa gente.
4- Portanto, teoria e prática de partido são históricas – precisam ser desenvolvidas. E nesse percurso, buscar as singularidades do tempo, dos desenvolvimentos estratégicos que se impõem, das originalidades de caminhos de cada país, como determinantes dos papéis, funções, identidade e perfil do Partido em cada situação nacional. Caso contrário, os Partidos Comunistas podem tornar-se disfuncionais à consecução de seu projeto político ou não ter um projeto exeqüível de transição para o socialismo.
Antes de dar sequência ao encadeamento do tema, vamos publicar na próxima coluna o Informe apresentado ao 11º Congresso sobre o tema do novo Estatuto como expressão aplicada desses preceitos.
Publicado em 2/2/2007