O impacto do PL 4330/2015 sobre a estrutura sindical brasileira
Inicialmente, é bom lembrar que a legislação pátria viabiliza algumas possibilidades de terceirização, como é caso do trabalho temporário e os serviços de segurança. E a Justiça do Trabalho, por força da Súmula 331 do TST, autoriza a terceirização das atividades que se enquadram no conceito de “atividade meio”.
O texto do PL 4330/2015 (terceirização) aprovado na Câmara dos Deputados impactará fortemente a estrutura sindical brasileira. Vejamos, a seguir, os principais itens que interessam à discussão:
Artigo 2º
Texto aprovado: Para os fins desta lei, considera-se:
I – terceirização: a transferência, pela contratante, da execução de parcela de qualquer de suas atividades à contratada para que esta a realize na forma prevista nesta lei;
Destaque: Define o que é terceirização
Artigo 4º
Texto aprovado: É lícito o contrato de terceirização relacionado a parcela de qualquer atividade da contratante que obedeça aos requisitos previstos nesta lei, não se configurando vínculo de emprego entre a contratante e os empregados da contratada, exceto se verificados os requisitos dos arts. 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.
Destaque: Autoriza e confere legalidade à terceirização de qualquer atividade (atividade fim) das empresas
Artigo 8º
Texto aprovado: Quando o contrato de prestação de serviços especializados a terceiros se der entre empresas que pertencem à mesma categoria econômica, os empregados da contratada envolvidos no contrato serão representados pelo mesmo sindicato que representa os empregados da contratante, na forma do art. 511 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.
Destaque: Disciplina o enquadramento sindical dos trabalhadores terceirizados
Atualmente, o sistema de relações sindicais é pautado por regras claras. De acordo com o regramento atual, a atividade econômica preponderante de uma empresa determina a categoria econômica a qual ela pertence.
Uma vez definida a categoria econômica defini-se, por simetria, a categoria profissional e, por sua vez, a representação sindical (o sindicato dos trabalhadores). É o que denominamos enquadramento sindical, disciplinado nos termos dos artigos 511, 570 e 577 da CLT.
Categoria econômica
(atividade econômica preponderante)
Artigo 511, §1º da CLT
Categoria profissional
Artigo 511, §2º da CLT
Por exemplo. A representação sindical dos trabalhadores de uma empresa do setor/ramo metalúrgico, pertencente à categoria econômica das indústrias metalúrgicas, será do sindicato da categoria profissional dos metalúrgicos.
Por força do enquadramento sindical, todos os empregados de uma empresa metalúrgica, exceto os trabalhadores que compõem uma categoria profissional diferenciada ou nos casos em que a lei permite a terceirização, serão representados pelo mesmo sindicato.
A organização sindical dos trabalhadores da indústria metalúrgica (categoria profissional dos metalúrgicos), por sua vez, se estabelece de acordo com a atual estrutura sindical brasileira, que contempla o sistema confederativo de representação. Os trabalhadores podem organizar-se através de sindicato, federação e de uma confederação.
Ao autorizar a terceirização de qualquer atividade (atividade fim) da empresa contratante (art. 4º), o PL 4330/2004 subverte o sistema de representação sindical. De acordo com o texto aprovado, a representação dos trabalhadores terceirizados dependerá da categoria econômica da empresa contratada (terceirizada), que poderá ou não ser a mesma da empresa contratante (art. 8º do PL 4330/2004).
Se a categoria econômica da empresa terceirizada for a mesma da empresa contratante, o sindicato será o mesmo. No entanto, se as empresas pertencerem a categorias econômicas distintas, os sindicatos profissionais também serão distintos.
Se definitivamente aprovado, o enquadramento sindical deixará de ser definido por regras claras. A considerar, inclusive, que o conceito de atividade preponderante é constitutivo do sistema de relações sindicais, não será exagero afirmar que o novo panorama jurídico dificultará a definição da categoria econômica a qual pertence a empresa contratada (terceirizada).
Diante da possibilidade de terceirização de qualquer atividade das empresas, a fragmentação das categorias profissionais será inevitável. Mais do ocorre hoje, dentro de uma mesma empresa poderão existir inúmeras categorias profissionais. Os conflitos entre sindicatos profissionais, as ações de dissídios coletivos e demais demandas judiciais poderão sofrer significativo aumento.
Além destes aspectos, a perda de direitos será inevitável. Os direitos atualmente previstos em normas coletivas (acordos e convenções coletivas), fruto das conquistas dos trabalhadores de cada uma das categorias profissionais, sofrerão um duro golpe.
É sabido que os trabalhadores detém um conjunto de direito, divididos em três partes.
As cláusulas normativas que prescrevem, por exemplo, adicional de hora extra em percentual superior ao previsto em lei, as que asseguram “estabilidade” a trabalhadores “lesionados”, as que fixam piso normativo da categoria, etc., serão desprezadas, ante a sua não aplicação aos novos contratos de trabalho dos “terceirizados”.
O trabalhador empregado da empresa contratada (terceirizada), na hipótese de a mesma não pertencer à categoria econômica da empresa contratante (tomadora de serviços), não terá assegurado os direitos previstos na norma coletiva firmada entre a contratante e o sindicato preponderante.
Além disso, as empresas terão as ferramentas necessárias para promover forte redução de custos, com a adoção de uma “eficiente” gestão de recursos humanos aliada à redefinição do processo de produção: demissão de empregados diretamente contratados e contratação de empresas “especializadas”, com custo menor, sem que os trabalhadores empregados pela empresa terceirizada possam usufruir dos direitos previstos na norma coletiva “mais onerosa” à empresa contratante.
Outra consequência a ser destacada é a diminuição/perda do poder de negociação dos trabalhadores, ante a inevitável fragmentação das categorias profissionais. Neste aspecto, o PL 4330/2004 caminha em sentido diametralmente oposto ao que prescreve a Convenção 98 da OIT e afronta os preceitos constitucionais que privilegiam a negociação coletiva.
Conforme destacamos, atualmente o enquadramento sindical é definido através de regras claras. Tanto os trabalhadores quanto as empresas sabem exatamente quais são os legítimos atores a figurarem na negociação coletiva. No entanto, e em prejuízo dos interesses dos trabalhadores, o PL 4330/2004 tende a promover um ambiente de incerteza para a negociação coletiva.
Como nos propomos a tão somente destacar as consequências negativas do PL 4330/2004 aprovado na Câmara dos Deputados deixaremos a análise de eventuais alternativas para o enfrentamento do tema para outra oportunidade.
∗ Advogado especialista em Direito Sindical e Direito Processual. Editor do site HYPERLINK “http://www.direitoesindicalismo.com.br” www.direitoesindicalismo.com.br. Mestre em Filosofia pela UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas. Bacharel em Direito pela UFV – Universidade Federal de Viçosa/MG.
Lei 6.019/1974, que dispõe sobre o trabalho temporário (vide Decreto 73.841/1974).
Lei 7.102/1983, que dispõe sobre serviços de segurança.
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
PL 4330/2004No Senado o projeto tramita sob o número PLC 30/2015
Subemenda Substitutiva Global do Dep. Federal Arthur Oliveira Maia (SD-BA), aprovada em 08.04.2015.
Emenda Aglutinativa nº 15 do Dep. Federal Arthur Oliveira Maia (SD-BA), aprovada no dia 22.04.2015
Idem.
Art. 581. Para os fins do item III do artigo anterior, as empresas atribuirão parte do respectivo capital às suas sucursais, filiais ou agências, desde que localizadas fora da base territorial da entidade sindical representativa da atividade econômica do estabelecimento principal, na proporção das correspondentes operações econômicas, fazendo a devida comunicação às Delegacias Regionais do Trabalho, conforme localidade da sede da empresa, sucursais, filiais ou agências.
§ 1º Quando a empresa realizar diversas atividades econômicas, sem que nenhuma delas seja preponderante, cada uma dessas atividades será incorporada à respectiva categoria econômica, sendo a contribuição sindical devida à entidade sindical representativa da mesma categoria, procedendo-se, em relação às correspondentes sucursais, agências ou filiais, na forma do presente artigo.
§ 2º Entende-se por atividade preponderante a que caracterizar a unidade de produto, operação ou objetivo final, para cuja obtenção todas as demais atividades convirjam, exclusivamente em regime de conexão funcional.
Art. 511. É lícita a associação para fins de estudo, defesa e coordenação dos seus interesses econômicos ou profissionais de todos os que, como empregadores, empregados, agentes ou trabalhadores autônomos ou profissionais liberais exerçam, respectivamente, a mesma atividade ou profissão ou atividades ou profissões similares ou conexas.
§ 1º A solidariedade de interesses econômicos dos que empreendem atividades idênticas, similares ou conexas, constitui o vínculo social básico que se denomina categoria econômica.
§ 2º A similitude de condições de vida oriunda da profissão ou trabalho em comum, em situação de emprego na mesma atividade econômica ou em atividades econômicas similares ou conexas, compõe a expressão social elementar compreendida como categoria profissional.
Art. 570. Os sindicatos constituir-se-ão, normalmente, por categorias econômicas ou profissionais, específicas, na conformidade da discriminação do quadro das atividades e profissões a que se refere o art. 577 ou segundo as subdivisões que, sob proposta da Comissão do Enquadramento Sindical, de que trata o art. 576, forem criadas pelo ministro do Trabalho, Indústria e Comércio.
Art. 577 – O HYPERLINK “http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm” l “anexo” Quadro de Atividades e Profissões em vigor fixará o plano básico do enquadramento sindical.
Art. 511 (…)
§ 3º Categoria profissional diferenciada é a que se forma dos empregados que exerçam profissões ou funções diferenciadas por força de estatuto profissional especial ou em consequência de condições de vida singulares. HYPERLINK “http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L12998.htm” l “art28” (Vide Lei nº 12.998, de 2014)
Lembremos que atualmente, por força da Súmula 331 do TST, considera-se lícita a terceirização das atividades que se enquadram no conceito de atividade meio.