UNA quer conquistar consciências, não apenas direitos para LGBT
A militância LGBT de todo o país viveu uma noite histórica, nesta sexta-feira, 16, quando jovens comunistas e a lideranças mais experientes se encontraram para a fundação da UNA (União Nacional LGBT). O evento foi prestigiado, tanto pelo Comitê Central do Partido Comunista do Brasil, lideranças comunistas das mais diversas entidades nacionais, como também por lideranças LGBT do mais diverso espectro partidário e ideológico.
Os discursos enfatizaram o caráter amplo da entidade, inclusive no aspecto ideológico, quando pretende lutar pelas bandeiras específicas, sempre mostrando a importância da transformação estrutural para superação das discriminações estratificadas na sociedade capitalista. Também houve ênfase no modo como o consórcio golpista que tenta derrubar os governos populares a força usam a luta LGBT para atingir Dilma e conquistar os setores mais conservadores da sociedade.
Ao final do sábado (17), depois de debates profundos foi eleita a nova diretoria, composta por gays, lésbicas, travestis, transexuais masculinos e femininos, e um estatuto foi aprovado. O militante LGBT, há 17 anos, Andrey Lemos foi conduzido à presidência da entidade. Na tarde do domingo (18), ocorreu o 1º encontro nacional LGBT da União da Juventude Socialista (UJS), em que foi encaminhado um calendário de lutas para 2016.
Luciana Santos, presidenta do PCdoB, destacou o modo como as campanhas eleitorais expressaram preconceitos de todos os tipos, contra a experiência dos últimos governos conquistados pelo povo brasileiro. “Estamos testemunhando o surgimento de uma agenda retrógrada, que quer impor um modelo de amor e relação afetiva. Este é um país plural de grandes conquistas históricas com a construção de sua nacionalidade a ferro e fogo. Não vamos aceitar. Vamos reagir criando entidades como essa para lutar contra qualquer tipo de discriminação e lutar para criminalizar a homofobia, barrar o Estatuto da Família e defender a democracia e os votos depositados na urna pelo mandato de quatro anos de uma mulher. Não é a toa que está aqui boa parte do Comitê Central”, disse a dirigente comunista.
Andrey Lemos ressaltou que a entidade é um instrumento que nasce do desejo de socialistas, compreendendo que “opressões a LGBT não surgem de pessoas ou grupos, mas da estrutura social, assim como o racismo, o machismo e a misoginia”. “A UNA vem para se somar a outras redes, para enfrentar essa conjuntura de avanço gravíssimo do conservadorismo, o debate sobre gênero, a discussão da família e o reconhecimento das pessoas LGBT. Precisamos de um grande acúmulo de forças e instrumentos de mobilização popular para fazer esse enfrentamento da onda de ódio que persegue pessoas, invade terreiros religiosos, mata travestis e transexuais. Não basta garantir a legislação, mas a transformação e emancipação social”, discursou Lemos, durante a abertura do seminário de lançamento da UNA.
Um dos idealizadores da UNA, Lemos considera que, o momento atual, requer cuidado e unidade das forças progressistas. “Estamos vivendo um momento do obscurantismo, onde há forças conservadoras, machistas e racistas, que se organizam para reagir contrariamente há uma série de avanços e conquistas no campo da democracia e dos direitos civis da população LGBT. Há um clima de ódio presente na sociedade, para cada conquista LGBT temos várias ações homofóbicas. Estamos vivendo um momento histórico e oportuno para ser lançado um novo instrumento de luta, para fortalecer a unidade de ação. A UNA tem o objetivo de unificar diferentes forças políticas, movimentos sociais, em uma só trincheira, onde tenhamos condições de combater às ameaças de retrocesso e opressões”.
Segundo Andrey, a luta emancipacionista e o direito à liberdade das diferentes identidades de gênero são o cerne da questão. “Temos muitas legislações, precisamos analisar de que forma as normativas se tornam realidade nos municípios. “No interior do Brasil as travestis, transexuais, gays e lésbicas são assassinados, violentados e excluídos da sociedade”, afirma.
Para a deputada estadual Leci Brandão (PCdoB-SP), a militância comunista e a juventude da UJS tornam-se referência a partir da criação da UNA LGBT, num momento em que setores da sociedade lutam para impedir o avanço de direitos da população LGBT.
A vice-prefeita da cidade de São Paulo, Nádia Campeão, destacou a importância da Parada do Orgulho LGBT para a cidade de São Paulo, “por ter ensinado muito sobre diversidade, especialmente a seus governantes”. Ela lembrou que o trabalho da Prefeitura com essa população é um enfrentamento constante do conservadorismo da cidade. Também ressaltou que a UNA LGBT é importante neste momento para o debate, “não apenas pela luta específica, como pela atenção à conjuntura política em que o avanço conservador ataca os direitos LGBT, tanto quanto as conquistas de amplos setores da sociedade”.
O deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP) chegou apressado para garantir em sua história a presença no surgimento de mais esta importante entidade da luta social, como quando esteve na fundação da Unegro, em Salvador. “A luta pelos direitos civis e contra todas as formas de LGBTfobia é parte da construção de uma nação plenamente livre”, enfatizou.
Toni Reis, secretário da ABGLT, associação brasileira que reúne 308 entidades filiadas, atento às movimentações obscurantistas no Congresso Nacional, convocou à resistência contra os retrocessos e “nenhum direito a menos”. “Não podemos permitir, como a presidenta Dilma disse, que moralistas sem moral venham dizer qual o tipo de família que pode ser reconhecida”, parafraseou. Após amplos avanços de direitos para a população LGBT, desde o Governo Lula, lembrou ele, Reis disse que vivemos um momento de LGBTfobia sem precedentes no Congresso Nacional.
Reis considera um imenso retrocesso a retirada do termo “identidade de gênero” dos Planos Municipais de Educação. “Foi um Tsunami reacionário e fundamentalista em todo país, transformaram a palavra gênero em um monstro que pega criancinhas”.
A ex-deputada federal Ângela Albino, atual coordenadora nacional LGBT do PCdoB, afirmou que “não abrimos mão de fazer política com amor”. “Para nós revolucionários, não nos serve reivindicar direitos para LGBT, mulheres, negros, mas revolucionar o mundo. A UNA não é um gueto para entocar os LGBT socialistas, mas um espaço para dizermos que queremos um Brasil melhor, também na perspectiva LGBT, com desenvolvimento econômico e plena democracia para todos”, destacou ela.
O militante Leonardo Lima, coordenador LGBT da UJS (União da Juventude Socialista), também ressaltou que a luta da UNA “deve alcançar voos maiores do que aquele pela conquista de direitos”. “Queremos conquistar a consciência da sociedade. Não são apenas os LGBT que têm que ter consciência de sua opressão, mas existe um arranjo amplo de mecanismos opressivos machistas, homofóbicos e racistas. Precisamos ter consciência desse modelo e lutar por uma nova sociedade. Essa união da vanguarda será muito vitoriosa, pois a juventude tem uma energia represada e propomos colocar o bloco na rua”, resumiu ele.
A presidenta da UNE (União Nacional dos Estudantes), Karina Vitral, considerou aquele um dia simbólico para a luta LGBT no país. “Impossível não perceber que há muita ternura no movimento LGBT, pois se move na luta em defesa de todas as formas de amor, o que é muito forte e poderoso. A pauta das opressões também é parte da tentativa de golpe em andamento no Congresso Nacional, por isso é tão importante unificar todos os democratas que são contra o golpe, para combater esses retrocessos conservadores”, declarou.
A presidenta da UBES (União Brasileira de Estudantes Secundaristas), Barbara Melo, por sua vez, considera a data histórica para todo o movimento social brasileiro. “Esse espaço será fundamental para que possamos disputar opinião e virar a chave desse conservadorismo que tanto nos ataca”.
Na cerimônia de fundação da UNA, ocorrida nesta sexta-feira (16) à noite, contou ainda com a presença do editor do Portal Vermelho, José Reinaldo de Carvalho, do presidente da Fundação Maurício Grabois, Adalberto Monteiro, do vice-presidente do PCdoB, Walter Sorrentino, da presidenta do PCdoB-RJ, Ana Rocha, o ex-coordenador de Políticas LGBT da Prefeitura de São Paulo, Julian Rodrigues, e o atual coordenador Alessandro Melquior, Laércio Baluarte (PSB-LGBT), Kátia Souto (Diretora de Gestão Participativa do Ministério da Saúde), a ex-presidente da UNE, Virginia Barros, Claudia Viana (do grupo Movê-los-CE), Deco Ribeiro (Ejovens Campinas) Angela Meyer (UPES), Fábio de Jesus (Articulação Brasileira de Gays- Artgay), Gil Santos (Conselho Nacional de Combate a Discriminação de LGBT), Luciano Palhano (Instituto Brasileiro de Transmasculinidade), deputada federal, Jô Moraes (PCdoB-MG), Milena Passos, presidenta da Atras, Silvana Conti, da Liga Brasileira de Lésbicas, André Tokarski (Secretário de Movimentos Sociais do PCdoB), Edson França (Unegro), Marcos Freire (Setorial LGBT do PT), Bárbara Melo (UBES), Rarikam Heven (UNE), Renan Alencar (UJS), Fernando Quaresma (presidente da Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo (APOGLBT), Liége Rocha (Secretaria Mulheres do PCdoB), Nivaldo Santana (vice-presidente da CTB e secretário Sindical do PCdoB) e André Pomba, do PV Diversidade.
Leia a íntegra da carta de princípios da entidade
Carta de princípios – UNA LGBT
A sociedade civil organizada, composta por mulheres e homens, lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais de todo território brasileiro, reunidos(as) para a fundação da UNA-LGBT (União Nacional LGBT), na cidade de São Paulo – SP, em 16 de outubro de 2015, como instrumento de luta pela emancipação política e humana ao defender idéias no campo da consciência de classe e de garantia de direitos, aprovam os seguintes princípios norteadores desta entidade:
Enfrentar o machismo, o racismo, a lesbofobia, homofobia, bifobia e transfobia, em todas as suas formas de manifestação, particularmente as ações sistêmicas que impedem o usufruto pleno dos direitos de cidadania de mulheres e homens com diferentes orientações sexuais e identidades de gênero.
Enfrentar todas as formas de discriminação de gênero, sistêmicas ou não, particularmente aquelas que afetem as mulheres lésbicas, travestis e transsexuais.
Enfrentar a exploração de classe em todas as suas manifestações, colocando-se ao lado dos interesses das trabalhadoras e dos trabalhadores.
Defender intransigentemente a livre orientação sexual e às diferentes identidades de gênero.
Solidarizar-se com a luta de todos os movimentos sociais e populares que se colocam no campo progressista.
Solidarizar-se com a luta dos oprimidos em todo mundo. Travar contato e estabelecer alianças para a luta com organizações LGBT nos diversos países.
Promover, a partir da concepção da emancipação política e humana, rupturas no sistema capitalista ou aprofundar as já existentes a partir de ações que incidam sobre o imaginário coletivo de toda a população.
Desmistificar os padrões construídos e naturalizados na sociedade através do desenvolvimento do capitalismo.
Apresentar à população LGBT e a população em geral um novo modelo de sociedade solidária, equânime, igualitária e livre de opressões, a sociedade socialista. Nós, militantes da UNA-LGBT, em território nacional, declaramos publicamente que defenderemos estes princípios de forma consciente e voluntária, como parte de um projeto de construção de um futuro feliz e digno para as nossas e as futuras gerações.