Antropoceno: a era do capital
Após 11,7 mil anos estamos prestes a nos despedir do Holoceno – iniciado na última Idade do Gelo – e ingressarmos em uma nova era geológica batizada pelo sugestivo nome de Antropoceno, ou seja, a “era dos homens”.
A possível troca de nome será votada ainda esse ano no Congresso Internacional de Geologia e nos faz refletir sobre a crescente intervenção humana no planeta, sobretudo após o estrondoso desenvolvimento do capitalismo, a partir da chamada Revolução Industrial.
Todo esse cenário de intensas mudanças fica ainda mais alarmante quando analisamos o tempo geológico levando em conta o calendário cósmico proposto por Carl Sagan¹ – popularizado na série Cosmos, exibida pela televisão.
Assim, sabendo que nosso universo tem aproximadamente 14,6 bilhões de anos e comprimindo todo esse tempo em um único ano a fim de termos uma melhor dimensão dos principais acontecimentos que ocorreram na história da vida, os primeiros hominídeos só teriam surgido na Terra por volta das 23 horas do último dia do ano, sendo que o desenvolvimento do capitalismo se deu apenas no último segundo deste ano.
No calendário cósmico de Sagan, esse segundo final que estamos vivendo pode deixar impactos semelhantes a outros grandes cataclismos pelos quais nosso planeta passou em várias eras, tais como a Extinção do Ordoviciano, a Extinção Cretáceo Paleogeno e a Extinção Termo Triassíca. A diferença é que enquanto todas essas extinções ocorreram por fatores externos, pela primeira vez nossa espécie corre o risco de ser dizimada por fatores internos, inerentes à ação humana consciente.
Por mais que essas palavras possam soar alarmistas, o fato é que nosso planeta dá sinais claros de não suportar mais esse modo de produção que se sustenta no apelo desenfreado ao consumo, onde 1% da população detém mais da metade das riquezas produzidas pelos 99% restantes.
De acordo com matéria divulgada em O Globo, cientistas afirmam que “as marcas deixadas pela ação humana na Terra são tantas, tão espalhadas e tão profundas que a definição do Antropoceno seria “inequívoca”. Entre elas, por exemplo, estão o que chamam de “tecnofósseis”, como os resíduos de plástico, concreto, alumínio elemental e outros materiais artificiais que acabaram nos depósitos sedimentares do planeta e nos oceanos. Outros registros importantes apontados por eles são a fuligem e as cinzas da queima de combustíveis fósseis que também encontraram lugar nestes sedimentos, além de se acumularem no gelo das regiões polares a partir do século XVII”.
Mas o pior, certamente, é o que está por vir caso ainda vigore por muito tempo esse sistema onde o “ter” prevalece sobre o “ser” e a concentração de riquezas cada vez mais nos arrasta para uma crise sem precedentes. Se a Grande Crise de 1929 culminou com a Segunda Grande Guerra Mundial, a atual crise iniciada em 2008 pode nos levar a um caminho parecido, mas com conseqüências muito mais graves em decorrência da letalidade das atuais armas de destruição em massa dominadas, principalmente, pelos países imperialistas.
Mais cedo ou mais tarde nos depararemos frente a uma encruzilhada histórica: ou pomos fim ao capitalismo ou daremos fim à nossa espécie justamente na “era dos homens”.
REFERÊNCIA:
¹ SAGAN, Carl. Dragões do Éden. Editora Gradiva. São Paulo, 2012.
Luciano Rezende Moreira
Professor e Diretor de Temas Ecológicos e Ambientais da Fundação Maurício Grabois