Golpe avança no Senado, resistência democrática prosseguirá
Essa votação escancara mais uma vez o caráter meramente político da decisão de afastar a presidenta eleita Dilma Rousseff. O relatório do senador Antonio Anastasia revelou-se uma fraude fenomenal, uma peça acusatória frágil, onde não se encontra um fiapo sequer de base jurídica que sustente o impedimento da presidenta. O senador tucano simplesmente descartou as argumentações da defesa, ignorou o depoimento de dezenas e dezenas de testemunhas que inocentaram Dilma das acusações que lhe foram feitas e passou por cima até mesmo de um parecer técnico do próprio Senado que diz, com todas as letras, que as alegadas “pedaladas fiscais” não configuram crime de responsabilidade.
O relatório fraudulento de Anastasia também ignora a tomada de posição do Ministério Público Federal de Brasília que decidiu pelo arquivamento do processo contra Dilma por entender que a presidenta não violou lei alguma no que se refere ao orçamento público.
Como ressaltou a senadora do Vanessa Grazziotin – que tem se destacado entre os senadores e senadoras que, bravamente, lutam contra o golpe –, das acusações imputadas à presidenta, restaram apenas três decretos de créditos suplementares que, além de não serem tipificados como crime, foram igualmente assinados pelos presidentes da República que antecederam a presidenta Dilma, inclusive pelo vice, usurpador da cadeira presidencial, Michel Temer. E contra eles não há nenhum questionamento jurídico. Portanto, se evidencia o uso arbitrário de dois pesos e duas medidas.
Pressa para julgar uma presidenta honesta, lentidão para votar processo de Cunha
O vice-presidente Michel Temer, que ocupa interinamente a presidência da República, vem pressionando o Senado para atropelar prazos para acelerar o impeachment. Ao mesmo tempo, ele e sua tropa de choque no Congresso atuam para postergar a cassação do mandato do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, temendo eventuais retaliações do comparsa que possam comprometer o governo interino e prejudicar a aprovação do impeachment. Ou seja, tramam um golpe para tirar do poder uma presidenta honesta, ao mesmo tempo em que protegem um político que carrega nos ombros pesada carga de crimes de corrupção.
Nesta semana, a pressa em consumar o golpe e o modus operandi de acobertamento de corruptos tornaram-se ainda mais reveladores quando vieram à tona graves denúncias envolvendo diretamente o vice-presidente Michel Temer e dois de seus principais ministros – José Serra e Eliseu Padilha – em casos de recebimento de propinas milionárias . Cabe lembrar que, caso Temer seja efetivado na Presidência, a Polícia Federal fica automaticamente impedida de investigar as denúncias que pesam contra ele.
A agenda regressiva do golpe
Tomar de assalto o poder e acobertar corruptos são motivações pessoais dos principais envolvidos na trama golpista, mas o objetivo central do golpe envolve um outro elemento mais estratégico para a direita e a grande finança: o que lhes interessa em essência é aniquilar o projeto político que vinha promovendo, nos últimos doze anos, um consistente processo de diminuição das desigualdades sociais, promoção de direitos e afirmação da soberana do país. Planejam uma verdadeira volta ao passado.
Neste breve período de quase três meses de vigência, o governo interino escancarou sua agenda regressiva, neoliberal e antipovo. Tudo o que os golpistas fizeram até agora e ameaçam fazer mais adiante, caso o golpe seja consumado, sinaliza para o mais virulento ataque ao arcabouço de conquistas asseguradas aos trabalhadores e aos mais pobres desde a Constituição de 1988. Até as conquistas asseguradas pela CLT de 1943 estão sob séria ameaça. Os golpistas ameaçam também com uma reforma previdenciária maquiavélica e cruel que pode inviabilizar a aposentadoria da maioria dos trabalhadores.
Ao lado destas medidas desastrosas, o país pode ter seus serviços públicos, sobretudo na área de educação e saúde, fragilizados pela PEC 241, defendida pela dupla Temer/Meirelles, que comprometerá os investimentos públicos por pelo menos duas décadas, atingindo sem exceção todas as políticas sociais. Além disso, o PLP 257/16, que trata da renegociação da dívida dos estados, junto com a PEC 241, significarão um avassalador desmonte da máquina pública.
E o desmonte do Estado, como reza a cartilha neoliberal dos golpistas, passará também pelo aprofundamento das privatizações e a entrega de riquezas estratégicas como o pré-sal para multinacionais estrangeiras.
Ao mesmo tempo, o país se depara com a escalada autoritária do governo interino que ameaça não só a democracia como também a liberdade e os direitos essenciais dos cidadãos. A perseguição e repressão aos movimentos sociais, a censura aos protestos pelo Fora Temer na Olimpíada, a ameaça de cassação do registro de partidos de esquerda – como a que fez o ministro do STF, Gilmar Mendes contra o PT recentemente – são demonstrações cabais da brutalidade antidemocrática que está por trás do golpe. Soma-se a isto uma já anunciada reforma política que buscará mutilar a democracia, restringindo o pluralismo político e partidário.
Erguer alto a bandeira do plebiscito, reforçar e ampliar as mobilizações
A aproximação da fase final do impeachment, somada a todas estas ameaças de retrocessos, impõe às forças democráticas e progressistas a urgência de reagirem com vigor nas ruas, no parlamento e em todos os lugares onde se possa denunciar e desmascarar a marcha golpista.
A bandeira do plebiscito para convocação de novas eleições diretas presidenciais é, neste momento, um instrumento mobilizador que indica para amplos setores da sociedade que a escalada golpista pode ser barrada e que o único caminho para reunificar o país e recolocá-lo no rumo do desenvolvimento passa necessariamente pela consulta ao povo, pela soberania do voto popular e jamais pela violência de um golpe de Estado.
Essa bandeira já foi admitida pela presidenta Dilma, é abraçada por juristas, advogados, movimentos sociais, parlamentares e, conforme várias pesquisas de opinião, é a saída vista para a atual crise pela maioria do povo brasileiro.
As mobilizações devem ser direcionadas ao Senado Federal: cada senador e cada senadora deverão ser persuadidos, abordados, alertados, no sentido de que a consumação do golpe só agravará a crise no país e que não há solução fora da democracia.
Que os golpistas não se embriaguem! A luta prosseguirá, independentemente do resultado do julgamento, até a restauração completa da democracia. No Brasil, no final a democracia sempre vence e seus algozes são duramente julgados pela história e pelo povo.
Brasília, 10 de agosto de 2016
Deputada Federal Luciana Santos
Presidenta do Partido Comunista do Brasil-PCdoB