Seminário reúne advogados para debate sobre “crise de estado”
Na sexta e no sábado, dias 17 e 18 de março, ocorreu o Seminário Democracia e Direitos dos Trabalhadores, que discutiu as contrarreformas do Governo Temer que afetam garantias consagradas do Estado Democrático de Direito e direitos adquiridos pela classe trabalhadora, por meio de palestras com ministras do TST, dirigentes da Ordem dos Advogados do Brasil, juristas, sindicalistas e representantes da sociedade civil organizada e gestores públicos. A série de debates ainda culminou com a realização do II Encontro Nacional da ADJC (Advogados pela Democracia, Justiça e Cidadania). O evento lotou o auditório do Novotel Jaraguá, no centro de São Paulo.
Promovido por Advogados pela Democracia, Justiça e Cidadania (ADJC), Fundação Maurício Grabois (FMG), Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e a Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat), o evento enfatizou a necessidade de formar uma ampla frente de resistência unificada para enfrentar os desafios do país num cenário de crise política profunda com reformas que ameaçam direitos constitucionais e a democracia.
Formaram a mesa de abertura o presidente da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas, Roberto Parahyba, o vice-presidente da CTB, Nivaldo Santana, a ministra do TST, Kátia Magalhães Arruda, a ministra do TST, Delaíde Arantes, o presidente do TRT-SP, Wilson Fernandes, o presidente do Sindicato dos Advogados de SP, Aldimar Assis, o ex-presidente da OAB, Marcelo Lavenere, o ex-presidente da OAB, Cezar Britto e o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP). Aldo Arantes, um dos coordenadores da ADJC, convidou o presidente da Fundação Maurício Grabois para uma saudação de abertura do evento.
Para Rabelo, a iniciativa dessa frente de advogados, trabalhadores e sindicalistas é de uma importância muito grande nesse momento. “Juntar juristas, advogados, juízes com trabalhadores e uma central sindical, na situação atual tem uma amplitude muito grande, tem um papel importantíssimo. E nós consideramos isso uma prioridade de trabalho”, ele enfatizou.
O Brasil vive uma grande crise que, em sua opinião, tem uma particularidade que não encontra paralelo na história politica e econômica brasileira, pois trata-se de uma crise de estado. “Algo que os advogados e juristas entendem melhor”. Conforme analisa Rabelo, no centro da própria crise política, há um desalinhamento, uma desarrumação com relação aos poderes de estado. “Há um vazio com referência ao poder executivo e um emparedamento do próprio poder legislativo, um ativismo muito grande de certos setores, como o Poder Judiciário e o Ministério Público Federal que ocupam esse espaço. Um ativismo em simbiose com a mídia, sobretudo em relação àqueles que têm o papel de julgar”, pontua ele.
“Já imaginou os juízes se dirigirem à opinião pública, ‘à turba’, e não ao devido processo legal, aos altos, que é o efetivo papel dos juízes?”, questionou. Como salienta ele, os direitos fundamentais são importantes e não podemos retroceder do estado democrático de direito. Em sua opinião, a luta fundamental, hoje, é pela retomada do estado democrático de direito. “Estamos diante de um golpe de tipo novo, de caráter parlamentar, coonestado pelo poder judiciário. Estamos diante de uma dialética em que o estado de exceção penetra e cresce no seio do próprio estado de direito”, aponta Rabelo.
“A nossa compreensão, pela ótica política, é que precisamos formar uma ampla frente democrática no país, no sentido de restaurar o estado democrático de direito e resgatar a soberania do povo no voto”, explica ele. Por isso, diz ele, que se enfatiza a importância das eleições diretas no país. “Nós achamos que superar crise, mesmo, só a partir do resgate da soberania do povo”, disse. O que está na ordem do dia, para ele, são as eleições diretas, em que se discuta programa e projeto de desenvolvimento nacional para o país, e se abra outro caminho para superar a realidade golpista.
O dirigente político explica aos advogados que a resistência cresce acumulando forças. O povo começa ir às ruas, disse ele, referindo-se à grande manifestação ocorrida na quarta-feira (15), a partir de uma greve geral contra a reforma da previdência. “Um processo de acumulação de forças que nem sequer podemos prever as consequências. Pode haver um catalizador que espalhe a mobilização a um nível muito maior. Estamos acumulando lenha seca para incendiar tudo isso que está aí”.
Aldo Arantes aponta o papel de advogados e juristas, no interior de uma ampla frente democrática, diante da grave crise. Segundo ele, vivemos uma situação muito grave em que a Constituição brasileira “está sendo rasgada permanentemente”, o estado democrático de direito “está sendo pisoteado”, os direitos econômicos e sociais “sendo destroçados”. “Ou seja, vivemos um retrocesso civilizatório e a sociedade tem que se movimentar, e não apenas um partido ou centrais sindicais, ou organizações sociais, mas o povo, os democratas que defendem o estado democrático de direito. Neste sentido, os advogados, os juristas e o juízes, têm um papel fundamental, pois são uma categoria que tem capacidade teórica e política de defender a constituição, pois estão no exercício da prática do direito”, avalia Arantes.
A ADJC, na opinião dele, é uma contribuição para construir a unidade do povo brasileiro. Ele mencionou a reunião de sábado como um desdobramento prático do seminário, para consolidar a articulação nacional e buscar um objetivo específico. “A Ordem dos Advogados do Brasil já jogou um papel político importante na defesa da democracia e, infelizmente, a atual diretoria foi conivente com o golpe. Temos clareza de que a OAB é uma entidade importante para a democracia brasileira e tem que ser resgatada. Uma das responsabilidades da ADJC é construir uma articulação para disputar as subseções, para disputar a OAB nacional, para disputar com um programa, e se fortalecer para ganhar autoridade para construir um programa mais avançado”, defendeu Arantes.
Cultura escravista e valor do trabalho
A ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Katia Magalhães Arruda abordou o tema dos ataques do governo aos direitos trabalhistas desmascarando as mentiras que a propaganda governamental espalha para convencer os trabalhadores de que suas reformas são necessárias. Segundo ela, são mentiras repetidas intermitentemente dentro de uma cultura secular de escravidão e desvalorização do trabalho e do trabalhador.
Para a ministra pressupor essa lógica de funcionamento do país é fundamental para compreender as propostas de desestruturação do direito do trabalho. “Nós convivemos com grandes tecnologias, com grandes avanços em alguns aspectos, mas também com contradições imensas como trabalho análogo a condição de escravo, trabalho infantil e a precarização em diversos moldes. O Brasil, ao mesmo tempo que é a sétima economia do mundo, em índices de desenvolvimento humano ou até mesmo em distribuição de renda, é o 80º e o 75ª, respectivamente”, destacou a ministra, que citou números oficiais que evidenciam a desigualdade social, apesar dos avanços dos últimos anos.
Segundo ela, os índices econômicos vêm acompanhados de uma “forte cristalização da desvalorização do trabalho” e do descumprimento das leis, que perpassa toda a história do nosso país que tem uma formação patriarcalista, machista, colonialista, nepotista e coronelista.
“Quando nós falamos de escravidão, estamos falando de uma cultura que prevalece no Brasil”, salientou. A ministra reforça que a escravidão perdurou no Brasil durante 388 anos e que temos hoje, 138 anos de trabalho livre. “É um tempo muito arraigado em nossa cultura em termos de dominação, de submissão, de subserviência. Esse lastro negativo da escravidão atuou de forma preponderante na construção da sociedade brasileira”, completou.
Segundo a ministra, “há uma naturalização da exploração do trabalho” no Brasil. “O trabalho ainda é visto como uma atividade de pessoas negras e pobres. Não há uma cultura de valorização. O trabalho não é visto como algo dignificante, essencial como direito humano”, explicou.
Sem citar a afirmação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de que “a Justiça do Trabalho não deveria nem existir”, a ministra Kátia Arruda rebateu: “Para muitos, os direitos trabalhistas são direitos secundários, que podem ser burlados”.
Sobre os mais de 40 projetos em trâmite no Congresso como terceirização, negociado sobre o legislado, demissão imotivada, entre outros, a ministra do TST destaca que se trata de ataques frontais aos direitos e a Justiça do Trabalho.
“Quase todas as propostas têm como objetivo afastar as causas da Justiça do Trabalho, porque segundo eles, o Tribunal Superior do Trabalho causaria insegurança jurídica na sociedade”, explicou ela, questionando se o descumprimento da lei não seria o verdadeiro motivador da insegurança jurídica.
Blitzkrieg reformista
Marcelo Lavenère, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), comparou as contrarreformas do governo Temer com a blitzkrieg, a “guerra-relâmpago” usada pelo exército nazista durante a Segunda Guerra Mundial que utilizava forças móveis em ataques rápidos, com brutalidade e de surpresa, com o intuito de evitar que as forças inimigas tivessem tempo de organizar a defesa.
“Neste momento, o que os golpistas de Michel Temer fazem é uma blitzkrieg contra a democracia e a constituição brasileira”, afirmou Lavenère. “É preciso que nós tenhamos consciência disso. Não tem nenhum campo, nenhum rincão, nenhuma instância política-jurídica que essa gente não esteja querendo destruir. Todos os nossos direitos estão sendo atacados ao mesmo tempo”, completou.
Para o jurista, o golpe contra o mandato da Dilma Rousseff foi uma parte desse desmantelamento. Ele disse ainda que a batalha da Previdência será uma espécie de teste. “Se nós ganharmos a batalha contra a reforma da Previdência teremos estabelecido uma cabeça de ponta, um marco de que a nossa resistência é bem-sucedida”, avalia.
E segue: “Não podemos nos acovardar… Bem unidos façamos para chegar a vitória final. Um apelo que hoje nós devemos fazer a todos os setores da esquerda, aos líderes progressistas é de que nós não podemos nos dispersar. Nessa hora de guerra não podemos levar em conta divergências que possamos ter. Precisamos fazer uma frente muito ampla dos progressistas do Brasil para fazer uma força de resistência para mostrar que esse país tem dono”.
Constituição suspensa por 20 anos
O professor da USP, Gilberto Bercovici, destacou que a elite brasileira ataca a Constituição desde o dia 6 de outubro de 1988. Bercovici cita o artigo 3º, que fala dos objetivos da República, como um exemplo de como a Constituição incomoda esses setores da sociedade brasileira.
O artigo diz: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
“Quando uma Constituição coloca no seu texto que é objetivo da República garantir a todos, independentemente do partido ou da sua filiação ideológica, construir uma sociedade livre, justa e solidária está dizendo que aquele país não é uma sociedade livre, não é uma sociedade justa, não é uma sociedade solidária”, enfatizou o jurista.
“Quando nós, juristas, defendemos uma constituição livre da política, qual foi o preço que pagamos: foi ter uma política livre da Constituição. Esta situação chegou ao clímax agora, em que além da blitz citada por Lavenère contra o que sobrou dos direitos previdenciários, trabalhistas e demais direitos, o Congresso Nacional conseguiu a proeza de aprovar a emenda 95 que suspende a Constituição por 20 anos”, frisou Bercovici se referindo à aprovação da PEC 55, hoje Emenda Constitucional 95, que congela os investimentos públicos por 20 anos, afetando principalmente o orçamento das área sociais, como saúde e educação.
“A Constituição de 88 não vigora mais. Não existe mais. Está suspensa por 20 anos. O que tínhamos de garantia mínima de aplicação de saúde, educação, e todos os setores de direitos sociais e políticas públicas, acabou. É uma emenda igual a emenda aprovada em 24 de março de 1933 na Alemanha chamada Lei de Plenos Poderes, que deu ao então chanceler, no caso Adolf Hitler, o poder de suspender a Constituição de Weimar, a primeira constituição social da Europa, que previa direitos sociais, a reforma agrária, o direito à educação, à saúde, à sindicalização”, comparou.
“Nós vivemos um assalto oligárquico à Constituição em nome da governabilidade, equilíbrio financeiro e fiscal. Deixamos de levar em conta os direitos básicos do cidadão”, apontou.
O advogado e deputado constituinte Aldo Arantes falou sobre a violação dos direitos fundamentais no que tange a ampla defesa e o contraditório, princípios constitucionais. Para ele, esse ataque evidencia o “desmonte do Estado nacional e a prevalência dos interesses do mercado”.
“O estado vai perdendo as condições de gerir e vai se subsumindo às condições do capital. Existiu um golpe institucional, não sob a lógica da força. No estado ditatorial o que predomina é a coerção. No estado democrático burguês são utilizados outros instrumentos”, afirmou.
“Modernizar” a exploração do trabalhador
No período da tarde, os participantes do debate apontaram as falácias do discurso do governo Michel Temer. Para eles, o argumento de que é preciso “modernizar” a legislação trabalhista para gerar mais empregos encobre o real objetivo da reforma: flexibilizar a lei e ampliar a exploração do trabalhador. De acordo com a ministra do TST, Delaíde Arantes, a saída para a crise está na economia, não na precarização do trabalho.
A investida do atual governo contra os trabalhadores inclui, além de medidas como a reforma da Previdência, os projetos de Lei 4302/98, que libera a terceirização irrestrita, e 6787/2016, que estabelece que as negociações coletivas podem se sobrepor à legislação, mesmo que para retirar direitos. Isso significa que conquistas como o 13º salário e as férias, por exemplo, já garantidos na lei, podem voltar à mesa de negociação.
Delaíde apontou uma tentativa de acabar com a Justiça do Trabalho, “quebrar a espinha dorsal” da Consolidação das Leis do Trabalho e desmoralizar a política. Para ela, trata-se de mais um movimento em busca de implementar o neoliberalismo no país. “Faz parte do esquema do neoliberalismo para implementar sua política de mercado. Em todo lugar foi assim”, disse, ao participar do debate.
Segundo Delaíde, os setores que agora apoiam a reforma trabalhista de Temer são os mesmos que criticam a Justiça do Trabalho desde a sua implantação. “Esse é o segmento que, quando se estenderam os direitos aos trabalhadores domésticos, dizia que haveria desemprego em massa. Os mesmos que, depois das conquistas da Constituição de 1988, diziam que empresas não teriam mais condições de oferecer emprego”.
A ministra ressaltou que, hoje, já é permitido que o negociado se sobreponha ao legislado, desde que para estabelecer benefícios ao trabalhador, para além da legislação. “A tentativa, agora, é para negociar aquém do que diz a lei”, prejudicando o trabalhador, disse.
Ela desconstruiu a ideia que o governo tenta passar de que a legislação trabalhista é responsável pelas dificuldades econômicas pelas quais o país passa, uma vez que tornaria mais onerosa a manutenção dos empregos. “A saída para a crise tem que ser encontrada na economia, não na precarização do trabalho”, foi taxativa.
Para comprovar que os direitos dos trabalhadores não impedem o país de crescer, ela lembrou o período em que a economia do país ia de vento em popa, há apenas alguns anos. “Tivemos uma fase de praticamente pleno emprego. A economia ia bem e tínhamos essa mesma legislação trabalhista e essa mesma Justiça do Trabalho”, afirmou.
Delaíde destacou que, nas relações entre capital e trabalho existe uma desigualdade muito grande. As partes e a legislação existem para equilibrar o jogo. “Os ministros do TST estão sendo acusados de proteger os trabalhadores. Mas nós não protegemos trabalhadores, nós aplicamos a legislação e a jurisprudência. Esse ataque faz parte de um intento de desmantelar o sistema jurídico processual trabalhista vigente”, denunciou.
Ela chamou a atenção para o poder de influência da mídia tradicional no debate sobre as reformas. “Falamos aqui nesse auditório para 200 pessoas. À noite, William Bonner e Renata Vasconcellos falam na Globo para 30 milhões, sempre a favor das reformas e de tudo que é proposto pelo governo”.
A ministra apresentou a relação de temas mais recorrentes nas estatísticas de 2016 do Tribunal Superior do Trabalho. Em primeiro lugar, estão os processos relacionados às verbas rescisórias (ou seja, trabalhadores despedidos que não receberam seus direitos); em seguida, vem a ausência de concessão de intervalo entre a jornada, repouso e alimentação (algo que atenta contra a segurança e a saúde do trabalhador); em terceiro lugar, aparecem os processos por horas extras.
Apesar de, no Brasil, 60% dos empregos serem ofertados por micro e pequenas empresas, no topo da lista dos principais litigantes estão a União, Estados e Municípios, bancos, grandes frigoríficos e grandes redes de supermercados, respectivamente.
Segundo ela, trata-se de uma realidade que as mudanças propostas por Temer devem agravar. “A experiência do contrato temporário em outras empresas mostra que isso só precarizou o trabalho e não gerou novos empregos. As empresas despedem os efetivos e contratam os temporários. Só precariza”, reiterou.
“A proposta [de Temer] é de Estado mínimo para o povo e os trabalhadores, mas não para as teles, as grades redes de televisão, nem para o sistema financeiro”, disparou.
Resistir a todo custo
Para o presidente da CTB, Adilson Araújo, as mudanças que o governo propõe são, na verdade, uma “contrarreforma”, que, sob o argumento da “modernização”, visa “acabar com a legislação trabalhista”.
Segundo ele, trata-se de um processo que está relacionado à virada política vivenciada pelo país. “O golpe contra Dilma significou um golpe do capital contra o trabalho”, disse. “Por trás da nuvem da modernização, nada mais se esconde além da flexibilização e da precarização. A lógica é jornada maior, salário menor”, criticou.
Segundo ele, não há como sustentar a ideia de que aumentando a exploração do trabalhador será possível criar mais empregos, aumentar salário e construir um ambiente mais saudável para a classe trabalhadora. “Dizem que as mudanças são para gerar empregos, mas é a velha cantilena. A reprodução de um contrato precário de trabalho não vai gerar emprego nenhum, pelo contrário, vai levar a demitir. E vamos criar um exército de trabalhadores com piores condições, adoecidos, vítimas de acidentes graves”.
Araújo avaliou que foi justamente no inverso – a melhoria das condições de vida do trabalhador – que contribuiu para o crescimento do país durante o governo Lula. “Chegamos ao patamar do crescimento chinês. Os 7,5% de crescimento do PIB de 2010 são o somatório de geração de emprego, ampliação da renda, valorização do salário mínimo. Isso foi empoderando o Brasil. Chegamos a 2014 com apenas 4,5% de trabalhadores sem empregos, uma das menores taxas do mundo”.
Na sua fala, o sindicalista questionou o que aconteceu para o cenário mudar tão rápido. “Faltou um projeto. Ficamos devendo o debate das reformas. Porque, se tivéssemos feito, não estávamos correndo os riscos que estamos hoje”, afirmou.
O presidente da CTB fez uma autocrítica, ao avaliar que, durante os governos do PT, o movimento sindical deveria ter feito mais pressão por novas garantias para o trabalhador. Como exemplo, ele citou a regulamentação do direito a greve dos servidores públicos.
Segundo ele, o atual ambiente de ataque aos direitos é complexo e desafiador para os trabalhadores. “O tempo fechou, enfrentamos um tsunami. Como nos comportar? O movimento sindical precisa fazer uma releitura. Ficamos devendo mais pressão. A classe trabalhadora é a principal força motriz no processo de transformação. A gente devia ter tido mais atitude, abraçado a justiça do trabalho, ser radicais na postura. Agora, é preciso resistir a todo custo”, encerrou.
Desvirtuando a negociação coletiva
O presidente da Abrat, Roberto Parahyba, sublinhou, durante o debate, o cenário já difícil em que se insere a reforma trabalhista de Temer. Ele destacou que o Brasil continua a conviver, por exemplo, com o trabalho infantil e o trabalho análogo à escravidão. E apresentou números que refletem a discriminação de gênero e raça. Não brancos, mulheres e jovens são maioria entre os terceirizados e trabalham mais para receber menos que os celetistas.
Segundo ele, mesmo com esta “triste realidade”, o Brasil de Temer segue “na contramão da história” e daquilo que está dito na constituição sobre os direitos aos trabalhadores.
Parayba centrou sua fala no projeto que coloca o negociado sobre o legislado. Para ele, a proposta em debate no Congresso desvirtua a própria natureza da negociação coletiva do trabalho, ao permitir que ela seja utilizada para retirar direitos.
“Todo mundo é a favor de negociação coletiva. Mas isso não autoriza a conclusão de que há espaço, no âmbito infraconstitucional, para a edição de uma lei que desfigura a própria natureza da negociação coletiva, que é promover a melhoria das condições sociais dos trabalhadores. Usar a negociação coletiva para piorar e rebaixar a condição de vida e trabalho das pessoas descaracteriza a razão de ser da negociação coletiva”.
De acordo com o advogado, a negociação coletiva é um instrumento que existe para promover a democratização de riqueza no âmbito da sociedade civil e a inclusão socioeconômica dos trabalhadores. “Você não pode simplesmente rasgar esse papel para transmutar sua essência, para ela virar um mecanismo de rebaixamento das condições dos trabalhadores”.
O presidente da Abrat defendeu que, ao invés de fortalecer o instrumento da negociação coletiva, o objetivo final do projeto é mesmo reduzir direitos trabalhistas.
Um aspecto observado por Parahyba é o fato de que, para fortalecer a negociação, teria de haver igualdade entre os entes contrapostos. Isso implicaria no fortalecimento dos sindicatos.
“Quando se fala em negociação coletiva, implica em adotar o princípio da liberdade sindical e aprendemos que, para isso, tem que impedir atos antissindicais, tem que viabilizar exercício da atividade sindical, impedir a influência indevida do empregador sobre o empregado. Tem que ter medidas protetivas, que não existem no Brasil”, ressaltou.
O evento prosseguiu na sexta, intervenções de Cezar Britto, ex-presidente da OAB, o presidente da Comissão de Direito Sindical da OAB-SP, Cesar Augusto de Mello, além do ex-ministro Carlos Gabas e Sérgio Pardal Freudenthal, especialista em Direito Previdenciário.
No sábado, o seminário abordou temas como abuso de autoridade e prerrogativas da advocacia, com Ricardo Toledo (OAB São Paulo) e Juarez Cirino dos Santos, advogado criminal e presidente do Instituto de Criminologia e Política Criminal (ICPC).