Pesquisas não podem substituir as ruas
O Datafolha serviu para a mídia jogar com os números e tentar esfriar os ânimos que se elevaram com os resultados do MDA e do Ibope. As pesquisas e as interpretações que se fazem delas são partes do arsenal de cada candidatura, mas esse dado remete à constatação de que desde a volta das eleições com regras democráticas há vários exemplos de resultados que não corresponderam aos números dos institutos. Nessa campanha há o considerável componente de que o Ibope e o Datafolha trabalham com o Grupo Globo, useiro e vezeiro de manipulações.
É preciso avaliar esse contexto também com o fato de que o Grupo Globo foi uma espécie de abre-alas da marcha golpista que culminou no impeachment fraudulento da presidenta Dilma Rousseff em 2016. Só esse dado já recomenda tremenda cautela; os resultados devem ser lidos de forma crítica. Pode-se agregar ainda que a mídia e a direita em geral seguem o enredo do Grupo Globo, interpretando as pesquisas com indisfarçável predileção pelas candidaturas do seu campo político e ideológico. Nesse caso, a partir do resultado do Datafolha, é visível a tentativa de criar animosidade entre as candidaturas progressistas, notadamente de Fernando Haddad e Ciro Gomes, um canto da sereia de elevados decibéis.
É facilmente perceptível a tática de negar que os números vigorosos da chapa Fernando Haddad-Manuela d’Ávila são sustentáveis. Usam o recurso de ignorar a base que impulsiona essas candidaturas desde que elas foram oficializadas em 11 de setembro: a transferência dos votos que seriam do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda em fase de transição. A intenção é pôr em dúvida a solidez da tendência de Haddad no segundo lugar que se irrompeu com menos de dez dias de campanha efetiva. Mais ainda: a projeção dos cenários para o segundo turno mostra que sua candidatura empata numericamente com a de Jair Bolsonaro, além de ser a única que ostenta tendência de crescimento.
As pesquisas mostram que Ciro Gomes está estacionado na faixa entre 11% e 13%, embora se mantenha competitivo no segundo turno. Na direita, fora Bolsonaro a tendência é de queda, com Geraldo Alckmin estagnado no patamar de 9% e Marina Silva em declínio acentuado. Com esse retrato, a mídia semeia a intriga e estimula confronto autofágico entre Ciro Gomes e Fernando Haddad também para dificultar a transferência de votos no segundo turno. O objetivo é fazer Fernando Haddad ou Ciro Gomes chegar desgastado ao segundo turno. Há ainda a hipótese, embora remota, de inserir Alckmin nesse jogo.
São possibilidades que demandam lições. Não se pode superestimar os resultados das pesquisas, por mais que sejam animadores. Seria uma atitude desmobilizadora, soberba, cantar vitória antes do apito final. Os dados revelados devem ser tomados como balizas e indicadores de que o importante mesmo é a campanha nas ruas, de porta em porta, nas escolas, no trabalho, nas redes sociais e mais onde se puder falar com o povo, o tão falado corpo a corpo. Outra lição é que as candidaturas do campo progressista devem se manter no debate programático, de ideias, sem usar munição contra si mesmas, o que seria fazer o jogo da direita.
O fator decisivo nesse xadrez é a consistência da campanha da chapa PT-PCdoB-Pros, a que mais cresce nas pesquisas. O desafio é manter os ânimos em alta nessas duas semanas que restam, com uma espécie de mutirão nacional para fazer as candidaturas Fernando Haddad-Manuela d’Ávila chegarem ao segundo turno com robustos índices de intenções de votos. Essa tarefa exige ousadia e amplitude. Agendas intensas, mesmo sem a presença dos candidatos. Desprendimento para conquistar o voto e atingir amplas camadas do povo. Amplitude que requer: angariar mais e mais apoios e abrir pontes com setores que estão polarizados pelas candidaturas adversárias.