“O que esse governo quer para a Educação? Qual é seu projeto político para a Educação? Temos de fazer esse diagnóstico para refletir quais são os desafios de nossa luta, da resistência”, afirmou a líder da UJS. O diagnóstico, segundo ela, deve apontar para uma “forma eficiente” de resistir ao governo e impor “barreiras contra o avanço do conservadorismo”.

Carina avalia que, embora se trate de uma gestão neoliberal (como a era FHC) e com traços autoritários (como na ditadura militar), o governo atual vai além disso. Depois de abrir mão de fazer uma disputa programática nas eleições 2018, Bolsonaro precisou de menos de 150 dias para transformar sua administração num “desastre”, sobretudo para a Educação. 

“Há problemas, por exemplo, com o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e com o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica), além da questão da Lava Jato da Educação. Já temos pistas de como será esse governo”, diz Carina. O caso mais grave, no entanto, é o fato de Bolsonaro ter “eleito a Educação como o principal ministério para fazer sua disputa ideológica – a disputa contra o suposto marxismo cultural. Ele está aparelhando o MEC”, reforça a presidenta da UJS. 

Fake news

A estratégia bolsonarista para ganhar adesões a seu projeto obscurantista passa pela divulgação massiva de uma série de falácias. “Um dos desafios da oposição é justamente desconstruir essas falácias – as teses que o governo impõe à sociedade como suas verdades.” E quais teses, precisamente? Carina enumera quatro exemplos de fake news que os bolsonaristas têm espalhado desde o início do governo.

Primeiro, a tese da “balbúrdia” na universidade. A essa mentira, Bolsonaro se contrapõe com discursos, igualmente falaciosos, de “defesa da produção científica, defesa da produção do conhecimento”. Que a comunidade acadêmica “rompa os muros”, melhore o diálogo com a sociedade e informe melhor o que a universidade já oferece, sugere Carina. 

Segundo, o governo mente ao dizer que o Brasil gasta muito com Educação (5,7% do PIB). “Nosso investimento por aluno do ensino básico é de 54% do que investem os países da OCDE. Temos de ver quanto gastamos por aluno e qual o custo da qualidade de ensino.” Para Carina, um dos problemas fundamentais da Educação brasileira ainda é a falta de investimento.

 

Para Carina Vitral, Educação já provou seu potencial de formar uma frente ampla (Foto: Karla Boughoff/UJS)

Terceiro, não é verdade que exista uma suposta “doutrinação” nas escolas e nas universidades, ao contrário do que prega o movimento Escola sem Partido. Sem “doutrinação”, tampouco é possível falar em “libertar” essas universidades. “Se a gente for pensar nas universidades brasileiras – e eu posso falar ainda mais do meu setor, que é a Economia –, a maior parte é liberal, não marxista. E o que existe, no geral, é a pluralidade, a liberdade de ensinar”. Esta se torna, assim, o alvo do Escola sem Partido. 

A quarta falácia é a depreciação do espaço escolar, associada ao elogio ao ensino domiciliar. Na visão de Carina, não faz sentido renunciar à presença física do aluno com seus pares. “O ambiente coletivo é importante para o aprendizado. As contradições que existem nas escolas são, na realidade, as contradições já existentes na sociedade, pois a escola não é um ambiente isolado”, diz. “O debate de gênero na escola será importante na medida em que sociedade ainda for machista. Do mesmo modo, o debate sobre sexualidade é pertinente pois a gravidez na adolescência é enorme, junto à evasão.”

Interesses reais

Por trás das fake news na Educação, o governo tem um projeto baseado em dois pilares: o autoritarismo e a privatização. “O que está verdadeiramente em jogo é investir menos em Educação para dar espaço ao setor privado. E não se quer controlar o que se ensina numa escola pública – nem se quer controlar o que se produz numa universidade – por uma questão de qualidade. O governo quer controlar para produzir censura e obscurantismo, para ter uma universidade e uma educação com pensamento único”, acusa Carina.

Como alternativa, a presidenta da UJS propõe a realização de um debate de projetos com a sociedade – um “debate franco e razoável”, em torno de propostas e ideias para a Educação. A demanda é urgente porque os constantes ataques contra a Educação, o movimento estudantil e os professores chegam a partir do próprio Bolsonaro. “Ele sabe que o movimento educacional é muito mobilizado”, diz ela, que se declarou “orgulhosa” com a luta do movimento estudantil contra os retrocessos do governo.

“Se temos uma mensagem sobre a estratégia de desconstrução do governo Bolsonaro, isso tem de passar por bandeiras amplas, capazes de constituir maioria e derrotar esse governo. E a Educação já provou, desde o governo Temer, seu potencial de formar uma frente ampla – sua capacidade de ser uma pauta para dialogar com amplos setores, inclusive do bolsonarismo, e mobilizar a sociedade brasileira”, concluiu Carina.

Além da presidenta da UJS, a mesa “Educação ou Barbárie: A Volta da Idade Média?” contou com a participação da reitora da PUC-SP, Maria Amalia Andery, do deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL-SP) e do professor Fernando Cassio, da UFABC. O 5º Salão do Livro Político se estende até quinta-feira (30), com debates, apresentações culturais e a tradicional feira de livros, que, neste anão, reúne mais de 40 editoras.