Participaram do evento os ex-ministros do Trabalho: Antônio Rogério Magri (1990/1992), Paulo Paiva (1995/1998), Jaques Wagner (2003/2004), Ricardo Berzoini (2004/2005), Carlos Lupi (2007/2011), Miguel Rossetto (2015/2016) e Caio Vieira de Melo (2018). 

Todos criticaram a extinção da pasta do Trabalho e defenderam a importância do ministério enquanto uma instância para o debate, discussão e regulamentação entre a classe trabalhadora e os empresários.

Para o presidente nacional da OAB, Felipe Santa Cruz, o evento foi histórico, ao reunir representantes de praticamente todos os governos desde a redemocratização e por oferecer alternativas ao desmanche da legislação trabalhista.

“A OAB defende a livre iniciativa, está na Constituição Federal e entendemos que é importante dar maior dinamismo no mercado brasileiro. Acelerar a economia é fundamental e talvez seja a única saída neste momento. Agora, não podemos, sob o discurso liberal radicalizado, desconsiderar décadas do Direito do Trabalho e de luta da classe trabalhadora. A saída dessa crise não é a destruição de todo e qualquer paradigma de Direito Social, mas pelo contrário, a destruição pode nos remeter para um momento de crise ainda mais aguda. É esse quadro de barbárie que pode se estabelecer se as relações de trabalho forem desorganizadas”, afirmou Santa Cruz.

O presidente da Comissão Nacional de Direitos Sociais, Antônio Fabrício, destacou a importância do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho para a organização da sociedade brasileira. “Direito do Trabalho serve para criar um patamar mínimo civilizatório e para permitir a distribuição de renda na sociedade. Estamos vendo essas coisas serem tratadas sem a preocupação devida no Brasil. Outros países passaram por desregulamentação e tiveram que conviver com estagnação na economia e não podemos suportar esse quadro”, destacou Antônio Fabrício.

Ex-ministros defendem a pasta

Primeiro a falar, o ex-ministro Carlos Lupi (2007/2011), lembrou que além do fim do Ministério do Trabalho, existe atualmente um ataque aos sindicatos e associações de trabalhadores. “Que sociedade é essa em que se extingue o Ministério do Trabalho, porque o ‘mercado’ acha isso necessário, e ninguém se rebela contra isso. O fim da pasta e o fim dos sindicatos representam também o fim do direito à vida para muitos trabalhadores brasileiros”, afirmou Lupi.

Já Antônio Rogério Magri (1990/1992) afirmou que os ataques à Justiça do Trabalho também entram na mesma lógica de agressão aos direitos sociais. “A ânsia destrutiva contra os sindicatos é tamanha que querem acabar com eles, com o Ministério e com a Justiça do Trabalho. Isso é um imenso desafio para a classe que vive de salário. Tudo isso em nome de uma modernidade que aumenta a produtividade, mas que concentra a renda”, disse Magri.

Segundo o ex-ministro Paulo Paiva (1995/1998), o Ministério do Trabalho sempre foi um espaço de arbitragem importante na organização social, mas que isso se perdeu com o fim do órgão. “Lamentavelmente, se extinguiu a pasta, perdendo esse foco de interlocução entre trabalhadores, empregadores e o Estado. Isso é uma perda muito grande, principalmente numa sociedade desigual como a brasileira, que tem necessidade de uma participação do estado para defender os direitos fundamentais e garantir o fim do trabalho escravo, do trabalho infantil e da discriminação no mercado de trabalho”, assegurou Paiva.

O ex-ministro Jaques Wagner (2003/2004) chamou atenção para os desafios futuros sem a presença do Ministério do Trabalho na organização do mercado. “Já temos mais de 4 milhões de trabalhadores atuando sem nenhum tipo de regulamentação, a partir dos aplicativos. Estamos mudando completamente as relações de trabalho e não estamos nos preparando para o futuro. O desafio é grande e precisamos também falar sobre democracia e soberania das instituições no Brasil”, afirmou Jaques Wagner.

Para o ex-ministro Ricardo Berzoini (2004/2005), é preciso atuar para resgatar a proteção aos trabalhadores brasileiros. “Reunir os ex-ministros, a OAB e outras entidades é importante para rediscutir esse marco, sobre a necessidade de nós termos a proteção aos trabalhadores de uma maneira equilibrada, razoável, mas sempre levando em conta o desequilíbrio entre as partes. Ter uma pasta do Trabalho é um marco da história de todos os países civilizados”, defendeu Berzoini.

De acordo com ex-ministro Miguel Rossetto (2015/2016), o importante é encontrar soluções para a crise do mundo do trabalho. “Temos que construir capacidade de articulação para reverter esse quadro. É no mundo do trabalho que as sociedades definem seu padrão de igualdade e desigualdade. A sociedade brasileira já é extremamente injusta e esse processo em andamento amplia a desigualdade e a exclusão social”, assegurou Rossetto.

Por fim, o ex-ministro Caio Vieira de Melo (2018) disse que a presença de representantes de praticamente todos os governos pós redemocratização revela a preocupação com o desmonte do setor. “Essa reunião é um marco para dizer não a esse tipo de atitude de desmonte dos Direitos Sociais. Temos que nos unir e, a partir desse movimento, fazer renascer o Ministério do Trabalho”, defendeu o último ministro do Trabalho antes do fim da pasta.

Carta dos ex-ministros do Trabalho

Ao final do evento foi lida e assinada uma carta defendendo a importância do Ministério do Trabalho como um órgão de Estado, não de governo, responsável por definir normas relativas à segurança, combater o desemprego e o trabalho escravo. A publicação também constitui um fórum permanente de ex-ministros da pasta, com objetivo de criar um diálogo permanente para debater sobre o futuro do mundo do trabalho.

Confira abaixo a íntegra da carta:

Os ex-Ministros do Trabalho, registraram, na Sede do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, em encontro realizado em 13 de agosto de 2019, as suas opiniões, manifestações e convergências, com o propósito de assentar ideias comuns que sirvam ao propósito de esclarecer a sociedade brasileira.

O Ministério do Trabalho e Emprego, órgão de Estado e não de governo, reclama sua existência e autonomia, a dirigir e fortalecer a política de emprego, o Sistema Nacional de Emprego (SINE) e proteção dos postos de trabalho digno, a formular as ações de combate ao desemprego, ao trabalho precário, propondo política sempre voltada à proteção dos postos de trabalho e da dignidade da pessoa humana.

Como órgão de Estado, deve o Ministério do Trabalho ter e possuir a competência para definir as normas relativas à segurança e ambiente do trabalho, com lastro em elementos técnico-científicos. A fiscalização do cumprimento de todas as normas do trabalho, por equipe especializada composta por técnicos do próprio Ministério é um elemento de garantia do cumprimento da legislação especial que se construiu ao longo das décadas para a proteção ao trabalho, como assim impõe a Constituição da República.

O combate ao desemprego, um dos principais males da organização social, implica investimentos nas políticas de trabalho, bem como o prestígio a todas as modalidades, que estejam conformes à Constituição Federal, aos valores sociais do trabalho, da livre iniciativa, cumprindo os objetivos fundamentais da República ali previstos, com geração de facilidades para o bom desenvolvimento de todas as atividades empresariais que mantenham relações saudáveis com o trabalho.

A escravidão é chaga que marca o passado histórico, tem seus resquícios presentes e precisa ser extirpada em futuro breve, não se justificando qualquer medida de distensão do combate às formas modernas análogas à escravidão. Afirmar uma política consistente de combate ao trabalho escravo e infantil é absolutamente imprescindível, assim como ampliar os investimentos em qualificação profissional para fomentar a empregabilidade da classe trabalhadora.

A desconstrução do arcabouço previdenciário não oferece perspectiva de futuro para o país. Ao contrário, as últimas medidas anunciadas merecem fundadas críticas, que transcendem ao partidarismo, pois implicam a degradação do quadro atual já grave da distribuição do trabalho no país.

O fim do Ministério do Trabalho é simbólico para marcar o início do obscurantismo.

É preciso resistir. Separar, nas propostas alusivas a um mundo do trabalho em transformação, joio de trigo. Proteger em justa medida o trabalho, reconhecendo o seu caráter dinâmico, é o grande desafio dos dias atuais.

No entanto, nada mais estático, menos estético, mais retrógrado, mais antigo e anacrônico do que postular a involução das relações do trabalho até o nascedouro do ramo do Direito. Restituir as relações do trabalho ao Direito Civil é retroceder séculos, fazer a cronologia da evolução humana retroceder.

Fonte: Assessoria de comunicação da OAB