Estudo analisa tributação dos mais ricos para alavancar a economia
O Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made), da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, divulgou estudo que discute como a tributação dos extratos sociais mais ricos para a transferência de renda às camadas mais pobres pode servir como instrumento de recuperação da atividade econômica, beneficiando a todos. Assim, o estudo procura quebrar as enormes resistências sociais, políticas e governamentais em criar novos impostos para uma parcela da população bancar a renda dos mais pobres.
Um dos objetivos do estudo é justamente ampliar o número de apoiadores de medidas como essa e mostrar que a tributação do 1% mais rico no imposto de renda beneficia todo o resto da economia, “mas, ainda assim, o 1% tem muita voz no debate público, muita capacidade de garantir opiniões fortes em jornais, em articuladores de opinião, então acho que parte da resistência vem daí”, afirma Rodrigo Toneto, mestre em Economia pela FEA e pesquisador do Made. O estudo foi desenvolvido junto com os pesquisadores Theo Ribas e Laura Carvalho.
O estudo partiu da base de dados da última pesquisa de orçamentos da renda familiar, feita entre 2017 e 2018 e que calcula o consumo no nível individual durante esse período. Enquanto os 10% mais pobres gastam cerca de 90% da sua renda adicional em consumo, o valor cai para 24% entre o 1% mais rico.
Com isso, o estudo simulou os impactos de um programa social para demonstrar que distribuir renda justamente para os extratos sociais que movimentam o consumo, sem aumentar o déficit público, dispara uma série de reações em cadeia, chamados “efeito multiplicador”, que possibilita que essa política seja um instrumento de recuperação econômica.
Toneto resume que a diferença entre o quanto gastam os extratos mais pobres e os mais ricos, permite que, mesmo que você tire renda dos mais ricos para transferir para os mais pobres, o topo da pirâmide acaba sendo beneficiado pelo crescimento da economia como um todo.
Ao olhar para o imposto de renda e selecionar o 1% mais rico (R$ 24 mil per capita por mês), o economista diz que a alíquota efetiva de imposto de renda varia de 2% a 5%. Toneto propõe que a alíquota efetiva de imposto de renda dos mais ricos seja elevada para cerca de 15%, para assim garantir que um programa distribuísse R$ 125 a todos os brasileiros pertencentes ao grupo dos 30% mais pobres, entregando a uma família de quatro pessoas R$ 500 a partir desse mecanismo de transferência.
“Essa mera alocação de um lugar para o outro é capaz de gerar R$ 108 adicionais na economia, a cada R$ 100 transferidos e, no longo prazo, isso é considerado efeito multiplicador”, explica Toneto. Utilizando o desenho do Auxílio Emergencial de 2020, os economistas calcularam que cada R$100,00 pagos através do programa aumentaram a renda agregada em R$140,00. Com isso, o estudo estima que, uma mudança como essa na atual estrutura da economia brasileira, poderia implicar num PIB 2,4% maior do que é hoje.
Segundo Toneto, o estudo demonstra que há muita renda não tributada, o que revela um espaço grande para tributação dos mais ricos. Mas existem também formas diferentes de fazer essa tributação, que precisam ser avaliadas em sua eficácia.
Uma dessas formas de colocar a tributação dos mais ricos em prática seria retirar deduções do imposto de renda sobre plano de saúde e educação ou tributação de lucros e dividendos.
O fato do estudo focar no 1% mais rico, quando poderia ampliar para os 10%, por exemplo, foi justamente porque esse extrato em que o quanto paga de imposto é menor do que a turma imediatamente anterior na distribuição renda. “Claro que vai haver um ajuste na capacidade de consumo desse 1%, mas se tem um benefício na redução da desigualdade e aumento do crescimento, algo que reduz a violência da qual esse 1% também é alvo”, afirma.
Toneto acredita que a conjuntura é favorável depois que o auxilio emergencial demonstrou que manter esses 30% na miséria é uma decisão política. “É um debate civilizatório, que deveria ser feito na reforma tributária. O estudo mostra que, num país desigual como o Brasil, talvez, a única forma de gerar crescimento econômico sustentável e ambientalmente responsável é garantindo renda para as parcelas mais pobres da população”.
“Tem gargalos estruturais na sociedade brasileira, seja do ponto de vista da renda, quanto dos serviços públicos, que representam oportunidades de desenvolvimento econômico, industrial e tecnológico”, completa.
O Centro de Estudos da Macroeconomia das Desigualdades reúne economistas e estudos para mostrar que as desigualdades são transversais, inclusive nas variáveis macroeconomicas em que os economistas não entram no tema, como desenvolvimento, crescimento, taxa de câmbio, taxa de juros, “que determinam e são determinadas”.
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Transcrição e edição de entrevista à Rádio USP