Em homenagem ao centenário do Partido Comunista Brasileiro (PCB), neste mês de março, o Centro de Documentação e Memória (CEDEM), da Unesp, que custodia o acervo do Partido, publica uma série de entrevistas com políticos e estudiosos do tema, buscando mostrar a visão daqueles que lutam por igualdade de oportunidades como ferramenta para alcançar a democracia plena.

O terceiro entrevistado é o deputado federal Orlando Silva, do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Na abertura da segunda entrevista, com a presidente do PCdoB Luciana Santos, foram explicadas as diferenças existentes entre PCB e PCdoB. Embora mantenham diferenças na forma de atuar, ambos reivindicam ser a agremiação fundada em 1922. suas diferenças táticas, estratégicas e de conceito 

O deputado federal Orlando Silva de Jesus Júnior foi ministro do Esporte nos governos de Luís Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Eleito deputado em 2014, foi vice-líder da Presidente Dilma Rousseff entre os anos de 2015 e 2016. Foi presidente da Comissão de Trabalho, Administração e Serviços Públicos em 2017, e líder da bancada do PCdoB em 2018. Foi relator da Lei de Migrações e da Lei Geral de Proteção de Dados. 

Leia entrevista a seguir:

CEDEM – Qual o significado do Partido Comunista para a democracia brasileira?

Silva – A história do Partido Comunista do Brasil se confunde com a história de lutas do povo brasileiro para conquistar e garantir a democracia, as liberdades e os direitos. Nos períodos de ditaduras ou restrições democráticas, os comunistas foram os primeiros a serem perseguidos, o Partido foi proscrito, dirigentes foram mortos, torturados, presos, exilados. Contudo, jamais deixou de lutar, organizar os trabalhadores e o povo. Nos períodos de maior abertura política, cresceu, participou de forma importante das constituintes de 1946 e 1988, tornou-se força política respeitada pelos mais amplos segmentos. Ou seja, o Partido Comunista é uma força imprescindível para a democracia brasileira.

CEDEM – Qual a relevância dos comunistas para a história política nacional?

Silva – A organização político-partidária dos comunistas no Brasil completa 100 anos ininterruptos, com a fundação do Partido Comunista do Brasil, então sob a sigla PCB. Desse grande tronco, muitas organizações se ramificaram, seja por divergências do próprio movimento comunista internacional ou por concepções distintas sobre o enfrentamento à ditadura. 

Mesmo em momentos de ilegalidade, de restrições para a atuação plena, os comunistas sempre disputaram importantes papéis políticos, participaram e ajudaram a organizar movimentos destacados, como a campanha O Petróleo é Nosso!, a entrada do Brasil na guerra contra o eixo nazifascista, a resistência às ditaduras do Estado Novo e Militar, a organização da Guerrilha do Araguaia, as campanhas pela Anistia e pelas Diretas Já, até os dias atuais. Isso sem falar na organização cotidiana do povo, através do movimento sindical, estudantil, dos movimentos sociais em geral. Essa luta permanente foi fundamental para a conquista de direitos e para evitar que sejam perdidos. 

O fato é que não é possível falar da política brasileira no período de mais de um século sem analisar a trajetória dos comunistas, do Partido Comunista, a leitura que fizeram sobre os diversos momentos críticos e a forma como agiram em cada um deles. 

CEDEM – A criação do PCB contribuiu com avanços para a sociedade brasileira. O senhor poderia falar mais sobre a influência do partido em questões que hoje parecem normais mas que foram postas em prática por causa da luta do PCB, como por exemplo os benefícios trabalhistas? 

Silva – Ainda antes da fundação do Partido, já havia comunistas na construção da greve de 1917. Foram as crescentes reivindicações operárias, sempre com grande participação dos comunistas, que redundou em muitas das conquistas realizadas na Consolidação das Leis Trabalhistas, por exemplo. Pouco se fala sobre isso, mas a proposta que garantiu a liberdade de religião e de culto como direito constitucional foi da lavra do então deputado federal comunista Jorge Amado. A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) foi originariamente proposta pelo intelectual comunista então deputado estadual Caio Prado Jr. Esses são alguns exemplos, mas a contribuição dos comunistas é bem mais ampla.

CEDEM – Qual a força política do partido na contemporaneidade?

Silva – Quando se debate esse assunto, há uma tendência de se olhar apenas para o tamanho do Partido no Congresso e nos governos. A meu ver, é uma leitura parcial, limitada. Exclusivamente por esse prisma, o PCdoB tem oito deputados federais, até recentemente teve representação no Senado e um governador de Estado. 

No entanto, é preciso um olhar mais amplo. Esse Partido com oito deputados sempre está representado em todas as listas de figuras mais influentes no Congresso Nacional, é uma das forças políticas mais respeitadas e atuantes. Um exemplo claro disso ocorreu recentemente na aprovação da lei das Federações Partidárias e depois na derrubada dos vetos do presidente da República a essa lei. Essa foi uma construção articulada principalmente pela bancada do PCdoB. 

Saindo do âmbito institucional, o PCdoB tem atuação destacada nos movimentos sociais. Há décadas, o Partido é a maior força política entre os estudantes brasileiros, liderando a União Nacional dos Estudantes (UNE), a União Brasileira de Estudantes Secundaristas (UBES) e a Associação Nacional de Pós-Graduação (ANPG). É a maior força na Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB), uma das grandes centrais sindicais do país. Além de ter ação destacada e permanente nos movimentos feminista, antirracista, pela reforma urbana, entre outros. Então, a influência política do Partido é grande, bem maior que sua presença no parlamento.  

CEDEM – Qual o significado da preservação da memória para os comunistas?

Silva – A preservação da memória é fundamental para a sociedade como um todo. Como diz a canção do artista Paulinho da Viola, “quando penso no futuro, não esqueço meu passado”. Olhar a história do país e também do movimento comunista, analisar seus acertos e erros, é uma pré-condição para projetar o futuro, pensar e lutar por um projeto nacional de desenvolvimento que reconstrua o Brasil.

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O CEDEM custodia o acervo de Astrojildo Pereira e o Fundo do Partido Comunista Brasileiro.