Petrobras está exposta a ataques em tempos de guerra e transição global
Seminário sobre desmonte do setor energético discute como a Petrobras chegou ao patamar de descontrole estatal sobre sua missão de beneficiar o país, para garantir lucratividade a acionistas estrangeiros. Especialistas apontam necessidade urgente de mudanças de rumos para enfrentar o cenário de turbulências globais e reorganizar a indústria nacional.
A Fundação Maurício Grabois, através da Cátedra Claudio Campos, começou nesta segunda (23) o Seminário “O Desmonte do Setor de Energia – Petrobras e Eletrobras – e os Caminhos para a sua Reconstrução”. O debate aprofunda o tema da crise do setor energético e os desafios para a sua recuperação.
O tema guarda atualidade, dada a tentativa de desmonte realizada pelo atual governo, mas também vai estar muito presente no processo eleitoral. Por isso, o objetivo é reunir elementos sobre a situação das duas empresas, para organizar a defesa durante a campanha e sua reconstrução posterior.
A criação da Petrobras (1953) e da Eletrobras (1962) foram marcos fundamentais na afirmação da soberania nacional, superando a ineficiência das companhias estrangeiras que aqui operavam, e permitiram um grande salto no desenvolvimento do país.
Além de conhecedores da real situação dessas duas empresas, os pesquisadores tiveram a experiência de dirigir ou trabalhar nelas ou na agência reguladora (caso da Petrobras).
Veja mais detalhes e a íntegra do debate ocorrido na TV Grabois:
Leia uma síntese das exposições:
Controle estatal
Após a apresentação da coordenadora da Cátedra Claudio Campos, Rosanita Campos, o seminário foi aberto pelo presidente da Fundação Maurício Grabois, Renato Rabelo, que apontou a dimensão da tarefa de reconstrução nacional a partir de uma plataforma programática para a federação partidária dessas eleições. Ele observa como questão estratégica e estrutural do atual governo o desmonte do setor energético para entrega a setores privados internacionais.
A reconstrução da Petrobras demanda retomar a distribuição e refino, privatizados nos últimos anos, tornando incontornável a regulação de preços. Renato também defende a recomposição da participação acionária estratégica da União no sistema Petrobras, com industrialização, construção de cadeia produtiva e desenvolvimento de conteúdo nacional com pesquisa em inovação e tecnologia.
No caso da Eletrobras, os consumidores serão penalizados pela desorganização do setor elétrico, descontrole de preços, assim como o país perde soberania e segurança energética.
Governo de reestatização
O mediador Jorge Venâncio apresentou o geólogo Guilherme Estrella, com atuação na Petrobrás de 1965 a 1994. Seus cargos mais importantes foram gerente de Exploração da Costa Leste Brasileira, gerente de Exploração e Produção da Braspetro Iraque, diretor de Exploração e Produção e superintendente Geral do Cenpes (Centro de P, D & E da Petrobrás). Ele ainda é doutor honoris causa pela Universidade do Porto (Portugal) e Universidade Federal de Ouro Preto (MG), laureado com a Medalha de Ouro Pandiá Calógeras e o Prêmio Dewhurst do Conselho Mundial do Petróleo. Além de membro da Academia Nacional de Engenharia – ANE (Brasil) e da National Academy of Engeenering (NAE) dos EUA, Estrella é atualmente membro do Conselho Diretor do Clube de Engenharia e do Conselho Curador da Fundação Gorrceix da Escola de Minas da UFOP-MG.
Ele começou apontando as enormes riquezas geológicas do país que apontam o Brasil com um grande destino nacional. Em seguida, mostrou como o imperialismo norte-americano e europeu disputaram recurso energéticos desde o século XIX, enquanto o Brasil ainda era movido à energia da mão de obra escrava.
A energia elétrica, a partir do potencial hídrico, foi toda importada da indústria americana. É com Getúlio Vargas que começa um processo de industrialização com atenção estratégica à questão energética. Ele descreve as turbulências golpistas desde o período getulista, com a estruturação da Petrobras, a partir da ótica da disputa internacional pelos recursos energéticos brasileiros.
Com o fim do socialismo soviético no leste europeu, o Consenso de Washington estabeleceu entre as obrigações dos países em desenvolvimento a privatização de todas suas estatais. Com Collor, Itamar e Fernando Henrique, as estatais começam a ser privatizadas em grande escala. Acaba com o monopólio estatal da exploração do petróleo, abrindo as bacias brasileiras à exploração estrangeira. Com a roupagem de fundo financeiro, a Petrobras passa a não querer mais correr riscos, como ocorreu com a interrupção no poço de Libra pela Shell, apesar de saber que há petróleo sob o sal.
Com o governo Lula, há a decisão política da Petrobras assumir o papel hegemônico no setor de petróleo e gás. Paralelamente, havia a decisão de integrar a Petrobras num sistema único, ao contrário da fragmentação do período FHC. Com a desconcentração da exploração em Campos, foram descobertos novos campos de pré-sal em outras regiões.
Com o golpe de 2016, a Petrobras é esquartejada e vendida ao capital internacional na forma da BR Distribuidora, os gasodutos e duas refinarias. Para ele, discutir a Petrobras é discutir o Brasil como ocupação colonial estrangeira. Como sair dessa? Em sua opinião, não adianta eleger o presidente Lula sem a firme disposição e contundente intenção de rever tudo que foi feito com a Petrobras. Para ele, não adianta assumir a gestão desse arremedo de estatal desmontado em sua capacidade de exploração produção, distribuição, refino, gasodutos, biocombustíveis, fertilizantes e termelétricas como um sistema.
Um estatuto contra o acionista majoritário
Magda Chambriard é engenheira civil, formada pela UFRJ, mestre em engenharia química pela Coppe/UFRJ e tem especialização em engenharia de petróleo pela Petrobras, onde atuou por 22 anos. Também exerceu diversos cargos na Agencia Nacional do Petróleo, onde atuou até 2016, inclusive como diretora geral. Tem atuado também na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro como consultora.
Ela posicionou o Brasil como 9o. maior produtor de petróleo do mundo, o 8o. maior consumidor, mas um país que consome per capita menos energia que a média mundial. São 4,5 vezes menos que os EUA e 2,5 vezes menos que a Alemanha, o que revela a distância do país dos países mais desenvolvidos.
O Brasil tem muita energia renovável contra os 83% do mundo de matriz energética de combustíveis fósseis e apenas 13% de renovável; ao passo que o Brasil tem 46% de energia renovável. Um esforço imenso, com apoio da Petrobras, para chegar a isso, segundo ela.
Com a pandemia e a guerra na Ucrânia, os questionamentos sobre a necessidade de manter essas estatais e suas cadeias produtivas revelaram uma resposta clara. A Petrobras se revelou um ativo estratégico para o desenvolvimento nacional pela exploração e refino de derivados de petróleo. Ela sugeriu o que seria do Brasil sem essa cadeia produtiva da Petrobras no oitavo maior mercado consumidor do mundo. Produzidos pouco mais de 3 milhões de barris de derivados e importamos 600 mil barris por dia, um quinto de todo derivado que consumimos no Brasil.
Ela mostra que o Brasil exporta parte de seu petróleo bruto, mas paga por uma logística complicada de exportação. Com as refinarias ociosas, o diesel que é o derivado mais utilizado já representa importando de 25% do consumo, num momento de alta contínua de preços. Isso impacta na inflação, pois “a cesta básica anda sobre rodas” a diesel com acentuada dependência internacional.
Magda observa que, desde 2016, o governo desonerou a estatal de abastecer o país, instaurou o regime de paridade de preços internacionais (PPI), enquanto os executivos da empresa se sentem “homens de negócios” desobrigados de se preocupar com as necessidades do país que garante a sobrevivência da empresa. Hoje, a imprensa especializada se alarma quando a Petrobras passa mais de 50 dias sem reajustar preços, quando essa volatilidade já foi questão de meses e anos.
Estamos praticando preços internacionais por conta de 25% de importações de diesel, quando 75% de derivados como esse são refinados no país. O pior é que esse preço internacional é aplicado num diesel, explica ela, que não envolve transporte e seguro, por exemplo, porque já está internalizado. A engenheira considera fundamental refutar esse PPI que teria que ser feita de outra forma para não assombrar o consumidor.
Ao analisar o estatuto interno da empresa, reformado em 2018, ela destaca que os acionistas minoritários ganharam poderes contra a atuação governamental, que passa a ficar restrita à cobertura de prejuízos em caso de sua atuação. Ela questiona porque não se inverte a visão para lucro, considerando que a atuação no pré-sal é uma vantagem competitiva e não é quantificada como benefício.
Quando se fala em aumentar o intervalo de reajustes, imediatamente se grita prejuízo ao acionista. “No frigir dos ovos, quantificando e fazendo o encontro de contas entre prejuízos e benefícios, o governo brasileiro e a sociedade como um todo já removeram da frente da Petrobras diversos empecilhos ao seu crescimento e garantiram que essa empresa crescesse e enfrentasse todo os desafios que ela enfrentou ao longo de seis décadas”, afirma.
Magda considera inadmissível a estatal vir a público ameaçar desabastecimento, como já fez, e também exigir que o acionista majoritário tenha que pedir autorização para o minoritário para fazer o que precisa ser feito. “Esse estatuto precisa ser revisto”.
A opção pelo desabastecimento
Carlos Felipe Rizzo é engenheiro civil, formado pela UFF, com MBA de Energia pela FGV e MBP pela Coppe, UFRJ. O consultor é ex-membro do Conselho da Refinaria de Manguinhos, ex-presidente da Doris Engenharia Brasil e ex-diretor de Relações Institucionais da Keppel Fels Brasil.
Ele aponta as disputas econômicas entre EUA e China, que são catalisadas pela guerra da Ucrânia. Em sua análise, o objetivo é reduzir a forte influência energética da Rússia sobre a Europa e também afastá-la da China, para aumentar o mercado consumidor americano entre os 700 milhões de europeus.
Ele diz que ainda não havia visto uma imposição de sanções que impactasse tanto na redistribuição do fluxo de petróleo, quanto no fluxo econômico como um todo. A Europa passa a se abastecer de petróleo no Oriente Médio com previsão de racionamento de diesel para os próximos dias, o fluxo de petróleo russo vai para a Ásia e os EUA terão racionamento de diesel em julho na costa leste. Isso se refletirá em problemas de abastecimento os próximos meses no Brasil, com forte aumento de preço. “O mundo entrou em modo de guerra, com modificação de fluxo logístico de combustíveis e aumento de utilização de legislação extraterritorial pelos EUA contra oligarcas russos, como fizeram com a Lava Jato no Brasil”.
Rizzo alerta para o fato da Petrobras estar extremamente exposta a este tipo de legislação extraterritorial. Para todos os efeitos, ela é uma empresa norte-americana como revelaram as pressões da Lava Jato e da legislação dos EUA sobre seus acionistas minoritários com ações na Bolsa de Nova York. Isso já vem ocorrendo com a Vale do Rio Doce, a partir dno episódio em Brumadinho.
Ele considera que este é o momento de avaliar se a Petrobras não deveria retirar suas ações das Bolsas de Nova York e Londres, que atacam empresas estrangeiras sob alegação de combate à corrupção, inclusive na Europa. Ou, ao menos, deveria reavaliar seu capital aberto no mercado americano.
A pandemia de covid também demonstra, na opinião dele, que o modelo antigo de industrialização “just in time” com produção concentrada no Oriente, capitulou. Para ele, com cenário de guerra e mudanças na globalização comercial, qualquer modelo de desenvolvimento que se pretenda soberano precisará considerar pelo menos 30% de produção industrial local. É o que os EUA de Joe Biden vem fazendo ao estabelecer padrões mínimos de 60% de conteúdo local para um produto ser considerado americano. Enquanto o mercado financeiro ocupa a costa leste e a tecnologia domina a costa oeste, a indústria pesada volta ao centro dos EUA.
Na reorganização da globalização, estamos no quintal dos norte-americanos e nosso principal cliente do outro lado do mundo. Para ele, a relação com a China precisa ser modificada com investimentos em infraestrutura industrial local e ruptura com o teto de gastos. “Não haverá outro momento na década onde esse passo possa ser dado”, sentenciou.
O engenheiro também aponta a falta e “missão” da Petrobras, atualmente. A Petrobras deixou de ser uma “empresa integrada de energia” para se tornar “empresa de geração de valor para os acionistas”, missão introduzida por Castelo Branco para garantir a venda da BR Distribuidora. “Isso é o oposto do que precisamos com a Petrobras”.
Com o controle quase total do abastecimento do país, de acordo com Rizzo, a Petrobras não poderia deixar haver racionamento de diesel no país nos próximos meses. Ele menciona os 50% de estoques ociosos da empresa que não aumenta para não sair do ponto ótimo de lucratividade. “A empresa que controla 75% do produção de diesel no país opta por não mexer na sua participação com a proximidade do desabastecimento”, critica.
Ele ainda aponta a necessidade da Petrobras trazer grande quantidade de gás para terra para ajudar a reindustrialização do país e equilibrar custos.
Tijolos da reconstrução
O engenheiro agrônomo especializado em Petróleo e meio Ambiente, Francisco Nelson Castro Neves é ex-membro da direção da ANP – Agência Nacional do Petróleo. Mestre em Bioenergia, em 2016 assumiu a Superintendência de Abastecimento e em 2017 a função de Superintendente de Fiscalização e Abastecimento da ANP.
Francisco apontou a grandiosidade dos números e da estrutura da Petrobras e do mercado de combustíveis no Brasil, assim como sua capilaridade nos municípios. Um cenário que lhe permite ser otimista sobre o futuro do desenvolvimento energético do país, a partir de um governo comprometido com esse realinhamento.
Para ele, há três elementos para essa reconstrução do sistema. A garantia do abastecimento depende da redução da dependência externa com produção industrial própria. Uma estrutura de distribuição de qualidade ao consumidor também é outro elemento. O terceiro é a definição de preços fora do caos criado pela PPI.
Francisco defende a necessidade de disputar mercados externos, para além do mercado brasileiro, sem estar fragilizado. Ele também defende a atenção do governo aos biocombustíveis, assim como investimento na matriz de gás natural e biometano. Ele lembrou da importância dos PACs (Programas de Aceleração do Crescimento) criados por Dilma para suprir investimentos em infraestrutura. Os PACs implicavam em planejamento de cadeias produtivas no longo prazo, algo que não existe mais.
Ele também considera importante modernizar o arcabouço regulatório para garantir investimento privado, assim como fiscalização das empresas sobre seus compromissos públicos. A política de conteúdo local também foi um esforço da ANP para estimular a inovação.
Ele terminou criticando o mecanismo da PPI, que não é apenas o maior preço de paridade de compra, mas também todo tipo de despesa para transporte desse produto. “N˜ao é paridade de preço internacional, mas paridade de preço de importação, pois pressupõe que todo produto é importado, o que é falso, abusivo e desorganiza a atividade econômica do país no seu conjunto”, analisou, recomendando a denúncia.
Transferir renda do povo direto para acionistas
O engenheiro eletricista Fernando Siqueira é pós-graduado em petróleo e cursos de instalação no mar em Houston (EUA). Trabalhou como engenheiro na Petrobras por 25 anos e exerceu as funções de projetista, chefe de setor de projetos especiais, chefe da Divisão de Engenharia, do departamento de produção e superintendente de projetos na bacia de Campos e de Santos. Tem MBA em previdência complementar e é autor de vários livros sobre petróleo. Hoje é diretor da AEPET – Associação dos Engenheiros da Petrobras da qual também já foi presidente, e diretor do Clube de Engenharia. Foi presidente do Conselho Fiscal da Petros.
Ele começou apresentando a estratégia do Departamento de Defesa dos EUA, nos anos 1980, que é clara em impedir que países como o Brasil e o Mercosul, como um todo, se desenvolvam para não haver risco de coalizão hostil à potência americana, além de garantir acesso absoluto aos recursos. Ele observa que a Noruega saiu da pobreza para o desenvolvimento com a exploração do petróleo.
No governo Collor, a receita americana é aplicada a partir de documento detalhado do banco Credit Suisse, publicado pela Aepet, que apontava para a necessidade de dividir a empresa para privatização. Foi assim que Collor privatizou ativos da Petrofertil, Petroquisa e Petrominas, mas enfrentou resistências em dividir a Petrobras em unidades de negócios. Depois, parlamentares do centrão tentaram uma interpretação espúria da Constituição para quebrar o monopólio do petróleo, mas Itamar Franco ajudou a impedir isso.
A quebra do monopólio veio com Fernando Henrique Cardoso com a mudança do Artigo 5o. na Constituição, pela Emenda 9 que permitia atores privados a produção e a lei 9478, de Concessão, com os piores termos contratuais do mundo, além de vender 33% das ações na Bolsa de Nova York, por um preço mais de quatro vezes menor do que valia. Na gestão de Henri Philippe Reichstull (1999-2001), a empresa saltou de menos de um acidente por ano para 65 na série histórica. “Inclusive com o afundamento da plataforma P36 visava jogar a Petrobras contra a opinião pública para justificar a privatização”, analisou Siqueira.
Com a descoberta do pré-sal e o alerta dos diretores Sérgio Gabrielli e Guilherme Estrella, sobre a perniciosidade da lei da concessão, Lula criou um GT para mudar o marco regulatório. Foi quando sofreu pressão contrário do cartel do petróleo, da Shell, da Total, da Chevron e do Consulado dos EUA, mas ainda assim foi aprovada a Lei de Partilha. Depois, lamentavelmente, o senador José Serra (PSDB-SP) conseguiu aprovar seu projeto tirando a Petrobras da condição de operadora única.
Em maio de 2013, Joe Biden pressionou Dilma, pessoalmente, que acabou leiloando Libra, o terceiro maior campo do pré-sal numa negociação muito ruim, segundo o engenheiro. Depois, para não repassar o alto preço do barril para o consumidor, Dilma sofreu ataques por importar derivados e vender mais baratos para seus concorrentes. “Mas ela mostrou que é possível desvincular o petróleo do preço internacional”.
Com o escândalo do petrolão, criticada por não ver corrupção na estatal, a auditoria independente Price Waterhouse começou a fazer exigências atendidas por Aldemir Bendini, como a venda de ativos e a implantação da PPI. Com a queda de Dilma, Michel assume buscando orientações nos EUA, nomeando Pedro Parente para a estatal, logo depois. Ele retoma o plano de privatização de 2001, vendendo ativos a preços aviltados e oficializando a PPI.
Embora, R$ 6,5 bilhões dos R$ 8 bi de prejuízo do petrolão tenham sido recuperados, Parente vendeu ativos com prejuízos superiores de R$ 50 bi e sequer foi indiciado. O paradoxo continua com Castelo Branco, que assumiu continuando esse processo de prejuízos bilionários em leilões da ANPS, malha de gasodutos Norte e Nordeste e Carcará.
Quando FHC assumiu, o governo detinha 84% do capital social da Petrobras, mas Reichstul vendeu, em 2000, 33% das ações em Nova York por US$ 5 bi, ou R$ 9 bi, quando as ações deveriam valer R$ 100 bi. A participação do governo cai para 34% com o incentivo de FHC aos estados venderem suas ações. Com Lula, a participação subiu para 48% e com Bolsonaro, ao vender as ações em poder do BNDES e do Banco do Brasil, voltou a cair para 36,75%. Assim, 44% das ações estão na Bolsa de Nova York, com transferência direta da renda da população brasileira para acionistas privados com o alto custo dos combustíveis, atualmente.
Siqueira contou como é formado o preço do GLP, o gás de botijão. Segundo Sérgio Tojal, gerente da Petrobras, informou numa audiência no Senado, são 18% de ICMS, 32% para a Petrobras e 50% para o atravessador que só coloca no botijão e vende. “É uma imoralidade, pois 15% já seria remuneração altíssima pelo que fazem”.
Com a denúncia feita por ele, mexeram na estrutura e o ICMS baixou de 18% para 15%, o distribuidor caiu de 50% para 36% e elevaram a participação da Petrobras de 32% para 49%, com os lucros dos acionistas “absorvendo a imoralidade”. “Com minha proposta, poderíamos baixar de R$ 103 para R$ 65 reais o preço do gás, com remuneração decente para todos, reduzindo o lucro imoral do acionista com a participação da Petrobras”, explicou.
No caso do diesel, ele mostra que o custo de produção para a Petrobras é de um real pelo litro, que é vendido por R$ 3,17. “É uma extorsão em cima de um combustível com uma alta função estratégica para o transporte de pessoas, alimentos e produtos, portanto gerador de inflação”, diz. Para ele, não faz sentido a empresa lucrar mais de 50% no litro de diesel, com mais de 200% do preço de custo em detrimento do povo brasileiro para repassar ao acionista privado.
No caso da gasolina, a Petrobras recebe R$ 3,85 por litro, com ganho de 200% do preço da gasolina vendido na bomba. Reduzindo o lucro a 100% de remuneração dos investimentos, com folga, o litro da gasolina que está em R$ 7,3 em média, poderia ter preço total por litro de R$ 4,81, segundo os cálculos do engenheiro.
Siqueira ainda acusou as fake news espalhadas por Globonews e CNN de que o preço da Petrobras ainda está 11% abaixo do preço internacional 11%, assim como defendem que é bom privatizar para ter mais concorrência e os preços cairem. Ele demonstrou numa comparação que fez, que o preço em dólar nos países com monópolio (como Venezuela, Irã, Kuaite, Malásia, Iraque, Catar, Arábia Saudita e Rússia) fica abaixo de um dólar. A Petrobras cobra US$ 1,20. Já no países em que o combustível é fornecido por empresas privadas em concorrência livre (caso do Canadá, Japão, Coreia do Sul, Espanha, Bélgica, Dinamarca), os preços ainda estão muito acima da Petrobras.
“Embora Bolsonaro diga que tem menos de 50% de culpa sobre a inflação de combustíveis, ele tem 100% da culpa da alta do preço, porque nomeia os diretores picaretas, que fazem o jogo do mercado americano para vender os ativos”, concluiu.
Acionista é detalhe frente ao imperialismo americano
Após o debate, Siqueira complementou dizendo que a PPI não serve apenas a beneficiar acionistas. Para isso, bastava aplicá-la aos 20% de produtos importados. Para ele, a política de preços abusiva serve para colocar a sociedade brasileira, a partir da mídia, contra a Petrobras e garantir sua privatização.
A queda de 80% para 40% na rejeição à privatização é um indicador dessa percepção da população que culpa a empresa e questiona seu caráter estatal. Para ele, é preciso ficar claro que a Petrobras é uma instituição e que a culpa é da diretoria colocada pelo governo.
Na visão dele, o benefício ao acionista é um detalhe de uma lógica imperialista ainda mais brutal. A insegurança energética dos EUA, com seus 4% da população mundial consumindo 35% da energia produzida no mundo, é o motivo principal. Siqueira testemunhou no Iraque a morte de Sadam Hussein, assim como na Líbia, Anuar Kadafi também foi assassinado, para garantir a posse americana sobre o petróleo daquelas nações devastadas. “O fundamental é que os EUA querem a Petrobras e o pré-sal!”
“O petróleo poderia transformar o Brasil numa grande Noruega”, afirmou, observando o receio dos EUA em que o país se torne hegemônico na economia mundial. Ele salientou que a Noruega tem enormes dificuldades climáticas na agricultura, que demonstra a enorme viabilidade do Brasil no mundo.
Alavanca da industrialização
Ele ainda fez um depoimento sobre como a Petrobras tem o poder de alavancar a indústria nacional. Em 1972, quando Siqueira entrou na Petrobras, o general Ernesto Geysel autorizou a empresa a comprar, até pelo dobro do preço internacional, equipamentos nacionais para a empresa. “Com isso, ao percorrer indústrias afins, levando tecnologia, desenvolvemos 1.500 fornecedores de equipamento de petróleo, competindo com o estado da arte internacional, que geraram 3.600 subfornecedores, somando 5 mil novas empresas de produtos nacionais para petróleo, podendo fornecer até para outras indústrias”.
FHC isentou as empresas estrangeiras desse tipo de equipamento e manteve o ICMS para as nacionais. Com isso, a vantagem de 100% caiu para menos 28%, derrubando a competitividade das empresas e dizimando-as, hoje, tornando-se escritórios de representação de suas concorrentes internacionais. “A Petrobras é a maior chance que o Brasil tem de alcançar seu destino histórico no mundo”, concluiu.