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Novas pesquisas de economia política do desenvolvimento

9 de fevereiro de 2023

Aloisio Sergio Barroso apresenta artigo do economista da UFMG, Diogo Santos

Considero o jovem economista Diogo Santos uma de nossas promessas mais profícuas. Promessa, aliás, que já vem se realizando, pois vem investigando a economia política intensamente.

Mestre e doutorando em teoria econômica no CEDEPLAR, Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da federal de Minas (UFMG), a formação marxista – e mais ampla, como deve ser – vem contribuindo para suas análises em geral concentradas na relação entre finanças e indústria no Brasil.

Tema crucial e de “fronteira”, a problemática do desenvolvimento contemporâneo está sendo (teórica e politicamente) revolvida com as crises cada vez mais devastadoras advindas do capitalismo “financeirizado”. No centro e na periferia subdesenvolvida.

O abandono recente do programa neoliberal integral, em países da zona do euro e nos EUA, revela não somente o ocaso dessa fase sistêmica da economia do imperialismo, bem como a necessidade de novas respostas gerenciadoras de seus impasses profundos.

Qual o papel dos bancos públicos, do mercado de capitais na relação entre as empresas financeiras e não financeiras no Brasil? Neste artigo, importante, SANTOS examina, por exemplo, o poder das empresas financeiras sobre o mercado de crédito, utilizando-se para isso as variáveis margem de spread bancário e importância do mercado de capitais. E ainda, adicionalmente, olha o grau de coordenação nacional do sistema de crédito, “captado pelas variáveis de participação de bancos estrangeiros e públicos na posse dos ativos financeiros domésticos”. No método utilizado, os modelos foram estimados para uma amostra composta majoritariamente de países avançados de renda alta, e outro, formado exclusivamente por países emergentes.

O texto é denso e tecnicamente mais voltado para quem tem o domínio da literatura afim. Mas é uma contribuição investigativa que vale a pena passar a vista.

Poder das instituições financeiras sobre o mercado de crédito e acumulação de capital: uma abordagem a partir de Marx e evidências com modelos de dados em painel para países avançados e emergentes

Diogo Santos (UFMG)

Introdução

O sistema de crédito ocupa uma posição chave no processo de acumulação de capital na abordagem de Marx. É uma alavanca imprescindível para permitir a expansão da acumulação e ao mesmo tempo um elemento gerador de instabilidades. Entretanto, mais do que salientar sua importância, Marx propõe uma abordagem teórica a respeito dos fatores que condicionam as características principais do mercado de crédito, em especial a taxa de juros. Essa abordagem está alicerçada na concorrência no mercado de crédito entre empresas não financeiras (“capital em função”, nas palavras utilizadas por Marx em um nível de abstração teórica mais elevada), demandantes de crédito, e empresas financeiras (“capital portador de juros”), ofertantes de crédito.

O objetivo deste artigo é integrar a abordagem de Marx a respeito dos determinantes do mercado de crédito à investigação histórica feita por Gerschenkron (1962) e Zysman (2018) sobre as formas das interações entre setor financeiro e não financeiro para em seguida realizar uma investigação econométrica que contribua para a apreciação da atualidade e desenvolvimento da abordagem teórica proposta. Esse objetivo é buscado a partir das etapas descritas a seguir.

Na Seção 2, é realizada a etapa teórica desta investigação. Será apresentada a abordagem de Marx e outros sobre  relação entre sistema de crédito e acumulação de capital, origem e determinação da taxa de juros e desdobramentos da abordagem de Marx sobre a concorrência entre empresas financeiras e empresas não financeiras no mercado de crédito. Na Seção 3, a partir da apreciação de trabalhos clássicos de Gerschenkron (1962) e Zysman (2018), a investigação se volta para a experiência histórica dos países a respeito das formas assumidas pela interação financeiro-produtiva, isto é, entre empresas financeiras e não financeiras, no desenvolvimento industrial. Essa investigação é particularmente importante, para se elucidar as particularidades dos países emergentes em relação à constituição das interações financeiro-produtivas.

Na seção 4 é realizada a investigação empírica. São apresentados dois modelos econométricos de dados em painel com o objetivo de captar algum padrão na relação entre acumulação de capital e variáveis que possam servir como proxies do poder das instituições financeiras sobre o mercado de crédito. O primeiro modelo é implementado para uma amostra de países desenvolvidos de renda alta que contém os membros da OCDE e o segundo modelo é implementado para uma amostra de países classificados como emergentes. Por fim, são tecidas considerações finais.

2 A abordagem marxista da concorrência entre capital a juros e em função como determinante da configuração do mercado de crédito

2.1 Sistema de crédito e acumulação do capital

Na passagem a seguir tem-se claramente a medida da importância dada por Marx ao sistema de crédito:

o crédito oferece ao capitalista individual, ou a quem exerce esse papel, um poder absoluto, dentro de certos limites, de dispor de capital, propriedade e, portanto, trabalho alheios. […] O próprio capital […] passa a servir de simples base para a superestrutura do crédito (Marx, 2017, Cap. 27, p. 635).

O sistema de crédito é crucial para a acumulação de capital. Assim, os capitais individuais que a ele tem acesso, podem crescer para além dos limites impostos pela acumulação interna de fundos, pois o crédito funciona como uma alavanca financeira. O crédito “acelera o desenvolvimento material das forças produtivas” (Marx, 2017, p. 638). Em uma palavra, o desenvolvimento do capitalismo é inconcebível sem a existência do sistema de crédito.

Essa também é a interpretação de Marx feita por Campbell (2002). Para a autora, a função do sistema de crédito é romper barreiras à expansão da acumulação de capital. Para esta autora, a função primordial do sistema de crédito é concentrar os recursos da sociedade na forma de dinheiro e colocá-lo à disposição dos capitais individuais. E essa função é ampliada pela capacidade dos bancos de conceder crédito em volume acima do que ele possui em depósitos (multiplicador bancário) (Campbell, 2002, p. 215). Liberta-se, assim, os capitais individuais de se expandirem limitados pelos lucros alcançados nas fases anteriores.

Sobre este ponto, Marx trata do poder dos bancos de concentrarem dinheiro que não poderia atuar como capital monetário se estivessem dispersos, criando um “poder monetário” (Marx, 2017, p. 581). Marx então concebe um papel aos bancos que não é somente de intermediários entre poupadores e tomadores de empréstimos, pois exercem uma função que nenhum capitalista industrial poderia desempenhar isoladamente e do qual nenhum deles não pode prescindir. Por fim, outra função do sistema de crédito que Campbell considera crucial é a unificação dos capitais individuais como capital social, em decorrência do fornecimento de crédito para todos os capitais individuais, permitindo assim que a tendência a equalização das taxas de lucro se viabilize.

Visto o papel decisivo do sistema de crédito para a dinâmica do capitalismo em Marx, e que a abordagem deste autor está sustentada sobre a classificação dos capitais em portador de juros e capital em função (isto é, empresas financeiras e não financeiras), o passo a seguir é caracterizar as relações entre estas frações do capital. Para isso, a investigação deve se voltar para a origem juros e determinação da taxa de juros em Marx.

2.2. Origem dos juros e determinação da taxa de juros

A investigação de Marx parte da demonstração da origem dos juros como uma fração extraída dos lucros das empresas não financeiras. Ele afirma que “é a separação dos capitalistas em capitalistas monetários e capitalistas industriais que, na realidade, converte uma parte do lucro em juros e cria, em geral, a categoria dos juros […].” (Marx, 2017, cap. 23, p. 533).

Essa definição da origem dos juros implica, como conclusão parcial, que as empresas financeiras, os bancos em particular, possuem uma dependência em relação às empresas não financeiras, do mesmo modo que estas dependem dos bancos para financiar suas atividades. Ambos os conjuntos de empresas possuem um interesse comum, visto que a fonte de seus rendimentos, lucros e juros, advém da mesma fonte, a extração de mais-valia no processo produtivo.

O processo possui a seguinte anatomia. O capitalista em função toma emprestado certa quantia de capital na forma monetária no setor financeiro. A empresa financeira empresta essa quantia sob a condição de que ela receberá em data futura a mesma quantia acrescida de um montante percentual estabelecida contratualmente, isto é, juridicamente, de antemão, ou seja, antes do emprego efetivo do dinheiro como capital. A função do capitalista produtivo é inserir o dinheiro no processo produtivo, isto é, transformá-lo em capital, pois é assim que ele gerará o valor adicionado a ser pago ao banco. Ao passar da forma monetária para a forma física (máquinas, matéria-prima e mão-de-obra) o capital deverá gerar, ao final do processo, um novo rendimento monetário, o lucro bruto, do qual somente uma parte será retida pela empresa industrial, chamado por Marx de “lucro do empresário”. A parte destinada ao banco, os juros, já estava determinada previamente.

Em Marx, deriva-se da descrição acima uma segunda implicação da origem dos juros, crucial para compreensão da determinação da taxa de juros, que diz respeito ao fato de que o capital portador de juros está em posição externa ao processo produtivo. Diferentemente do lucro do empresário que depende do êxito da geração e realização do mercado da mais-valia, o juros é originado em uma relação jurídica acordada entre capitalistas financeiros e produtivos.

Uma terceira implicação na abordagem de Marx sobre a origem dos juros também extraída da descrição acima é que as empresas produtivas, tomadoras de empréstimos, devem considerar em seus cálculos de rentabilidade tanto a remuneração do capital enquanto valor investido produtivamente, quanto o capital enquanto montante monetário que rende juros. Afirma Marx:

O empregador do capital, ainda que trabalhe com capital próprio, desdobra-se em dois personagens: o simples proprietário do capital e o empregador do capital. Seu próprio capital, com relação aos tipos de lucro que ele gera, decompõe-se em propriedade do capital, capital fora do processo de produção, que rende juros por si só, e capital dentro do processo de produção, que, como capital em ação, gera o ganho empresarial. (Marx, 2017, cap. 23, p. 540).

O capitalista em função, portanto, compara o retorno do capital imobilizado na produção com o retorno do capital portador de juros de mesma magnitude, ou seja, quanto de juros o capitalista em função receberia se se desfizesse desse patrimônio e o emprestasse na forma monetária como capital.  Essa abordagem de Marx já contém a semente da compreensão das razões da busca do capital por se desprender de suas formas especificas imobilizadas e dirigir-se à valorização financeira. O cálculo implícito do juros como referência para a rentabilidade necessária para o capital imobilizado – isto é, a rentabilidade do capital enquanto propriedade e não enquanto função – já indica que o capitalista em função é impelido a decidir constantemente se é mais lucrativo investir ou aplicar financeiramente. Por esse caminho que se pode compreender a chamada  “financeirização” como fenômeno interno à lógica do capital e não como anomalia.

Sendo a origem dos juros a extração de um montante do lucro bruto gerado pelas empresas no processo produtivo, resultante da divisão dos capitais em portadores de juros e em função, a questão a ser respondida é o que determina este montante, isto é, como é determinada a taxa de juros.

A origem comum de lucro e juros geradora de uma unidade de interesses entre capital portador de juros e capital em função é sobreposta pela concorrência entre estas duas frações em torno da divisão do lucro bruto médio[1]. E esta divisão não está determinada por nenhuma regularidade econômica objetiva. Marx refuta a concepção de que existem leis materiais que determinem a taxa de juros. Isso ocorre porque, como visto acima, a definição do pagamento de juros de uma empresa a um banco é uma definição contratual externa ao processo produtivo.

A ênfase de Marx em que o capitalista proprietário do capital monetário está em uma posição externa ao ciclo produtivo do capital permite a conclusão de que esse capitalista é essencial ao ciclo produtivo, porém não há uma determinação necessária de que ele participe do ciclo e em que condições, sejam elas apropriadas ou não para a reprodução do capital em função, em uma determinada circunstância histórica. Isto é, participação do capital monetário no ciclo produtivo é essencial, mas sua forma não é compulsória.

Portanto, pela natureza da relação entre as duas frações do capital, existe uma arena de disputa em que os capitalistas do setor financeiro possuem uma forte vantagem competitiva para a determinação da taxa de juros. O que leva também à conclusão de que se houver meio mais vantajoso para emprestar os recursos monetários (ao Estado, por exemplo), as empresas do setor financeiro o preferiram. Dado esse caráter externo do capital portador de juros em relação ao ciclo do capital, Marx também conclui que não há uma taxa de juros natural:

[…] a concorrência não determina os desvios da lei, pois não existe lei nenhuma que regule a divisão além daquela imposta pela concorrência, já que, como veremos adiante, não existe um nível “natural” da taxa de juros. Por nível natural da taxa de juros entende-se, antes, a taxa estabelecida pela livre concorrência (Marx, 2017, cap. 21, p. 510).

No trecho acima fica clara a posição de Marx sobre a natureza da determinação da taxa de juros. É a concorrência entre capital portador de juros e capital em função que a determina. Também fica evidente que Marx reconhece a existência de uma taxa de juros que varia no mercado e um nível para essa taxa determinado pela concorrência. Em nenhum momento, portanto, Marx parte da noção de um nível para a taxa de juros, ou taxa média, materialmente determinado, em torno do qual flutuaria a taxa de mercado. A relação, diz Marx, entre nível e taxa de juros, não é análoga à relação entre preços de produção e preços de mercado, este último, sim, flutuando em torno do primeiro que, por sua vez, é materialmente definido. Marx é enfático:

Não existe nenhuma razão para que as relações médias da concorrência, o equilíbrio entre prestamista e prestatário, tenham de render necessariamente ao prestamista uma taxa de juros de 3%, 4%, 5% etc. sobre seu capital ou determinada porcentagem, digamos, de 20% ou 50%, do lucro bruto. Quando o elemento decisivo é a concorrência como tal, a determinação é, por si mesma, fortuita, puramente empírica, e só o pedantismo ou a fantasia podem pretender desenvolver essa casualidade como algo necessário (Marx, 2017, cap. 22, p. 520).

Conclui-se que a concorrência entre capital portador de juros e capital em função é o núcleo da abordagem de Marx sobre a determinação da taxa de juros[2]. Assim, a pergunta seguinte é: quais elementos determinam a concorrência entre as duas frações do capital?

Marx cita alguns elementos que podem influenciar a força concorrencial relativa das duas frações na definição da taxa de juros, como o desenvolvimento da acumulação de capital de um país e do mercado de crédito de modo a aumentar os recursos disponíveis para empréstimo, favorecendo assim a posição das empresas não financeiras pela redução da taxa de juros; e as diferentes fases do ciclo econômico em que estas empresas tenham mais ou menos fundos próprios ampliando ou reduzindo sua dependência de empréstimos. Contudo, não há nos escritos de Marx um tratamento sistemático dos determinantes da concorrência no mercado de crédito[3]. O desenvolvimento desse ponto crucial ainda é uma questão em aberto e será abordada a seguir.

2.3. Um passo para expandir o argumento de Marx sobre a determinação da concorrência entre empresas financeiras e não financeiras

A pouca literatura que se debruçou sobre a compreensão dos determinantes da concorrência entre as duas frações do capital no mercado de crédito a partir da abordagem de Marx dirigiu-se à análise de fatores econômicos, mas sobretudo da institucionalidade que condiciona as regras dessa concorrência. A razão desta forma de abordagem, decorre, mais uma vez, da posição peculiar do capitalista monetário em relação ao ciclo produtivo do capital. Visto que a taxa de juros não é materialmente determinada, e sim contratualmente estabelecida, é fundamental que o setor financeiro influencie as regras que moldam funcionamento do mercado de crédito.

O ponto central da teoria marxista sobre a determinação da concorrência em torno da taxa de juros é que, seguindo e ampliando a definição de Panico (1980)[4], a distribuição econômica estrutural de poder entre as duas frações do capital se reflete na institucionalidade criada em cada situação histórica para reger o funcionamento das relações entre as duas frações no mercado de crédito, de modo que essa institucionalidade condiciona o nível da taxa de juros e as condições gerais do mercado de crédito, ou seja, se esse mercado será mais ou menos favorável a uma ou outra fração do capital.

A forma assumida pela institucionalidade que governa o mercado de crédito, portanto, contém uma determinada correlação de forças entre empresas financeiras e não financeiras. Essa abordagem é um desdobramento da teoria de Marx de que os juros são simplesmente uma fração do lucro bruto médio, de modo que há um conflito que se estabiliza concretamente por meio da constituição de instituições que constrangem a ação dos agentes econômicos em determinadas direções.

O banco central, por exemplo, como afirma Argitis (2001), ainda que defina a taxa de juros sob sua responsabilidade exógenamente, é uma instituição inserida no ambiente de competição entre as frações do capital e que portanto está sujeita à correlação de forças econômicas e políticas entre essas frações. Ou seja, diz Artigis (2001), o banco central não é uma instituição exógena. Desse modo, acrescenta, as posições relativas do setor financeiro e não financeiro também influenciarão a forma assumida pela política monetária que o banco central deve executar.

Essa é a mesma linha de argumentação de Epstein (1992) que propõe uma tipologia das relações entre as empresas do setor financeiro e não financeiro e da posição do banco central no interior do Estado para analisar qual política monetária emerge de cada uma das combinações possíveis. A proposta analítica de Epstein é alicerçada pela concepção de que o banco central está sujeito à disputa entre frações do capital, denominado por ele de “contested terrain model of central bank” (Epstein, 1992).

Esse desenvolvimento teórico dos determinantes da concorrência em torno da taxa de juros e, à luz da experiência histórica posterior à Marx, permitem uma revisão das considerações deste autor. Por exemplo, Marx (2017, cap. 31) argumenta que na fase de recuperação do ciclo econômico, o fluxo de caixa das empresas industriais e comerciais e a fluidez do crédito comercial torna a reprodução do capital em função relativamente autônoma do capital de empréstimo dos bancos e assim a correlação de forças entre capital em função e capital monetário é mais favorável ao primeiro, levando assim a uma redução da taxa de juros. Entretanto, se a correlação de forças entre capital monetário e capital em função é tal que mesmo na fase ascendente do ciclo, a institucionalidade vigente que governa a concorrência no mercado de crédito – como metas de inflação – imponha um aumento da taxa de juros, o capital em função continuará com menos poder para determinar a taxa de juros mesmo nessa fase do ciclo. Ou seja, o processo estritamente econômico é sobreposto pelas instituições que lhe dão forma e impactam seu conteúdo.

A conclusão fundamental, portanto, da abordagem marxista sobre os determinantes da concorrência entre o setor financeiro e não financeiro é que as condições gerais do mercado de crédito e o nível da taxa de juros, em particular, se alteram a partir de mudanças na estrutura que governa esse mercado de modo a criar uma nova posição relativa entre os dois setores. Essas alterações podem reforçar a desigualdade de forças prevalecente ou diminuí-la e mesmo invertê-la.

Contudo, a análise dessas mudanças está fora do terreno da teoria, pois, não há leis materiais que governam a definição da taxa média de juros. Assim, é preciso analisar qual foi o desenvolvimento em formações sociais concretas das interações financeiro-produtivas e como a institucionalidade em cada caso impactou essas relações. Em específico, a investigação histórica é relevante para captar as características próprias dos países que não foram pioneiros na industrialização. Nesses países, a relevância da institucionalidade do mercado de crédito e seu efeito sobre as formas assumidas pelas interações financeiro-produtivas foi ainda maior para os objetivos de desenvolvimento industrial dos países.

3 A importância da coordenação nacional do mercado de crédito para o desenvolvimento industrial: Gerschenkron e Zysmam

Gerschenkron é um ponto de partida relevante por dois motivos. Em primeiro lugar porque tratou diretamente do tema das formas de interação entre setor bancário e industrial. Em segundo lugar, porque um elemento central de sua argumentação é que há diferenças fundamentais no processo de desenvolvimento entre os países avançados e os “atrasados” e que se devem em grande medida à “instrumentos institucionais” distintos (GERSCHENKRON, 1962, p. 7). Entre essas diferenças se inclui as formas de interação financeiro-produtivas.

O recorte da análise de Gerschenkron são alguns países europeus entre o século XIX e a primeira guerra mundial. É bastante conhecida a análise de Gerschenkron (1962) propondo a interpretação de que nos países de industrialização tardia a interação entre as funções financeiras e o setor industrial será tão mais dirigida pelo Estado quanto maiores os obstáculos ao florescimento industrial. Gerschenkron pioneiramente estabelece a relevância do papel do Estado na coordenação da estrutura de financiamento das economias em que as instituições privadas não realizam a função de financiamento da acumulação.

Segundo Gerschenkron (1962, p. 13), no caso da França o padrão de envolvimento do banco Credit Mobilier com a industrialização foi também fundamental para moldar o comportamento bancário na Europa continental na segunda metade do século XIX. A novidade da conduta desse banco é o financiamento de longo prazo, muito distinto, frisa Gerschenkron, dos bancos comerciais ingleses voltados ao financiamento de curto prazo.

A principal diferença segundo o autor no que se refere ao financiamento da industrialização entre a Inglaterra e os demais países é que no caso inglês as necessidades de financiamento estavam diluídas no tempo em decorrência de processo mais estendido de crescimento industrial, tornando desnecessário a constituição de instituições fornecedoras de crédito de longo prazo. Desse modo, conclui o autor, a existência de bancos de financiamento do investimento industrial é um fruto das necessidades da industrialização dos países atrasados.

A conclusão relevante é que estar fora do centro avançado do capitalismo é uma característica que dita a forma de interação financeiro produtiva  dos países que o desenvolvimento requer. Aparentemente essa conclusão é ainda mais relevante quando o país está ainda mais longe das industrializações pioneiras da Europa. Zoninsein (2000) e Castro (2009), por exemplo, destacam a pertinência da interpretação de Gerschenkron para a compreensão do papel do Estado no financiamento da industrialização dos países que a realizaram após a Segunda Guerra Mundial.

O  caso paradigmático segundo Gerschenkron de bancos profundamente ligados ao financiamento da industrialização é o alemão. Esses bancos construíram uma relação estreita com as empresas industriais que ultrapassava o financiamento do investimento e adentrava funções de proeminência na hierarquia interna das empresas financiadas. Mas é crucial destacar que os bancos alemães não se articulavam igualmente com todos os setores industriais. O interesse dos bancos, segundo Gerschenkron (1962, p. 15), estava nas grandes empresas da Indústria pesada do Aço, Elétrica e Química, vale dizer, as empresas líderes dos setores que eram os motores principais daquela fase da industrialização alemã.

Sobre este ponto, Deeg (2003), realizando uma análise crítica da interpretação de Gerschenkron, afirma que foram poucos os casos de representantes dos bancos que participavam do conselho de administração das empresas; e que a presença das grandes empresas nas quais a interação com os bancos era mais intensa, como suposto por Gerschenkron, era baixa e localizada em alguns poucos setores. Vale dizer, contudo, em primeiro lugar, que é difícil de compreender porque Deeg (2003) atribui a Gershenkron a opinião de que a interação particular entre os bancos universais alemães e a indústria era uniformemente distribuída entre empresas e setores, visto que Gerschenkron mostra exatamente a seletividade dos bancos. Em, segundo lugar, o mais importante é que a pesquisa Deeg reforça a característica do interesse dos bancos em se associarem somente com grandes empresas líderes e em setores mais dinâmicos.

Entretanto, a influência dos bancos sobre as empresas não resultava em harmonia de interesses. Tanto que Gerschenkron afirma, o que remete a abordagem de Marx da concorrência entre capital a juros e em função, que na Alemanha, na virada do século, com as grandes empresas industriais consolidadas elas passam a adotar outra conduta diante do setor bancário: ampliam as relações para vários bancos e não mais um único banco; e criaram seus próprios bancos, ambas medidas que diminuíam a submissão ao controle do banco financiador.

Por fim, Gerschenkron (1962, p. 20) faz a consideração igualmente relevante, utilizando a Rússia como exemplo, de que em casos de países ainda mais atrasados, em que o sistema bancário privado, por um conjunto de fatores, não consegue desempenhar a função de  financiar a industrialização, e sendo este um objetivo nacional, o Estado assume compulsoriamente está função. O autor acrescenta que na Rússia, a função dos bancos ampliou-se nas primeiras décadas do século XX, quando a ação estatal foi diminuída. O financiamento antes provido pelo Estado passou crescentemente a ser realizado pelos bancos como no modelo alemão.

Mas, mesmo no caso alemão, o estudo de Allen et al. (2010), indica que a ação estatal foi relevante para gerar a forma especifica de interação financeiro produtiva indutora da industrialização. Neste trabalho, os autores argumentam que a legislação alemã era muito rígida quanto à constituição do mercado de capitais. E, mais importante ainda, quando o governo alemão na década de 1870 permite o florescimento do mercado de capitais, este mecanismo é utilizado majoritariamente para diversificação de riqueza via propriedade de ativos financeiros e não para gerar novas fontes de financiamento do investimento.

Ainda sobre a ação estatal no caso alemão, Kohli (2012) afirma que mesmo a capacidade de os bancos universais alemães assumirem o risco de emitirem e adquirirem ações das grandes empresas decorria do suporte público. Os bancos financiadores do desenvolvimento industrial detinham acesso privilegiado à liquidez do banco central alemão. E, além disso, ao longo das décadas de 1880 e 1890 as ações do governo alemão direcionaram-se novamente para desincentivar o desenvolvimento do mercado de capitais.

Segundo Kholi (2012), o caso japonês aponta da mesma direção. A relevância do mercado de capitais no período anterior à segunda guerra mundial era baixa; as emissões de ações se concentravam em algumas grandes empresas e as ações eram emitidas para alguns investidores milionários em acordo previamente estabelecido que as comprariam; e o banco central detinha um papel crucial na garantia de liquidez das ações. Além disso, dois bancos de desenvolvimento foram criados pelo governo japonês nas duas últimas décadas do século XIX para realizar financiamentos de longo prazo.

Já Zysman (2018) analisa os casos de Inglaterra, França, EUA, Japão e Alemanha no que se refere ao papel do sistema financeiro na busca desses países em reorientar o desenvolvimento industrial no período do pós II guerra. O autor estabelece três dimensões para se classificar sistemas financeiros nacionais: 1) se baseado no mercado de capitais ou no crédito bancário; 2) tipo de formação de preços; e 3) papel desempenhado pelo governo, seus objetivos e instrumentos (Zysman, 2018, p. 69).

A partir das dimensões citadas acima, Zysman propõe três tipos de sistemas financeiros: 1) market-based; 2) credit-based de tipo 1 (coordenado pelo governo); e 3) credit-based de tipo 2 (dominado por instituições financeiras privadas).

Sinteticamente, no primeiro tipo de sistema financeiro o mercado de ações e títulos privados fornecem o financiamento de longo prazo e os bancos fundamentalmente fazem empréstimos de curto prazo; os preços são determinados em condições competitivas; bancos e industrias não possuem uma relação direta estreita; e o Estado tem poucos instrumentos para influenciar a alocação dos recursos do sistema financeiro. No segundo tipo, o Estado intervém setorialmente para alcançar determinado resultado em termos de desenvolvimento industrial; o mercado de capitais é pouco relevante; crédito bancário é crucial para o financiamento; governo fornece apoio a política de credito dos bancos e influência nos preços; a relação entre governo e empresas torna-se parte do sistema financeiro de modo a gerar uma diminuição das fronteiras entre público e privado. No terceiro tipo, os preços são determinados pelo mercado condicionado pelo poder de mercado das instituições financeiras; governo deve atuar em negociação com setor financeiro para atingir objetivos de alocação do crédito.

Zysman (2018, p. 72) afirma que o sistema financeiro market based é característica exclusiva dos países de industrialização pioneira, o que está em sintonia com a interpretação de Gerschenkron (1962). O exemplo por excelência é a Inglaterra e também se encaixa os EUA. O segundo tipo é ocupado na classificação de Zysman por França,  Japão e Itália. E o terceiro tipo pela Alemanha. Uma primeira conclusão que emerge do trabalho de Zysman é que não é possível analisar o sistema financeiro de um país em particular a partir de um único modelo geral abstrato de sistema financeiro.

O argumento central do autor é o seguinte: a estrutura do sistema financeiro nacional condiciona as relações que se estabelecem entre bancos, empresas e governos. De modo que condiciona os instrumentos e objetivos políticas de desenvolvimento industrial e a forma dos conflitos políticos. Portanto, a coordenação estatal do sistema financeiro é condição necessária para o sucesso das estratégias nacionais de modernização industrial. Uma conclusão fundamental de Zysman é que a associação do sistema financeiro com o financiamento do desenvolvimento dependeu da construção pelo Estado de uma institucionalidade que impelia os bancos a essa associação. Zysman não pode ser mais enfático quando afirma que “selective credit allocation is the single discretion necessary to all state-led industrial strategies” (Zysman, 2018, p. 76).

Um primeiro motivo para a necessária coordenação estatal das interações entre setor financeiro e industrial no argumento de Zysman está nas características do financiamento de longo prazo. Tomar empréstimo de longo prazo significa para a empresa industrial ampliar a interferência dos bancos nos assuntos internos como condição de efetivar o empréstimo. Para o banco há o risco de descasamento entre o retorno do empréstimo de longo prazo e as retiradas realizadas pelos depositantes dos bancos no curto prazo, o que pode afetar a capacidade do banco de continuar emprestando. Outro risco é a subida da taxa de juros de curto prazo que o banco paga pelos depósitos (Zysman, 2018, p. 62).

O autor acrescenta que para realizar empréstimos de longo prazo os bancos devem ser capazes de avaliar a empresa cliente para além do curto prazo. Precisam avaliar a posição competitiva da empresa no interior da indústria no presente e no futuro (Zysman, 2018, p. 194-5). Esta necessidade decorre de que são os empréstimos de longo prazo que possibilitarão às empresas ampliar a capacidade produtiva e concorrer no mercado, o que pode ou não sancionar o empréstimo, a depender do sucesso ou fracasso da aposta da empresa, pois são os lucros esperados futuros a fonte de recursos para pagar o empréstimo. Em suma, o Estado tem um papel chave em garantir a estrutura de financiamento nos países de desenvolvimento tardio, porque a dependência de empréstimos de longo prazo gera novos e maiores riscos para bancos e empresas  (Zysman, 2018, p. 63).

Um segundo motivo para a necessária coordenação estatal é, justamente conforme a abordagem marxista, a desigualdade de poder econômico entre empresas financeiras e industriais no mercado de crédito. Zysman afirma que “allocation of funds in markets dominated by financial actors gives those with market power the ability to make discretionary choices about whom to lend to and on what terms” (Zyzman, 2018, p. 68). Bancos com maior poder sobre o mercado de crédito dificilmente financiarão no longo prazo para empresas que não sejam líderes consolidadas dos setores, dada os maiores riscos associados a esse tipo de financiamento.

Zysman apresenta uma investigação exaustiva dos mecanismos estatais em cada país para dirigir o crédito privado e colocá-lo à disposição dos objetivos nacionais de modernização industrial, que passam em especial pelo arranjo do poder executivo para retirar obstáculos burocráticos à influência direta sobre os setores industrial e financeiro; estatizações de empresas e bancos; criação de instituições financeiras paraestatais; e controle direto sobre a taxa de juros.  Não é necessário reportá-los aqui. O fundamental é frisar o fato cabal de que nos países em que a industrialização foi um objetivo político, o Estado teve que impelir o setor financeiro privado a financiar o desenvolvimento, retirando as decisões de alocação do crédito, taxa de juros e condições dos empréstimos, do controle exclusivo dos mecanismos de mercado. Ou seja, para o Estado impactar a estrutura industrial e assim dirigir o desenvolvimento foi crucial exercer o poder de influenciar a alocação de crédito.

O estudo histórico de Zysman reforça a abordagem geral de Marx sobre o papel imprescindível do sistema de crédito para a acumulação de capital. Em específico, o estudo de Zysman também corrobora a importância da mecanismos de promovam a oferta de crédito de longo prazo, porém não vincula essa função a um tipo específico de instituição, seja bancos ou mercado de capitais. Allen et al (2010), reforçam essa percepção ao mostrarem que bancos e mercado de capitais tiveram papeis e pesos distintos entre os países. Entretanto, a participação dos bancos, ainda que com funções distintas, é generalizada, é regra em todos os países, enquanto o mercado de capitais tem maiores diferenças entre os países, com relevância mais restrita em termos de períodos, setores e importância quantitativa para o financiamento. Por fim, o trabalho de Zysman permite avançar consideravelmente a abordagem marxista de que os determinantes da concorrência no mercado de crédito e a correspondente distribuição relativa de forças entre empresas financeiras e não financeiras dependem da constituição da institucionalidade que rege este mercado e condiciona a ação dos agentes, especialmente nos países de industrialização tardia.

Tem-se, portanto, uma concepção teórica reforçada e expandida pela investigação histórica com contornos relativamente definidos sobre a natureza das interações financeiro-produtivas no capitalismo e a relevância da coordenação nacional e estatal destas interações em vista de objetivos de desenvolvimento econômico. Entretanto, essas relações teoricamente estabelecidas encontram sustentação em evidências contemporâneas que reiterem a pertinência desta abordagem para a atualidade? O objetivo da próxima seção é apresentar elementos que permitam considerar uma resposta a essa pergunta.

4 Evidências empíricas da relação entre poder das instituições financeiras sobre o mercado de crédito e acumulação de capitais dos países

4.1. Base de dados, especificação dos modelos e método econométrico

Antes de passar ao detalhamento das variáveis e especificação dos modelos econométricos, vale apresentar a proposta geral da investigação empírica. Como variável dependente será utilizada o crescimento do estoque de capital, como proxy da acumulação de capital dos países. Será investigada a relação desta variável com o poder das instituições financeiras de condicionar o sistema de crédito a seu favor. Para representar empiricamente esta noção teórica, e diante da disponibilidade de informações, é proposto utilizar duas variáveis. A primeira é a margem de spread bancário e a segunda é a relevância do mercado de capitais no sistema de crédito em cada país. Para esta estimação a amostra utilizada é composta majoritariamente por países de alta renda, incluindo todos os membros da OCDE[5].

Em seguida, o modelo será acrescido de duas outras variáveis independentes para representar o grau de controle nacional sobre o sistema de crédito. O objetivo é apreciar a investigação histórica apresentada anteriormente que atesta a relevância da coordenação nacional para impelir as instituições financeiras ao financiamento do desenvolvimento industrial. As variáveis acrescentadas foram a porcentagem dos ativos financeiros domésticos de posse de bancos estrangeiros e a porcentagem dos ativos financeiros domésticos de posse de bancos públicos. Em linha com a investigação histórica de que a coordenação nacional do sistema de crédito é relevante sobretudo para os países não pioneiros na industrialização, a amostra utilizada para esta estimação é composta pelos países classificados como mercados emergentes pelo FMI e exclui todos países da OCDE.

Exceto pela variável de porcentagem dos ativos financeiros domésticos de posse dos bancos públicos, espera-se, a partir da teoria e da experiência histórica tratadas, que a relação entre essas variáveis de interesse e o crescimento do estoque de capital dos países seja negativa. A seguir descreve-se detalhadamente as variáveis utilizadas e modelos propostos.

Como já mencionado, serão implementados dois modelos. A amostra do primeiro modelo é composta de 65 países, incluindo todos os membros da OCDE, sendo 41 classificados como renda alta, e 24 como renda média alta ou média baixa, segundo critério do FMI. Ou seja, é um conjunto majoritariamente de países desenvolvidos de alta renda. A especificação do modelo de dados em painel utilizado para essa amostra é a seguinte

〖gk〗it= α_0+〖∂gk〗(i,t-1)+ β1 〖SM〗_it+β_2 〖BC〗_it+β_3 〖FME〗_it+β_4 〖GDP〗(i,t-1)+β_5 〖TT〗_it+μ_i+τ_t+ε_it (1)
Onde:
gk = crescimento do estoque de capital
α_0 = intercepto
SM = margem de spread bancário
BC = concentração bancária
〖FME〗_it = importância do mercado de capitais
GDP = crescimento do PIB
TT = Termos de troca

Os termos μ e τ indicam respectivamente, os efeitos fixos das unidades do painel (países) e os efeitos fixos de tempo. O termo ε representa o erro aleatório e os subscritos i e t representam respectivamente as unidades do painel e o período de tempo. Note que a defasagem da variável dependente foi inserida como regressor, pois espera-se que o crescimento do estoque de capital de um período anterior impacte o crescimento no período atual. Este é, portanto um modelo de painel dinâmico, o que requer metodologia adequada para lidar com esta especificação, o que será discutido oportunamente. O Quadro 1 a seguir a apresenta as definições e fontes das variáveis. As estatísticas descritivas das variáveis são apresentadas no Apêndice A.

Além das variáveis de interesse SM e 〖FME〗_it, foram acrescentadas variáveis de controle de modo a que o termo de erro não contenha variáveis relevantes para explicar a variável dependente e que possivelmente sejam correlacionadas com as variáveis de interesse, evitando assim problemas de viés de variável omitida. Sugere-se que a concentração bancária possua uma relação com a margem de spread bancário, uma vez que a concentração eleve o poder de mercado dos bancos em relação às empresas demandantes de crédito. Sugere-se também que o crescimento do PIB de um período anterior, além de impactar o crescimento do estoque de capital no período presente, também impacte a margem de spread bancário via aumento da demanda das empresas por crédito e também impacte a dinâmica do mercado de capitais em termos de volume de transações. Por fim, os termos de troca foram inseridos na especificação do modelo como um controle das características estruturais dos países no mercado internacional de modo a captar possíveis diferenças entre esses países que impactem as variáveis independentes de interesse. O intervalo de tempo neste modelo é de 2000 a 2018.

Quadro 1. Variáveis utilizadas, definições e fonte dos dados

Nome da VariávelDefiniçãoFonte
Crescimento do estoque de capitalVariação anual do estoque de capital a preços nacionais constantes de 2017. O estoque de capital é mensurado a partir de dados de investimento distribuídos em  4 ativos: estruturas, máquinas, equipamentos de transporte e outros ativos.Penn World[6] Table
Margem de spread bancárioDiferença entre a taxa de juros cobrada pelos bancos em empréstimos a clientes do setor privado e a taxa de juros paga pelos bancos comerciais ou similares por depósitos à vista, a prazo ou de poupança.FMI
Concentração bancáriaAtivos dos cinco maiores bancos comerciais em proporção do total de ativos bancários comerciais.Banco Mundial
Importância do mercado de capitaisÍndice que contém três dimensões do mercado de capitais: profundidade (capitalização do mercado de ações e títulos de dívidas em relação ao PIB), acesso (participação de empresas a fora as 10 maiores e número de emitentes de dívidas) e eficiência (ações negociadas em relação à capitalização).FMI[7]
Crescimento do PIBVariação anual do PIB real per capita a preços nacionais constantes de 2017.Penn World Table
Termos de trocaRazão dos índices de preços das exportações e importaçõesPenn World Table
Participação dos bancos estrangeiros na posse dos ativos financeiros domésticosPercentual do total de ativos bancários detidos por bancos estrangeiros (estrangeiros detém 50% ou mais de suas ações).Banco Mundial
Participação dos bancos públicos na posse dos ativos financeiros domésticosPorcentagem dos ativos bancários detidos por bancos controlados pelo governo (governo detém 50% ou mais de ações).Banco Mundial

Fonte: Elaboração própria

Para o segundo modelo, a amostra é composta de 79 países emergentes, dos quais apenas 19 são classificados como renda alta e 60 como renda média alta e média baixa. Todos os países membros da OCDE foram excluídos, pois o objetivo é captar evidências a respeito dos países considerados emergentes, não dos desenvolvidos. Segue a especificação do modelo.

〖gk〗it= α_0+〖∂gk〗(i,t-1)+ β1 〖SM〗_it+β_2 〖BC〗_it+β_3 〖FME〗_it+β_3 〖FBS〗_it+β_3 〖GBS〗_it+β_4 〖GDP〗(i,t-1)+μ_i+τ_t+ε_it (2)
As variáveis acrescentadas em relação à equação 1 do primeiro modelo são:
FBS = porcentagem de ativos financeiros domésticos de posse de bancos estrangeiros
GBS = porcentagem de ativos financeiros domésticos de posse de bancos públicos

A descrição e fontes destas variáveis também está no Quadro 1 acima.

A inclusão destas variáveis busca captar o grau de controle nacional de cada país sobre o sistema de crédito. Há hipótese sugerida, baseada na apreciação histórica realizada na seção anterior, é que quanto menor este controle, menor a capacidade de coordenação nacional e estatal sobre o mercado de crédito em termos de direcioná-lo ao financiamento do desenvolvimento, o que impactaria a acumulação de capital do país. Espera-se, portanto, que haja uma relação negativa entre a variável porcentagem de ativos financeiros domésticos de posse de bancos estrangeiros e o crescimento do estoque de capital e uma relação positiva entre esta última variável e a porcentagem de ativos financeiros domésticos de posse de bancos públicos.

O intervalo de tempo da estimação deste segundo modelo é distinto. Devido à disponibilidade de dados das duas variáveis acrescentadas, o intervalo foi de seis anos 2011 a 2016.

O Método utilizado para estimar os coeficientes das variáveis independentes em ambos os modelos foi o Método de Momentos Generalizado (GMM), proposto por Arellano e Bover (1995) e Blundell e Bond (1998). A escolha por esse método de estimação deve-se a dois motivos: o controle dos efeitos fixos não observados das unidades do painel e de tempo e o controle do viés de endogeneidade, isto é causalidade reversa, entre as variáveis independentes e a variável dependente. O controle da endogeneidade favorece o pode explicativo do modelo por permitir, por exemplo, a inclusão da variável dependente defasada como regressor, o que é importante para um modelo que possui a variável e crescimento do estoque de capital como variável dependente.

 O controle do viés de endogeneidade devido à causalidade reversa também é importante de ser controlado nestes modelos devido à relação entre a variável dependente e as variáveis de interesse. O crescimento do estoque de capital amplia a demanda das empresas não financeiras por capital de terceiros de modo a financiar as decisões de investimento. Portanto, tanto a margem de spread bancário quanto o volume de transações no mercado de capitais podem ser positivamente impactados pela variável dependente. Do mesmo modo, a maior demanda por crédito pode impactar a política de concessão de crédito de bancos estrangeiros e públicos e assim alterar a participação destas instituições do total de ativos financeiros domésticos. Conclui-se, portanto, que o estimação por GMM é a mais adequada para a presente investigação.

Seguindo Blundell e Bond (1998), o método GMM controla os efeitos fixos não observados das unidades e de tempo e o viés de endogeneidade por meio da utilização da utilização da regressões em primeira diferença e de variáveis instrumentais. Os instrumentos são obtidos a partir da própria amostra por meio da utilização de valores defasados das variáveis (dependente e explicativas) em nível como instrumentos. O método GMM-System, especificamente, utilizado neste trabalho, acrescenta mais um conjunto de instrumentos com as diferenças defasadas para instrumentalizar as variáveis endógenas em nível. Esse procedimento tem objetivo de superar as limitações da matriz de instrumentos do estimador GMM-Difference (Arellano e Bond, 1991).

Dada sua estrutura, dois critérios devem ser respeitados para se garantir a validade dos estimadores de GMM: 1) que os instrumentos sejam estritamente exógenos e que 2) não haja autocorrelação serial de segunda ordem (AR2) do termo de erro. O primeiro critério garante a validade dos instrumentos e é averiguado pelo teste de Hansen, cuja hipótese nula é que a matriz de instrumentos utilizada é válida. Busca-se, portanto, não rejeitar a hipótese nula.

Ocorre que um critério adicional deve ser acrescentado quando se analisa o teste de Hansen, pois está estatística de teste é sensível ao aumento demasiado do número de instrumentos gerados pelo modelo, de modo que pode-se obter uma estatística de teste que não rejeite a hipótese nula, porém que não esteja efetivamente captando a validade da matriz de instrumentos e sim sendo impactada pelo alto número de instrumentos gerados. Portanto, ainda que não se tenha um critério preciso para lidar com esta questão, é comummente utilizada a regra sugerida por Roodman (2009) de que o número de instrumentos não ultrapasse o número de unidades do painel.

O segundo critério a ser respeitado, quanto à ausência de correlação serial de segunda ordem, é aferido pelo teste Arellano e Bond para AR2 em primeira diferença. Este teste possui como hipótese nula a ausência de autocorrelação serial de segunda ordem. Portanto, como no teste de Hansen, busca-se a não rejeição da hipótese nula.

4.2 Resultados

A Tabela 1 a seguir apresenta o resultados das estimações do modelo da equação 1, cuja amostra é majoritariamente composta por países desenvolvidos de alta renda.

A tabela 1 apresenta três resultados de especificações do modelo. A especificação que corresponde exatamente à equação 1 é a da coluna (3). Os resultados das colunas (1) e (2) são apresentadas somente com o propósito de checar a robustez dos resultados do modelo completo por meio da inclusão paulatina das variáveis de controle e, portanto, não serão analisados.

Os resultados da estimação da equação 1, apresentados na coluna (3), indicam que entre a margem de spread bancário e a importância do mercado de capitais, as duas variáveis de interesse, somente a segunda possui um relação negativa com o crescimento do estoque de capital. Esse mesmo resultado é encontrado dos coeficientes das colunas (1) e (2).

Table 1. Resultados das estimativas por GMM-System para 65 países em sua maioria avançados, 2000-2018

 (1)(2)(3)
Crescimento do estoque de capital, defasado0.8592***0.8350***0.8344***
(0.05)(0.09)(0.09)
Margem de spread bancário-0.2039-0.2281-0.2337
 (0.19)(0.23)(0.24)
Importância do mercado de capitais-2.5229**-1.9755*-2.1014**
(0.98)(0.99)(0.92)
Crescimento do PIB, defasado0.08940.22490.2191
(0.14)(0.26)(0.25)
Concentração bancária 0.00570.0062
  (0.02)(0.02)
Termos de Troca  -0.9748
   (3.01)
Constante3.0032**1.16702.2487
 (1.13)(2.01)(3.02)
Observações221195195
Instrumentos202122
Teste Arellano-Bond para AR(2) em primeira diferença (p-valor)0.05630.08610.0860
Teste de Hansen para a validade conjunta dos instrumentos (p-valor)0.23870.21790.2119

Fonte: Elaboração própria

 Este resultado é interessante por alguns motivos. O primeiro motivo é que a variável de interesse com coeficiente significativo não apresentou sinal positivo. Isso é uma indicação de que a abordagem teórica, a partir de Marx, de que o mercado de crédito se estrutura sobre a concorrência com interesses contraditórios entre empresas financeiras e não financeiras, continua válida. O segundo motivo se relaciona com o fato de que nos países desenvolvidos, o mercado de capitais ocupa uma posição mais relevante como fonte de capitais de terceiros para as empresas quando comparado com os países emergentes e é justamente essa variável que apresenta coeficiente estatisticamente significativo.

Por fim, e provavelmente mais importante, o coeficiente significativo e negativo da variável de relevância do mercado de capitais está em sintonia com a literatura sobre o impacto majoritariamente negativo do agigantamento do papel deste mercado nas economias avançadas sobre o crescimento econômico. Santos e Resende (2021) demonstram teoricamente que os fenômenos conhecidos como “financeirização” afetam negativamente a capacidade do mercado de capitais de realizar a função de funding e, assim, dificultam a estruturação de balanços contábeis líquidos pelas empresas, fator necessário para as decisões de investimento.

Além, das duas variáveis de interesse, somente a variável dependente defasada apresentou coeficiente estatisticamente significativo. Vale dizer que o sinal positivo desta variável é o esperado e assim contribui para aferir a robustez do modelo. A seguir, na Tabela 2, são mostrados os resultados do segundo modelo representado pela equação 2.

A coluna (4) apresenta o resultado da estimação da equação 2. Como para o primeiro modelo, aqui também as demais colunas, de (1) a (3), apresentam os resultados das estimações com a inclusão paulatina das variáveis e servem como teste de robustez da equação principal. Relembra-se que para este modelo, além das variáveis de interesse do modelo anterior, busca-se averiguar qual a correlação do crescimento do estoque de capital com o grau de coordenação nacional do mercado de crédito, representado pelas variáveis de participação dos bancos estrangeiros e públicos na posse dos ativos financeiros domésticos.

Table 2. Resultados das estimativas por GMM-System para 79 países emergentes, 2011-2016

 (1)(2)(3)(4)
Crescimento do estoque de capital, defasado0.6437***0.6447***0.7358***0.7435***
(0.09)(0.10)(0.09)(0.09)
Margem de spread bancário-0.2602**-0.2790**-0.1996*-0.1730*
(0.12)(0.13)(0.11)(0.10)
Participação de bancos estrangeiros nos ativos financeiros-0.0329***-0.0322***-0.0273**-0.0305**
(0.01)(0.01)(0.01)(0.01)
Crescimento do PIB, defasado0.1794***0.1776***0.2259***0.2396***
 (0.06)(0.07)(0.06)(0.06)
Importância do mercado de capitais 0.48070.91300.9723
 (1.32)(1.32)(1.58)
Concentração bancária  0.01110.0187
  (0.02)(0.03)
     
Participação de bancos públicos nos ativos financeiros   -0.0161
   (0.03)
Constante4.9966***4.9715***2.59652.2552
(1.72)(1.78)(2.01)(1.96)
Observações208208181177
Instrumentos44454647
Teste Arellano-Bond para AR(2) em primeira diferença (p-valor)0.82260.80650.81870.4589
Teste de Hansen para a validade conjunta dos instrumentos (p-valor)0.34760.32820.27980.2690

Fonte: Elaboração própria

Primeiramente, observa-se na coluna (4) que as duas principais variáveis de controle, crescimento do estoque de capital defasado e crescimento do PIB defasado, apresentaram coeficientes significativos e positivos, como esperado.

Quanto às variáveis de interesse, a margem de spread bancário apresentou coeficiente significativo à 10% de significância e negativo. Seguindo a abordagem teórica apresentada, isto indica que para o conjunto dos países emergentes, um maior poder dos bancos em condicionar o mercado de crédito impacta negativamente a acumulação de capital destes países. Esse resultado é interessante também porque está em linha com o fato de que neste conjunto de países o setor industrial é menos desenvolvido em comparação com os países desenvolvidos e, portanto, segundo a abordagem teórica apresentada, seu poder de influenciar o mercado de crédito favoravelmente às necessidades de financiamento da acumulação seria menor nos primeiros.

A participação dos bancos estrangeiros na posse dos ativos financeiros domésticos apresentou coeficiente significativo a 5% e também negativo. Isto é, existe uma correlação negativa entre o grau da presença dos bancos estrangeiros no sistema de crédito de cada país com a acumulação de capital de capital. Ou, visto pelo outro ângulo, o grau de controle nacional sobre o sistema de crédito está positivamente associado à acumulação de capital. Este resultado aponta na mesma direção da investigação histórica tratada na seção anterior segundo a qual os países fora do centro dinâmico do capitalismo em cada época necessitam construir uma estrutura nacional de financiamento para coordenar o sistema de crédito com vistas ao favorecer o desenvolvimento industrial. Se se admite que os bancos estrangeiros possuam estratégias nos país em desenvolvimento, no mínimo mediadas pelo cálculo global coordenado pela matriz e não somente local, é razoável supor que a coordenação nacional do sistema de crédito é comprometida.

Para este conjunto de países, o modelo não indicou significância do coeficiente de relevância do mercado de capitais, como ocorreu com a amostra de países majoritariamente desenvolvidos e de renda alta. A menor relevância do mercado de capitais como fonte de capital de terceiros e menor número de empresas que acessam esta fonte de recursos financeiros nestes países pode ser uma das razões para que o modelo não capte um impacto desta variável sobre o crescimento do estoque de capital.

A variável de participação dos bancos públicos na posse dos ativos financeiros domésticos também não apresentou coeficiente significativo. O que este resultado possivelmente indica é que a simples estrutura de propriedade do banco estatal não significa que eles tenham uma estratégia distinta em comparação aos bancos privados no que se refere à constituição de interações financeiro-produtivas favoráveis ao desenvolvimento. Zysman (2018, p. 76) trata desta questão e afirma que não basta os bancos serem estatais e sim que hajam instrumentos institucionais que possam ser mobilizados para este fim. Visto que desde os anos 1990, os países em desenvolvimento estão largamente se inseriram na globalização financeira de modo que moldaram sua institucionalidade à livre movimentação dos capitais diminuindo a presença discricionária do Estado no mercado de crédito, é mesmo de se esperar que a propriedade estatal dos bancos não seja na média uma característica definidora de uma correlação significativa destas instituições com a acumulação de capital.

Considerações finais

Este trabalho primeiramente realizou uma apresentação sistematizada da abordagem de Marx sobre os determinantes do mercado de crédito, demonstrando que o ponto central desta abordagem é a unidade contraditória entre empresas financeiras e empresas não financeiras neste mercado. Argumentou-se que a distribuição de poder entre estes dois grupos de empresas sobre o mercado de crédito em cada situação concreta está amalgamada na institucionalidade que o rege. Deste modo a investigação histórica sobre as experiências de constituição de interações entre esses dois grupos de empresas com vistas ao desenvolvimento industrial dos países não pioneiros na industrialização devia necessariamente complementar a discussão teórica. Ao se abordar os trabalhos de Gerschenkron (1962) e Zysman (2018) a partir deste corpo teórico concluiu-se que as empresas financeiras precisaram ser impelidas a formarem interações que impulsionem o desenvolvimento e que, portanto, os países tiveram que construir uma estrutura nacional de financiamento devidamente coordenadas para este fim.

Construído o referencial teórico e histórico, foram realizados a seguir dois exercícios econométricos com o objetivo de apreciar a pertinência de se utilizar este referencial na atualidade. Os modelos buscaram estimar o impacto sobre o crescimento do estoque de capital dos países, utilizado como proxy da acumulação de capital, de variáveis que buscassem captar: 1) no primeiro modelo, o poder das empresas financeiras sobre o mercado de crédito, utilizando-se para isso as variáveis margem de spread bancário e importância do mercado de capitais; e 2) adicionalmente no segundo modelo, o grau de coordenação nacional do sistema de crédito, captado pelas variáveis de participação de bancos estrangeiros e públicos na posse dos ativos financeiros domésticos. O primeiro modelo foi estimado para uma amostra composta majoritariamente de países avançados de renda alta, enquanto a amostra utilizada no segundo modelo era formada exclusivamente por países emergentes.

Os resultados da estimação do primeiro modelo indicaram que para os países desenvolvidos a importância do mercado de capitais no sistema de crédito possui uma relação negativa com a acumulação de capital. Já a variável de margem de spread bancário não apresentou coeficiente estatisticamente significativo aos níveis de significância padrão. Para o segundo modelo estimado, os resultados apontaram um impacto negativo sobre acumulação de capital tanto da margem de spread bancário como da participação de bancos estrangeiros na posse dos ativos financeiros domésticos. A importância do mercado de capitais e a participação dos bancos públicos na posse dos ativos financeiros domésticos não apresentaram coeficiente estatisticamente significativo.

Em conjunto esses resultados permitem considerar como atualmente válida a abordagem teórica e histórica empregadas. As variáveis utilizadas como proxies dos conceitos subjacentes aparentemente ainda possuem as relações esperadas com a acumulação de capital. Ou seja, a abordagem da configuração do mercado de crédito como determinado pela concorrência entre empresas financeiras e não financeiras e da importância da constituição das estruturas nacionais de financiamento demonstraram-se pertinentes diante das evidências empíricas encontradas. Além disso, os resultados apontam que as diferenças entre países desenvolvidos e emergentes devem ser levadas em conta.

Esses resultados contribuem sobretudo para subsidiar novas investigações a partir deste referencial teórico. Outras variáveis podem ser concebidas para melhor captar este referencial. Por exemplo, poder-se-ia construir um indicador de distribuição de poderes entre empresas financeiras e não financeiras sobre o mercado de crédito em cada países a partir de características das institucionalidade que rege cada um como grau de independência do Banco Central em relação ao Poder Executivo, existência de regras mais ou menos rígida de metas de inflação, existência de políticas de direcionamento de crédito e regulação do mercado de capitais. Também seria pertinente alterar o nível de investigação utilizando-se dados de empresas financeiras e não financeiras. Em suma, novas investigações a partir desta abordagem parece um caminho relevante e frutífero.

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Apêndice A. Estatísticas descritivas das variáveis utilizadas

VariávelNº de observaçõesMédiaDesvio PadrãoMenor valorMaior valor
Crescimento do estoque de capital6328.817.36-8.9353.18
Margem de spread bancário5637.207.34-17.4560.61
Participação dos bancos estrangeiros na posse dos ativos financeiros domésticos24442.8131.090.00100.00
Importância do mercado de capitais7110.200.300.001.00
Concentração bancária56078.7615.9032.73100.00
Participação dos bancos públicos na posse dos ativos financeiros domésticos23918.7719.740.0072.26
Crescimento do PIB6325.548.11-38.7266.58
Termos de troca7111.020.120.711.45

Fonte: Elaboração própria

Apêndice B. Lista de países presentes nas amostras utilizadas

 Países que compõem a amostra do modelo 1  Países que compõem a amostra do modelo 2
1Argentina41Malaysia1Albania41Kazakhstan
2Australia42Mexico2Algeria42Kuwait
3Austria43Malta3Angola43Lebanon
4Belgium44Morocco4Antigua and Barbuda44Malaysia
5Brazil45Myanmar5Argentina45Mauritius
6Bulgaria46Netherlands6Armenia46Mexico
7Brunei Darussalam47Norway7Aruba47Mongolia
8Canada48New Zealand8Azerbaijan48Morocco
9Switzerland49Peru9Bahamas, The49Namibia
10Chile50Philippines10Bahrain50Nigeria
11Cambodia51Poland11Barbados51North Macedonia
12China52Portugal12Belarus52Oman
13Colombia53Romania13Belize53Pakistan
14Cyprus54Russian Federation14Bolivia54Panama
15Czech Republic55Saudi Arabia15Bosnia and Herzegovina55Paraguay
16Germany56Singapore16Botswana56Peru
17Denmark57Slovak Republic17Brazil57Philippines
18Spain58Slovenia18Brunei Darussalam58Poland
19Estonia59Sweden19Bulgaria59Qatar
20Finland60South Africa20Chile60Romania
21France61Thailand21China61Russian Federation
22United Kingdom62Tunisia22Colombia62Saudi Arabia
23Greece63United States23Costa Rica63Serbia
24Hong Kong SAR, China64Turkey24Croatia64Seychelles
25Croatia65Vietnam25Dominican Republic65South Africa
26Hungary26Ecuador66Sri Lanka
27Costa Rica27Egypt, Arab Rep.67St. Kitts and Nevis
28India28El Salvador68Suriname
29Ireland29Equatorial Guinea69Syrian Arab Republic
30Iceland30Eswatini70Thailand
31Israel31Fiji71Trinidad and Tobago
32Italy32Gabon72Tunisia
33Japan33Georgia73Turkey
34Indonesia34Guatemala74Turkmenistan
35Kazakhstan35Hungary75Ukraine
36Korea, Rep.36India76United Arab Emirates
37Lao PDR37Indonesia77Uruguay
38Lithuania38Iran, Islamic Rep.78Venezuela, RB
39Luxembourg39Jamaica79Vietnam
40Latvia   40Jordan  

Fonte: Elaboração própria


[1] Freitas (1997) sintetiza a posição de Marx com a afirmação de que  “os bancos e seus clientes (as empresas industriais e comerciais) mantêm uma relação dialética especial de conflito e de interdependência.”

[2] É também a conclusão de Argitis (2001): “However, the important point is that he [Marx] considered the credit relations between the two groups of capitalists within a political framework where intra-capitalist conflicts occur over the distribution of profits. The power relations between industrial and money capitalists are at the centre of Marx’s analysis of the interest rate”.

[3] Vale registrar que o Livro 3 de O Capital foi editado postumamente a partir de manuscritos de Marx por Engels e que este afirma que a Seção V, que trata das questões aqui analisadas, é a que se encontrava em condições mais incompletas.

[4] Panico (1980) afirma que a análise marxista considera “the behaviour of monetary institutions as reflecting the distribution of power in the social structure.”

[5] A lista dos países que compõem as amostras de países pode ser consultada no Apêndice B.

[6] Para mais informações sobre a construção das variáveis da base de dados Penn World Table ver Feenstra, Inklaar e Timmer (2015) e também acessar www.ggdc.net/pwt.

[7] Para mais detalhes sobre a variável de importância do mercado de capitais ver Svirydzenka (2016).