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Governo federal ainda não entendeu a importância da comunicação

12 de dezembro de 2023

Realização da II Conferência Nacional de Comunicação ainda não está na agenda do governo federal

A Secretaria Geral do governo federal, órgão responsável pela relação governamental com a sociedade civil, disponibiliza em seu site um calendário das conferencias nacionais de políticas públicas que serão convocadas até 2025. Ao longo de 2023 foram 5 conferências realizadas. Em 2024, serão 11 encontros. Já para 2025 há 3 propostas. Ao todo, há no calendário do governo a proposta de realização de 19 conferências. Sinal de que um reencontro mínimo entre representação, participação e deliberação, como já foi apontado em outro momento por Fabiano Santos e Thamy Pogrebinschi (ver aqui), voltou a ser uma aposta do governo.

Há, no entanto, pelo menos uma ausência nesse calendário. Passado quase um ano de governo, a construção da II Conferência Nacional de Comunicação (II CONFECOM) ainda não entrou na agenda. Essa é uma exigência das dezenas de entidades, movimentos e organizações que compõem o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). Afinal, já se passaram quase 15 anos desde a realização da última conferência nacional de comunicação.

Com o tema Comunicação: meios para a construção de direitos e de cidadania na era digital, a I CONFECOM foi realizada em 2009 com a participação de quase 1.700 delegados de todo o Brasil. Aquele encontro foi um passo importante para toda uma mobilização e organização da sociedade civil em torno do tema da democratização da mídia que emergiu a partir dali. Primeiro, com o movimento de blogueiros que foi organizado nacionalmente pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé em 2010. Em seguida, com ativistas digitais que ocuparam as ruas nas jornadas de junho de 2013 como o Mídia Ninja e outros. Podemos dizer que aquela I CONFECOM regou o jardim e fez florescer milhares de interessantíssimas iniciativas de comunicação espalhadas por todo o país.

Nesse processo, a sociedade civil chegou até mesmo a formular propostas de regulamentação dos artigos da Constituição que tratam da comunicação. O objetivo era criar mecanismos legais para impedir a concentração dos meios de comunicação e garantir maior pluralidade e diversidade na mídia. Mas essas iniciativas nunca foram assumidas pelos governos desde então.

A convocação da II CONFECOM pode contribuir em duas direções. Por um lado, para a mobilização da sociedade civil que debate o tema da democratização da mídia. Hoje, esses movimentos estão dispersos e enfraquecidos, mas a convocação da conferência pode servir de estímulo para a reorganização do movimento como aconteceu em 2009. Por outro lado, para a construção coletiva de uma nova agenda de reivindicações de políticas públicas e regulamentações que são cada vez mais necessárias com o avanço do capitalismo digital das big techs.

Num cenário em que o conservadorismo vigora no Congresso Nacional, a trincheira democrática possível é a da sociedade civil. Hoje, esse Congresso impede que leis como a da regulamentação das plataformas que foi construída pelo deputado Orlando Silva (PCdoB) sejam aprovadas. Ao mesmo tempo, o Congresso está perto de aprovar uma legislação – PL 07/2023 – que visa concentrar ainda mais os serviços de radiodifusão no país.

Em um livro recente sobre as jornadas de junho de 2013 (ver aqui), Fábio Palácio explica em detalhes e profundidade como no meio daquele cenário econômico favorável do início do governo Dilma Rousseff emergiu uma onda de protestos que culminou em um golpe contra a democracia em 2016. Palácio mostra como os governos Lula e Dilma apostaram na agenda da redistribuição econômica, mas deixaram de lado a disputa de consciências, a luta de ideias, a construção de hegemonia. Isso abriu o terreno, diz Palácio, “para que a direita reacionária, investindo com força nos novos meios digitais, oferecesse sua própria interpretação, despolitizando as conquistas, identificando-as como fruto do mérito e da iniciativa individual, e não de um projeto político deliberado”.

Não há como democratizar a democracia sem antes democratizar a comunicação. Esse erro do passado não deveria ser cometido novamente.

Theófilo Rodrigues é cientista político