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Aldo Arantes: ‘Enfrentamos guerra cultural, precisamos disputar mente das pessoas’

13 de abril de 2024

Ex-presidente da UNE adverte que a esquerda precisa entender a dimensão da luta atual e levar o povo à rua e às redes

A vida política do goiano de Anápolis Aldo da Silva Arantes começou nos anos 1950 e no movimento estudantil secundarista. Depois militou na universidade, na Juventude Universitária Católica (JUC), na União Nacional dos Estudantes, a UNE, da qual foi presidente entre 1961 e 1962, na Ação Popular (AP), que ajudou a fundar, na Campanha da Legalidade, no exílio em Montevidéu, e durante a clandestinidade na Ação Popular Marxista Leninista (APLM) e, por fim, no PCdoB, desde o momento em que as duas organizações de combate à ditadura se uniram.

Quando Leonel Brizola desafia o golpe em curso em 1961, Aldo Arantes vai transferir a direção da UNE para o Rio Grande do Sul. Vai estar presente ao lado do governador gaúcho para garantir a posse do vice-presidente João Goulart, inclusive atuando na “Rede da Legalidade”.

Teve grande protagonismo na ascensão da “Ação Popular” (AP) dentro do movimento estudantil. Católico, o grupo foi criado em maio de 1962 com o objetivo de orientar a luta revolucionária pela libertação nacional e ele integrava sua direção nacional.

Com o advento da ditadura, foi preso duas vezes junto com sua esposa e dois filhos pequenos. A primeira prisão ocorreu em 1968 e a segunda em 1976 na esteira das perseguições que se seguiram à chamada “Chacina da Lapa” quando o comitê central do PCdoB foi cercado e três membros assassinados em São Paulo.

Barbaramente torturado, foi condenado em julho do ano seguinte a cinco anos de cárcere. Com a anistia, em agosto de 1979, foi libertado.

Hoje presidindo o movimento Advogados e Advogadas pela Democracia, Justiça e Cidadania (ADJC), Arantes esteve em Porto Alegre para o ato de Des-comemoração dos 60 anos do golpe de 1964, na Assembleia Legislativa/RS.

Nesta conversa com Brasil de Fato RS, ele relembrou seus percalços e conquistas na militância, analisou o avanço da maré ultradireitista no Brasil e no mundo e criticou a dificuldade da esquerda para entender a importância da luta ideológica que se trava agora.

Confira:

Brasil de Fato RS – Como foi a tua experiência na resistência da UNE aqui no Sul em 1961, durante a Campanha da Legalidade?

Aldo Arantes – Eu tinha acabado de ser eleito presidente da UNE e fui visitar o presidente Jânio Quadros. Chegando lá, enfrentei uma situação inusitada.Tinha três ministros militares esperando para falar com ele mas o Jânio deixou os três esperando e foi falar com o presidente da UNE.

Ali já estava configurada uma crise de grandes proporções, razão pela qual ele não tinha recebido os militares. Fui para Goiânia e, quando chego lá, tomo conhecimento da renúncia do Jânio. De imediato, vou para o Rio de Janeiro.  Ao chegar lá, a sede da UNE já tinha sido atacada pela direita, pelos militares. Então soubemos que, no Rio Grande do Sul, o governador Leonel Brizola tinha levantado a resistência. Então, a direção da UNE faz um manifesto, conclamando os estudantes para uma greve geral, nacional, em solidariedade à legalidade.

Fomos para o Rio Grande do Sul junto com o Betinho (Herbert José de Souza), que também era da Ação Popular e atuava como assessor da UNE. Foi um momento extremamente importante porque, naquele momento, não havia movimentos sociais organizados em plano nacional, a não ser a juventude.

Tanto é assim, que a UNE, o movimento estudantil, tanto na Universidade, quanto nas escolas secundárias, representou uma coluna vertebral da articulação da resistência em nível nacional. A palavra de ordem política era a do Brizola, mas eu falava também.

Acho que a participação da juventude foi decisiva a ponto de, depois de tomar posse, o presidente João Goulart visitou a sede da UNE. Foi a primeira vez em que um presidente da república foi lá para agradecer aos estudantes.

BdF RS – Lembras como era a luta da Ação Popular (AP) de que fazias parte naquele tempo?

Aldo Arantes – Na verdade tem um episódio muito interessante. Eu e o Betinho éramos da esquerda da JUC (Juventude Universitária Católica). Eu era a liderança política e o Betinho era a liderança intelectual e, nós dois, fomos, digamos assim, peças fundamentais na organização e na AP. Como surge a ideia de organização e a Ação Popular? Ocorre que foi se criando progressivamente um conflito entre a alta hierarquia da igreja e a esquerda da JUC. Em determinado momento, quando fui eleito presidente da UNE com o apoio do Partidão (PCB), o cardeal do Rio de Janeiro (Dom Jaime de Barros Câmara) me convidou para uma conversa.

Disse que o Vaticano tinha determinado o meu afastamento da JUC e da Ação Católica. Posteriormente, fiquei sabendo que talvez não tenha sido uma determinação do Vaticano mas assim foi que ele me transmitiu.

Disse ao cardeal – que apoiaria depois o golpe em 1964 – que ele estava cometendo um grave erro. Expliquei que estávamos exatamente procurando expressar aquilo que  considerávamos a opção de um católico comprometido com as lutas populares. Isso veio como um desdobramento de fatos ocorridos quando fui presidente do DCE da PUC/RJ.

Quando houve a invasão de Cuba (ataque realizado por exilados treinados e financiados pelos Estados Unidos em 1961) fizemos um movimento denunciando aquilo. Então, a direita da universidade começou uma movimento para me afastar. A gente realizou também um evento chamado Semana Social que redundou no manifesto do DCE da PUC/RJ. Tudo foi criando um conflito com a alta hierarquia da igreja e, com a minha eleição para a UNE, levou à ruptura. Já havia uma insatisfação do pessoal de esquerda com a tentativa da alta hierarquia impor limitações. Resolvemos fundar a Ação Popular em 1962, em Salvador.

BdF RS – Tinha um jornal em São Paulo, Brasil Urgente?

Aldo Arantes – O Brasil Urgente tinha uma ligação conosco. O nome Ação Popular tem a ver com o Action Populaire, da França. O pensamento francês, naquele momento, tinha uma influência grande. Os padres de pés descalços (ordem religiosa) têm uma certa influência no pensamento francês. Jacques Mounier tem uma influência grande.

Naquele momento, o Betinho era o coordenador da Ação Popular que, guardadas as devidas proporções, naquele momento se assemelha ao PT no momento seguinte. Com a diferença de que a Ação Popular tinha origem na juventude e o PT no meio dos trabalhadores. Em termos de dimensão e força política, sem dúvida nenhuma tem uma semelhança. Era basicamente a AP que conduzia a liderança na UNE e na UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), mas tinha presença forte entre os camponeses e operários.

Quando veio o golpe, eu era muito visado. Tanto eu quanto o Betinho resolvemos sair do Brasil. Fomos para o Uruguai. E lá, a gente convivia com o Brizola e outras lideranças exiladas. Depois, voltamos os dois. Betinho nem deveria ter voltado para o Brasil porque, como hemofílico, corria riscos. Voltamos para fazer a luta aqui na clandestinidade.

BdF RS – Isso foi quando?

Aldo Arantes – Viemos em 1965 para reorganizar a Ação Popular. E passei a ser o dirigente principal da AP.

BdF RS – Foi quando foi escrita aquela peça chamada Documento Base?

Aldo Arantes – Não, o Documento Base é feito em 1962. Antes do golpe. Ele sintetiza as ideias fundamentais da AP. Tenho um livro sobre isso, da AP ao PCdoB. É um livro elaborado por mim e o Haroldo Lima. Nele, mostramos que há uma evolução de um pensamento reformista radical – dentro do reformismo tínhamos uma posição bem mais radical do que, por exemplo, o antigo Partidão – para uma posição revolucionária.

O Documento Base ainda expressa essa concepção reformista radical. Defende o socialismo e tal. A resolução política, que adotamos em 1965, rompe com essa visão e coloca a questão da luta armada no centro da nossa concepção.

BdF RS – Foi quando o pessoal foi estruturado em células. É isso?

Aldo Arantes – Células, sim. É um nível de organização mais aperfeiçoado. Vai haver uma transição para o pensamento marxista. A necessidade de uma explicação mais aprofundada, de maior consistência para enfrentar aquela situação, abriu um debate chamado DTI, “debate teórico-ideológico”, que era exatamente uma tentativa de busca de um caminho que, na verdade, era o caminho marxista.

Nesse ínterim, somos convidados pelo Partido Comunista Chinês para ir à China. Vou para a China, e aí se abre, na Ação Popular, uma luta que termina transformando a AP em APML, a Ação Popular Marxista-Leninista.

BdF RS – Aqui no Rio Grande do Sul, naquela época, tínhamos o (hoje cientista político) José Luiz Fiori, não sei se você lembra.

Aldo Arantes – Conheço demais.

BdF RS – O Fiori era uma liderança do movimento.  E quando a AP começou a se entrosar no movimento operário? Sei que (o ex-deputado estadual) Raul Carrion foi um dos que deixou de ser estudante para ser operário e trabalhar no movimento operário.

Aldo Arantes – Na verdade, com essa ida para a China, escrevi um documento chamado Documento Amarelo. Amarelo era a cor da capa. Retratava uma série de conferências de que participei lá. Sobre marxismo-leninismo, o pensamento de Mao Tse Tung, o problema da revolução democrática, o caminho da luta armada, o partido.

O Documento Amarelo abre um processo de debate e de opção pelo marxismo como via, quer dizer, da concepção marxista da China naquele momento. É um dado interessante porque, naquele momento, o Partido Comunista do Brasil não tinha boas relações com a China. O PCdoB não considerava o maoísmo como uma nova etapa do marxismo. Por isso mesmo, o PC chinês começou a convidar uma série de organizações de esquerda, de tendência marxista para visitar o país.  

Quando voltamos há um processo de discussão e aprofundamento. E aí tem um episódio muito interessante. Várias pessoas eram religiosas, cristãs. Paulo Freire era da direção de AP, como também o Duarte Pacheco Pereira. Os dois eram da direção e religiosos consistentes. Então, havia aquele conflito. Duarte era muito estudioso e pesquisou e identificou uma polêmica no Partido Bolchevique (no começo da Revolução Soviética). Foi, digamos, a tábua de salvação para aquele conflito que os religiosos viviam. Porque Lênin, então, estava enfrentando um problema com os chamados padres vermelhos, que os setores sectários do Partido Bolchevique não aceitavam.

E Lênin diz o seguinte: “Temos que saber separar a política da ideologia”. Quer dizer, um partido político coloca a política como condição de militância. Se a pessoa adota o programa do partido, é assim. O partido tem a sua ideologia mas não a impõe. A visão materialista-dialética. O partido confia que, no processo da luta social, essas pessoas tenham a opção política e chegarão a isso. Então, essa história de separar a opção política facilitou a opção pelo marxismo.

BdF RS – Nessa época, lia-se muito, do ponto de vista religioso, o (filósofo e teólogo católico) Teillard du Chardin. E teve um filósofo francês, o Roger Garaudy, que era do Partido Comunista Francês, que escreveu um livro, Do Anátema ao Diálogo, que foi base para a AP. Ele colocava justamente essa discussão na França entre religiosos e marxistas. Foi um anátema e, então, estava em um momento de diálogo entre a situação do pessoal, como aqueles padres operários…

Aldo Arantes – Vou contar algo que não tem diretamente a ver com isso, mas tem certa relação e é muito significativo. Durante um período razoável, eu estive na OAB, até hoje estou ligado à OAB federal. Eu dirigia a Comissão de Mobilização pela Reforma Política, junto com a CNBB. Era a OAB, a CNBB e mais de 100 entidades. E  fiquei muito amigo do secretário-geral da CNBB, que era o Dom Leonardo Ulrich Steiner, hoje cardeal na Amazônia.

O presidente da Comissão Brasileira de Justiça e Paz era o Carlos Moura, meu amigo desde a década de 1960, desde a época de JUC, hoje liderança nacional do Movimento Negro. Escrevi um livro de memórias que se chama “Alma em Fogo”, que sintetiza toda essa história minha. Em certo momento, o Moura sugeriu que eu mandasse o livro para o Papa. Mandar para o Papa? Isso em 2015…

BdF RS – Sim, já era o Francisco.

Aldo Arantes – Aí falei “Bem, Dom Leonardo está indo para lá. Vou mandar”. Peguei dois exemplares. “Dom Leonardo, queria que o senhor levasse esse livro para Roma.” Ele perguntou “Para quem?” Claro que ele fez para me sacanear. Eu não ia falar que era para o Papa. Aí o assessor dele viu que eu estava em dificuldade. “Não, leva para o cardeal, o secretário de Estado”. Falei: “É, leva para o secretário de Estado”.

Na volta, ele me contou que estivera com o Papa. Inclusive, o Papa brincou com ele. Ele é muito brincalhão. Naquele momento, estava aquela história da Dilma, problema de compra de voto e tal. Ele brincou com o Dom Leonardo (perguntando) se o Dom Leonardo tinha comprado muito voto para poder ser reeleito secretário da CNBB. E aí também manifestou a solidariedade à Dilma.


Capa do livro enviado para o Papa Francisco / Foto: Divulgação

Nesse ínterim, Dom Leonardo fala para ele que eu fora expulso da Igreja e que, hoje, eu era um dirigente comunista. Era da Ação Católica e fora afastado por determinação do Vaticano. E o Papa: “Escuta, o que eu mando para ele?” Dom Leonardo disse para mandar uma benção. O Papa saiu, trouxe um terço de prata, benzeu e mandou para mim. Tenho esse terço até hoje. Quer dizer, o Papa e eu, então, mantemos boas relações.

BdF RS – Queria que você estabelecesse para o leitor as diferenças entre a luta na ilegalidade e depois da legalização do Partido. Quais são?

Aldo Arantes – Passei clandestino 11 anos da minha vida e fui preso duas vezes. Na clandestinidade, era militante e dirigente da Ação Popular e, no momento seguinte, passei a ser militante e dirigente do PCdoB. A vida clandestina era muito difícil. Uma  opção minha e da minha mulher – e eu diria mais dela, mas com meu apoio –  foi de não nos separarmos dos filhos. Isso foi fundamental para eles. As pessoas que se separaram dos filhos, que deixaram os filhos com a avó, não sei o que tem, criou-se um problema.

Em determinado momento, nesse processo de opção pelo marxismo, uma das coisas que fizemos foi a integração na produção, política de integração, sobre a influência da China e principalmente dos vietnamitas. Quer dizer, lá no Vietnã, não tem história. “Comer junto, trabalhar junto, lutar junto com o povo”. Então, a ideia era que, para avançar do ponto de vista de uma ligação mais direta com os trabalhadores, era necessário ir para o campo. Fui para o interior de Alagoas morar com os camponeses, o Betinho foi para uma fábrica, a Mara Loguércio e o José Loguércio foram para a Bahia…

A gente morava no Interior, em um distrito que se chamava Pariconha, pertencente à cidade de Água Branca, sertão de Alagoas. Eu fui preso, meus filhos, de dois e três anos de idade, ficaram presos quatro meses e meio com a mãe. Fiquei seis meses e terminei fugindo. Foi a primeira prisão. Voltei para a clandestinidade.

Nesse meio tempo, a AP se incorpora ao PCdoB. Deveria haver um congresso mas a gente chegou à conclusão de que, em função da guerrilha do Araguaia, tínhamos que acelerar. Então, a maioria de AP decidiu se incorporar ao PCdoB. Um segmento não aceitou. Esse segmento, uma parcela dele, inclusive, entrou no PT posteriormente.

BdF RS – Quero que compares a situação do golpe de 1964 com a tentativa de 2023. Será que dá para dizer que o 8 de janeiro de 2023 foi aquela história do Marx, que a história se repete uma vez como tragédia e outra como comédia?

Aldo Arantes – O golpe de 1964 é um desdobramento que vem em uma tentativa golpista. E começa com Getúlio Vargas (em 1954). Uma coisa que fica caracterizada na história do Brasil é que, sempre que existe um presidente que tem algum tipo de sensibilidade com o povo e algum tipo de afirmação da soberania nacional, vem golpe.

Veio a tentativa de golpe contra o Getúlio. Foi abortado porque ele se suicidou. Mas depois veio a tentativa de golpe contra Juscelino (Kubitschek). Ele não era um homem de esquerda, mas teve, digamos, a coragem de enfrentar o FMI. Então, isso, para o imperialismo era suficiente.

BdF RS – A criação da Petrobras tem a ver com a tentativa de golpe contra Getúlio também?

Aldo Arantes – Certamente. A política de desenvolvimento nacional independente do Getúlio tem tudo a ver. Depois vem a Legalidade, em 1961. É a tentativa novamente de roubar. Sob a alegação de que o Jango estava na China e que era comunista, os ministros militares decidiram que, caso ele viesse para cá, seria preso. E aí o Brizola desencadeia a Campanha da Legalidade.

No golpe de 1964, você teve o Instituto Brasileiro de Ação Democrática, o IPES. Você tinha o IBAD, a Ação Democrática Parlamentar. Você tinha a Marcha com Deus pela Família. Você tinha os Corpos da Paz, que era a presença da CIA em várias partes do Brasil. E você teve, exatamente, a presença da marinha norte-americana no Nordeste. Com o apoio dos setores empresariais, o golpe veio e rapidamente se consolidou.

Qual a diferença do golpe para a situação atual? No passado, os golpes militares eram dados com tanques. Hoje, são dados através da conquista da mente das pessoas. É isso que explica por que a extrema direita ganha eleição no mundo inteiro. A chamada guerra cultura trabalha a consciência das pessoas no sentido de desmontar os valores que a esquerda e os setores democráticos construíram.

Os valores de igualdade, de justiça, de soberania nacional, de democracia. Tudo isso é ideia velha. O novo é o mercado. São os interesses do mercado e a utilização do fascismo como forma de impor a lógica do mercado. A guerra cultural coloca para nós um novo momento da luta política, que ganha novos contornos. Veja que, depois de tudo o que aconteceu,  Bolsonaro continua forte. Na rua, nas redes sociais, no parlamento.

A esquerda, de uma forma geral, não compreendeu ainda a importância dessa questão da dimensão da luta ideológica. Subestimou o fator subjetivo. Subestimou a questão da construção de uma consciência social. É a luta pela hegemonia. Essa questão está muito presente. Nos dias atuais temos que compreender a importância da frente ampla.


Livro organizado por Aldo Arantes para a AJDC / Foto: Divulgação

Compreender a necessidade que o governo atenda às aspirações da sociedade. Mas sabemos que o governo não age só por sua disposição. O governo expressa a correlação de forças. E é atacado o tempo todo por um poderoso grupo econômico, pela grande mídia, pelos militares. E acho que o movimento social está frágil.

É incrível você ver como, hoje, a extrema direita está mais ativa do que os setores democráticos. Acho que o MST tem uma contribuição importante nisso. Mas os setores democráticos, de uma forma geral, têm que jogar pesado para botar o povo na rua. Mas botar milhares, não adianta botar mil, dois mil, três mil, isso não refresca.

BdF RS – Teria alguma coisa a ver, por exemplo, com a relação que o Lula está tendo com os militares? Essa relação meio que de aceitação…

Aldo Arantes – Acho que tem a ver. Uma coisa é o que o presidente da República fala em função das situações que sofre. Qual o problema que percebemos na atitude do Lula ao dizer que não é para comemorar o golpe? Ele está mais preocupado em garantir que militares sejam presos. Isso é fundamental.

Agora, acho que o movimento social não pode ficar nisso. Ele, como presidente da República, tem que estar preocupado com o que garante a ele prender militares. Então, faz uma média, entrega uma parte para poder conquistar a outra. O movimento social não pode. Pelo contrário, o Lula tem dito que é necessário pressão.

Se o governo sofre uma pressão forte dos setores econômicos e dos militares, fica difícil. O cara não vai poder agir sozinho. Então, é necessário que ele tenha uma pressão forte da sociedade e a pressão que falo é o povo na rua, mas também nas redes sociais. Hoje, a eficácia das redes sociais é grande e estamos dançando nisso.

Tenho um livro sobre isso, chamado Reconstruir a Democracia, União de Amplas Forças Políticas e Sociais para a Luta Ideológica. O pessoal não compreende. Absolutizou a questão da luta política. Não percebeu que a luta política hoje tem uma nova dimensão e não valorizou a luta de ideias.

Fonte: Brasil de Fato