Primeiro de Maio: o festival secular da classe trabalhadora
No Dia do Trabalhador, centrais sindicais publicam artigo conjunto com reivindicações unitárias da classe trabalhadora na Folha de SP
Por Theófilo Rodrigues
Em um artigo de 1990 intitulado “O nascimento de um feriado: o primeiro de maio” e que foi publicado posteriormente no livro “Pessoas extraordinárias: resistência, rebelião e jazz”, o maior historiador de todos os tempos, o marxista britânico Eric Hobsbawm, apresenta uma das mais deliciosas narrativas sobre a história de criação do Dia do Trabalhador (1).
Hobsbawm lembra que as sociedades seculares jamais tiveram êxito na oferta de alternativas aos rituais religiosos. Haveria, talvez, apenas uma única exceção, uma “única conquista indiscutível realizada por um movimento secular sobre o calendário cristão ou qualquer outro calendário, um feriado estabelecido, não apenas em um ou dois países, mas oficialmente, no ano de 1990, em 107 países”. Hobsbawm estava falando do Primeiro de Maio, a festa internacional do movimento da classe operária que foi realizada pela primeira vez em 1890.
Foi nesse contexto de celebração e luta do Primeiro de Maio que dirigentes das oito principais centrais sindicais no país se uniram ontem para publicar um artigo conjunto na Folha de SP para defender uma agenda única de reivindicações dos trabalhadores no Brasil (2).
Assinado por Adilson Araújo (CTB), Antonio Neto (CSB), Sérgio Nobre (CUT), Miguel Torres (Força Sindical), Ricardo Patah (UGT), Moacyr Roberto Tesch Auersvald (NCST), Nilza Pereira (Intersindical Central da Classe Trabalhadora) e José Gozze (Pública Central do Servidor), o artigo argumenta que “não há democracia sem sindicatos, e a luta sindical é parte essencial da vida democrática”. E eles estão certos. Como disse Antonio Candido em uma famosa entrevista, “o que se pensa que é face humana do capitalismo é o que o socialismo arrancou dele com suor, lágrimas e sangue” (3). Parafraseando Candido, poderíamos dizer que o que temos de democracia no mundo é o que a luta dos trabalhadores arrancou do capitalismo com suor, lágrimas e sangue.
No Brasil, a atuação dos sindicatos é muito forte. Basta dizer que todos os anos, os sindicatos celebram cerca de 50 mil acordos e convenções coletivas no país. Segundo dados do Dieese, 86% dos contratos coletivos celebrados neste ano contam com aumento salarial. Ou seja, a luta sindical vale a pena, mesmo que dentro dos limites do capitalismo. Diga-se de passagem, como bem recorda Engels em uma carta para Bloch de 1890, se essa não fosse uma luta relevante, Marx não teria escrito o capítulo 8 de O Capital, aquele em que tratou da luta histórica da luta pela redução da jornada de trabalho (4).
As centrais sindicais defendem no texto “a articulação e coordenação de uma política de desenvolvimento produtivo, com forte ênfase industrializante, orientada pela sustentabilidade socioambiental, com a geração de empregos decentes, qualidade nos postos de trabalho e crescimento dos salários”. Trata-se de um ponto fundamental. Ao trazer a sustentabilidade para o centro de sua preocupação, as centrais sindicais demonstram estar conectadas com a grande agenda do século XXI de enfrentamento das mudanças climáticas.
Outro ponto importante levantado pelas centrais é o que menciona o trabalho precarizado dos profissionais de plataformas como a Uber. São trabalhadores que não possuem direitos trabalhistas, previdenciários, sociais e sindicais. De acordo com o texto, as centrais estão empenhadas na aprovação de um “acordo histórico que garante ao motorista autônomo as proteções previdenciária e trabalhista, trabalho decente, piso de remuneração, direito e acesso à informação, capacidade de organização sindical e direito de representação e de contratação coletiva, agora em debate no Congresso por meio do PLC 12/2024”.
As centrais concluem apontando para a urgência de “tratar das políticas para os aposentados, da correção da tabela do Imposto de Renda, da valorização do serviço público e da reorganização do sistema público de emprego, trabalho e renda”.
A unidade das representações da classe trabalhadora, como demonstrada nesse texto unificado publicado ontem, é um instrumento fundamental para o avanço da democracia.
Referências:
(1) HOBSBAWM, Eric. Pessoas extraordinárias: Resistência, rebelião e jazz. São Paulo: Paz e Terra, 1998.
(2) O artigo na Folha de SP pode ser visto aqui.