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Reflexões sobre a III Plenária do XX Comitê Central do Partido Comunista da China

17 de setembro de 2024

Intervenção de Rodrigo Moura, secretário da representação do PCdoB na China, no XIV Fórum Socialista Mundial da Academia Chinesa de Ciências Sociais

Reflexões sobre a III Sessão Plenária do XX Comitê Central do Partido Comunista da China por uma perspectiva brasileira: Uma faísca, dois paradigmas e três oportunidades

Prezados camaradas, senhoras e senhores:

Exprimo a minha mais profunda gratidão ao XIV Fórum Socialista Mundial da Academia Chinesa de Ciências Sociais que se realiza aqui hoje.

Dirijo cordialmente a minha saudação a todos os camaradas comunistas, aos jovens trabalhadores, aos destacados dirigentes políticos, aos estudiosos e às delegações e organizações convidadas a participar deste frutífero evento.

Em primeiro lugar, gostaria de salientar que me sinto honrado por participar neste fórum tão importante.

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E é de fato tão importante porque está em um momento histórico altamente complexo, perigoso e imprevisível. Atualmente são muitas sombras e muito poucas luzes. De forma que o próximo passo que daremos determinará o nosso futuro e o futuro da própria humanidade.

Portanto, hoje, neste encontro, me atrevo a apresentar-vos, sob uma perspectiva brasileira, um entendimento sobre a III Sessão Plenária do XX Comitê Central do PCCh, a importância da América Latina para a continuidade do movimento comunista em todo o mundo, os dois novos paradigmas proporcionados pelo cenário atual que possibilita os países do Sul Global a buscarem um reposicionamento a fim de alcançar a independência econômica, geopolítica e social. Por conveniência, decidi abreviar este colóquio para: uma faísca, dois paradigmas e três oportunidades.

Camaradas, a III Sessão Plenária do XX Comitê Central do PCCh, realizada em julho de 2024, é um marco importante no caminho do desenvolvimento político e econômico da China, e uma referência muito adequada às necessidades globais atuais, porque apresentou uma visão mais inovadora, mais coordenada, mais amiga do meio ambiente e mais aberta. Considerando conflitos internos e externos, busca maior abertura e conectividade com outras regiões, ao mesmo tempo que promove a autossuficiência, o mercado próprio e tecnologias próprias; Enquanto procura garantir a estabilidade interna, também propõe um ambiente externo mais equitativo e inclusivo em termos de autodeterminação, desenvolvimento e soberania nacional.

Alguém definitivamente perguntará: O que esta conferência chinesa tem a ver conosco do outro lado do mundo? Prezados, mesmo que hajam movimentos de divisão, alienação e desacoplamento no mundo de hoje, não devemos nos enganar. Através das infraestruturas, mídias digitais, comércio, dificuldades e sonhos, estamos mais conectados do que nunca. Portanto, devemos prestar atenção ao que está acontecendo aqui e acolá. Como dizem, o bater de asas de borboleta na China pode desencadear um tufão no outro lado do mundo. E vice-versa.

Sabemos que os Partidos Comunistas desempenharam um papel crucial na história política e social de muitos países. Eles foram e continuarão sendo pioneiros na luta pela justiça social, anti-imperialismo e desenvolvimento independente. Durante muitos anos, os Partidos Comunistas ajudaram a construir e fortalecer as sociedades baseando-se nos princípios da equidade e do coletivismo. Mas essa compreensão e perspectiva mudaram recentemente, especialmente desde a dissolução da União Soviética e seu bloco socialista, entre 1989 a 1991.

Nos últimos dias, do outro lado do mundo, no Brasil, jovens comunistas se engajaram em um debate muito acalorado nas mídias sociais sobre a verdadeira viabilidade do socialismo: se vamos ganhar ou se já perdemos. O sentimento pessimista tornou-se ainda mais forte, baseado nas muitas dificuldades que enfrentamos na região: o histórico brutal do domínio imperialista e das políticas econômicas impostas, tais como, receitas, terapias, crédito e novas formas de colonização. Até chegar ao momento que vivemos hoje: crises crônicas e recorrentes do Neoliberalismo. São todos eventos catastróficos em toda a América Latina. Vemos portanto que o pessimismo destes jovens camaradas tem algum sentido.

Como disse a presidente da Assembleia Geral da ONU, Maria Fernanda Espinosa Garces, em 2018, “A desigualdade priva muitas sociedades de esperança e oportunidade. A falta de sonhos e significado para o futuro é usada para dividir nossas comunidades, exacerbar racismo, xenofobia e violência, tudo isso viola completamente a Carta que adotamos em 1945.”

Mas há esperança na China. Vivendo aqui, tive a oportunidade de conversar com os jovens para entender sua compreensão da causa comunista. Fiquei impressionado com

as habilidades teóricas e conceituais desta sociedade da nova era. De fato, os debates nas ruas e na Internet mostra que há uma nova configuração inteligente avançada que pede o aprofundamento ainda maior do socialismo. No entanto, vi também um alto nível de ignorância em relação à causa comunista em outras partes do mundo. Um dia, perguntei à alguns jovens estudantes: O que aconteceu no outro lado do mundo? Sem dúvida me responderam: Ah, no outro lado, tudo é capitalismo; O capitalismo já venceu.

Naquele momento, percebi que eles não nos reconheciam, nós, partículas, fragmentos, pequeninas faíscas de batalhas anteriores. Então corrigi-os e disse: “Não, lá não é tudo o capitalismo. Existem faíscas!” Como Mao Zedong disse: “Uma faísca é suficiente para incendiar a pradaria.” Assim camaradas, para nós latino-americanos, a luta continua. Cuba continua a lutar. Os movimentos sindicais no Uruguai e na Argentina continuam lutando. Os movimentos Quilombolas no Brasil continua lutando. Movimentos indígenas na Amazônia, Bolívia, México, Guatemala, Equador, Chile e Peru continuam lutando. Agricultores sem terra, trabalhadores urbanos sem direitos e entregadores semi-escravizados continuam a sacrificar suas vidas pela causa comunista.

Estas faíscas de esperança e unidade decorrem da compreensão de que a luta do comunismo pela justiça social e pelo bem-estar coletivo é um esforço global possível. Hoje, vemos mudanças no mapa geopolítico e econômico global; Temos dois novos paradigmas. O primeiro é a multipolarização internacional. O mundo não é mais dominado por uma única grande potência ou grupo; Pelo contrário, estamos a viver uma distribuição mais equilibrada do poder entre os diferentes países e regiões. Esta nova dinâmica traz imediatamente o desafio de navegar entre interesses políticos e econômicos e um novo capítulo do imperialismo. Mas também nos traz novas oportunidades para alcançar independência econômica, geopolítica e social.

O segundo paradigma é o desenvolvimento do socialismo, especialmente a experiência da China, que tem provado ser um modelo eficaz para o desenvolvimento e estabilidade da sociedade chinesa. Isto é importante para vós e para nós. Porque a teoria socialista amadureceu e alcançou resultados significativos e eficazes. Desde a implementação das reformas econômicas na década de 1970, este modelo provou a sua capacidade de promover o crescimento econômico e, recentemente, conseguiu manter ainda mais o seu compromisso com a justiça social. Proporciona uma outra visão para todos, de como equilibrar o desenvolvimento econômico com a prosperidade comum. Para todos, essas inspirações representam uma abordagem socialista pragmática e adaptativa, enfatizando a importância de considerar as origens históricas e culturais únicas de cada povo e cada nação.

Nesta situação, os partidos comunistas nacionais e locais têm três oportunidades: 

A primeira é a reforma da governança global – a multipolaridade está a mudar a governança global. A China posicionou-se como uma potência mundial e apresentou novas propostas para construir uma comunidade com um futuro compartilhado para o mundo através de três medidas principais: desenvolvimento global, segurança global e civilização global. Essa nova postura, juntamente com outras iniciativas como BRICS, G20 e fóruns regionais, dá ao Brasil a oportunidade de se reposicionar no sistema internacional e desempenhar um papel ativo no desenvolvimento de novas normas e estruturas internacionais para promover a justiça social e econômica, respeitando a diversidade cultural e política de todos os países.

A segunda oportunidade é o desenvolvimento e integração regional –  estamos à beira de uma nova ronda de desenvolvimento industrial impulsionada pela inovação tecnológica e pelo desenvolvimento sustentável. A América Latina tem a oportunidade de liderar iniciativas que incorporam justiça social ao desenvolvimento econômico e garantir que os benefícios das novas tecnologias, desenvolvimento sustentável e economia verde se tornem um novo ponto de partida para o Brasil e a América Latina. Seja pela energia limpa ou pelas riquezas naturais, o foco principal deveria ser o desenvolvimento humano em todo o continente latino-americano. 

Notem também que a estratégia da iniciativa “Cinturão e Rota” é claramente uma plataforma chinesa para o mundo. Mas em uma América Latina tão dividida, a Iniciativa Cinturão e Rota não significa apenas conexões com a China, mas também oferece mais oportunidades de integração regional entre os próprios países latino-americanos. O Brasil que historicamente sempre esteve de costas à América Latina, agora, busca cada vez mais aprofundar suas relações com os países vizinhos.

A terceira oportunidade é a revitalização dos partidos comunistas – este é o momento de revitalizar a luta comunista em todo o mundo. Para os partidos comunistas em todo o mundo, a experiência, conquistas e influência da China no Sul global trouxeram mudanças significativas no ambiente regional, o que significa que os partidos comunistas locais têm novas oportunidades de ação. Agora, o socialismo apresenta novas propostas disruptivas que competem com as ideologias dominantes, e já alcançou resultados sem precedentes na história da humanidade. Por exemplo, o desenvolvimento pacífico, a civilização ecológica, a revitalização rural e o Programa de Alívio à Pobreza.

Em suma, o papel dos partidos comunistas é mais importante do que nunca, e as oportunidades de mudança no Sul global também são mais promissoras. A situação é mais complexa, as dificuldades são maiores e os riscos são enormes. Mas como nos disse o grande João Amazonas, construtor e teórico do Partido Comunista do Brasil: “Este será o século XXI. No início haverá sombras e luzes, mais sombras do que luzes. Depois a imagem se inverterá. Nessa momento, a humanidade viverá em uma era de esperança.”

Vamos relembrar também a Longa Marcha de Mao Zedong, que foi também um momento decisivo na história do comunismo. Durante esse período, os líderes do PCCh enfrentaram adversidades extremas, podemos até dizer que estavam derrotados, mas sua perseverança e estratégia política permitiram que a luta revolucionária continuasse. Ou seja, eles fizeram todos os esforços para utilizar os recursos disponíveis naquele momento. Este evento não só simboliza a resiliência, mas também a adaptabilidade necessária para superar desafios aparentemente intransponíveis.

Camaradas, obrigado por continuar a desenvolver o socialismo com características chinesas e fazer contribuições para o desenvolvimento do socialismo mundial. Obrigado pela vosso suporte e troca de experiências, que são fundamentais para a construção de uma comunidade de destino compartilhado. Obrigado por este encontro, obrigado aos tradutores e a toda a equipe que se empenhou arduamente para a realização deste evento.

Rodrigo Moura, 36 anos, natural de Osasco, SP. Filiado e Militante do PCdoB, Secretário de Estruturação Partidária da representação do Partido na China. Formado em Negócios Internacionais pela FGV e Mestre em Estudos Chineses pela Universidade de Zhejiang. Na China integrou o Grupo de Estudos do Socialismo com Características Chinesas da Universidade de Zhejiang, fez parte do movimento estudantil como presidente do Conselho Internacional de Estudantes em 2021 e em 2021 fundou o Centro de Estudos Latinoamericanos da Zhejiang University International Business School onde convidou a ex-presidenta Dilma Rousseff para fazer o discurso de abertura. Seu foco de pesquisa são as políticas de Alívio a Pobreza, revitalização rural e recuperação do meio ambiente na China.