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Mais impulsos ao trabalho de Formação. Combate ao neofascismo

14 de novembro de 2024

O economista Sérgio Barroso apresenta um diário de sua passagem por Lisboa e Paris

Entre 9 e 24 de outubro estivemos em Lisboa e Paris, misturando trabalho e contatos, com o esticar de olhos nas metamorfoses dessa parte do “velho mundo”. É sabido que dois ilustres franceses da ciência da história, Lucien Febvre [1] e Fernand Braudel [2] vasculharam detalhes dessa Civilização.

Lisboa ainda me pareceu melancólica – em angústias ao mar, com Pessoa? Claro, apenas pareceu. De todo o modo, o dileto camarada e amigo António Filipe, jurista e deputado Federal do PCP expressou-se em grande preocupação: o partido neofascista “Chega” passara de 12 para 50 deputados, entre 2019 e 2024, nas legislativas de março. “Inesperado”, esse crescimento, disse Filipe.

Com António Filipe: trocando livros e conversas

NEOFASCISMO

A propósito, tenho recomendado com insistência o importante estudo de Gianni FRESU, “Nas trincheiras do ocidente: lições do fascismo e antifascismo”. O livro revolve as entranhas da ascensão de Mussolini, na Itália; debate diversas teorias; revisita contribuições de Gramsci; atualiza as características e determinações atuais do fascismo europeu.

Para Fresu, existe uma clara diferença – “perigosa” – entre o fascismo dos anos 1920-30 e o avanço neofascista europeu contemporâneo. Ela residiria em que, agora, grupos fascistas e xenófobos ganham boa parte do próprio consenso eleitoral nas grandes periferias urbanas em áreas e regiões de crise pós-industrial, no seio das massas populares e trabalhadores, contra os imigrantes e críticos dos privilégios da corrupção política. Especialmente no pós-crise capitalista global iniciada em 2007-8, junto à “crise de hegemonia das classes dirigentes liberais, há empobrecimento geral das camadas populares e das camadas médias; e haveria “esgotamento da credibilidade da esquerda europeia”, aponta o filósofo italiano (Ponta Grossa, UEPG, 2017, pp. 230-1).

ESCOLAS, TRABALHO DE FORMAÇÃO

Na histórica sede do Partido Comunista Português, foi bastante proveitosa a troca de ideias – e projetos -, com o camarada Manuel Rodrigues (Comissão Política do PCP, editor do “Avante!”, e do Setor de Formação), e a camarada Cristina Cardoso (da Secretaria de Relações Internacionais).[3] Com os camaradas do PCP nossa proposição principal foi a encontrarmos as formas adequadas de reforçarmos a colaboração teórica e ideológica, exatamente nesse quadro de grandes impasses do capitalismo, de avanço da extrema-direita, de ascensão da China socialista.

Com os camaradas Cristina e Manuel Rodrigues (Lisboa, 11/10/2024).

PARIS REVOLUCIONÁRIA

Na bela Paris,[4] logo me deparo com a barroca Igreja de Saint Paul (construída entre 1627-1641) e a célebre inscrição – inapagável -, em uma de suas colunas, de revolucionários comunardos jovens, fuzilados, então abrigados por jesuítas: “República francesa ou morte!”

Igreja de Saint Paul, centro de Paris

Aliás, não creio que exista – não conheço – nenhuma cidade do mundo onde a efervescência das transformações contemporâneas combine-se com o enraizamento e o cultivo das tradições revolucionárias, como em Paris. As ruas de hoje estão, por exemplo, coalhadas da presença imigrante, em sua grande exuberância cosmopolita. Enquanto suas estações da extensa rede de metrô (Bastille, Stalingrado, Colonel Fabien, Bolivar, Gabriel Péri etc.) fixam a memória histórica inabalável.

No centro de Paris (Marais), uma homenagem expressiva à Revolução dos Cravos!

A GRAVE CRISE POLÍTICA FRANCESA

Na breve e simpática troca de ideias com o camarada Vincent Boulet, Secretário de Relações Internacionais do PCF, chamou a atenção o problema grave da crise política da França atual. Como se sabe, o presidente Macron recusou a indicação dos nomes da Nova Frente Popular, vencedora das eleições ao parlamento, para o cargo de Primeiro-Ministro. O PCF está voltado para debate interno, neste final de ano,[5] cuja temática central pode-se ver na nota da Comissão Executiva Nacional do partido francês: “Onde está a crise política francesa?” [6]. Na sequência, dei umas pinceladas sobre o nosso resultado eleitoral de 2024 e questões sobre o seu significado. Boulet fez questão que nos fotografássemos sob o famoso quadro de Delacroix.

Com o camarada Vincent Boulet. Atrás, o famoso quadro de Eugène Delacroix, “A liberdade guiando o povo” (1830), homenagem à revolução francesa.

ECONOMIA POLÍTICA

Na abordagem do trabalho de formação, foram bastante produtivas as conversas com Frederic Boccara (Executiva Nacional do PCF, responsável da economia, emprego e da mundialização econômica do CC); e Denis Durand, (diretor da tradicional Revista de Economia Política).

Com Fredéric e Denis (sede do PCF)

Acordamos em concentrar esforços em dois temas gerais, “Alternativas ao dólar”, e “Financeirização global”, certamente dois pontos centrais no estágio atual do capitalismo. Aqui, avançou-se em ideias concretas, como seminários, colaboração efetiva em livros e revistas, grande importância da temática dos Brics, estudos sobre economia chinesa etc.

Ressaltou-se a grande contribuição de Paul Boccara, teórico marxista francês e formulador da ideia do “Capitalismo monopolista de Estado; informou-se do esforço de pesquisas do PCdoB sobre o capitalismo contemporâneo, e a importância dos estudos do camarada Elias Jabbour sobre a China.

O ciclo de frutíferas da troca de ideias sobre a formação marxista e progressista na atualidade, em Paris, foi concluído pelo diálogo com o membro da executiva nacional, responsável pelo setor de Formação, hoje vice-presidente e indicado próximo presidente da Fundação Gabriel Peri, camarada Guillaume Roubaud-Quashie.

As mesmas questões foram abordadas, no sentido do fortalecimento bilateral das relações entre as Fundações Maurício Grabois e Gabriel Péri, a partir de várias coincidências sobre o espectro “marxista e progressista” de ambas entidades.

Alto da sede nacional PCF, com Guillaume Roubaud-Quashie

FASE COMPLEXA DO TRABALHO FORMATIVO

A criação dos 8 Grupos de Pesquisa pela Fundação Maurício Grabois evidencia o esforço hercúleo a ser empreendido, diante das violentas alterações que sacodem o mundo. Particularmente no GP-8, a Comissão de Estudos Teóricos deve constituir um programa de pesquisa e estudos, nuclearmente sustentada numa bibliografia/debates/cursos/seminários, definindo uma hierarquia de prioridades, baseada na (i) Economia Política Marxista e do Desenvolvimento; (ii) no Exame do Estágio atual do Imperialismo e as implicações à Lei do Desenvolvimento Desigual; (iii) Filosofia da Ciência; (iv) Teoria marxista do Conhecimento (desenvolvimento da Gnoseologia Marxista); (v) 4ª revolução industrial ou Indústria 4.0 e Inteligência Artificial (ou novos paradigmas tecnológicos disruptivos); (vi) no estudo das Experiências da Construção Socialista Contemporânea e o Planejamento (incluso o “Projetamento”); (vii) Ciência Política, Estado e Democracia.

O reforço internacional dos laços com o teórico-formativo, em curso, celebrando convênios com a China, e elevando agora o nível de contatos com o PCP e o PCF, representam passos indispensáveis para o fortalecimento de nossa luta apela causa do desenvolvimento e da perspectiva socialista. O que igualmente significa o combate sem tréguas ao neofascismo.

Aqui, em visita ao físico e filósofo da ciência Michel Paty, honroso amigo, e a sua companheira Cida (mineira), em seu apartamento, em Paris. O retrato, famoso – do (santista) Mario Gruber, 1978 -, é do formidável físico (pernambucano) Mario Schenberg. Abaixo, o novo livro editado por Olival Freire, que, conforme o ilustre professor Michel Paty: “A obra já é considerada um sucesso”. Editora consagradíssima, uma pancada de 1312 páginas!

NOTAS

[1] Conforme Febvre, em seu famoso Curso no Collège de France (1944-45), a Europa é um sonho de unidade; e assim sendo, a feudalidade, que é o contrário da unidade, a feudalidade que é multiplicidade, que é complexidade, a feudalidade, que é despedaçamento, esmigalhar do poder, a feudalidade nada tem a ver com a gênese da Europa. (“A Europa: gênese de uma civilização”, Aula XI, Bauru, EDUSC, 2004, p. 139).

[2] F. BRAUDEL, em “Gramática das civilizações”: A Europa é uma península asiática. (…) [possui] suas ligações com os sete mares do mundo. (…) Existe oposição entre Leste e Oeste, entre Norte e Sul, entre o Mediterrâneo quente, o Mar Internum, o mar Interno do Sul e os ‘Mediterrâneos’ frios do Norte: Mancha, mar do Norte, Báltico. (…) Esses contrastes Leste-Oeste ou Norte-Sul decorrem de causas históricas quanto da geografia. O Oeste olha para Roma, o Leste para Constantinopla (Martins Fontes, 2004, p.286, 3ª edição).

[3] Há muitas coincidências entre o trabalho nas escolas de formação do PCP e do PCdoB, entre elas a simultaneidade de atividades dos nossos professores, que não possuem dedicação integral. Ressaltamos o nosso percurso de construção do Currículo da Escola João Amazonas, com um novo destaque para uma bem maior compreensão do Brasil.

[4] Em todas atividades em Paris contei com a inestimável ajuda e descortínio de nosso querido camarada Henri Blotnik, membro da Secretaria de Relações Internacionais do PCF. A ele, nossos efusivos agradecimentos!

[5] A Conferência Nacional do partido será 14 dezembro (mais de 500 delegados). O processo de mobilização e discussão começou no final de setembro, as células e secções tinham o mês de outubro e início de novembro para produzir suas contribuições coletivas.

[6] No texto, contundente, da CEN do PCF, lê-se: “É colocada ao capitalismo francês a questão crucial do seu lugar e da sua margem de manobra, no contexto da globalização em colapso”. Ou ainda, “A sociedade francesa, fraturado por 40 anos de contrarrevolução neoliberal, vê todas as contradições que a atravessam se desenrolar”.

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