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O legado do PCdoB nas políticas públicas de valorização do trabalho na Bahia

4 de dezembro de 2024
Ex-secretário do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte do Governo da Bahia, Nilton Vasconcelos apresenta o legado de políticas públicas de valorização do trabalho deixado pelo PCdoB. Na foto, o ex-secretário de Trabalho do Governo da Bahia, Davidson Magalhães (2019-2024).

Ex-secretário do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte do Governo da Bahia, Nilton Vasconcelos apresenta o legado de políticas públicas de valorização do trabalho deixado pelo PCdoB. Na foto, o Secretário de Trabalho do Governo da Bahia, o também comunista Davidson Magalhães (2019-2024).

Retomando a temática da participação dos comunistas na gestão pública, este texto aborda uma questão fundamental para aqueles que almejam uma sociedade menos desigual, em que as contradições entre capital e trabalho sejam resolvidas por meio da socialização dos meios de produção ou, ao menos, pela subordinação do processo de acumulação do capital aos interesses de toda a sociedade.

No contexto de um governo democrático sob o capitalismo, essa perspectiva se manifesta também na valorização do trabalho, seja por meio de uma política econômica e fiscal que não transfira aos trabalhadores os ônus das crises periódicas do capitalismo, ou que consolide conquistas econômicas e sociais históricas dos trabalhadores. Essas medidas exigem, necessariamente, o acúmulo de forças nos âmbitos legislativo – para assegurar uma legislação que proteja os interesses dos trabalhadores e garanta sua liberdade de organização -, e judiciário, de modo a garantir a aplicação efetiva dessas leis.

De acordo com o Programa do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), a luta pelo socialismo no Brasil exige a valorização do trabalho por meio de ações como:

“Reversão da atual transferência de renda da esfera do trabalho para o capital. Democratizar o sistema de relações sociais do trabalho… (da) Luta por mais empregos, melhores salários; salário igual para trabalho igual entre homens e mulheres; …ampliação dos direitos trabalhistas e previdenciários; … formalização do mercado de trabalho; e, sobretudo, pela redução constitucional da jornada de trabalho sem redução salarial” (Programa Socialista).

No campo institucional, as políticas públicas de valorização do trabalho se traduzem em programas específicos que abrangem a geração de emprego e renda, o fomento ao microcrédito produtivo e orientado, a intermediação do emprego, aproximando oportunidades ofertadas por empregadores e trabalhadores desempregados. Mas não apenas isto, que também cuide da formação e da qualificação profissional, estimule a redução das desigualdades no mercado de trabalho – no ambiente e nas relações de trabalho assalariadas ou não, remuneradas ou não.

Importa destacar o avanço das políticas liberalizantes que têm intensificado a precarização do trabalho, caracterizada pelo rebaixamento sistemático da remuneração, aumento do desemprego estrutural, do emprego de tempo parcial, e do trabalho intermitente, e a ampliação do trabalho informal.  A narrativa do “empreendedorismo” muitas vezes mascara empregos precários como alternativas emancipadoras, descoladas do emprego assalariado tradicional. É o caso do trabalho por aplicativos, especialmente no transporte de pessoas e mercadorias, que ganhou relevância desde a pandemia de Covid-19, funcionando como alternativa para milhões de trabalhadores. Em 2022, estimava-se que 1,5 milhão de pessoas atuavam nesse setor, segundo pesquisa da Unicamp e IBGE.

No entanto, as políticas públicas de trabalho não têm evoluído substancialmente no sentido de apoiar adequadamente a organização do trabalho associado de modo a ganhar autonomia em relação às grandes plataformas que dominam o mercado global. Apesar de muitas vezes ser reconhecido pela justiça como uma relação de emprego disfarçada, face à presença dos elementos que configuram a relação trabalhista, a matéria está longe de estar pacificada no meio jurídico.

Enfim, as políticas públicas do trabalho têm inúmeras particularidades e é grande o desafio de desenvolver a elaboração de novos programas que sigam na contramão do sistema concentrador de renda, e gerador de desigualdades.

A experiência do estado da Bahia, sob gestão do PCdoB na Secretaria do Trabalho, Renda e do Esporte (Setre), em sucessivos governos comandados pelo PT – Jaques Wagner, Rui Costa e Jerônimo Rodrigues, ilustra uma abordagem continuada de valorização do trabalho. Secretários indicados pelo PCdoB, Nilton Vasconcelos (2007 – 2014), Álvaro Gomes (2015 – 2016), Olívia Santana (01/2017 – 04/2018), Vicente Neto (05/2018 – 12/2018) e Davidson Magalhães (2019-2024) promoveram iniciativas relevantes, como a implementação da Agenda Estadual de Trabalho Decente e da política de Economia Solidária, que são referências no país e fora dele. A continuidade dessas políticas ao longo de dezoito anos consecutivos de gestão, permitiram o seu contínuo aprimoramento.

Leia mais: Nilton Vasconcelos: Atuação dos comunistas na vida institucional

Em um processo de renovação dos quadros da área institucional, o dirigente comunista Augusto Vasconcelos, vereador reeleito em Salvador com expressiva votação, sindicalista bancário, advogado, professor, foi anunciado como novo titular da Secretaria do Trabalho, com o desafio de avançar na formulação e implantação da política do trabalho no Estado da Bahia.

O Trabalho Decente e a Economia Solidária

Esses programas foram estruturados por meio de diversas leis e decretos e têm orçamento garantido nos planos plurianuais. São apresentados a seguir, os traços mais gerais dessas políticas.

Antes, porém, deve-se mencionar peculiaridades do desenvolvimento do estado da Bahia, que detém a quarta maior população entre os estados brasileiros, a sétima economia medida pelo PIB, e uma das menores renda per capita do país. A informalidade, a baixa remuneração, e a significativa participação entre os beneficiários do Bolsa Família, demonstram os efeitos de uma economia baseada na produção de bens intermediários – industriais e commodities agrícolas, e em uma indústria de baixa capacidade de incorporação de força de trabalho. Simultaneamente, tem 68,7% do seu território ocupado pelo semiárido, onde predomina uma economia de subsistência. Associado a isto, não restam dúvidas de que a pobreza está diretamente ligada aos séculos de escravização da população negra, somada às características do desenvolvimento capitalista dependente.

É neste contexto que se dá a implementação da política de valorização do trabalho.

Adotando o conceito formulado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) de Trabalho Decente, que orientou a ação daquela agência tripartite a partir do final dos anos 1990, a Secretaria do Trabalho da Bahia, em 2007, implementou a estratégia considerada pela própria OIT como a pioneira em todo o mundo, servindo de referência para outras unidades da federação e para outros países.

Segundo a OIT, o Trabalho Decente é um trabalho produtivo, desenvolvido em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humana. Com base nesse conceito, duas formas de trabalho devem ser abolidas em todo o mundo: o trabalho infantil e o trabalho escravo, este último previsto na legislação brasileira como “trabalho análogo ao trabalho escravo”.

Promover as condições de trabalho decente ou reduzir de forma incremental os déficits é uma estratégia que pode ser aplicada a diferentes situações observadas no mundo do trabalho, a exemplo das diferenças entre homens e mulheres e entre negros e brancos. Estas diferenças correspondem, em especial, às taxas de desemprego e aos valores de remuneração, sempre desfavoráveis para negros e mulheres. Noutra dimensão, jovens, pessoas com deficiência e trabalhadoras domésticas também sofrem discriminação em relação a oportunidades de emprego e de renda.

O ambiente de trabalho também pode apresentar fatores altamente negativos que comprometem a segurança e a vida, devido à insalubridade e à periculosidade, presentes em diversas atividades laborais. A informalidade nas relações de trabalho, a inexistência de proteção social e a falta de empregos de qualidade são, igualmente, déficits a serem superados para alcançar condições de trabalho dignas. Assim, a lista de circunstâncias ou atividades que vulnerabilizam os trabalhadores aumenta quanto piores são as oportunidades de ocupação.

Para enfrentar este quadro foram constituídas câmaras com participação de organizações da sociedade civil para cada uma das prioridades identificadas na agenda após processo de mobilização social e realização de diversas conferências no estado da Bahia. Cada câmara, integrada por governo, trabalhadores, empregadores e sociedade civil, definiu os principais déficits a serem enfrentados, estabelecendo metas específicas para alcançar melhorias com base no diagnóstico traçado.

Desde 2007, muitos avanços foram obtidos, entre os quais a criação e consolidação do Fundo Estadual de Promoção do Trabalho Decente (FUNTRAD), que financia iniciativas alinhadas com os objetivos de valorização do trabalho. Os recursos são oriundos, em grande parte, do resultado de termos de ajuste de conduta firmados pelo Ministério Público do Trabalho e decisões da Justiça do Trabalho.

A segunda dimensão da política a ser mencionada é voltada ao fortalecimento da Economia Solidária, com a criação de superintendência específica, que também abrange políticas para o cooperativismo.

As iniciativas do chamado cooperativismo popular nos anos 1990, em um contexto de forte crise econômica e desemprego no Brasil, impulsionaram a criação de incubadoras de cooperativas populares vinculadas às instituições de ensino superior e o surgimento do Fórum Brasileiro de Economia Solidária, em 2001, seguido posteriormente pelos fóruns estaduais. 

Com o governo Lula, foi criada, em 2003, a Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes), marco importante para a criação da política nacional do segmento, que sofreu revezes após o golpe de estado que afastou a presidenta Dilma Rousseff.

A contínua implementação da política para este setor na Bahia fez com que se apresentasse hoje como uma das mais completas iniciativas do país, destacando-se a aprovação do marco legal da Economia Solidária e a implantação dos Centros Públicos de Economia Solidária, distribuídos por 17 Territórios de Identidade, e responsáveis pela assistência técnica a empreendimentos solidários no estado.

Outras políticas, como a manutenção de agências de microcrédito em mais de 200 municípios, editais específicos para fomentar fundos rotativos e bancos comunitários, apoio à realização de feiras regionais, formação de redes de empreendimentos solidários, e incentivo à reciclagem, entre outros, conferem contornos mais definidos à política estadual.

O ano de 2023 foi marcado pela constituição do Comitê de Economia Solidária no âmbito da Câmara de Desenvolvimento Econômico do Consórcio Nordeste – autarquia interestadual de integração dos nove Estados da região. Sob a presidência da Setre, o Comitê tem buscado disseminar práticas exitosas com o intercâmbio de informações e ações regionais, indicando um mecanismo institucional inovador para o avanço dessa política.

Assim, pode-se concluir que essa política pública constitui uma forte contribuição do PCdoB ao processo de valorização do trabalho, no âmbito de um governo democrático, configurando-se como uma ferramenta essencial para o enfrentamento das grandes desigualdades sociais engendradas pelo capitalismo.

Nilton Vasconcelos é Doutor em Administração Pública, ex-secretário do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte do Governo do Estado da BahiaÉ membro do Grupo de Pesquisa sobre Estado e Instituições da Fundação Maurício Grabois.

Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial da FMG.