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    Economia

    Era Digital transforma trabalho no Brasil; entenda como

    Gig economy e digitalização impõem novos desafios às condições laborais e acentuam a precarização do trabalho no país.

    POR: Carlos Rogério de Carvalho Nunes

    Entregadores de aplicativos, em São Paulo (SP).
    Entregadores de aplicativos, em São Paulo (SP). Rovena Rosa/Agência Brasil

    Quais são os efeitos da digitalização na classe trabalhadora brasileira na atualidade? A pergunta pode ser respondida sob diversos ângulos ou pontos de vista. Os diagnósticos podem ser diferentes de acordo com a perspectiva de classe social. As instâncias de governo – devido à composição de classe delas – geralmente refletem o ponto de vista empresarial ou, no máximo, procuram responder a um entendimento consensual da classe que a forma. Pretendemos, com este artigo, contribuir para o debate sobre os aspectos nefastos da digitalização para a classe trabalhadora brasileira. Apesar desse artigo ter reduzido elementos de análise, partiremos de uma abordagem real e objetiva desses efeitos na classe trabalhadora, sempre sob o ponto de vista dos seus interesses.

    É salutar que um conjunto amplo de organizações da sociedade civil, como a academia, por exemplo, imbuídas em estudos e pesquisas, também façam análises e conclusões assertivas quanto ao impacto de novas ferramentas, processos e formas de gestão que alteram profundamente o processo produtivo e a circulação de mercadorias sob a égide digital. As consequências para a classe trabalhadora brasileira são expostas com detalhes por essas instituições.

    Algumas expressões surgiram para identificar uma nova tendência na economia e no mundo do trabalho. Uma delas é a Gig economy, termo de origem norte-americana criado para designar atividades realizadas por trabalhadores sob formas flexíveis e alternativas nas relações de emprego, , isto é, vínculos ou contratos de trabalho modificados, diferentes dos vínculos formais anteriormente conhecidos. O surgimento da Gig economy é um exemplo dessa nova onda. Ela está ligada diretamente com a era digital para a prestação de serviços temporários ou atividades de curta duração. Chamamos esse fenômeno de precarização do trabalho.

    Constatamos o crescimento dessa modalidade de contratação de trabalhadores. Dados empíricos do mundo do trabalho no Brasil revelam que essa tendência está aumentando e, ao mesmo tempo, se mantendo em taxas elevadas. O trabalho precário, portanto, desponta como uma tendência intimamente ligada à era digital. O trabalho precário cresce como uma tendência vinculada diretamente à era digital.

    Essa precarização induz à informalidade. “Temos uma informalidade brutal – não conseguimos tirá-la de perto dos 40% da população ocupada –, há muita rotatividade e baixa renda”, afirma José Pastore, especialista em mercado de trabalho.

    A partir de dados da pesquisa sobre mercado de trabalho do IBGE de 2023, constatamos uma população na força de trabalho em torno de 109,1 milhões de pessoas. Desse contingente registra-se uma população ocupada com trabalho formal em quantidade de 59,6 milhões, o que representa uma taxa de formalização de 59,3%, e, como consequência, uma taxa de informalidade de 40,7%.

    Bom lembrar que a população na força de trabalho formal inclui empregados com carteira assinada, trabalhadores domésticos formalizados, militares, funcionários públicos estatutários, e trabalhadores por conta própria ou empregadores que contribuem para a previdência social. Ficam ausentes dessa população aqueles com nenhuma formalização de suas atividades laborais.

    Ainda sobre a Gig economy, pesquisa realizada pelas fundações Maurício Grabois, Perseu Abramo, Lauro Campos, Marielle Franco e Rosa Luxemburgo identificou que a maioria dos trabalhadores desse segmento valorizam os direitos trabalhistas.  Há um forte desejo desse grupo pesquisado em obter direitos trabalhistas tais como: 77% gostariam de ter o direito do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, dentre outras opiniões.

    Confira a íntegra da pesquisa do CASB sobre as classes trabalhadoras

    Duas atividades ilustram bem a tendência da precarização das relações de trabalho no Brasil: entrega de mercadorias e transporte de passageiros. Ambos os grupos exercem suas atividades a partir de plataformas digitais – os aplicativos. Esses trabalhadores representam cerca de 1,7 milhões no primeiro trimestre de 2023.  A informação é importante para constatarmos o crescimento de um setor de trabalho na economia que se caracteriza pela ausência de vínculo formal, existência de vários contratantes e flexibilidade de jornada de trabalho. O que chamamos popularmente de trabalhadores por aplicativos.

    Porém, essa é apenas uma parte do processo de crescimento da digitalização na economia e, consequentemente, nas relações de trabalho. Temos ainda o avanço da Inteligência Artificial, entre outros. Ainda outra preocupação. Todos esses processos estão em andamento e em expansão. Estamos acompanhando a precarização em um setor da economia – terciário -, onde temos pesquisas detalhadas e onde percebemos empiricamente as consequências. 

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    Existem ainda os setores diretamente ligados com a produção de mercadorias: agricultura, pecuária, extrativismo e indústria de transformação em geral. Esses setores são responsáveis diretamente pela produção de bens, onde o valor de uso e de troca se contemplam, e onde se cria o mais valor. É sobre essa realidade que trataremos em um próximo artigo.

    Fontes:

    Dados IBGE: Síntese de Indicadores Sociais.

    Revista Conjuntura Econômica, julho 2023, volume 77 , nº 07. Mercado de trabalho: a agenda pendente que só a queda do desemprego não resolve

    Pesquisa do CASB sobre “As classes trabalhadoras”. Disponível em: www.grabois.org.br.

    Carlos Rogério de Carvalho Nunes é coordenador do Grupo de Pesquisa Era Digital da Fundação Maurício Grabois.

    Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial dFMG.

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