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    Sociedade

    Seguem afiados os dentes do fascismo

    Cida Pedrosa reflete sobre o avanço da extrema-direita no mundo, os reflexos no Brasil, a organização da resistência e a luta por um futuro plural e democrático

    Protesto contra o ódio, o fascismo, a supremacia branca e outras formas de intolerância, em Pittsburgh (EUA).
    Protesto contra o ódio, o fascismo, a supremacia branca e outras formas de intolerância, em Pittsburgh (EUA). Foto: Mark Dixon/Flickr (CC BY)

    Se há uma certeza, nesse grande labirinto da existência, é que a vida é cíclica. A história é feita de arrodeios. Vai e vem, dá cambalhota, corre e volta para gargalhar na nossa cara. De tempos em tempos, tomamos um susto ao constatar que seguem afiados os dentes do fascismo. Com o fracasso da política neoliberal em todo o planeta, os capitalistas seguem se reinventando e correm de boca aberta atrás do nosso cangote. 

    A novidade, desta vez, são as big tecs e seus donos bilionários apoiando explicitamente a corrida pelo fim do mundo. Sem o menor constrangimento de se alinhar ao garoto propaganda do apocalipse, todos se empenharam em eleger e aplaudiram de pé a volta de Donald Trump. Ao analisarmos a semiótica do evento de posse, temos pistas do que vem por aí: a supremacia branca e pós-neoliberal, tão bem adornada de preconceitos e intolerâncias, segue pronta para nos globalizar, impondo suas vontades sádicas e imperialistas. 

    Leia também: Musk, Zuckerberg e novos oligarcas na órbita de Trump

    Chantageados ou não, os donos das principais plataformas de comunicação do mundo mostraram – inclusive com saudações nazistas – que xenofobia, misoginia, transfobia, racismo e os mais diversos tipos de absolutismos estarão cada vez mais presentes em uma tela muito próxima a cada um de nós. A esquerda precisa aprender a dominar e colocar em prática, de uma vez por todas, o funcionamento dos algoritmos para não sermos engolidos pelos reels muito bem produzidos e mentirosos da extrema direita. A crise do pix foi só uma prévia do que nos aguarda nas próximas eleições, aqui no Brasil. 

    A equação segue a mesma durante os séculos: quanto mais avançarmos nas pautas progressistas, mais tencionamos o lado conservador. Assim, medimos a temperatura e distância das mudanças socioculturais. Nesta quadra da história que vivemos, marcada por recessão econômica, instabilidade política e ineficiência das elites tradicionais – combustíveis suficientes para explodir a tampa do totalitarismo, vimos, a olhos nus, a organização de partidos e movimentos de extrema-direita ao redor do mundo, criando uma verdadeira “Internacional Fascista”. Alguns desses partidos, inclusive, já chegaram ao poder, como na Itália e Hungria. 

    No Brasil, vivemos poucos dias com o cheiro fresco da democracia renovada. Aí veio o 8 de janeiro, a descoberta do plano golpista de matar a chapa presidencial eleita e instalar estado de sítio no país, além de uma gama de revezes que o governo Lula tem sofrido a cada negociação parlamentar com o Centrão misturado de extremistas. Seguimos nas rédeas do país, mas é por enquanto. Precisamos urgentemente reforçar a frente ampla em torno de Lula e reconquistar o apoio de trabalhadoras e trabalhadores, incluindo os informais e empreendedores.

    Golpe do 8 de janeiro: não foi o primeiro, nem será o último

    As células neofascistas seguem vivas e prontas para a mitose, basta acompanhar a quantidade de representantes que ocuparam cadeiras das Câmaras e Assembleias país afora nas últimas eleições. Nos Estados Unidos, Trump já começou o governo com decretos absurdos, políticas xenófobas e protecionistas. “Limpar” a Faixa de Gaza, expulsando os palestinos que moram lá há séculos, parece ser sua nova diversão tirana, apesar das manifestações contrárias. Só a história dirá se essa correnteza nos afogará ou vai engrossar o caldo da resistência deste lado dos trópicos. 

    Leia também: Trump e Gaza – o apoio do empreendedor ao projeto colonial e genocida de um século

    Por aqui, estamos nos organizando coletivamente para defender a nossa democracia e a manutenção de direitos. Como vereadora do Recife, tenho tentado barrar os retrocessos. A cada sessão plenária, inicia-se a batalha de articulações para tirar de pauta projetos que afrontam diretamente questões de gênero, diversidade religiosa e tantas outras conquistas que já foram consolidadas. 

    A boa notícia é que não andamos só. A Alemanha resiste às investidas fascistas, movimentos como o Black Lives Matter tentam frear os desmandos de Trump, a França ensaia suas marchas democráticas e, no Brasil, movimentos sociais, artistas e organizações de direitos humanos têm se mobilizado na defesa do bem viver. 

    Manifestantes participam da Culturata da 14ª Bienal da UNE em Recife (PE), celebrando a democracia e reivindicando justiça. Com bandeiras e sombrinhas de frevo, o ato destaca o lema “Democracia e Paz – Sem Anistia para Golpistas! Foto: UNE / Divulgação

    Precisamos seguir vigilantes e, ao invés de correr, encararmos o fascismo cara a cara. Enfrentar a extrema direita é o que temos para o futuro próximo e, para isso, precisamos fortalecer nossa memória coletiva. Somos um povo marcado pelas violências e não podemos mais naturalizá-las. Derrotamos os fascistas na década de 1940, derrotaremos novamente agora. Sigamos na luta por dias melhores, fincando os pés no presente para colhermos um futuro frutífero, plural e próspero.  Contem comigo. 

    Cida Pedrosa é advogada, poeta, escritora premiada e vereadora reeleita do Recife. É membro do Grupo de Pesquisa Cultura & Sociedade da Fundação Maurício Grabois.

    Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial da FMG.

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