Novidades importantes surgiram com a divulgação da pesquisa de Origem-Destino (OD) realizada pela Companhia do Metrô de São Paulo. A cada 10 anos, desde 1967, a pesquisa mapeia como são feitos os deslocamentos da população da região metropolitana de São Paulo, onde moram cerca de 20,7 milhões de pessoas.
Excepcionalmente, a pesquisa foi antecipada (a próxima seria em 2027) para captar o que havia de mudanças nos deslocamentos pós-pandemia. Surgiram algumas novidades interessantes, mas predominam as que são preocupantes e apontam para retrocessos em relação às políticas públicas que vêm sendo implementadas na área do transporte urbano.
O dado positivo é a queda do número de viagens diárias realizadas entre 2017 e 2023, de 42 milhões para 35,6 milhões, uma redução de 15%, e a primeira vez em seis décadas. Os motivos ainda estão sendo melhor averiguados, mas a interpretação inicial é de que sejam resultado da mudança de hábitos provocados pela pandemia, ou seja, a adoção do trabalho remoto, híbrido e do ensino a distância.
Entretanto, o mais surpreendente é que pela primeira vez em 20 anos, os moradores passaram a usar mais o transporte individual que o coletivo. Carros, motos, táxis e veículos por aplicativo foram usados para fazer 51,2% das viagens, enquanto os deslocamentos por metrô, ônibus e trens somaram 48,8%.
O acelerador do transporte individual são os serviços por aplicativo que se instalaram nos últimos dez anos. O crescimento foi de 137,3%.
Os automóveis são o modal mais utilizado (com uma pequena queda de 0,9%), seguido pelas viagens a pé e por ônibus. Houve crescimento de 15,9% nas viagens com motocicletas. Nestas o destaque fica com o aumento no uso pelas mulheres, uma elevação de 72,6%.
Os dados completo da pesquisa divulgada nesta terça-feira (11) estão disponíveis em: PESQUISA ORIGEM E DESTINO 2023
A queda do transporte coletivo foi de expressivos 19,8%. Esta tendência de declínio vinha sendo constatada desde 2007, mostrando que os efeitos positivos da introdução do Bilhete Único nos anos 2000 – que permitiu economia e integração dos modais – não foram sucedidos por novas iniciativas de peso para induzir o uso do transporte público. As tarifas permaneceram altas: uma passagem de ônibus ou de metrô em São Paulo, ida e volta, custa, respectivamente, R$10 e R$10,40.
Mesmo a implementação de corredores exclusivos de ônibus, na gestão municipal de 2013-2016, foi perdendo abrangência nos governos seguintes. A expansão do metrô é de uma lentidão impressionante, e a malha como um todo é totalmente insuficiente.
![Iniciada em 2015, construção da linha 6 - Laranja do metrô de São Paulo (SP) ainda não concluída. Em 12/12/2024, parte da obra na futura Estação Bela Vista desabou. Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil](https://grabois.org.br/wp-content/uploads/2025/02/pin8402-300x225.webp)
Iniciada em 2015, construção da linha 6 – Laranja do metrô de São Paulo (SP) ainda não concluída. Em 12/12/2024, parte da obra na futura Estação Bela Vista desabou. Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
Em síntese, em vez de expansão do transporte público e coletivo – com mais investimentos, tarifas mais baixas , eficiência, conforto e rapidez , o que se estabelece é o padrão de mais veículos particulares nas ruas, mais trânsito, maior número de acidentes envolvendo motociclistas, carros e pedestres, mais estresse individual.
Neste momento, há uma pressão para a regularização dos serviços de mototáxi na capital, o que elevaria tanto o número de motos nas ruas quanto os riscos de acidentes. As mortes em acidentes com motos representam 37% do total dos óbitos no trânsito da capital. Foram 483 mortes em 2024, uma elevação de 20% em relação ao ano anterior.
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O Brasil é um país com cidades intensamente urbanizadas, em que os deslocamentos da população para trabalhar e estudar continuam sendo longos, demorados e cansativos. Representam uma jornada a mais para aqueles que se deslocam para o trabalho, retirando um tempo precioso de vida útil e saudável para as pessoas. O que a pesquisa OD revela é que estamos caminhando para trás, um péssimo sinal para o interesse dos cidadãos em geral e um grave alerta para todos os gestores públicos.
Nádia Campeão é engenheira agrônoma com especialização em gestão pública. Foi Secretária de Esportes, Secretária de Educação e Vice-Prefeita de São Paulo (SP). É membro do Conselho Curador da FMG.
Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial da FMG