Trump… de novo – No Ocidente, o menor crescimento, o aumento da desigualdade e o aquecimento planetário deram origem a vozes messiânicas, como Erdogan, na Turquia; personagens mercuriais, como Trump, nos EEUU; e figuras caricaturais, como Milei e sua motosserra, na Argentina. A multiplicação do xenofobismo, do protecionismo exacerbado e eventos como Brexit sinalizam a ascensão de um imperialismo neomercantilista, na falta de melhor solução.
A reeleição de Trump para comandar a maior economia do mundo até 2029 acentua a instabilidade e as dúvidas. Uma certeza é o retrocesso em termos morais e éticos, sendo os primeiros alvos desta onda ultraconservadora a imigração, a diversidade e o meio ambiente. Outra é a intimidação violenta por parte de uma superpotência sob nova direção. O caos, como instrumento de barganha, também marca o personagem.
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Cada vez mais, a política econômica e a política externa dos EEUU se confundem com o mercantilismo original: o comércio exterior é uma guerra, os monopólios são concedidos aos mais próximos, e as colônias fornecem matéria-prima e se subordinam politicamente à metrópole. A aliança entre, por um lado, banqueiros e comerciantes e, por outro, reis e príncipes alavancou o capitalismo como modo de produção e estendeu seus braços ao resto do mundo. Vale lembrar que, com a falência do mercantilismo e o fim do Antigo Regime, o século XVIII foi o mais sangrento na Europa, depois do passado.
Em pleno século XXI, de novo, conflitos militares, sanções comerciais, disputas tecnológicas, populismo e demagogia ameaçam acabar em um embate de civilizações – agora, numa era nuclear. As expectativas atuais estão muito distantes daquelas geradas com a chegada do novo milênio, há 25 anos. Em termos econômicos, além do tom mercantilista, o cenário é contaminado pelo encarecimento do capital e pela necessária mudança estrutural. O futuro depende de um planeta com bem menos gases de efeito estufa na atmosfera e, portanto, de um novo ciclo de investimento.
A incerteza alimenta o ceticismo, assim como a aversão ao risco do capitalista, o que fará perdurar a “estagnação secular” (tomando emprestado a noção dos pensadores clássicos): depois dos choques do petróleo, década após década, tirando China e Índia, o crescimento só fez cair. Antes do próximo ciclo, o país precisa reerguer sua infraestrutura, recuperar o atraso em C&T, reforçar o protagonismo nos biocombustíveis e retomar o avanço na eletrificação dos processos industriais, da mobilidade coletiva e nas residências.
Enquanto Trump atiça o enfrentamento global, cabe ao Brasil definir um projeto próprio de desenvolvimento que considere a presente fragmentação mundial e o futuro bastante indefinido das relações internacionais. Para o país, as dotações em recursos naturais, a extensão geográfica e o bônus demográfico não bastam. Além disso, os seis anos passados de desmonte do Estado em nada ajudam quando, lá fora, paira a desordem na transição energética e se confirma o declínio ocidental.
Luis Eduardo Duque Dutra é professor da Escola de Química da UFRJ, e autor de Capital Petróleo: A saga da indústria entre guerras, crises e ciclos e pesquisador do Grupo de Pesquisa da Fundação Maurício Grabois sobre Transformação ecológica e diversificação energética
Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial da FMG