O 8 de Março é um marco na celebração da luta das mulheres ao longo da história. Na atualidade, vem se ampliando para o que se chama Março Mulher, quando se estendem mobilizações de diversas formas por todo o mês.
Neste Março Mulher de 2025, brasileiras de várias regiões do país se mobilizam a partir de uma agenda ampla e unificada em cada estado brasileiro. A pauta se repete e permanece atual, com poucas variações: democracia (e também a luta contra o fascismo), o fim das violências de gênero – em especial, o feminicídio –, o direito à vida, a garantia das condições para o aborto previsto em lei, a descriminalização do aborto, a igualdade salarial, o fim da escala 6×1, comida no prato, o direito à cidade, o bem viver e o combate ao racismo.
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A agenda diversificada, além de ter correlação entre as lutas, é um mini retrato das adversidades e desigualdades proporcionadas pelo patriarcado na atual sociedade capitalista, que afetam as mulheres quando não lhes subtrai a vida pelo feminicídio, aliás, com níveis alarmantes em nosso país.
Quem se indigna com o feminicídio e com as violências de gênero de todo tipo, entre elas também a violência política, não pode deixar de buscar a identificação das causas desse grave problema, que está na estrutura da nossa sociedade e na cultura reproduzida e retroalimentada a partir dela. Sem dúvida, com o avanço do conservadorismo em todo o mundo, essa situação se agudiza e se torna mais premente.
As mulheres são maioria da população, do eleitorado e, desde 2022, também maioria das chefias de família (provedoras) do nosso país. Nos lares monoparentais, aqueles onde apenas um adulto vive com os filhos, sem a presença de um cônjuge, a chefia feminina chega a 92%. Mas continuam em condições desiguais.
O Dieese, em Boletim Especial do 8 de Março com dados de 2024, ressalta o crescimento de 3,5% do PIB e a criação de 1,7 milhão de empregos com carteira, na queda do desemprego e no aumento recorde da massa salarial do país sob o Governo Lula. No entanto, constata que, diante desse cenário positivo, as desigualdades entre mulheres e homens no mercado de trabalho permanecem inabaláveis. As mulheres continuam com as maiores taxas de desemprego, em trabalhos mais precarizados, e ganham menores salários. O rendimento médio das mulheres é 22% a menos do que o dos homens para trabalho igual (IBGE) e ainda acumulam tarefas domésticas, incluindo atividades relacionadas aos cuidados de outras pessoas, atribuição que muitas ainda realizam além dos limites dos próprios lares, como trabalho remunerado.
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A situação é ainda mais desigual para as mulheres negras. Ressalta-se que a conciliação entre a jornada no ambiente público e o exercício das atribuições em ambiente doméstico costuma ser descrita como dupla jornada de trabalho. Em algumas situações, essa carga ainda se amplia, sendo expressa como tripla jornada. Na realidade, porém, é muito mais do que jornada de trabalho. Trata-se da divisão sexual do trabalho em nossa sociedade sob relações de domínio do patriarcado, que destina às mulheres o trabalho de cuidados com os filhos e outras pessoas e afazeres domésticos, vinculado ao papel social que lhes é atribuído. Ainda que inseridas no mercado de trabalho, elas continuam sendo as protagonistas das tarefas domésticas.
Na mesma perspectiva, as mulheres estão sub-representadas na política e também em outros espaços de decisão, a exemplo de postos de gestão em empresas e instituições públicas, em direção de grupos de pesquisa e outros espaços. Ainda que sejam maioria em determinado segmento e, muitas vezes, mais qualificadas tanto na educação formal, acadêmica, quanto na especialização técnica.
As hierarquias de classe e raça incidem no acesso aos espaços de poder e decisão. A divisão sexual do trabalho e as formas de construção do feminino a ela relacionadas também fazem com que as mulheres tenham chances menores do que os homens de ocupar posições na política institucional e de dar expressão política às perspectivas, necessidades e interesses.
A agenda de lutas de uma maioria não pode ser considerada apenas como a agenda de um nicho. E isso leva à questão de que a divisão sexual do trabalho é um problema da democracia e que, para o fortalecimento democrático, essa questão necessita ser abordada.
As mulheres fora dos espaços institucionais, em especial na política institucional, têm menos condições de exercer influência nas políticas públicas e até mesmo de que existam políticas públicas que as contemplem.
São conquistas a instituição pelo Governo Lula da Lei da Igualdade Salarial e da Política de Cuidados, com uma conjunção de esforços do Governo, da Bancada Feminina no Congresso Nacional e dos movimentos sociais, em especial do movimento feminista. Mas é preciso avançar na implementação dessas políticas e ir além.
Ainda estamos aqui na luta.
Fontes:
- Boletim Especial 8 de Março do DIEESE, 2025
- Biroli, Flávia. Gênero e Desigualdades: os limites da democracia no Brasil, 2018
Julieta Palmeira, médica, assessora de inovação da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep/MCTI), secretária de estado de Politicas para Mulheres da Bahia de 2017 a 2022.
Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial da FMG.