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    Sociedade

    Como municípios podem enfrentar a violência e o crime organizado?

    Do tráfico de drogas à falta de iluminação pública, entenda por que a segurança pública exige ações locais integradas e como sua cidade pode agir

    POR: José Carlos Pires

    9 min de leitura

    A violência e a criminalidade decorrem, dentre outros fenômenos, dos crimes comuns que acontecem nos territórios das cidades brasileiras e são os responsáveis potenciais pela sensação de insegurança pública, pelo medo e pela angústia da população. Destacam-se os homicídios dolosos e os culposos relacionados ao trânsito, além de roubos, furtos – inclusive de veículos, violência contra as mulheres, manifestações do racismo estrutural, atos de homofobia, entre outros.

    Em outra dimensão, temos a ação do crime organizado com atuação regional, nacional e internacional, no tráfico de drogas, contrabando e lavagem de dinheiro em diversos segmentos da economia. O crime organizado está presente em diversas cidades brasileiras, por meio de variadas organizações criminosas, entre elas: Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho, Comando do Norte e as Milícias.

    Leia também: Quem é o terrorista no RJ? A polêmica do Comando Vermelho e o acordo anti-crime com os EUA

    Percebe-se que o enfrentamento da violência e da criminalidade é um desafio complexo, multifatorial, que envolve a atuação coordenada, integrada, sistêmica e perene dos entes federados — União, Estados, Distrito Federal e Municípios — e a participação efetiva da sociedade, a partir da implementação de uma Política de Segurança Pública Democrática e Cidadã, pautada, de fato, na defesa dos Direitos Humanos. Por isso, o enfrentamento da violência e da criminalidade está intimamente ligado à integração, à inteligência, à prevenção e à repressão aos diversos fenômenos da violência.

    Para tanto, é necessário que o poder público se debruce sobre a realização de um diagnóstico das condições locais, visando identificar os tipos de crimes que acontecem nos diversos territórios do município, para definir as estratégias, os objetivos, as metas para a prevenção e a repressão à violência e à criminalidade, a garantia dos Direitos Humanos, o pleno exercício da cidadania e a construção da paz social. Mas, por qual motivo isso deve ser realizado? Cada tipo de crime requer medidas no campo estratégico e tático-operacional, visando à adequada solução para garantir a segurança da população. E qual o papel dos municípios na Política de Segurança Pública para o enfrentamento da violência e da criminalidade, para a garantia dos Direitos Humanos e da ordem pública, para o pleno exercício da cidadania, a construção da paz social e o convívio harmônico da população nos territórios urbanos e rurais dos municípios brasileiros?

    A Lei Federal nº 13.675/2018 que instituiu o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) diz no artigo 2º que:

    “A segurança pública é dever do Estado e responsabilidade de todos, compreendendo a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no âmbito das competências e atribuições legais de cada um.”

    Portanto, aos municípios cabem a prevenção primária da violência e da criminalidade, de forma integrada e sistêmica com os entes federados — União, Estados e Distrito Federal.

    Para tanto, os municípios devem realizar a prevenção da violência por meio da implementação de sistemas de monitoramento para a produção de dados, conhecimento e informações para o trabalho de inteligência na prevenção e enfrentamento da violência e da criminalidade; atuação das guardas municipais, da defesa civil, dos órgãos de poder de polícia administrativa (fiscalização de trânsito, comércio, posturas, vigilância sanitária); da implementação de políticas sociais nos territórios e segmentos de maior vulnerabilidade social; e do incentivo à participação da sociedade na elaboração, execução e controle da Política de Segurança Pública.

    A atuação das guardas municipais deve obedecer aos princípios preconizados pelo Estatuto Geral das Guardas Municipais, sendo considerado como elementar a proteção dos direitos humanos fundamentais, do pleno exercício da cidadania e das liberdades públicas, da preservação da vida, da redução do sofrimento e diminuição das perdas, do patrulhamento preventivo comunitário, do compromisso com a evolução social da comunidade e do uso progressivo da força. O papel da guarda municipal é, essencialmente, a prevenção da violência.

    Leia mais: Guarda Municipal para atuar na prevenção da violência

    Também como prevenção da violência, é necessário que os municípios atuem para garantir o ordenamento urbano, a mobilidade urbana ágil e segura para os pedestres, ciclistas, motociclistas e condutores, por meio da fiscalização, autuação, sinalização vertical e horizontal; o enfrentamento da perturbação do sossego, visando garantir o bem-estar dos munícipes; e a zeladoria, buscando garantir iluminação pública de qualidade, conservação e manutenção das cidades, permitindo a ampliação da sensação de segurança pública.

    A atuação dos municípios na prevenção da violência deve contribuir para garantir o pleno desenvolvimento das funções sociais das cidades, nos termos do artigo 182 da Constituição Federal, que define: 

    “A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.”

    A materialização da participação dos municípios na prevenção e enfrentamento da violência e da criminalidade se dá por meio da elaboração da Política Municipal de Segurança Pública, harmonizada em um Plano de Segurança Pública constituído por diagnóstico situacional e pela realização de audiências públicas, para garantir que as demandas da sociedade sejam atendidas. A política de segurança deve ser constituída com base em evidências, e o referido plano deve ser composto por diretrizes estratégicas, objetivos, metas e indicadores, nos termos do § 5º do artigo 22 da Lei do SUSP. O Plano de Segurança Pública é o instrumento de governança e de implementação do SUSP no âmbito do município.

    “A segurança pública precisa de uma transformação, que tenha dimensão política e que estabeleça mudanças estratégicas e operacionais com uma governança democrática. Hoje, a gente não tem governança democrática.” (Lozano, A.; Pires, J.C.; e Scárdua, M., 2025, p. 68)

    A Política de Segurança Pública deve ser construída de forma a integrar o uso de tecnologias inovadoras, a atuação dos órgãos de Segurança Pública, dos órgãos de Poder de Polícia Administrativa, a implementação de políticas sociais de prevenção da violência nos territórios de maior vulnerabilidade social, das ações de zeladoria e o incentivo à participação da comunidade.

    Segundo Kopittke (2023):

    “A política de prevenção social à violência busca reduzir fatores de risco e potencializar fatores de proteção específicos, relacionados ao comportamento violento nos níveis individual, familiar, escolar e comunitário, mesmo que a realidade econômica e social seja extremamente desigual.”

    Para a gestão, coordenação e integração do Plano de Segurança Pública, os municípios devem constituir Gabinete de Gestão Integrada Municipal (GGIM), composto por representantes dos órgãos de Segurança Pública — Polícias Militar, Civil e Rodoviária, Guarda Municipal —, dos órgãos de Poder de Polícia Administrativa, de gestores das políticas sociais, do trabalho de zeladoria, do Ministério Público, do Judiciário e da OAB.

    A atuação dos municípios deve ser pautada pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), em especial o ODS 16: promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à Justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis.

    “O fortalecimento da participação dos municípios na segurança pública necessita de recursos para financiar a política de segurança pública no município, que precisa ser de forma perene no orçamento municipal.” (Pires, J.C., 2024, p. 120)

    Os referidos recursos podem advir da participação dos municípios no Fundo Nacional de Segurança Pública, de emendas parlamentares dos legislativos municipais, estaduais e federal, e da iniciativa privada. É fundamental a existência de projetos adequados para garantir a efetiva aplicação dos recursos.

    A atuação dos municípios na Política de Segurança Pública deve ser articulada, integrada e implementada de forma sistêmica e perene, por meio do SUSP, a partir das competências e atribuições de cada ente federado, visando à garantia dos Direitos Humanos, do pleno exercício da cidadania, da ordem pública e da construção da paz social nos territórios das cidades brasileiras.

    José Carlos Pires é advogado, da Coordenação Estadual da Associação dos Advogados e Advogadas pela Democracia, Justiça e Cidadania – ADJC-SP, Mestre em Desenvolvimento de Negócios e Inovação; Especialista em Gestão Pública Municipal; Consultor em Segurança Pública; Autor dos Livros Segurança Pública Uma Inovação na Gestão, Sistema Único de Segurança Pública no âmbito municipal e Organizador dos Livros Violência, Criminalidade, Segurança Pública; Segurança Pública: Integração, Inteligência e Prevenção e Gestor de Segurança Pública no Município de Jundiaí – SP de 2013/2016.

    Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial dFMG

    Referências:

    BRASIL. Constituição Federal.

    BRASIL. Lei Federal nº 13.675/2018 – Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS).

    KOPITTKE, A. (2023). Manual de Segurança Pública Baseada em Evidências. Passo Fundo: Conhecer.

    ONU BR – Nações Unidas no Brasil. A Agenda 2030. 2015. 

    LOZANO, A.; PIRES, J. C.; SCÁRDUA, M. (2025). Segurança Pública: Integração, Inteligência e Prevenção. Jundiaí: Editora Fibra & Edições Brasil.

    PIRES, J. C. (2023). Violência, Criminalidade e Segurança Pública: Estratégias para garantir a ordem pública, o pleno exercício da cidadania e a construção da paz social. Jundiaí: Editora Fibra & Edições Brasil.

     

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