O debate político brasileiro está restrito a “quem faz o melhor ajuste fiscal”, afirmou Elias Jabbour nesta segunda-feira (16), em referência à disputa envolvendo o decreto que elevou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), editado pelo governo Lula.
Professor associado da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e presidente do Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos, Jabbour aponta que esse tipo de “micronarrativa” passou a operar no debate público no lugar das categorias de totalidade, “que nos capacitam a construir uma estratégia e uma tática consoante com essa realidade”.
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“Despareceu do debate público o que eu chamo de categorias de totalidade. Nenhuma força política, tirando o PCdoB, fala hoje em desenvolvimento, projeto nacional, política industrial e classe social.”
O desafio do socialismo
A estratégia e a tática para o enfrentamento ao bolsonarismo, organizado e atuante no país, é a mesma necessária para a implementação do socialismo, aponta Jabbour: a construção de uma maioria política “que compreenda a centralidade de um caminho brasileiro ao socialismo centrado no projeto nacional de desenvolvimento”.
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Para chegar a esse nível de amadurecimento político, o professor da Uerj defende que é fundamental desobstruir o debate sobre o socialismo na sociedade brasileira, muitas vezes idealizado sem levar em conta as contradições inerentes à sua implementação na realidade de um país. Essa visão de mundo, “que beira o moralismo, atinge em cheio o marxismo”, aponta Jabbour.
Ele destaca que para defender o socialismo é fundamental entender que o socialismo hoje não é uma ciência acadêmica, mas uma ciência do poder político. “O socialismo nasce como uma ideologia igualitarista de caráter internacionalista, um hegelianismo de esquerda. Ao final do século XIX, o socialismo já é uma ciência, com categorias, conceitos e noções, uma teoria de profundidade, e a partir do século XX passa a ser efetivamente poder político.”

Mesa do debate Atualidade do Socialismo no Século XXI, em São Paulo (SP). Da esquerda para a direita: Guilherme Bianco, vereador de Araraquara (SP); Elias Jabbour, professor da Uerj e presidente do Instituto Pereira Passos (IPP); Thayna Malta, representante discente no Conselho Universitário da USP; Gustavo Petta, secretário nacional de Juventude do PCdoB e vereador em Campinas (SP); Manuella Mirella, presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE); e Gabriela Beraldo, diretora da Associação de Pós-Graduandos (APG) da USP. Foto: Yuri Salvador / PCdoB / Divulgação
Essa transição de uma teoria para o exercício do poder trouxe contradições para o movimento comunista. “No mundo real em que você tem que operar a formação social é viva, e uma formação social viva é feita de contradições”, destaca Jabbour.
Ele ressalta que o marxismo se desenvolve na sociedade de duas formas: a partir do exercício do poder político ou por meio da luta pelo socialismo. No caso do Brasil, onde não há uma experiência de socialismo real no exercício do poder, a perspectiva do PCdoB é de “radicalizar e ampliar”.
“Em uma realidade em que você tem uma extrema direita organizada te cercando, em que as ideias marxistas estão longe de ser hegemônicas na sociedade e que mesmo ser de esquerda não é algo trivial, você ser amplo, você está sendo muito radical.”
Olhando para a história brasileira, Jabbour destaca que os saltos civilizatórios do país como a Independência (1822), Abolição da Escravatura (1888), Proclamação da República (1889), Revolução de 1930 e a primeira eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (2002), não foram obra de um único partido, mas de uma “maioria heterogênea”.
“Quando o Partido Comunista do Brasil compreende que a história do país tem essas leis objetivas, nós passamos a operar observando essas leis”, destaca Jabbour, sobre a estratégia política do PCdoB.
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Socialismo do século XXI
A análise de Elias Jabbour foi feita para com plateia lotada no auditório Milton Santos, no prédio de Geografia e História da Universidade de São Paulo (USP), na etapa paulista do Ciclo de Debates O Futuro tem Partido, com o tema A atualidade do socialismo no século XXI.
Com sua carreira acadêmica trilhada na Geografia da USP, Jabbour lembrou que foi o intelectual Milton Santos quem o estimulou, ainda em 1993, a estudar a China como forma de entender o socialismo. Jabbour teve seu primeiro artigo sobre este país asiático aprovado em 1996 e desde então esse tem sido o foco de seus estudos, com o objetivo de compreender o socialismo. “A China é uma unidade de análise dentro da minha área de estudos que é o socialismo”, explicou.
“A China entrega presente e futuro para o seu povo e é governada pelo Partido Comunista, que carrega os mesmos símbolos desde 1948. Quem entrega futuro para seu povo é um país dirigido pelo Partido Comunista, assim como o Vietnã, com os índices de IDH [Índice de Desenvolvimento Humano] que sobem mais rápido na Ásia hoje.”
Caravana em Brasília (DF)
A próxima parada da caravana realizada pelo PCdoB, pela União da Juventude Socialista (UJS) e pela Juventude Pátria Livre (JPL), que percorre o Brasil com o Ciclo de Debates O Futuro Tem Partido, acontece em Brasília (DF), no dia 26 de junho (quinta-feira), das 17h às 20h, no Teatro de Arena da Universidade de Brasília (UnB). O tema será: Solidariedade entre os povos na construção de um mundo justo e multipolar.